O machismo é prejudicial aos homens

O machismo é prejudicial aos homens

Airton Alves Chaves Junior e Alexandre dos Santos Baldaia *

 

 


O machismo prejudica a socialização e o bem-estar de mulheres e homens e afeta relações familiares e interpessoais. Enquanto os danos para as mulheres são conhecidos, pouco se discute sobre o impacto na vida e na saúde dos homens.

 Como nos alerta Santos (2021)[1]:

(…) aspectos negativos do processo de socialização masculina são o estímulo a comportamentos de risco como prova de masculinidade, o afastamento das práticas de cuidado e convivência no ambiente familiar e doméstico, a ausência de contato ou negação de emoções que conotem fraqueza ou fragilidade.

No imaginário popular, a ideia de masculino está ligada ao ato de prover e proteger, bem como mostrar força e reprimir emoções que possam demonstrar vulnerabilidade. Na cultura machista, é comum a crença de que homens fortes, como esperam, não choram, não sofrem e devem ser fortes.

Essa mentalidade machista reprime, humilha e afeta a saúde mental e física dos homens, o que resulta em outros problemas associados à masculinidade violenta. Sousa (2005) revela que: “No Brasil, os homens vivem, em média, sete anos a menos que as mulheres e esse número, certamente, está ligado à toxicidade da masculinidade”.[2] O autor também cita algumas estatísticas:

Dos 15 aos 19 anos, os homens morrem 6.3 vezes mais que as mulheres; dos 20 aos 24 anos suas taxas são 10.1 vezes maiores que as das mulheres. Nos homicídios esse risco é de quase 12 óbitos masculinos em relação a cada morte feminina (SOUSA, 2005).

Existe certo consenso que o machismo mata os homens, principalmente, por três motivos: descaso com a saúde, relação perigosa com álcool, direção agressiva. A negligência em relação à saúde masculina é frequente, o que inviabiliza diagnósticos mais prematuros, profilaxia, controles, que diminuíram a mortalidade de diversas doenças, e diminui a expectativa de vida. Segundo Tenório (2019)[3], “[n]o Brasil, quase 40% dos homens até 39 anos e 20% daqueles com mais de 40 só vão ao médico quando se sentem mal. Boa parte deles não tem ideia de como anda o coração nem faz exames cardiológicos”.

Existe um senso comum de que o machismo é benéfico para os homens, pois supostamente eles não sofrem, não são frágeis ou adoecem. No entanto, essas ideologias são mentirosas e prejudiciais, pois práticas com graves consequências tanto para os homens quanto para a sociedade.

Para reduzir o machismo, é fundamental discutir e refletir sobre a cultura machista tóxica e o papel de homens e mulheres nas divisões do trabalho, incluindo tarefas domésticas, democracia, práticas agroecológicas, entre outros aspectos. Nesse sentido, é possível propor intervenções, como projetos que abordem questões relacionadas à saúde masculina em diferentes espaços e contextos, como comunidades e escolas. Um exemplo de campanha que já traz práticas nesse sentido e pode ser estendido ao longo do ano é a Novembro Azul, que busca conscientizar sobre a saúde masculina e promover discussões sobre as causas e consequências do descaso em relação à saúde.


Referências citadas no texto

[1] https://www.bulbapp.com/u/machismo-masculinidades-ressocializa%C3%A7%C3%A3o-do-autor-de-viol%C3%AAncia-contra

[2] https://www.scielo.br/j/csc/a/5QrxkHxfMdzwgCRVjPXf8yh/?lang=pt#

[3]  https://saude.abril.com.br/medicina/pesquisa-mostra-onde-os-homens-pisam-na-bola-com-a-saude/?_gl=1*d5gsl1*_ga*SFRibmxKT0RfRHlfSmtZNWhDVFlWNDNad1EtMnQ4cmxrRTRQNlI3NGx0SndnQ0p2bDdTdEdqbFhQR05Ua1JtRA




* Airton Alves Chaves Junior e Alexandre dos Santos Baldaia são acadêmicos da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziram este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre de 2022 (janeiro a junho de 2023). Foi orientado pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

Agroecologia, soberania e segurança alimentar em comunidades quilombolas

Agroecologia, soberania e segurança alimentar em comunidades quilombolas

Por Sunamita Nelma Ferreira Alves *

A agroecologia abrange diversas práticas agrícolas que asseguram a soberania e a segurança alimentar nas comunidades Quilombolas. A abordagem para lidar com a terra pode variar conforme a região, povo e condições climáticas. Contudo, um fator crucial para determinar qual prática adotar é a cultura de plantio local, que se relaciona com os conhecimentos transmitidos pelas gerações anteriores. O modo de plantar e cultivar a terra visando uma produção ecológica, em que as famílias assumem o protagonismo, resulta em alimentos saudáveis e contribui para uma melhor qualidade de vida.

