O início de um sonho

O início de um sonho

Por Viviane Soares Silva [1]



Comecei na vida escolar aos 7 anos de idade, em uma escola pequena em meu bairro. Foram momentos incríveis, desde as atividades em sala de aula, as músicas infantis cantadas e dançadas no pátio da escola, até o hino nacional nas segundas-feiras. Antes de entrar na escola, eu só tinha conto com textos escritos por meio de revistas de novelas e de signos, compradas pela minha tia.

No ano de 2007, passei para a 5ª série (hoje 6º ano). Como minha escola era pequena, fomos transferidos para a escola maior do bairro vizinho, onde estudei até me formar. Foram novos hábitos, novos colegas, professores, tudo novo. Lá conheci minhas melhores amigas, onde vivi anos inesquecíveis, pude presenciar a maldade e covardias decorrentes do tom de pele, ou espessura corporal, dentre outros motivos, os quais sempre terminavam em socos e pontapés.

No ano de 2014, aproximava-se o tão sonhado dia, o da nossa formatura do 3º ano do ensino médio. Trabalhamos o ano todo, vendendo rifas, bingos, caderno de ouro, todos com os mesmos objetivos, arrecadar dinheiro para a formatura. Fizemos várias festas para arrecadar dinheiro para quando chegasse o dia, para garantir que o dinheiro era suficiente para nossa festa. O tão sonhado dia foi 20/12/2014. Tivemos a missa de formatura, que foi muito linda, cm uma igreja impecável. O jantar de formatura foi na escola. Naquele momento vimos que todo esforço valeu a pena, que cada bingo, rifa, festas, tudo foi compensado.

Sete anos após a formatura do 3º ano, estou realizando o sonho de ingressar em uma universidade federal, a  UFVJM, para me tornar uma excelente profissional.



[1] Viviane Soares Silva é graduanda da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziu este relato na disciplina Prática de Leitura e Produção de Textos, ofertada no primeiro semestre de 2023. A organização e edição do material foi feita pelo Projeto de Extensão Aula Digital.

Este trabalho foi orientado pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro, com as ricas contribuições na revisão e organização do tutor Marcos Roberto Rocha.

Agroecologia e Educação Sexual na Escola

Agroecologia e Educação Sexual na Escola

Por Ivane dos Santos Lopes*

 

Entre as polêmicas que permeiam o currículo educacional, trabalhar a educação sexual nas escolas é uma questão que não deve ficar em segundo plano, visto que é de extrema importância a compreensão das mudanças corporais e comportamentais que fazem parte da realidade dos adolescentes em idade escolar. A agroecologia, aliando-se a temática, visa a manutenção ecológica do solo para a garantia de subsistência respeitando a natureza, inclusive os seres humanos.

Conforme consta no artigo 205 da Constituição Federal[1], a educação é um direito de todos e educar é um dever da família e do Estado. No que tange à educação sexual, no Brasil, nota-se que crendices populares e tabus levam para os jovens informações falsas que colocam suas saúdes em risco. Sem orientação, não encontram respostas para suas dúvidas por parte dos responsáveis e nem da escola e acabam por procurar em outras fontes, nem sempre confiáveis. Informações erradas, além de problemas de saúde, têm consequências sociais, como gravidez indesejada, gravidez na adolescência, pandemias de doenças e infecções. Outro viés importante da educação sexual é combater a violência, como nos casos de pedofilia.

Para mudar esse contexto, a escola deve trabalhar a educação sexual nas escolas respeitando a faixa etária das crianças e adolescentes, pois, na maioria dos casos, os pais e responsáveis não têm informação suficiente para assumirem essa demanda. Adicionalmente, as crendices religiosas agravam a situação.

Em primeiro lugar destaca-se a importância do papel da escola na prevenção do abuso sexual. E necessário educar, bem como defender, nossas crianças e adolescentes frente a abusos e exploração sexual. A escola e a gestão pedagógica podem fomentar um ambiente protetivo e de observação das mudanças comportamentais das crianças e adolescentes, uma vez que passam bastante tempo na escola, quando podem dar sinais sobre situações de abusos e violência sexual.

Não se deve associar educação sexual a ensino de relações sexuais, pois o foco na escola é a consciência do corpo, o conhecimento da biologia e o entendimento dos limites que definem o abuso. O ideal é que a família ensine para suas crianças a necessidade de cobrirem seus corpos, de conhecer os nomes corretos de cada órgão ou membro de seus corpos, ter cuidados de higiene e protegerem seus corpos, sobretudo suas partes íntimas. Também devem aprender que providências tomar em caso de abuso, como contar para alguém de confiança como a mãe ou a professora. Assim, as crianças terão conhecimento para diferenciar toques invasivos, importunação e abusos sexuais, o que ajudará a evitar abusos e a relatarem, caso ocorram.

De acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2022[2], publicado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, em cerca de 76% dos casos de estupro as vítimas são menores de 14 anos e, na maioria das vezes, o crime ocorre em ambiente familiar, sendo o agressor um parente da vítima ou mesmo um amigo da família. É evidente que trabalhar a educação sexual nas escolas pode prevenir a violência que há muito tempo assola a sociedade. Melhor seria com a participação de equipes de área da saúde, pois, poderiam desenvolver atividades lúdicas, palestras, projetos em grupo e seminários auxiliando aos adolescentes na prevenção de infecções sexualmente transmissíveis (ISTs) e da gravidez precoce.  Sabe-se que quando uma adolescente engravida sua vida mudará radicalmente, afetando também sua saúde física e mental, bem como a educação. Em decorrência da gravidez, muitas interrompem os estudos, o que certamente diminui suas chances de conseguir um bom emprego. Consequentemente, essa mãe poderá ficar em condição de vulnerabilidade econômica e risco de exclusão social. Nesse sentido, nota-se a importância de pais, ou responsáveis, trabalharem em conjunto com a escola para que seus filhos entendam e aceitem as mudanças físicas, mentais e emocionais de seus corpos.

