Alguns números sobre o ensino remoto nas comunidades Ausente de Cima e Serra da Bicha

Por Juliana da Paz Ferreira [1]

 

Entre os dias 11 e 27 de maio de 2021 foi realizada uma pesquisa quantitativa com os estudantes do ensino médio da Escola Estadual Leopoldo Pereira no âmbito do PIBID-UFVJM da qual este relato faz parte.  O objetivo de toda a pesquisa é compreender quais são as principais dificuldades enfrentadas pelos estudantes da referida escola em relação às metodologias utilizadas na realização das atividades escolares durante o ensino remoto decorrente da pandemia da covid19.

Atualmente a escola atende 14 comunidades rurais e está situada no distrito de Milho Verde, Serro/MG. Dentre os dez estudantes oriundos das comunidades de Ausente de Cima e Serra da Bicha, quatro participaram desse processo sendo dois de cada uma delas. Para saber um pouco mais sobre essa realidade, organizamos um questionário contendo 37 questões fechadas e uma aberta opcional, aplicado via Google Forms. As perguntas fechadas trataram, sobretudo, sobre as formas de estudos online durante o tempo de pandemia, e como essas condições tecnológicas no meio rural são acessíveis a eles no auxílio às atividades escolares. Para além das condições tecnológicas, perguntamos ainda algumas questões de cunho social que comporão esta análise nos próximos parágrafos. Na última questão, a aberta, foi solicitado um comentário sobre as principais dificuldades encontradas pelo estudante no ensino remoto, e o que ele está fazendo para superá-las. A divulgação dos resultados foi autorizada pelos próprios estudantes em conjunto com a direção da escola com a condição de manter os nomes em anonimato.

Conforme os resultados da pesquisa, 50% dos estudantes são do sexo feminino e 50% do sexo masculino, com idades entre 16 e 17 anos. Todos cursam o ensino médio. Isso significa que esses estudantes estão se preparando, ou deveriam, para dar continuidade nos estudos no ensino superior. Quanto à renda familiar, no Ausente de Cima, 100% dos entrevistados recebem o Bolsa Família e apenas 50% receberam o Auxílio Emergencial. Já na Serra da Bicha, 50% recebem o Bolsa Família e 100% receberam o Auxílio Emergencial. Em ambas as comunidades as famílias dos estudantes sobrevivem da agricultura familiar de subsistência. Tanto na Serra da Bicha como no Ausente de Cima, predomina o baixo grau de escolaridade como afirmam os estudantes ao responderem que o nível de escolaridade dos seus pais é baixo, sendo que nenhum finalizou o ensino fundamental. Com isso, podemos deduzir que o apoio dos pais na realização dos Planos de Estudos Tutorados (PETs) e das atividades complementares fica comprometido.

50% dos estudantes afirmaram que a família não possui televisão em casa, em contrapartida todos têm aparelho celular na residência. Em relação às ferramentas de ensino remoto mais utilizadas no dia a dia, no Ausente de Cima 50% dos entrevistados responderam que utilizam o WhatsApp e 50% o Google Sala de Aula com maior frequência. Já na Serra da Bicha, 100% dos entrevistados afirmaram que utilizam no dia a dia com maior frequência os grupos do WhatsApp. Ao perguntar sobre as ferramentas na qual possuem maior dificuldade, em ambas as comunidades, 100% afirmaram que eles têm maior dificuldade em acessar o aplicativo Conexão Escola 2.0, ferramenta destinada à interação síncrona entre professor e aluno. Como causa desta realidade, nas duas localidades, 50% dos alunos afirmaram que não sabem e 50% disseram que o sinal de internet é muito fraco, pois acessam através dos dados móveis do aparelho celular para estudar porque não tem antena nem internet a cabo em casa. 50% dos estudantes da Serra da Bicha e 100% de Ausente de Cima consideraram a conexão instável, e 100% dos estudantes, das duas comunidades, disseram que o sinal de internet é ruim, impossibilitando-os de baixar arquivos ou vídeos que os professores disponibilizam. Todos afirmaram também que a escola tem utilizado com maior frequência as ferramentas de ensino remoto e com maior diversidade comparada ao ano de 2020.

No ensino remoto, há uma dependência muito grande em relação às tecnologias e vários fatores influenciam no acesso. O mais agravante é que as famílias são de baixa renda por isso não conseguem colocar recarga com frequência no telefone dos filhos para garantir o acesso à internet. No caso desta pesquisa, os quatro estudantes utilizam a internet 4G pré-paga. Em relação ao tempo disponível de acesso ao serviço de internet, no Ausente de Cima 50% dos estudantes tem acesso de onze a vinte dias, e a outra metade de vinte um a trinta dias. Na comunidade de Serra da Bicha os dados são iguais quanto ao tempo de acesso à rede. Ao serem questionados sobre as principais dificuldades enfrentadas nesse ensino remoto, foram unânimes em dizer que a falta de acesso à internet.

Por mais que os professores mandem impressos todos os materiais dos PETs, eles dependem de um auxílio tecnológico para solucionar possíveis dúvidas e pesquisas em relação às atividades. Em uma das respostas, no comentário final, uma estudante ressalta que a maior dificuldade encontrada é a falta de internet, pois muitas vezes o sinal é muito fraco, em condições que o aplicativo Conexão Escola 2.0, utilizado na interação entre professores e alunos, não funciona, dificultando assim o aprendizado dos conteúdos. A entrevistada relatou que mesmo com toda dificuldade enfrentada, não deixa de fazer as atividades pedidas e busca sempre se dedicar ao máximo.

Ao analisar as respostas dadas pelos estudantes, verifica-se que os resultados são preocupantes uma vez que, por mais que eles tenham interesse em aprender, as ferramentas de trabalho não são acessíveis a todos, o que dificulta muito o aprendizado. Conversando com alguns professores da Escola Estadual Professor Leopoldo Pereira, eles relatam que se preocupam muito com a aprendizagem dos estudantes por muitas vezes não obter o retorno desejado, pois o contato por meios das plataformas de comunicação digital é mínimo entre eles, isso fez com que os professores buscassem alternativas de ensino para que os alunos não saiam prejudicados. Uma dessas alternativas foi montar um grupo através do aplicativo WhatsApp visto que, esse aplicativo é muito utilizado entre os adolescentes da escola. O avanço da vacinação e, como consequência, os planejamentos para o retorno às aulas presenciais ajudarão a esses estudantes que não conseguiram se adaptar ao ensino remoto devido à falta de condições das famílias de baixa renda, dentre outras questões.

[1] Juliana é estudante da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM). Esta pesquisa foi supervisionada pelo professor Vítor Sousa Dittz, da Escola Estadual Professor Leopoldo Pereira, e orientada pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro, da UFVJM, no âmbito do PIBID-UFVJM.

Agradecimentos aos estudantes-sujeitos e suas famílias, bem como ao diretor da E. E. Professor Leopoldo Pereira, o professor Maycon Souza.

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