Construindo memórias



 

Durante a minha infância, eu não tinha contato com livros ou textos. Morava com a minha avó e, creio que pelo fato de ela não saber ler, não havia opções de livros em casa. Lembro que, quando ia brincar na casa das minhas amigas, percebia que a mãe delas sempre deixava uma bíblia aberta em uma mesa ao lado da imagem de Nossa Senhora Aparecida. Como toda criança curiosa, eu a olhava e folheava, mas não compreendia o que havia escrito.

Outro local em que tive contato com textos foi na igreja. Todo domingo frequentava a missa com minha avó, onde sempre eram distribuídos folhetos com a liturgia. Eu gostava muito de olhar aquela folha cheia de letras, mas ainda não conseguia compreender sobre o que se tratava.

Outro momento em que tive acesso a outras mídias foi com CDs e DVDs. Em nossa casa, havia um som e uma televisão daquelas de tubo. Meu tio sempre escutava música no som, e enquanto ele fazia a troca dos CDs, eu observava curiosa as capas, que me chamavam a atenção. Sempre perguntava a ele o que estava escrito na capa. Ele me respondia lendo o nome de várias músicas e as colocava para tocar para que eu pudesse escutar. Já a televisão era mais utilizada pela minha avó, que adorava assistir a novelas à noite. Eu sempre gostei de assistir aos desenhos que passavam logo após o almoço.

Com seis anos, comecei a frequentar a escola e foi aí que tive meu primeiro contato com outros livros, além da bíblia. No início, não tinha conhecimento de quase nada em relação à escrita, não conhecia os números nem as letras. No meu primeiro dia de aula, fiquei com um pouco de medo, pois nunca havia ficado em um ambiente sem alguém da minha família, mas logo fui me acostumando.

De início, a professora começou a trabalhar letras e números. Logo depois, ela nos ensinou a escrever nosso nome. Ela sempre nos levava para um espaço onde havia vários livros, escolhia um e fazia uma roda para que começasse a ler a história. Todos nós ficávamos muito encantados com o fato de um livro cheio de letras conter uma história tão boa. Após a leitura, a professora nos perguntava sobre o que foi lido, e nós respondíamos o que havíamos entendido. Depois da leitura em conjunto, ela nos deixava olhar os outros livros daquele espaço, e eu amava folheá-los, principalmente os que tinham imagens.

Ao final do primeiro ano do ensino fundamental, eu já sabia juntar sílabas e formar palavras, além de ler pequenos textos. Como toda criança em período de alfabetização, eu tinha minhas dificuldades na escrita, que foram corrigidas através de atividades que a professora passava. Uma lembrança muito boa que tenho dessas atividades é a forma como eram impressas no mimeógrafo, um tipo de impressora antiga que utilizava álcool para possibilitar que a tinta de uma matriz transferisse as imagens e a escrita para uma folha de sulfite.

Outra atividade que a professora passava muito era o ditado, usado para avaliar nossa ortografia e, assim, trabalhar mais nas dificuldades diagnosticadas. Até o quinto ano do ensino fundamental foi uma época de muito aprendizado e evolução na escola. Foi nesse período que aprendi a ler, somar, criar textos e interpretá-los.

Do sexto ao nono ano, no ensino fundamental II, começaram novos desafios na minha aprendizagem, como as várias disciplinas, que me ensinaram, antes de tudo, a me organizar para que pudesse compreender cada uma delas. Um dos momentos que mais gostava nesse período era quando íamos para a biblioteca escolher um livro para ler e depois fazer resumos sobre o que foi lido. Um dos livros que escolhi se chamava “Capitães da Areia”, de Jorge Amado, que narrava a vida de crianças abandonadas que viviam nas ruas de Salvador. Esse é um dos melhores livros que já conheci.

Já no ensino médio, novos desafios foram surgindo. Lembro-me de que realizei muitos trabalhos, e um que me marcou foi um teatro que retratou momentos do modernismo, baseado em obras literárias. Nesse período, também tive a oportunidade de fazer a prova do Enem, cujo resultado me trouxe ao curso de pedagogia na Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri, a UFVJM. Essa trajetória de descobertas e desafios me mostrou o poder transformador da educação e da leitura, e é essa paixão que pretendo levar adiante na minha carreira de pedagoga.



SOBRE A AUTORA:

Eliane Simões de Oliveira  é graduanda da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziu este relato na disciplina Prática de Leitura e Produção de Textos, ofertada no primeiro semestre de 2024. A organização e edição do material foi feita pelo Projeto de Extensão Aula Digital.

Este trabalho foi orientado pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

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