A agroecologia visa a manutenção ecológica do solo respeitando e incluindo a biodiversidade e a diversidade humana. Conforme cartilha sobre diversidade sexual do Instituto Federal do Piauí (UFPI)[3]:

A sexualidade humana é formada por uma múltipla combinação de fatores biológicos, psicológicos e sociais, e é basicamente composta por três elementos: sexo biológico, orientação sexual e identidade de gênero e expressão de gênero.

Ou seja, há uma diversidade que não podemos controlar, tão pouco padronizar, pois é algo socialmente construído. Assim, se existir qualquer forma de desrespeito, exploração ou discriminação, da escravidão ao machismo e à LGBTfobia, não existe agroecologia. Neste sentido se lutamos contra a escravidão, contra o patriarcado, contra o racismo, devemos incluir outros excluídos nessa luta. Para viver bem em sociedade devemos aceitar e respeitar que todos somos iguais, justamente porque somos diferentes. Todas as mazelas que foram construídas socialmente, nos contextos histórico-culturais específicos, devem ser desconstruídas socialmente. Claro que não do dia para a noite, mas cada atitude positiva faz grande diferença.

Ao longo da história, muitas pessoas, principalmente a população LGBTQIA +, foram e ainda são privados de muitos direitos por causa de uma sociedade culturalmente preconceituosa e opressora. Visando ao respeito à diversidade, os educadores também devem direcionar aos estudantes para que sejam sujeitos de bem para viver socialmente em harmonia, livres de ações discriminatórias que regridem a sociedade.

O governo, por sua vez, deve investir em projetos para a área da educação e da saúde, buscando fortalecer o cumprimento das leis existentes e, se necessário, criação de novas. Órgãos como o ministério da educação e da saúde podem promover a educação sexual nas escolas como disciplina, e também investir em palestras, eventos, campanhas educativas e distribuição gratuita de preservativos e contraceptivos. Assim, a Constituição de 1988, no que diz respeito ao direito à educação e à saúde para todos, poderá ser respeitada.

Referências

[1] <http://www.un.org/en/universal-declaration-human-rights/>

[2]  <http://www.forumseguranca.org.br/atividades/anuario/>

[3] <https://www.ifpi.edu.br/paulistana/noticias/CartilhaComunidadeLGBTQIAPemmbitoeducacional.pdf




* Ivane dos Santos Lopes  é acadêmica da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziu este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre de 2022 (janeiro a junho de 2023). Foi orientada pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

Lembranças dos meus letramentos

Lembranças dos meus letramentos

Por Vânia Evangelista Fagundes Ribeiro [1]



Durante minha infância era muito comum o acesso a livros na minha casa, pois sou a filha mais nova de sete filhos. Então, sempre via meus irmãos estudando, fazendo lição de casa. Então, eu sempre estava atrás deles pedindo folhas para rabiscar, e sempre via minha mãe lendo a Bíblia e livros da igreja, por ela ser muito católica. Ela era presidente do grupo de legionárias e catequista.

Com isso, sempre se reunia com crianças e adolescentes uma vez na semana, na minha casa, para passar os ensinamentos bíblicos. Então, eu sempre via eles lendo, escrevendo, e ali estava eu, sempre grudada nela, a acompanhando nos encontros e na missa. Recordo-me bem que em casa sempre tinha os jornaizinhos da igreja, que minha mãe levava ao final de cada missa que assistia. Eu os folheava, mas não entendia nada, pois não sabia ler.

Lembro que quando era pequena minha mãe me presenteou com um kit de livrinhos de historinhas infantis, que veio acompanhado de um quebra-cabeça da Branca de Neve, que era o que eu mais gostava por ter as peças para ir montando, e tinha uma historinha por trás das peças. A presença da minha família nessa fase foi de muita importância me ensinando e esclarecendo minhas dúvidas.

Aos quatro anos de idade, minhas irmãs me ensinaram a contar até 50 e a conhecer as algumas letras. Sempre brincávamos de escolinha, onde minha irmã Vanessa era a professora e eu, aluna. Aos poucos, através dos meus rabiscos, fui aprendendo o alfabeto. Aos seis anos eu frequentei, pela primeira vez, a escola, onde iniciei na turminha do pré-escolar com a professora tia Cidinha (uma professora tão meiga), e através dos ensinamentos dela fui aprendendo a formar sílabas, palavras. Até aprendi a ler. E, nos anos seguintes, entre sete e oito anos, fui aprendendo a fazer pequenas contas de somar e subtrair. Muitos professores passaram na minha vida. Lembro também de uma professora chamada Terezinha, que incentivava bastante a leitura. Ela nos levava na biblioteca todas as semanas para pegar um livro para fazer um resumo e apresentar em sala, e eu sempre escolhia os mais coloridos e que tinham final feliz. E isso foi ampliando meu conhecimento de interpretação, leitura e escrita. Em 2010, iniciei o Ensino Médio na Escola Betânia Tolentino Silveira. O primeiro ano não foi tão legal, pois havia muitos alunos dentro de uma mesma sala, e isso acabou me desmotivando um pouco. Mas nos anos seguintes a turma foi dividida e o contato com textos mais complexos aumentou, e a professora de Português nos apresentou grandes obras, dentre elas “Iracema”, de José de Alencar.

Em 2012, conclui o Ensino Médio e logo fiz vestibular de Direito e Engenharia Civil, nos quais passei e decidi cursar Engenharia no início de 2013, na Faculdades Verde Norte, onde aprendi muitos cálculos, do básico ao estrutural, e pude melhorar minha escrita em diversos aspectos. Em 2022, decidi buscar novos conhecimentos. Então, fiz o vestibular para o curso de Licenciatura em Matemática da UFVJM, no qual acabei ingressando. Sinto-me muito feliz, pois mais um sonho foi realizado e nesse curso estou tendo a oportunidade de ampliar meus conhecimentos e futuramente me tornar uma grande educadora.



[1] Vânia Evangelista Fagundes Ribeiro é graduanda da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziu este relato na disciplina Prática de Leitura e Produção de Textos, ofertada no primeiro semestre de 2023. A organização e edição do material foi feita pelo Projeto de Extensão Aula Digital.

Este trabalho foi orientado pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro, com as ricas contribuições na revisão e organização do tutor Marcos Roberto Rocha.