A agroecologia é amplamente aplicada nas terras Quilombolas do Brasil, geralmente em pequenos quintais ou roças de toco. Essa prática está centrada na preservação da natureza e na garantia da segurança alimentar das famílias. O manejo do solo adotado nas comunidades Quilombolas consiste em produzir na estação apropriada o que a terra naturalmente oferece, utilizando poucos ou nenhum fertilizante. Essa abordagem está intrinsecamente relacionada aos povos do campo e às tradições que mantêm vínculos com a terra e seus territórios. Os habitantes dessas áreas reconhecem-se como parte do ambiente de plantio, conhecendo cada lugar pelo nome, em que cada denominação carrega o peso de uma história ancestral.

As práticas agroecológicas constituem uma parte essencial da cultura na comunidade Quilombola de Raiz, garantindo a soberania alimentar para sua população. A arte de escolher quais alimentos produzir, como produzi-los e como distribuí-los é um aspecto crucial para determinar quais alimentos serão consumidos, assegurando, assim, a segurança alimentar e nutricional.

Ao falar em alimentos nutritivos, a agroecologia emerge como o caminho para uma vida saudável e a conquista da soberania alimentar. Os povos Quilombolas, enraizados em suas culturas, adotam práticas comuns para o desenvolvimento da agricultura de forma sustentável e ecológica, fundamentada em princípios sólidos, historicamente construídos. Segundo Primavesi (2008, p. 3) [1]:

A Ecologia se refere ao sistema natural de cada local, envolvendo o solo, o clima, os seres vivos, bem como as inter-relações entre esses três componentes. Trabalhar ecologicamente significa manejar os recursos naturais respeitando a teia da vida. Sempre que os manejos agrícolas são realizados conforme as características locais do ambiente, alterando-as o mínimo possível, o potencial natural dos solos é aproveitado. Por essa razão, a Agroecologia depende muito da sabedoria de cada agricultor desenvolvida a partir de suas experiências e observações locais. 

A produção e manejo do solo são variáveis de acordo com a região e cultura. Encontramos cultivos em quintais, hortas isoladas, campos de produção e pequenos quintais. Algumas produções são completamente naturais, enquanto outras dependem da estabilização do solo, da matéria orgânica presente no local de plantio, do tipo do terreno e sua localização geográfica, seja plano ou em colinas. No Quilombo de Raiz, situado na porção meridional da Serra do Espinhaço, onde esta autora reside, não é diferente.

Em meio ao cerrado, próximo à nascente do rio Jequitinhonha, para garantir a segurança alimentar das famílias que ali residem, são utilizadas práticas agroecológicas, como o cultivo em pequenos quintais e roças de toco. Esses espaços são escolhidos por possuírem maior quantidade de matéria orgânica e geralmente ficam próximos a afluentes de água, proporcionando um solo mais fértil e produtivo. O desbravamento desse espaço é realizado com respeito à natureza, e o cultivo pode durar de um a dez anos, momento em que o agricultor, com seu conhecimento acumulado, compreende a necessidade de descanso do solo, migrando o plantio para um novo local semelhante, permitindo que o solo descanse e recupere suas características naturais.

Esse manejo está intrinsecamente ligado à cultura e assegura a soberania alimentar no Quilombo. As famílias produzem seguindo conhecimentos transmitidos de geração para geração. Os plantios são realizados de acordo com as fases da lua, que, segundo os agricultores, exercem uma influência significativa sobre a produção, conforme a sabedoria transmitida pela agricultura tradicional. Em entrevista para este projeto, uma agricultora que preservaremos a identidade relata:

Nós fazemos as plantações tanto nas roças como também nas hortas segundo as fazes da lua, o que se produz na horta são hortaliças diversas e essas necessitam da fase certa da lua para um bom resultado, hoje se vê muito dizer que isso não interfere e que também não tem nada a ver, que se plantar de qualquer forma vai produzir, porém segundo a nossa experiência isso não funciona, se plantados em lua errada o resultado jamais será o mesmo. As roças por exemplo, uma grande plantação de milho, feijão ou mandioca, pode dar caruncho, broca e perder muito daquela plantação, a batata doce por exemplo, fica amarga e cheia de caruncho além de cair muito na produção.

Ao analisar o relato da agricultora, é possível identificar as particularidades da produção exclusiva do Quilombo de Raiz. Esse quilombo, localizado em meio a colinas, adota uma produção inteiramente orgânica, o que garante alimentos de qualidade nas mesas das famílias. Para alcançar o equilíbrio entre a produção e o manejo de pragas, é necessária muita sabedoria, pois compreendem que nenhuma forma de vida deve ser exterminada e que há uma ampla cadeia natural em jogo. Portanto, a decisão de não utilizar produtos sintéticos para a proteção e controle de pragas requer um vasto conhecimento tradicional, transmitido de forma oral.

