Por Adilson Gomes Santos [1]
Ouça um trecho lido pelo próprio autor a seguir. O texto completo, em formato escrito, segue logo abaixo.
Trago aqui reflexões sobre o meu processo de adaptação com algumas ferramentas tecnológicas a partir de experiências que marcaram esse percurso. Além disso, deixo minhas percepções como futuro educador do campo, em um contexto educacional onde novas metodologias podem ser escassas.
Durante minha infância, o contato com as tecnologias digitais era muito difícil, pois se dava na escola estadual onde estudava, apenas quando éramos levados para a sala de informática para pesquisar algo relacionado a matéria estudada. Todas as recomendações da professora, com o medo de estragarmos aquele computador empoeirado, já despertava em nós a preocupação em atrapalhá-lo.
A chegada dos celulares, por exemplo, na Comunidade Quilombola do Furtuoso, no município de Coluna, onde resido, se deu de forma muito lenta. Me lembro que o meu primeiro acesso a um aparelho celular foi aos 17 anos, quando um primo conseguiu comprar um.
Com o passar do tempo, consegui comprar um aparelho bem simples, que aos poucos fui trocando. O tempo foi passando e com o apoio da Associação Quilombola da Comunidade conseguimos levar a internet para nosso quilombo. Isso possibilitou a redistribuição da rede e a instalação nas residências dos moradores, facilitando assim o contato com o “mundo globalizado’’. A partir daí foi possível criar contas nas redes sociais como o Facebook, consegui comprar meu primeiro notebook, utilizado com mais frequência para os estudos, mas também para momentos de descontração.
Em meu processo de uso das tecnologias, muitas oportunidades e incentivos foram dados por meus professores, da Licenciatura em Educação do Campo, que me colocaram ativamente no uso das ferramentas digitais. Em minha prática atual com a tecnologia digital, uso com muita frequência a plataforma Google Classroom, mensageiros e redes sociais como WhatsApp, Facebook e Instagram, usados para troca de mensagens. Considerando que faço parte dos movimentos sociais quilombola na comunidade onde moro, às vezes, bem raramente, posto algumas fotos nas redes, mas não curto muito essa ideia.
No meu cotidiano, as tecnologias midiáticas estão sempre presentes. Pensando no dia de ontem, o primeiro aparelho tecnológico que utilizei no dia foi o celular, que serviu até mesmo como despertador. No decorrer do dia, também usei o notebook. Uma das ferramentas ainda não explorada por mim, que pretendo utilizar e tenho essa curiosidade, é o GPS, que pode facilitar as rotas de viagem que pretendo fazer em um futuro bem breve.
Percebo que em função de algumas tecnologias, algumas práticas comuns foram se perdendo. Antes era comum o diálogo face a face, a interação humana de forma presencial; e hoje em dia as pessoas se encontram alienadas pelos aparelhos digitais, com isso muitas tradições e culturas foram sendo perdidas. Recordando-me da época de convivência com meus avós, tios e primos mais velhos, percebo que a tecnologia que chegou como “moderna” na comunidade também excluiu, de certa forma, as práticas culturais da comunidade. Um dos exemplos que pode ser citado, ainda fresco em minha memória, é o momento em que grande parte da família se reunia próximo ao pé de manga gigante que existe na casa de minha avó para ouvir histórias, algumas vezes de assustar. Íamos embora para casa com medo após os causos contados. Hoje esse espaço é ocupado pela juventude nos jogos de Free Fire, sem espaço para as pessoas mais velhas e as tradições.
Por outro lado, as tecnologias têm facilitado de forma significativa o desenvolvimento, mesmo excluindo pessoas como mostra nosso quadro de grande desigualdade social. Considerando essa realidade, como professor eu buscaria metodologias e ferramentas que atendessem, de certa forma, às nossas necessidades educativas e que fosse de fácil acesso aos alunos. Optaria, por exemplo, por usar celular e notebook para envolver a todos, como em trabalhos em grupo.
Como já mencionado, na minha trajetória escolar a experiência com computadores e internet se dava na sala de informática, onde a tarefa que predominava era pesquisar na Wikipédia assuntos relacionados às atividades trabalhadas em sala de aula, como se estivéssemos na biblioteca. Anos após, ao realizar o processo de estágio nessa mesma escola, percebi que não houve uma grande evolução. Na mesma sala de informática os computadores se encontram no mesmo lugar, alguns deles amontoados e empoeirados, fazendo entender que são pouco utilizados.
No meu percurso universitário, as principais tecnologias utilizadas são Moodle, E-campus, Google Classroom, Google Meet, e-mail institucional e, recentemente, a assinatura digital. Para mim esse novo ambiente foi bastante desafiador, acredito que para todos, por se tratar de ferramentas novas com as quais eu não tinha contato. O Moodle foi a ferramenta que mais encontrei dificuldades no domínio e acredito que isso tenha dificultado, de certa forma, meu aprendizado, pois os materiais para estudos eram postados nesse espaço. Com as dificuldades encontradas, eu só usava o ambiente para postagem de trabalhos.
No período do isolamento social, destaco como algo positivo o uso de algumas ferramentas para manter o diálogo e algumas atividades da universidade iniciadas presencialmente, mudando totalmente a metodologia. As ferramentas que antes eram mais utilizadas para interação social, com a pandemia se tornaram essenciais para o desenvolvimento dos trabalhos, como por exemplo, o WhatsApp. Assim, o período pandêmico me levou a me adequar a essas tecnologias também para o uso profissional, o que fez com que eu comprasse alguns novos aparelhos para conseguir acompanhar as atividades propostas.
No contexto escolar das comunidades do campo, percebi que a implantação do Ensino Remoto Emergencial acabou dificultando o processo de aprendizado dos alunos e a atuação dos professores. Esses tiveram que se adequar à nova realidade muitas vezes sem possuir ferramentas básicas como conexão com a internet, além de não terem ajuda com recursos e nem formação específica.
Durante o processo de estágio, foi possível perceber que o uso das tecnologias na escola são um grande tabu, visto como algo totalmente negativo, até mesmo com a proibição do uso do celular em sala de aula. Deixam, assim, de aproveitar as ferramentas úteis ao processo de ensino e aprendizado dos alunos.
Como futuro educador percebo a necessidade de se buscar por conhecimentos e capacitação para conhecer ferramentas que possam ser levadas para a sala de aula e que atendam ao público. Concluo com a defesa do uso de tecnologias adequadas ao espaço escolar, que possam atender a todos, de maneira significativa no processo de aprendizado dos alunos. Nesse sentido, deve-se quebrar essa barreira da proibição e adequar as ferramentas midiáticas utilizadas ao contexto social. Com relação à segurança em se trabalhar com as tecnologias em práticas educativas, percebo que é algo bem desafiador, pois precisa levar em consideração o público que será atendido. No entanto, a presença de computadores e acesso à internet em grande parte da escola facilita o trabalho com metodologias voltadas para a pesquisas que contribuem para a criticidade dos alunos.
[1] Adilson Gomes Santos é graduando do curso Licenciatura em Educação do Campo (LEC), da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM).
Este trabalho foi orientado pelos professores Carlos Henrique Silva de Castro, Luiz Henrique Magnani e Mauricio Teixeira Mendes.