Fechamento de escolas rurais: um retrocesso para Educação do Campo

Fechamento de escolas rurais: um retrocesso para Educação do Campo

Por Izaura Aparecida Ferreira*

“Educação, direito de todos” é um bonito slogan de diversas secretarias de educação Brasil afora, respaldadas em uma garantia da Constituição Brasileira de 1988 e pela Lei de Diretrizes e Bases LDB 9394/96. Entretanto, ao que parece, o homem do campo não está inserido nesse “todos” do slogan, pois o que mais vemos nos últimos anos é o fechamento de escolas rurais. Trata-se de um retrocesso para educação do campo que traz impactos imensuráveis para o modo de vida das comunidades campesinas.

Para Sales (2013, p. 01):

A retirada das instituições gerou a desmobilização destas comunidades e a ausência dos serviços básicos, até mesmo da manutenção das estradas de acesso. O impacto abrange vários vieses, seja o social, econômico ou político:

Dessa forma, como aponta Kremer (2006), o fechamento dessas unidades de ensino fragiliza a comunidade, comprometendo projetos comuns que poderiam lhes asseguram direitos sociais, culturais e identitários importantes. Isso se dá porque o espaço escolar, sobretudo no contexto do campo, desprovidos de aparelhos estatais, tem funções que vão muito além da educação formal e acabam se tornando o elo entre comunidade e poder público. A escola é um espaço de encontros culturais, que, assim, funciona também como instrumento político de inclusão e promoção social (ARGENTON, 2020, p.1). Trata-se, ainda, de um desrespeito e uma tentativa de apagamento de anos de luta dos movimentos sociais ligado às questões da terra, que empunham a bandeira da educação de qualidade para o homem do campo, pautada na diversidade e especificidade desses povos.

Como solução imediatista e inadequada, há aqueles que defendem um projeto capitalista maquiado pela falsa ideia de qualidade de aprendizagem. O que contraria toda a especificidade da educação no âmbito do campo que, espera-se, que seja contextualizada, como já apontam documentos oficiais como a citada LDB 9394/96.  Nessa direção errônea há inúmeros argumentos, como as denunciadas no parecer CEB 23/2006[1], aprovado em 2012 pelo Ministério da Educação, onde defendem o fechamento de escolas em decorrência de baixa densidade populacional. Atacam, ainda, a metodologia da mutisseriação, utilizada em muitas escolas do campo com poucos estudantes. A solução, segundo alguns municípios que defendem tais ideias equivocadas, seria formar núcleos de estudantes de várias comunidades onde prometem oferecer melhorias na aprendizagem (RODRIGUES, 2017).

É evidente que esse discurso é meramente político e capitalista, pois o fechamento de escolas rurais é de uma violência sem tamanho para com a população campesina. É importante ter sempre em mente que a educação do campo é um direito; e para que seja efetivamente assegurado, sem o risco de fechamento das escolas rurais, é necessário que o povo campesino e suas lideranças tenham conhecimento da Constituição e, sobretudo, da Lei 12.960[2] que os ampara nesta questão do fechamento de escolas rurais. Outra medida importante e que lideranças campesinas ocupem cadeiras nos conselhos municipais e estaduais de educação para dialogar e agir politicamente em prol de seus territórios e, em caso de violação de direitos, possam acionar mais facilmente o Ministério Público em defesa de seus direitos.

Referências

ARGENTON, Gabriel Tamanchieviz.  Educação do Campo: garantia de direitos em tempos de pandemia. Disponível em: <https://www.brasildefators.com.br/2020/06/16/artigo-educacao-do-campo-garantia-de-direitos-em-tempos-de-pandemia>. Acesso em 31/01/2023;

KREMER, Adriana. Educação e Desenraizamento: processo de Nucleação das Escolas no Município de Bom Retiro – SC. 29ª Reunião anual da Anped, 2006. Disponível em: <29reuniao.anped.org.br/trabalhos/posteres/GT06-2313–Int.pdf>. Acesso em: 31/01/2023.

SALES, Suze da Silva. Análise de um processo consolidado: histórico do percurso da nucleação de escolas rurais brasileiras (1989-1999). In: SIMPÓSIO NACIONAL DEHISTÓRIA, 27., Natal, RN, 22-26 jul. 2013.

RODRIGUES, Ana Cláudia da Silva, Nucleação de escolas no campo: conflitos entre formação e desenraizamento. Educ. Real. 42 (02), 2017. Disponível em: <https://doi.org/10.1590/2175-623657687>. Acesso em 01/02/2023.

[1] http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/2007/pceb023_07.pdf

[2] http://legislacao.planalto.gov.br/legisla/legislacao.nsf/Viw_Identificacao/lei%209.394-1996?OpenDocument




*Izaura Aparecida Ferreira é acadêmica da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziu este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre de 2022 (janeiro a junho de 2023). Foi orientada pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

Minhas lembranças

Minhas lembranças

Por Thauane de Sousa Costa [1]



 

Desde criança sempre tive contato com livros, sejam eles de histórias ou não. Lembro que o meu primeiro contato foi com uma Bíblia que tinha na minha casa, que era da minha mãe. E, desde então, ela sempre lia as histórias para mim. Quando eu ia para a casa da minha avó, ela sempre me motivava a ler a Bíblia e, com isso, fui começando a ler aos poucos.

Ainda antes de entrar para a escola, quando minhas irmãs estudavam, eu sempre pegava os livros e tentava ler os textos. Como meus pais não tinham tempo para me ensinar a ler e escrever, porque trabalhavam muito, minhas irmãs me davam livros de histórias, desenhos para colorir e de números básicos para eu ir aprendendo aos poucos.

Quando entrei para a escola, aos seis anos, eu já tinha o conhecimento do alfabeto, dos números e já sabia ler algumas coisas e somar o básico, pois eu vivia com livros nas mãos e sempre procurava saber e aprender as coisas novas sozinha. Com o tempo, fui me interessando ainda pelos livros, principalmente os de matemática, mas a minha caligrafia não era muito boa. Então, a minha professora, no Ensino Fundamental, me dava aula de reforço na casa dela para melhorar a escrita.