Vale ressaltar que nesse Quilombo, as famílias realizam as plantações em trabalho conjunto, onde todos colaboram: homens, mulheres e crianças, todos participam ativamente no processo da produção. É um quilombo liderado por mulheres jovens e essa liderança aparece em todas as partes, desde o momento de buscar políticas públicas para a produção até os projetos de escoação dos produtos. Essas lideranças buscam projetos para escoação como Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) [2]. O programa da esfera federal realiza a compra da produção agrícola de muitas famílias, a fim de alimentar outras. Assim, além de garantir a renda de muitas comunidades, o PAA acaba com a fome de inúmeras famílias, com uma boa oferta de alimentos saudáveis. Há também o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) [3], que, diferentemente do primeiro, garante a segurança alimentar nas escolas, mas também compra os alimentos produzidos pela agricultura familiar.

Assim como em outras comunidades Quilombolas, no Quilombo de Raiz, as mulheres assumem a dianteira nas múltiplas tarefas, buscando constantemente meios de sustentar a renda da comunidade. Embora todos desempenhem seu trabalho, são elas que se destacam nessa busca. A prática da agricultura é comum nesse cenário, e o manejo ecológico do solo assegura a soberania alimentar na comunidade. Através da agroecologia, o solo ganha vida e se torna nutriente. Como afirma Primavesi (2008, p. 3) [1]:

Um solo vivo pressupõe a presença de variadas formas de organismos interagindo entre si e com os componentes minerais e orgânicos do solo. Essa dinâmica biológica exerce uma função essencial na agregação do solo, de modo a torná-lo grumoso e permeável para o ar e para a água. Além disso, são esses organismos que mobilizam os nutrientes e os disponibilizam para as plantas.

É notável a relevância da produção agroecológica nas terras Quilombolas, pois proporciona a soberania alimentar para diversas famílias e instituições públicas, como escolas, uma vez que os alimentos provenientes da agroecologia garantem a segurança alimentar. Ao contrário de todo este movimento pela saúde, condições de trabalho e sobrevivência da população, temos uma luta política que perpassa falas contra a demarcação de terras quilombolas pelo ex-presidente da república e um movimento pela aprovação do marco temporal, que, na prática impediria novas demarcações no país, como pode se acompanhar na imprensa.

É um absurdo a defesa de pautas desse tipo, pois há uma dívida histórica e um genocídio desses povos que não cessaram. Adicionalmente, quem sustenta o Brasil são os PCTs (Povos de Comunidades Tradicionais) e quilombolas. A demarcação dessas terras é garantida na legislação brasileira na Organização Internacional do Trabalho – OIT 169 [4] , no plano nacional de PCT. Portanto, cabe ao Estado garantir tais direitos e agir em favor dos povos que trabalham pela manutenção da terra e pela soberania alimentar.

Compete aos povos tradicionais a luta pela implementação das políticas públicas, enquanto cabe ao Estado a execução dessas mesmas políticas, visando alcançar a soberania alimentar. Para a aplicação efetiva de uma política de segurança e soberania alimentar, baseada na agroecologia, é imprescindível que os povos tradicionais e Quilombolas tenham acesso à terra. A tradição não pode ser dissociada do território, pois a disponibilidade de alimentos e água de qualidade nas mesas é resultado do cuidado e do cultivo realizado pelos quilombolas e povos tradicionais em seus territórios, assegurando, assim, a soberania alimentar.


Referências citadas no texto

[1] https://www.bibliotecaagpta.org.br/agricultura-novo/agroecologia-artigos/

[2] https://www.gov.br/pt-br/noticias/agricultura-e-pecuaria/2020/01/entenda-como-funciona-o-programa-de-aquisicao-de-alimentos

[3] https://www.gov.br/fnde/pt-br/acesso-a-informacao/acoes-e-programas/programas/pnae

[4] https://portal.antt.gov.br/conven%C3%A7cao-n-169-da-oit-povos-indigenas-e-tribais

 



* Wesley Moreira dos Santos Paranhos é acadêmico da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziu este relato na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre de 2022 (janeiro a junho de 2023). Foi orientado pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

Alimentação saudável e saúde mental

Alimentação saudável e saúde mental

Adilson Santos e Solidade Figueira*

Com certeza, em algum momento, você já deve ter ouvido o seguinte ditado popular: “Você é o que você come.” Este ditado carrega consigo diversas verdades. De acordo com Televita (2017)[1], uma alimentação saudável também impacta positivamente na saúde mental, podendo inclusive auxiliar na recuperação de transtornos mentais, como ansiedade e depressão. É imprescindível para a sobrevivência que uma boa alimentação, aliada a outras práticas de autocuidado, traga benefícios satisfatórios para a autoestima e o bem-estar.

Não é novidade que a saúde mental é tão importante quanto a saúde física, uma questão que ganhou bastante destaque atualmente. A Organização Mundial da Saúde (OMS) define saúde como um “estado de completo bem-estar físico, mental e social, e não apenas a ausência de doença” (GOV.BR, 2020)[2]. São muitos os transtornos que se desenvolvem devido a diversos fatores e comportamentos, como estresse, preocupação e nervosismo. Atualmente, a depressão e a ansiedade são dois dos principais transtornos mentais que afetam as pessoas (SCIELO, 2018)[3].

