REANP escancara desigualdades e dificuldades

Por Maria Flor de Maio de Jesus Silva [1]

 

Trago aqui um relato de entrevistas realizadas com alunos que frequentam o ensino médio da Escola Estadual Professor Leopoldo Pereira, localizada na comunidade de Milho Verde, distrito do município do Serro, Minas Gerais. A instituição é considerada escola do campo pelo perfil dos estudantes que atende. Trata-se de uma escola nucleada rural, ou seja, o seu espaço físico está situado na comunidade de Milho Verde, mas a área de abrangência da comunidade escolar é maior que a área onde a escola está localizada. 

Atualmente, a escola atende a 14 comunidades da zona rural que englobam desde a sede do distrito de Milho Verde, que tem uma pequena infraestrutura urbana, até localidades como a Serra da Bicha, o Amaral e a Jacutinga, lugares onde o acesso, seja às casas, à infraestrutura de comunicação, aos meios de transporte ou à saúde, é muito precário.

Diante da pandemia da Covid19, a Escola Estadual Professor Leopoldo Pereira, como as escolas de o estado, suspendeu as aulas presenciais e passou a buscar formas alternativas de manter o processo de ensino-aprendizagem de forma remota. Nesse período, em consonância com as propostas do governo estadual de Minas Gerais, utilizou principalmente os recursos tecnológicos como aplicativos e plataformas on-line. A estratégia adotada escancara a desigualdade e as dificuldades enfrentadas pelos estudantes e professores, pois alguns problemas comuns à maioria dos alunos têm origens econômicas como: acesso limitado a internet, falta de computadores e de espaço em casa, problemas sociais, sobrecarga de trabalho docente e baixa escolaridade dos familiares.

Foram entrevistados três alunos do ensino médio com o objetivo de obter subsídio para essa análise. Em relação ao contexto socioeconômico dos estudantes, podemos perceber que os estudantes A e B residem na zona rural, onde fazem o uso do transporte escolar para acesso à escola presencial. Já o estudante C mora próximo à escola, ou seja, na sede do distrito. Os estudantes A e B não possuem internet na comunidade e, assim, fazem o uso de dados móveis para estudar quando fazem recarga no telefone pré-pago, quando podem, pois acham caro. O estudante C tem internet em casa e em sua comunidade há duas prestadoras desse serviço.

As famílias dos estudantes A e B recebem auxílio do governo como o Auxílio Emergencial e o Bolsa Família, os pais são trabalhadores rurais e possuem o ensino fundamental. Os pais de C concluíram o ensino médio, seu pai, trabalha numa empresa de abastecimento de água. Sua mãe é dona de casa e recebe Bolsa Família. A qualidade de internet na zona rural é péssima, pois quase não há lugar com sinal de operadoras de celular e, quando há sinal, a transmissão dos dados funciona lentamente. Todos os três estudantes, no momento, não trabalham, ajudam nos afazeres domésticos e estudam.

No que se refere ao perfil dos entrevistados enquanto estudantes e dedicação à escola, o entrevistado A disse que não gosta muito de estudar e que só faz os deveres de casa quando solicitado. O conteúdo com o qual mais se identifica é história. Já o estudante B se dedica todos os dias aos estudos, independentemente de ser época de prova ou não. Ele afirma que sempre foi participativo nas atividades e com o ensino remoto dedicou-se ainda mais aos estudos. Disse também que gosta de “enturmar” com os colegas de sala. A disciplina que mais se identifica é biologia. O estudante C é um estudante muito esforçado, pois declarou que gosta muito de estudar e sempre dedicou aos estudos diariamente.

Em relação às percepções e preferências para seus futuros, todos os três entrevistados não pretendem ficar no campo, afirmam que querem cursar o ensino superior e ter uma profissão na cidade. Já sobre as percepções desses estudantes sobre o Plano de Estudos Tutorados (PET), foram distintas. Afirmaram que no início acreditavam que aprender não seria possível, mas perceberam também que as atividades seriam também uma forma de manter uma conexão com a escola. Com o passar do tempo, a didática dos PETS foi evoluindo, porém afirmaram que não conseguiram aprender todos os conteúdos e que as atividades eram de difícil entendimento, sobretudo por não terem internet de qualidade para assistirem às videoaulas. Os entrevistados disseram que assimilam melhor o conteúdo no ensino presencial do que a distância. Também perceberam que as formas de interações sociais foram prejudicadas com o distanciamento social. Todos possuem esperança de que a pandemia acabe logo.

Podemos observar que são realidades bem diferentes, mas o grande aprendizado deste período está realmente nas diferenças de contexto entre estudantes, professores e escolas. As desigualdades são multidimensionais, o que faz com que sejam mais intensas para alguns estudantes do que para outros, mesmo entre estudantes que frequentam a mesma escola, como mostra o resultado da análise das entrevistas que aqui finalizo, uma vez que são determinadas por suas condições sociais.

[1] Maria Flor de Maio é estudante da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM). Este relato foi produzido a partir de pesquisa supervisionada pelo professor Vítor Sousa Dittz, da Escola Estadual Professor Leopoldo Pereira, e orientada pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro, da UFVJM, no âmbito do PIBID-UFVJM.

Agradecimentos aos estudantes-sujeitos e suas famílias, bem como ao diretor da E. E. Professor Leopoldo Pereira, o professor Maycon Souza.

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