Com isso, todos os dias eu ia até a biblioteca pública da minha cidade e pegava diversos livros para ler em casa. Ainda no Ensino Fundamental comecei a fazer várias produções de texto, mas sempre tinha dificuldades de desenvolver os textos.

Lembro-me também que na escola tinha vários projetos de leitura e isso me motivava ainda mais a ler, mas sempre que chegava da escola de manhã, fazia a lição de casa e, logo em seguida, já ia até uma estante que tinha na minha casa, cheia de livros, e pegava os livros de matemática para resolver os problemas. Lembro que cheguei a responder 3 livros completos de matemática. E, desde então, quase não brincava com outras crianças, pois eu vivia focada nos livros.

Quando cheguei ao Ensino Médio, comecei a produzir redações. Tive contato com textos diferentes do Ensino Fundamental, porém não tinha mais o mesmo tempo de ler livros como na infância, pois comecei a trabalhar. E sempre tive o sonho de fazer um curso superior, até que, ao concluir o Ensino Médio, fiz, pela primeira vez, o ENEM e, através dele, consegui ingressar em uma faculdade para fazer o curso de Matemática. Porém, me deparei com textos diferentes, textos acadêmicos e, com isso, comecei a ter dificuldades, pois tinha perdido o hábito de ler como antes. Hoje, estou cursando Matemática na UFVJM, pois é uma área que eu amo e na qual sempre me dei bem na escola.



[1] Thauane de Sousa Costa é graduanda da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziu este relato na disciplina Prática de Leitura e Produção de Textos, ofertada no primeiro semestre de 2023. A organização e edição do material foi feita pelo Projeto de Extensão Aula Digital.

Este trabalho foi orientado pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro, com as ricas contribuições na revisão e organização do tutor Marcos Roberto Rocha.

Sua consciência racial não é minha obrigação

Sua consciência racial não é minha obrigação

Por Isaura dos Santos Lopes*

Questionamentos sobre consciência racial e questões de raça/racismo têm sido pauta em muitos debates e polêmicas nas mídias de massa, como redes sociais. Nos reality shows dos famosos, como A Fazenda e Big Brother Brasil, os participantes são sempre motivos de críticas excessivas e ódio, como o caso de Karol Conká na edição do BBB de 2021 e Cariúcha n’A Fazenda de 2023. 

Sobre as questões de raça, poucas críticas são sobre a postura dos participantes brancos e, ao mesmo tempo, muitos esperam que os negros ensinem consciência racial. Como negra que sou, entendo que não cabe a nós, a negritude, tornar os brancos pessoas conscientes obre essas e outras questões. Os negros não têm essa responsabilidade, pois não criaram o racismo.  

Ser mulher negra não me obriga a saber e a ensinar tudo (o tempo todo) sobre racismo e feminismo negro e é injusto nos cobrar isso. Se olharmos a forma como nossa sociedade foi construída, fica evidente tal injustiça, pois as pessoas negras foram marginalizadas e privadas de coisas essenciais, como o acesso à educação. Prova disso é a lei sancionada em 1837[1] para proibir pessoas escravas nas escolas públicas.

Por outro lado, quem sempre teve melhor acesso à educação e à formação política foram os brancos. Então, são essas pessoas que deveriam estar capacitadas para buscar sua consciência racial e educar os demais. No entanto, a branquitude não assume seu lugar de classe opressora e usa como estratégia para manterem seus status um discurso “integracionista”. Em outras palavras, negam sempre a existência do racismo e da desigualdade no nosso país para mascarar seus privilégios, os quais não querem abrir mão. Estamos cansados de ouvir que “não existe racismo no nosso país, pois os negros não são mais escravos”; ou que “fulano não é racista, pois tem um amigo ou um parente negro”. São expressões usadas para difundir a negação do racismo, como estratégia para mascarar uma questão que é estrutural. Parafraseando o atual ministro dos direitos humanos, Sílvio de Almeida (2023), “(…) quando se admite a existência do racismo, cria-se automaticamente a obrigação moral de agir contra ele”. Tomando essa ideia como ponto de partida, entendemos por que toda a negação da existência do racismo estrutural.

Além da negação, a branquitude ataca os movimentos negros visando a desestabilizá-los a partir da deslegitimação de suas lutas. É comum ouvir que “os brancos não podem apoiar as causas dos negros, pois só os negros podem fazer isso, já que buscam inverter a ordem”. Pensar isso é um absurdo! Assim como é necessário o apoio dos homens aos movimentos feministas, já que o patriarcado é uma construção sobretudo do público masculino, o principal alvo na desconstrução dessa ideia. Da mesma forma, as causas defendidas pelos movimentos negros precisam do apoio dos brancos, afinal o opressor deve ser conscientizado e fazer parte da mudança.

Um exemplo evidente disso é a Coordenação de Mulheres Quilombolas do Vale do Rio Doce, onde a senhorita Agda, uma mulher branca não quilombola, está sempre apoiando os interesses do grupo. Agda participa de momentos formativos e eventos com as mulheres do grupo, além de prestar serviços de assessoria técnica sobre direito dos quilombolas nas comunidades. Atua em eventos da Comissão das Comunidades Quilombolas do Alto e Médio Rio Doce, sempre com respeito e sabendo que está cumprindo seu papel de colaboradora na luta por um mundo racialmente mais justo. Ela entende que luta enquanto mulher com privilégios, mas que tem consciência racial para apoiar o movimento que busca garantia de direitos para os quilombolas.  O próprio Silvio de Almeida, o já citado ministro dos Direitos Humanos, disse em sua participação no programa Roda Viva em 2021 que: “Sem os brancos, não é possível superar o racismo[2]”.

Por fim, com colaboração de todos a consciência racial pode ser atingida e se tornar o principal o instrumento de luta pela igualdade racial. Um caminho para que aconteça é fazer valer as leis que visam promover a igualdade racial e a reparação ao povo preto, tal como as leis de cotas, contra o racismo e a injúria racial.  Essas Leis são exemplos de medidas contra o racismo que devem ser divulgadas e, de preferência, estudadas nas escolas. Outro exemplo é a lei que torna obrigatório o ensino sobre o ensino sobre História e Cultura Afro-brasileira nas escolas, que deve ser de fato ser implementada. Vejo a abordagem destas leis nas instituições de ensino básico como uma estratégia essencial para formar política, crítica e socialmente as gerações futuras.