Um dos fatores que influenciam o desencadeamento desses transtornos é o consumo de alimentos pobres em nutrientes, tais como carboidratos ruins, fast-foods, alimentos processados, entre outros. Segundo o agricultor e psiquiatra da Universidade de Columbia, em Nova York, Drew Ramsey, uma dieta deficiente é um dos maiores fatores que contribuem significativamente para o desenvolvimento da depressão (ASBRAN, 2019)[4]. Esse tipo de dieta, além de causar inflamações, prejudica também a formação dos neurotransmissores devido à ausência de certos nutrientes essenciais para sua composição. É por esse motivo que o intestino também é chamado de segundo cérebro.

Um dos neurotransmissores mais conhecidos e de grande importância para o organismo é a serotonina, também conhecida como hormônio da felicidade. Seu precursor é o aminoácido triptofano, que, quando consumido em grandes quantidades, provoca uma alteração positiva e significativa no humor. No entanto, esse aminoácido não é produzido pelo nosso organismo, sendo necessário obtê-lo por meio da ingestão de alimentos que o contenham ou por meio de suplementação. É por esse motivo que uma alimentação saudável pode influenciar positivamente na saúde mental.

Alguns alimentos, como queijo, ovos, amendoim, banana, cacau e abacate, que possuem o desejado aminoácido triptofano, devem estar presentes na alimentação, já que sua ingestão promove a produção de serotonina, responsável pelo bem-estar e pela regulação do humor, apetite, sono, libido e outras funções do organismo. Além da serotonina, vitaminas do complexo B, magnésio e ômega 3 também auxiliam na manutenção do equilíbrio entre as células nervosas e outras células, conforme informado pelo site Tua saúde (2023)[5].

Apesar de sabermos da importância da alimentação saudável para essas e outras funções na vida humana, é importante ressaltar as dificuldades em manter esse hábito. Os alimentos saudáveis, ou in natura, são de difícil acesso e, geralmente, possuem preços mais altos nos mercados e feiras em comparação aos alimentos processados. Segundo matéria do Correio Braziliense (2021) [6]:

O custo médio de uma alimentação saudável é cinco vezes mais alto do que o preço de uma refeição com baixo teor nutricional”, afirma Rafael Zavala, representante da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) no Brasil, em entrevista ao programa CB.Agro, uma parceria entre o Correio e a TV Brasília.

Além do alto preço desses produtos, que torna a alimentação saudável inacessível para muitas pessoas, outro fator relevante para explicar por que as pessoas se alimentam de forma inadequada, tendo a “falta de tempo” como justificativa para optar por alimentos “prontos”, devido à praticidade de consumo e preparo, além da falta de educação alimentar, uma vez que muitas pessoas não escolhem os alimentos com base em seu valor nutricional.

A indústria alimentícia também atrai os consumidores com receitas que utilizam diversos nutrientes de baixo valor nutricional, como gorduras, açúcares, sal e aromatizantes, tornando esses tipos de alimentos mais atrativos. Fast foods e serviços de entrega também são exemplos que ganharam grande visibilidade e têm “facilitado” a vida dos consumidores, que renunciam a uma boa alimentação, e muitas vezes pagam com a saúde.

Diante de todos os empecilhos, só mesmo com planejamento, organização, escolhas conscientes e condição financeira para arcar com os custos dos alimentos orgânicos, produzidos e cozidos de forma adequada. Para alcançar a soberania alimentar, é preciso investir mais na agricultura sustentável, dando protagonismo à agroecologia. Essa abordagem é responsável por incorporar em suas práticas questões sociais, culturais, ambientais e éticas. Só políticas públicas podem possibilitar acesso a alimentos saudáveis mais acessíveis. Deve fomentar educação para a agroecologia, infraestrutura adequada para todo tipo de agricultor, oferta de insumos, máquinas e formação para alimentação saudável. Fortalecer as iniciativas agroecológicas é fundamental, pois são benéficas para o planeta, para o ser humano e para o equilíbrio entre o corpo e a mente.

Referências utilizadas neste artigo de opinião:

[1] https://plus.google.com/share?url=https://www.telavita.com.br/blog/alimentacao-saudavel-na-saude-mental

[2] bvsms.saude.gov.br/05-8-dia-nacional-da-saude/

[3] www.scielo.br/j/sdeb/a/Y36fDqvZL5Js4nnWpXrYpBb/?lahttpsng=pt

[4] www.asbran.org.br/noticias/em-estudo-a-alimentacao-e-impacto-na-saude-mental

[5] www.tuasaude.com/omega-3/

[6] www.correiobraziliense.com.br/economia/2021/10/4955681-comida-saudavel-custa-5-vezes-mais-caro-diz-representante-da-fao-no-brasil.html




* Adilson Santos e Solidade Figueira são acadêmicos da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziram este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre de 2022 (janeiro a junho de 2023). Foram orientados pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