Referências

[1] <https://www.scielo.br/j/ep/a/9ZhqHKsrZg987cSGqd7SbNg/>

[2] <https://www.youtube.com/watch?v=cqPduxB7woE>




* Isaura dos Santos Lopes é acadêmica da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziu este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre de 2022 (janeiro a junho de 2023). Foi orientada pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

Lançamento: “Encontros e Encantos de Conhecimentos e Fazeres Tradicionais com Linguagens e Ciências da Natureza”

Lançamento: “Encontros e Encantos de Conhecimentos e Fazeres Tradicionais com Linguagens e Ciências da Natureza”

Por Maurício Teixeira Mendes*

Novo Livro “Encontros e Encantos de Conhecimentos e Fazeres Tradicionais com Linguagens e Ciências da Natureza” é Lançado como Fruto de Colaboração interdisciplinar e intercultura. 

O livro “Encontros e Encantos de Conhecimentos e Fazeres Tradicionais com Linguagens e Ciências da Natureza” é fruto de um trabalho coletivo, desenvolvido a partir da articulação do projeto de extensão “Educação do campo: saberes e práticas envolvendo letramentos e agroecologia” que está vinculado ao Programa Encontro de Saberes da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM). 

O material foi produzido com a colaboração entre mestres e mestras dos saberes tradicionais de Serro-MG e participantes do curso de Licenciatura em Educação do Campo da UFVJM. Este livro faz a junção entre saberes sobre agricultura e sementes crioulas, folia de reis e plantas medicinais e benzeção com os conteúdos escolares indicados pela Base Nacional Comum Curricular (BNCC) nas áreas de Linguagens e Ciências da Natureza.

As atividades contidas no livro surgiram a partir das unidades curriculares Prática de Ensino e Desenvolvimento do Estágio Curricular Supervisionado na Escola Estadual Ministro Edmundo Lins, também localizada em Serro-MG. Essa escola é profundamente enraizada em tradições locais, e três oficinas temáticas foram desenvolvidas, abrangendo áreas como agricultura e sementes crioulas, folia de reis, plantas medicinais e benzeção. Estas oficinas foram cuidadosamente elaboradas com base nos planos de curso do Currículo Referência do estado de Minas Gerais (CRMG) e BNCC. Com um foco particular na educação crítica, inspirada pela visão de Paulo Freire, procuramos brechas nesses currículos para se pensar em uma educação dialógica e contextual.

O capítulo inicial do livro destaca a importância de incorporar os conhecimentos tradicionais no ambiente escolar, ressaltando a riqueza que essas tradições podem adicionar ao aprendizado. Os capítulos subsequentes fornecem uma visão detalhada da estruturação do material de planejamento das oficinas temáticas e oferecem um resumo das atividades desenvolvidas.

O livro está disponível no formato de e-book e pode ser baixado gratuitamente no repositório institucional da UFVJM, acessível através do seguinte endereço eletrônico: http://acervo.ufvjm.edu.br/jspui/handle/1/3284 . Os autores e autoras do livro desejam a todos os leitores uma experiência enriquecedora e inspiradora ao explorar as páginas deste trabalho coletivo.




* O Prof. Dr. Maurício Teixeira Mendes é um dos organizadores do livro.

Eu e a educação

Eu e a educação

Por Sandra Soares de Oliveira [1]



Na minha infância, com idade insuficiente para frequentar uma escola, era comum ver textos em livros em minha casa.  Meus irmãos mais velhos, que já frequentavam uma escola, tinham acesso ao livro didático, caderno de desenhos, lápis e outros objetos que a prefeitura disponibilizava aos alunos. Meus irmãos sempre me deixavam olhar, escolher a cor dos desenhos, mas não me deixavam pintar.

Na minha comunidade era muito comum a ter aulinha, nos finais de semana. Minha prima mais velha brincava de escolinha, usando giz e um quadro. Eu ganhava uma folha e um lápis bem pequeno para rabiscar e minha irmã me presenteava com um caderno. Aprendi a escrever meu nome antes mesmo de entrar para a escola. As aulas aconteciam na área de minha casa.

Quando completei seis anos de idade, comecei a frequentar a escola e ser alfabetizada, porém não foi uma fase fácil. Tive muito medo de ir só, perde ônibus ou motorista me esquecer, pois morava na zona rural, meus irmãos não estudavam na mesma escola. Sinceramente, em sala de aula, tive muitas dificuldades nos primeiros anos, pois sabia muito pouco nessa época. Aprendi por meio de histórias em quadrinhos, contos de fadas etc. Apesar de falar os números, não sabia reconhecer valores, por isso meus pais me davam moedas de centavos para comprar balas e me motivar a ir à escola. A professora mandava todos os últimos dias de aula da semana escolher livros e levá-los para casa para lermos no fim de semana. No início da semana, devíamos recontar o texto lido. Certamente isso ajudou-me a desenvolver a leitura. Durante as aulas, a professora sempre tomava a tabuada.  

Minha família foi a base nos meus anos iniciais. Minha mãe me ajudou muito na leitura. Meu pai não sabia ler, mas sabia contar. Isso foi o suficiente para eu passar de série no ensino fundamental. Dentre os livros mais usados nas séries iniciais do ensino fundamental, recordo de te lido umas duas ou mesmo três vezes, foi.” O patinho feio” da biblioteca da escola municipal. Com dez anos, mudei para uma escola estadual, onde a professora de português recomendava vários livros. Isso contribuiu para uma grande mudança na minha leitura e escrita.

Meu primeiro ano de faculdade apresentou mudanças positivas porque tive capacidade de entender o plano de ensino no curso ciências e tecnologia da UFVJM, entretanto senti dificuldades por que o mundo passava por uma pandemia.  Como meu curso era integral e de forma remota quase não tinha tempo para fazer nada, pois era preciso estudar muitos cálculos. Acredito que não aprendi o suficiente por esse motivo. Com o retorno das aulas presenciais, resolvi iniciar outra graduação EaD, em licenciatura em física. Hoje, estudo o primeiro período e muito feliz. Sei que sou capaz de administrar bem minha vida financeira e acadêmica.