Agroecologia e Meritocracia

Agroecologia e Meritocracia

Por Wesley Moreira dos Santos Paranhos *

O idealismo da meritocracia capitalista é um pilar estrutural das desigualdades socioeconômicas existentes tanto no campo quanto na cidade. Amplamente difundido na sociedade contemporânea, o termo propõe a existência de uma sociedade ideal composta por “vencedores natos” que, ao superarem todas as adversidades[1], conquistariam seu lugar ao sol. Esse discurso tem sido incorporado ao arcabouço ideológico do neoliberalismo[2], que defende a competição como força motriz da economia e acredita que a “competição justa” leva ao sucesso individual e coletivo. No entanto, essa argumentação é contraditória, uma vez que aqueles que defendem a conquista pelo mérito pessoal são denunciados por uma estrutura de privilégios arraigada em todas as camadas sociais, que busca manter o status quo dos modos de produção (HARVEY, 2005)[3]. Ignoram completamente a complexidade da existência humana, na qual fatores externos como situação socioeconômica, raça, gênero, orientação sexual, disponibilidade de recursos e oportunidades atuam como potencializadores ou inibidores do sucesso. Pregar a meritocracia como justiça em uma sociedade que alimenta suas desigualdades é uma compreensão simplista e fantasiosa do mundo. Essa interpretação, difundida e aceita pelo público, valida os modelos dominantes de opressão, desmobiliza as lutas de classe e intensifica as desigualdades socioeconômicas, tanto no campo quanto na cidade.

Desde a criação das sesmarias, regime no qual as terras eram cedidas segundo a capacidade de exploração de cada requerente, e que naturalmente exigia trabalho escravo (ZENERATTI, 2021)[4], o Brasil sempre sustentou uma ideia extremamente imperialista quanto às suas relações com a terra, o trabalho e os privilégios. Esse legado persiste atualmente devido às concentrações fundiárias do agronegócio, geralmente promovidas pela apropriação de terras públicas, o que resulta em aumento da precarização do trabalho e da dominação violenta de povos tradicionais (ASSUNÇÃO & DEPIERI, 2022)[5]. Não é por acaso que, após a política conservadora neoliberal intensificar a destruição dos direitos trabalhistas, ocorrem tantas denúncias de trabalho análogo à escravidão, como os ocorridos no Rio Grande do Sul (XAVIER, 2023)[6].

Assim, o agronegócio pode ser entendido como expressão do capitalismo institucionalizado no campo brasileiro. Além disso, as empresas que prestam serviços por aplicativos, embora com uma proposta diferente, geram resultados semelhantes. Em tempos de crise no mercado de trabalho, muitas pessoas assumem jornadas longas com baixa remuneração em esquemas que beneficiam apenas os empregadores, os quais encontram na terceirização uma forma de se eximir das responsabilidades trabalhistas. Podemos observar que essas mesmas relações predatórias se manifestam tanto no campo quanto na cidade, evidenciando a era da precarização laboral (OLIVEIRA; MOITA e AQUINO, 2016)[7]. O status quo e a exploração continuam em alta. Essas dinâmicas trabalhistas, cada vez mais normalizadas, revelam uma nova faceta da meritocracia que é ocultada por seus maiores defensores. Tanto a existência dos latifúndios quanto a propriedade privada dos meios de produção exercem uma pressão socioeconômica semelhante em uma dinâmica de classes. Enquanto um pequeno grupo obtém altas taxas de lucratividade por meio da exploração do trabalho alheio, outro grupo é cada vez mais fragilizado pelas mazelas de uma estrutura de concentração de renda institucionalizada e mantida pelo capital político, o qual desempenha um papel determinante na crítica da meritocracia como uma competição justa para a ascensão social.

Desde a grande carga tributária destinada ao consumo (FARIA, 2023)[8], até os ataques neoliberais aos sindicatos dos trabalhadores (OLIVEIRA, 2020)[9], não se pode negar a importância da representatividade política de peso na defesa dos interesses das lutas de classes. O agronegócio, por exemplo, possui uma das bancadas mais bem organizadas no parlamento, o que não é surpreendente, considerando sua sustentação na exploração indiscriminada da natureza, acumulação de grandes riquezas por meio de trabalho “análogo à escravidão”, apropriação de terras públicas e de territórios tradicionais. Fica a questão de como um vereador pode defender tais práticas[10], evidenciando a manifestação mais pura da defesa de seus interesses privados, que são meramente negócios. Esses episódios levantam a reflexão sobre se o trabalhador médio possui representantes com determinação ferrenha e capital político para defendê-lo, enquanto seus empregadores certamente possuem. Assim, é revelado um padrão de que a “riqueza advém do trabalho” e, se houver excessiva concentração, é provável que a pessoa errada esteja se beneficiando dele. Esse é apenas um exemplo de como o capital político pode ser usado a favor ou contra uma determinada classe, e aqueles que possuem os melhores representantes diante do estado certamente terão maiores chances de sucesso.