[1] Sandra Soares de Oliveira é graduanda da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziu este relato na disciplina Prática de Leitura e Produção de Textos, ofertada no primeiro semestre de 2023. A organização e edição do material foi feita pelo Projeto de Extensão Aula Digital.

Este trabalho foi orientado pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro, com as ricas contribuições na revisão e organização do tutor Marcos Roberto Rocha.

A persistência da violência contra as mulheres no Brasil

A persistência da violência contra as mulheres no Brasil

Por Jane Beatriz Fernandes Alves e Cláudia Cristina Ribeiro*

Há dezesseis anos, a Lei nº 11.340, conhecida como Lei Maria da Penha, foi sancionada. Há oito anos, houve a criação da Lei nº 13.104, conhecida como Lei do Feminicídio. Essas leis têm por finalidade coibir e prevenir a violência contra mulheres, que sofrem com múltiplas formas de agressão, e criminalizar crimes hediondos em razão do gênero contra pessoas do sexo feminino. As leis são instrumentos de grande importância para um estado democrático, pois visam controlar as ações e comportamentos dos indivíduos para garantir a justiça na sociedade.

Apesar da existência das leis, a violência e os crimes contra mulheres ainda persistem, pois o que se vê é que, na maioria das vezes, a justiça não é feita. A educação também é importante, não apenas para educar uma sociedade menos sexista e menos violenta, mas também para fornecer conhecimento e informação sobre os direitos de muitas mulheres e jovens, sejam da cidade ou do campo.

Muitas mulheres, principalmente as que vivem nas zonas rurais, encontram-se afastadas de assistências básicas necessárias para enfrentar situações de violência. As causas do feminicídio são diversas, mas majoritariamente estão relacionadas à violência doméstica, ao machismo e à cultura de objetificação da mulher. Em muitos casos, o agressor é uma pessoa próxima da vítima, e os crimes muitas vezes se acumulam a outros decorrentes de interseccionalidades.

As práticas desses atos estão ligadas ao patriarcado, que foi criado historicamente e permanece com traços até os dias atuais. Entretanto, o machismo é considerado uma situação extremamente preocupante na qual a sociedade vive, colocando o homem em posição hierárquica diante da mulher, colocando-a em situações de vulnerabilidade. Também se apoia a misoginia, que é o ódio às mulheres, ao universo feminino e à fatalidade de punição por mulheres assumirem suas sexualidades como lésbicas ou bissexuais. Além da violência, em alguns casos, é praticado o lesbocídio.

Além disso, como resultado das violências diárias decorrentes dessa estrutura patriarcal, muitas mulheres mantêm relacionamentos mal estruturados com receio de serem violentadas, mas também por fatores como falta de recursos financeiros para se sustentar sozinhas e por falta de apoio da família, como citado por Ana Prado.[1]

Há muitos fatores que levam as mulheres a se calarem ou não denunciarem diante os ataques e as agressões sofridas, como inadequação do atendimento às vítimas, falta de impunidade e ameaças constantes. Como resultado, os agressores não se intimidem e continuem com suas práticas violentas, levando ao ponto de cometer violências fatais. Segundo dados do site do G1[2] (2022), no primeiro semestre de 2022, 699 mulheres foram vítimas de feminicídio no Brasil, uma média de quatro mulheres por dia, que se refere ao maior número já registrado em um semestre. Analisando a trajetória histórica percebe-se que mesmo com a implementação de leis de proteção, vem aumentando casos de violência e, consequentemente, de feminicídio em vários estados do Brasil, como é mostrado pelo G1[3].

Essa dura realidade não atinge somente as mulheres dos centros urbanos, mas também muitas que vivem em zonas rurais. Nesse contexto, há exemplos como o caso de feminicídio na comunidade de São Gonçalo dos Rios das Pedras[4], cuja vítima foi assassinada dentro da casa de parentes pelo antigo companheiro. Há falta de registros de casos, pois essas mulheres são, muitas vezes, silenciadas e há uma naturalização desse ciclo. As mulheres do campo são vítimas de várias formas de violências que são resultados de fatores como a pobreza, a desigualdade de gênero, a precariedade de acesso aos serviços públicos e às políticas públicas, as quais tornaram-se pouco eficazes para sancionar determinados problemas.  

Conforme dados do anuário de Segurança Pública do MST[5], em 2021, foram registrados 1.341 crimes de feminicídios, sendo que 62% eram negras. A violência também avançou entre a comunidade LGBT: hoje uma travesti ou mulher trans é assassinada a cada 2 dias. As mulheres negras e a população LGBT sofrem de forma específica de violência de gênero, em razão do gênero de sua orientação sexual e/ou sua identidade de gênero, além da interseccionalidade com as questões raciais. Frequentemente esses grupos são discriminados e marginalizados em nossa sociedade, o que aumenta sua vulnerabilidade e a violência. Essas mulheres enfrentam vários tipos de preconceitos, incluindo o mercado de trabalho e a educação. Além disso, diariamente lidam com a homofobia e o racismo. De acordo com levantamento da Comissão Pastoral de Terra (CPT)[6], no campo, entre 2011 e 2020 foram registradas 77 tentativas e 37 assassinatos de mulheres por conflitos fundiários e ambientais, além de agressões, ameaças, estupros e outros crimes de violência.

Diante das múltiplas violências que as mulheres sofrem na sociedade, medidas para devem ser implementadas como políticas públicas relacionadas, como programas de conscientização que envolvam debates e diálogos com finalidade de que as leis existentes em proteção às mulheres saiam dos papéis e funcionem. É importante investir na educação e na conscientização sobre desigualdade de gênero e direitos, na finalidade de combater a violência contra as mulheres desde a infância, mostrando o quanto elas devem ser respeitadas dentro da sociedade, destacando que elas estão em posição de igualdade e direito com os homens. O Estado deve preparar as mulheres para que elas não fiquem desamparadas e tenham conhecimento sobre as leis que as asseguram. Em relação às mulheres do campo, elas devem procurar movimentos que tenham contato com mulheres camponesas, como o Movimento Macha das Margaridas e o Movimento Sem Terra (MST) para apoio e diálogo. É necessário divulgar com eficiência canais de apoio e de denúncias, para que informações e apoio cheguem a toda a população feminina, além da zona urbana.