Enfatizo a característica central da meritocracia na agenda neoliberal: a vitória individual manifestada pelo consumo. Essa noção atribui ao indivíduo a responsabilidade exclusiva por suas conquistas e fracassos, algo que já vimos anteriormente não ser tão simples. Além disso, classifica-os hierarquicamente com base em seus padrões/quantidades de consumo. Nessa narrativa, o colega de trabalho, que vive em um cenário socioeconômico semelhante, não é visto como amigo, mas sim como concorrente. E o chefe que o oprime não é considerado inimigo, mas sim um ideal de sucesso, o que Freire chama de a “Pedagogia do Oprimido”, título de uma de suas obras mais expressivas (FREIRE, 1987)[11].

O que mais impressiona nessa narrativa é a disseminação generalizada e espontânea que ela possui em nossa sociedade, mesmo que muitos a propaguem sem sequer compreender a agenda que estão defendendo. Nessa estratégia, pessoas da mesma classe, do mesmo sangue, da mesma luta, são colocadas umas contra as outras em discussões ideologizadas, beneficiando apenas aqueles que buscam manter as atuais contradições e usando o povo como massa de manobra. Ao atacarem seus vizinhos, perdem o foco do verdadeiro inimigo e, muitas vezes, do causador de suas angústias. Isso desmobiliza a organização popular, que é a única arma daqueles que não se beneficiam de dividendos e especulação imobiliária. Até mesmo o empreendedorismo absorveu essa abordagem, criando aversões e conflitos que levam à individualização das lutas sociais, esvaziando os sindicatos e movimentos que garantem os direitos da classe trabalhadora, o que, logicamente, apenas aumenta o abismo social entre a classe trabalhadora e a burguesia, mais uma vez questionando a validade da meritocracia.

Diante de todo o exposto, o problema da meritocracia está intrinsecamente ligado a diversos fatores estruturais de nossa sociedade, que se organizam em torno de uma lógica de mercado. Portanto, seria improvável criar uma intervenção eficiente e duradoura para esse problema sem uma mudança de igual magnitude. Um movimento inicial de transformação deve se basear na implementação de novas políticas públicas que revisem os modelos de produção, trabalho e privilégios existentes tanto no campo quanto na cidade. Isso também incluiria a análise das estruturas políticas que beneficiam as elites dominantes, como a alta carga tributária direcionada ao consumo e os ataques neoliberais aos sindicatos dos trabalhadores. No entanto, em um último estágio dessa mudança, que se aproxima de uma revolução, seria necessário abandonar o último vínculo que nos prende a essas estruturas de dominação: a superação do sistema capitalista.

Referências citadas no artigo

[1] BRONDI, Paulo. Limbo meritocrático. Brasil de Fato. dez. 2021. Acesso em: https://www.brasildefato.com.br/2021/12/02/limbo-meritocratico

[2] ESQUERDA. David Harvey: O neoliberalismo é um projeto político. 2016. Acesso em: https://www.esquerda.net/artigo/david-harvey-o-neoliberalismo-e-um-projeto-politico/43872

[3] HARVEY, David. O neoliberalismo. História e implicações. São Paulo: Loyola, 2005

[4] ZENERATTI, Fábio Luiz. O acesso à terra no Brasil: reforma agrária e regularização fundiária. Revista Katálysis, v. 24, p. 564-575, 2021. Acesso em: https://www.scielo.br/j/rk/a/stvqSwRD88wztYbCpGvSB4t/abstract/?lang=pt

[5] ASSUNÇÃO, Matheus Gringo de; DEPIERI, Marcelo Alvares de Lima. O agronegócio como elemento potencializador das desigualdades no campo no Brasil. Tricontinental. 2022. Acesso em: https://thetricontinental.org/pt-pt/brasil/o-agronegocio-como-elemento-potencializador-das-desigualdades-no-ca mpo-no-brasil/

[6] XAVIER, Getúlio. PF faz nova operação contra vinícolas flagradas com trabalho escravo. Carta Capital. 2023. Acesso em: https://www.cartacapital.com.br/sociedade/pf-faz-nova-operacao-contra-vinicolas-flagradas-com-trabalho-escravo/

[7] OLIVEIRA, Eveline Nogueira Pinheiro de; MOITA, Dimitre Sampaio; AQUINO, Cassio Adriano Braz de. O empreendedor na era do trabalho precário: relações entre empreendedorismo e precarização laboral. 2016. Acesso em: https://repositorio.ufc.br/handle/riufc/52938

[8] FARIA, Glauco. Tributação tem tudo a ver com a luta de classes”, afirma Pedro Rossi. Brasil de Fato. 2023 Acesso em: https://www.brasildefators.com.br/2023/01/26/tributacao-tem-tudo-a-ver-com-a-luta-de-classes-afirma-pedro-rossi

[9] OLIVEIRA, Caroline. Por mais lucro, os neoliberais atacam sindicatos para desorganizar trabalhadores. Brasil de Fato. 2020. Acesso em: https://www.brasildefato.com.br/2020/05/01/por-mais-lucro-neoliberais-atacam-sindicatos-para-desorganizar-trabalhadores

[10] REDAÇÃO G1. Vereador do RS que discursou contra baianos é alvo de pedidos de cassação; MPT apura apologia ao trabalho escravo. G1 – Rio Grande do Sul. 2023. Acesso em: https://g1.globo.com/rs/rio-grande-do-sul/noticia/2023/03/01/vereador-do-rs-que-discursou-contra-baianos-e-alvo-de-pedidos-de-cassacao-mpt-apura-apologia-ao-trabalho-escravo.ghtml

[11] FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. 17a ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.