Referências

[1]  <https://super.abril.com.br/coluna/como-pessoas-funcionam/por-que-tantas-mulheres-continuam-em-relacionamentos-abusivos>

[2] <https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/2022/12/07/feminicidios-batem-recorde-no-1o-semestre-de-2022-no-brasil-quando-repasse-ao-combate-a-violencia-contra-a-mulher-foi-o-mais-baixo.ghtml>

[3] <https://www.google.com/amp/s/g1.globo.com/google/amp/monitor-da-violencia/noticia/2023/03/08/aumento-dos-feminicidios-no-brasil-mostra-que-mulheres-ainda-nao-conquistaram-o-direito-a-vida.ghtml>

[4] RIBEIRO, Cláudia Cristina. Entrevista concedida a Igor Cássio dos Passos no dia 12 fev. 2023. Sobre: Caso de Feminicídio na Comunidade de São Gonçalo do Rio das Pedras.

[5] MST. Anuário de Segurança Pública. Disponível em: <https://mst.org.br/2022/11/25/lutamos-pelo-direito-de-existir-em-todas-as-possibilidades-afirma-dirigente-do-mst>.

[6] <https://mst.org.br/2022/11/25/lutamos-pelo-direito-de-existir-em-todas-as-possibilidades-afirma-dirigente-do-mst>




* Jane Beatriz Fernandes Alves e Cláudia Cristina Ribeiro são acadêmicas da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziram este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre de 2022 (janeiro a junho de 2023). Foram orientadas pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

Descobrindo o mundo das letras e dos números

Descobrindo o mundo das letras e dos números

Por Rafaela Paulino dos Santos [1]



 

Quando criança me lembro de sempre ver o meu pai lendo livros bíblicos, escrevendo em lições da escola sabatina, e minha mãe comumente lendo revistas. Lembro-me que às vezes eu olhava alguns gibis mesmo não sabendo ler ainda, e que eu tinha vários DVDs com histórias e músicas, eu gostava mais de assistir ao DVD do Patati Patatá, o cenário era sempre muito colorido, as músicas animadas e tinha várias histórias ao longo do DVD.

Não me recordo muito bem quando comecei a contar, só lembro que, quando aprendi, saía pela casa toda contando as coisas, foi como uma nova porta se abrindo para mim. Recordo-me que meus avós sempre davam moedas e dinheiro de papel para mim e para minha irmã, no dinheiro de papel sempre que eu via um número maior ou algum animal que comumente eu não ganhava, já sabia que o valor era maior. Quanto às moedas que ganhava eu gravava na mente que as moedas de 50 centavos e de 1 real valiam mais. Comecei a entender o valor do dinheiro, quando ia a mercearia comprar balas e salgadinhos e me explicavam o que daria para comprar com cada quantia de dinheiro.

Acho que comecei a somar e diminuir com 5 ou 6 anos, antes de entrar na escola. Com o decorrer do tempo os problemas matemáticos se tornaram mais fáceis. A escola e minha família foram fundamentais ao meu aprendizado de matemática, meu pai e meu avô tinham um bom conhecimento nessa área, eles me ensinavam de forma simples a como fazer contas e a escola me auxiliou muito também.

Antes de entrar na escola já conseguia escrever meu primeiro nome e o de alguns familiares, foi muito bom a experiência de perceber que eu conseguia escrever algumas coisas e ficava muito contente ao conseguir ler corretamente as palavras.  A escola foi bastante fundamental, sempre havia coisas para ler e escrever, isso deixava cada dia mais fácil e natural o aprendizado.

Lembro-me que havia um projeto na escola chamado “sacola mágica”, que consiste em sortear alguma pessoa da turma para “ganhá-la” e trazer na próxima semana textos sobre os livros lidos. Acho que foi a partir daí que tive mais contato com a leitura, ia à biblioteca da escola e pegava vários livros para ler, sempre fui uma pessoa muito curiosa e a literatura avivou isso ainda mais. No ensino fundamental, gostava muito de ler contos ou histórias em quadrinhos, no ensino médio gostava mais de ficção científica, crônicas e contos de terror. Normalmente na escola produzia mais redações ou textos críticos sobre alguns assuntos propostos.

Na escola nos anos iniciais do pré até o 6º ano havia uma salinha que ficavam os computadores e alguns livros em prateleiras, já na outra escola em que passei o restante dos meus anos escolares havia uma biblioteca com vários livros e projetos de incentivo à leitura.

Noto que nos primeiros anos na universidade tenho lido poucos livros, escrito coisas apenas relacionadas aos assuntos estudados e não mais livros de meu interesse. Mas que tenho escrito mais, seja textos acadêmicos, relatórios e coisas relacionadas.

Sinto bastante falta de uma base sólida da escola, principalmente em questão de matemática, eu não tive muito contato aprofundado sobre, e tenho sentido um pouco desse Impacto agora na universidade com algumas atividades. Percebo que agora estou começando a entender cada vez mais a importância do professor e de um ensino de qualidade.



[1] Rafaela Paulino dos Santos é graduanda da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziu este relato na disciplina Prática de Leitura e Produção de Textos, ofertada no primeiro semestre de 2023. A organização e edição do material foi feita pelo Projeto de Extensão Aula Digital.

Este trabalho foi orientado pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro, com as ricas contribuições na revisão e organização do tutor Marcos Roberto Rocha.

Agroecologia e permanência do homem no campo

Agroecologia e permanência do homem no campo

Ingrid Cristina dos Passos e Igor Cassio dos Passos*

A migração do campo para a cidade é um processo em que a população da zona rural se transfere para as cidades, trocando as atividades rurais pelas urbanas (SIQUEIRA, 2012) [1]. Esse fenômeno tem crescido cada vez mais, e um dos principais motivos é a industrialização. Um exemplo dessa industrialização é a “Revolução” Verde, que representou uma ruptura nos meios de produção do campo ao introduzir a mecanização e, com grandes investimentos, alterou as estruturas produtivas tradicionais. 