 



* Wesley Moreira dos Santos Paranhos é acadêmico da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziu este relato na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre de 2022 (janeiro a junho de 2023). Foi orientado pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

Invertendo a narrativa: a verdade por trás do estupro

Invertendo a narrativa: a verdade por trás do estupro

Por Adelaine Aparecida Santos e Maria Madalena de Oliveira Gomes*

A discussão que aqui nos propomos refere-se a desconstruir a culpabilização da vítima nos casos de estupros, comum na cultura do estupro em que estamos imersas. Apesar de ser meio óbvio que o estupro não seja causado pelas mulheres, vítimas na grande parte dos casos, percebemos que parte da sociedade não acredita na vítima e chega a culpá-la por, por exemplo, serem provocativas ao usarem certas vestimentas.

Destacamos, portanto, a importância de fornecer o apoio necessário às vítimas, uma vez que ocasionalmente não recebem o apoio adequado. O estupro é um dos crimes mais violentos, pois afeta o estado físico e emocional das vítimas. De acordo com o Código Penal Brasileiro, Lei nº 12.015 de 2009, considera-se estupro constranger alguém, violentar, ameaçar, coagir, agredir, oprimir, assediar, intimidar, forçar e praticar atos carnais sem o consentimento. A pena no Brasil varia de 12 a 30 anos, dependendo da conduta do agressor.

Segundo dados do 13º Anuário Brasileiro de Segurança Pública, 180 mulheres são estupradas por dia no Brasil. Em uma publicação do Correio Braziliense por Thay Martins e Cristiane Norberto, foi relatado o caso de Maria Ferrer, que foi estuprada em 2018 pelo empresário André Aranha. O sistema judicial apresentou falhas ao absolver o empresário da acusação por falta de provas, em uma votação de três votos no TJSC (Tribunal de Justiça de Santa Catarina). Essa decisão levanta sérias preocupações sobre a capacidade do sistema de agir diante de casos de violência sexual. Apesar das evidências apresentadas, como o laudo médico do recente rompimento do hímen, a perícia que encontrou o sêmen, materiais de DNA comprovando a compatibilidade, imagens de câmeras e depoimentos de testemunhas, o caso de Maria Ferrer é um exemplo contundente das inúmeras dificuldades enfrentadas pelas vítimas de estupro na busca por justiça. Ele revela, de maneira inegável, como a cultura do estupro exerce um impacto profundamente negativo no acesso efetivo à justiça. Majoritariamente, as mulheres nestes casos não são bem-vistas por causa do machismo.

Apesar das notícias citadas, os números de casos são muito maiores do que os denunciados. Isso ocorre porque, na maioria das vezes, a vítima se sente acuada diante dos constantes julgamentos. No entanto, a denúncia é um dos primeiros passos que a mulher dá em busca de justiça. Em alguns casos, as mulheres podem se sentir completamente alienadas, resultando em uma diminuição da capacidade de pensar e reagir. Esse processo de alienação muitas vezes leva à negação, na qual a mulher se culpa e se torna vulnerável, resultando em sintomas psiquiátricos evidentes. O estupro tem consequências severas e devastadoras.

Em um artigo escrito pela Secretaria da Mulher Trabalhadora (CUT), publicado por Mara Feltes, comenta-se que “o estupro não é culpa da mulher e nem da roupa que ela usa”. O problema é de caráter estrutural e precisa ser abordado em conjunto nas escolas, comunidades e na sociedade em geral. Outro ponto expressado por Feltes diz respeito aos ensinamentos transmitidos aos filhos. Eles devem aprender questões como o fato de que o corpo da mulher pertence à mulher, ela pode usar a roupa que quiser, ir aonde quiser e suas opiniões devem ser respeitadas, assim como o “não é não”. Não é necessário ensinar as mulheres a se vestirem ou a não saírem pelas ruas; o que precisa ser ensinado é o respeito mútuo, independentemente de gênero, vestimenta ou local onde estejam.

O artigo intitulado “Cultura do estupro: prática e incitação à violência sexual contra a mulher” provoca uma reflexão profunda sobre os atos de violência presentes em nossa sociedade. O texto ressalta que os estupradores podem ser encontrados em todas as esferas da sociedade, independentemente de sua posição social ou classe. Por meio de atos violentos e desprezíveis, eles abusam das vítimas contra sua vontade, violando seus direitos mais básicos. É importante salientar que a busca pela satisfação do agressor se manifesta de diversas maneiras, mas nenhuma delas justifica a agressão. A violência contra as mulheres é uma clara manifestação da desigualdade de gênero presente em nossa sociedade. É alarmante constatar que uma parcela significativa das vítimas são pessoas de baixa renda, evidenciando como essa forma de violência impacta desproporcionalmente os segmentos mais vulneráveis da população.

A violência ocorre em diversos ambientes, muitas vezes até mesmo dentro do ambiente familiar. No entanto, não se limita a isso; também pode ocorrer no trabalho, em festas, escolas, faculdades e nas ruas. O preocupante é que, na maioria dos casos, os agressores são pessoas conhecidas das vítimas, o que torna a situação ainda mais chocante, pois a vítima não esperava por tal agressão. Diante desse contexto, é urgente uma reavaliação da percepção social em relação a certas práticas. É crucial reconhecer que algumas delas, como beijo não consentido e sexo oral não consensual, também se configuram como estupro. Infelizmente, muitas pessoas ainda limitam o conceito de estupro apenas à penetração sexual, o que é um equívoco lamentável.

Para combater essa problemática, é fundamental ampliar nossa compreensão e conscientização sobre o consentimento e os limites pessoais. Devemos reconhecer que qualquer forma de atividade sexual não consensual é uma violação séria e uma violência inaceitável. Somente por meio de uma mudança de mentalidade e de uma educação continuada é que poderemos criar uma sociedade mais justa e segura.

Em uma publicação intitulada “Estupro marital” no “Direito Net – Artigos”, Luciana Andrade Maia discute o ponto de vista de Nelson Hungria e Mário de Noronha. Esses doutrinadores afirmavam que não era possível que o marido cometesse estupro contra a própria esposa, argumentando que ele tinha o direito de exigir que a mulher tivesse conjunção carnal com ele, pois isso era considerado uma das obrigações matrimoniais. Essa visão baseava-se na concepção de que o casamento impunha certas obrigações sexuais à mulher.

Ainda existem muitos pensamentos ultrapassados que limitam a visão da mulher apenas ao papel de dona de casa, restringindo-a a ter filhos e participar apenas de relações sexuais. O artigo 5º da Constituição Federal garante que todos são iguais perante a lei e devem ter a liberdade, segurança e direitos garantidos. Essa liberdade mencionada também se refere à forma como a mulher se veste, aos locais que ela queira frequentar e com quem ela quiser se relacionar. Sendo assim, a Lei Maria da Penha definiu que “a violência doméstica e familiar contra a mulher consiste em qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico ou patrimonial: III – em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação”.

Portanto, fica claro que as vítimas não são culpadas pela agressão. A violência praticada naturaliza o desrespeito aos direitos humanos. O estupro, presente em diversas partes do mundo, está intrinsecamente ligado a estruturas patriarcais que estabelecem relações de poder e dominação. Nesse contexto, existem crenças e valores socialmente aceitos que contribuem para a ocorrência do estupro. A cultura do estupro é alimentada por uma sociedade tolerante que aceita comportamentos repugnantes. Infelizmente, a mulher muitas vezes é culpabilizada, sendo vista como responsável por “incitar os homens”. No entanto, é fundamental reconhecer com maturidade que a mulher não é de forma alguma responsável pelo crime de estupro.

Acreditamos que a sociedade não ficará livre tão cedo do estupro, mas podemos optar por propostas de intervenção. Juntamente com a população e organizações não governamentais (ONGs) dedicadas à prevenção e apoio às vítimas, podemos produzir cartilhas. Outros grupos que poderiam atuar seriam os profissionais da área da saúde e profissionais da educação, fornecendo informações sobre educação sexual. Intervenções como exposição de cartazes, rodas de conversa, trabalhos nas instituições escolares e grupos de apoio podem ser ferramentas de auxílio às vítimas.

Um exemplo claro que serve para dar força às vítimas aconteceu na cidade de Toronto, Canadá, com um grupo de mulheres canadenses que foram às ruas em protesto contradiscursos de culpabilização e agressões sexuais. Após esse evento, manifestações semelhantes ocorreram em várias outras cidades. O protesto ficou conhecido como a Marcha das Vadias, que foi uma forma de intervenção. Ele chama a atenção para o fato de que nenhuma mulher está “pedindo” para ser estuprada, independentemente de como esteja vestida. Esta foi uma resposta à cultura do estupro e uma tentativa de despertar a conscientização pública sobre a violência sexual.

Portanto, é necessário quebrar os estereótipos e desafiar as normas culturais que perpetuam a cultura do estupro. É importante educar as pessoas desde cedo sobre o consentimento, o respeito mútuo e a igualdade de gênero. Além disso, é fundamental apoiar e ouvir as vítimas, garantir que elas sejam tratadas com respeito, oferecer-lhes apoio emocional e encorajá-las a denunciar os crimes. A responsabilidade de combater a cultura do estupro é de todos nós.




*Adelaine Aparecida Santos e Maria Madalena de Oliveira Gomes são acadêmicas da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziram este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre de 2022 (janeiro a junho de 2023). Foram orientadas pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.