Com a chamada Revolução Verde ocorreu a elitização do acesso à terra, uma vez que a mão de obra dos pequenos agricultores foi substituída por maquinários. Da mesma forma, muitos pequenos produtores não foram incluídos no acesso às novas tecnologias, levando muitos à falência e os obrigando a vender suas terras e migrar em busca de emprego (BRASIL, 2021) [2]. Consequentemente, os agricultores familiares, que produzem tanto para sua própria subsistência quanto para a venda em mercados e projetos escolares, também são afetados. Com a modernização crescendo cada vez mais, a mão de obra dos camponeses é dispensada, o que resulta no êxodo rural.

Segundo Rosset (2013) [3], a agricultura está perdendo força devido à migração, muitas vezes de famílias inteiras, para os centros urbanos em busca de melhores condições de vida, estudo, aumento da renda e acesso à saúde. Consequentemente, há uma diminuição na população rural e um aumento na população urbana.

Com a chegada de novos moradores nas cidades e o crescimento populacional, as moradias acabam sendo construídas em lugares totalmente sem planejamento. Outro problema na busca por emprego é que boa parte dessas pessoas não possui boa formação e especialização. Siqueira (2012) [1] afirma que, devido à pouca escolaridade, as pessoas provenientes da agricultura não encontram empregos de qualidade. Tanto homens quanto mulheres enfrentam trabalhos exaustivos e mal remunerados. Os filhos também acabam renunciando aos estudos e da infância para ajudar nas despesas da casa, expondo-se a todo tipo de perigo.

Dessa forma, muitos buscam melhores condições de vida, mas se deparam com outra realidade, tendo que viver com uma qualidade de vida inferior à que possuíam no campo. Alguns ficam desempregados e vão morar nas periferias em condições de vida desumanas, sem o mínimo de higiene e segurança. Como consequência, por falta de oportunidades, surgem atividades ilícitas, o que, por sua vez, leva a um aumento da violência e da marginalização.

Para superar o êxodo rural, é necessário criar alguns mecanismos, sendo a agroecologia um dos meios de garantir a permanência das pessoas no campo. A agroecologia envolve uma diversificação das atividades agrícolas com a participação da comunidade local. Elas podem ser desenvolvidas por meio da agrofloresta e da agricultura orgânica. Nessa atividade, há geração de empregos devido à necessidade de maior mão de obra e aumento da renda com a comercialização local dos produtos obtidos. Além disso, ocorre o fortalecimento das comunidades e dos saberes tradicionais, incentivando os agricultores a produzirem alimentos saudáveis.

Uma maneira de iniciar esse processo é introduzir cursos técnicos em agroecologia no ensino médio. Esse curso proporciona mais conhecimento e especialização na área, tornando o ambiente da agricultura mais atrativo para os alunos e incentivando-os a desenvolver o espírito empreendedor, para que se tornem proprietários dos próprios negócios e não precisem migrar em busca de novas oportunidades


Referências

[1] SIQUEIRA, Volmir. Industrialização, Urbanização, êxodo rural, no Sudeste do Paraná. Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), Unijuí-RS, 2012, 46 f. Disponível em:: https://www.yumpu.com/pt/document/read/18762320/tcc-volmir-de-siqueira-prontopdf-unijui>.

[2] Brasil Escola. Êxodo rural. Aula em Youtube, disponibilizada em 11 de julho de 2021. Disponível em: <https://youtu.be/X7xgn781lY8>.

[3] ROSSETTI, Daniela Paula. Agricultura familiar: aspectos motivadores do êxodo rural em Constantino – RS. 2013. 84 f. Monografia (Bacharel em Administração). Curso de Administração. Universidade de Passo Fundo, Sarandi, RS, 2013.




* Ingrid Cristina dos Passos e Igor Cassio dos Passos são acadêmicos da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziram este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre de 2022 (janeiro a junho de 2023). Foram orientados pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

Meu processo de alfabetização

Meu processo de alfabetização

Por Pauliana Soares dos Santos [1]



Tenho lembranças nítidas do meu primeiro contato com as letras. A casa era bem escura, já que não tínhamos energia elétrica, a iluminação era feita com a lamparina, movida à querosene. Meus pais, durante o dia, trabalhavam na lavoura, cultivando arroz, café etc. No período da noite, sentávamos na beira do fogão à lenha para ouvir as notícias pela rádio, pois não tínhamos TV. Afinal, naquela época, cerca de 20 anos atrás, quem possuía esse tipo de aparelho eram só as pessoas ricas. Meus pais não tiveram oportunidade de estudar, possuem a 3ª série do nível fundamental. Mas, mesmo assim, me incentivaram da forma que podiam.

Meu contato com a escrita foi em casa. Bem antes da matrícula na escola, meus pais me ensinaram a escrever meu nome. Com 6 anos ingressei na escola. Era bem longe, cerca de 3 km. E eu ia a pé para a escola e mesmo assim a alegria e empolgação de aprender coisas novas era tanta que a caminhada era satisfatória. A Bíblia foi o primeiro livro que conheci, pois minha mãe tinha uma desde criança. Assim, eu ia à igreja e passei a conhecer a Palavra de Deus.

Na escola, ouvia a professora contar historinhas, e tudo era mágico. Eu dizia que quando crescesse queria ser igual à tia Janete, minha primeira professora. O que eu mais gostava era das histórias em quadrinhos. E colorir, então, nossa, a hora voava!

Recordo-me também dos projetos de leitura que tinha na escola. Uma vez na semana a professora levava os livros e as revistas numa caixa de papelão e escolhia alguns livros para fazermos a leitura. Da 4ª série, o livro do qual me lembro até hoje é “O Mágico de Oz”.

No Ensino Fundamental tive ótimos professores que incentivaram a leitura. Eram bem rigorosos no critério de produção de textos etc. Todos os bimestres tínhamos que pegar livros na biblioteca e fazer resenha deles, para garantir que tínhamos realmente lido os exemplares. Participava de projetos de leitura, onde o interesse em ler despertava ainda mais.

Essa prática de leitura me auxiliou desde a minha infância até a pré-adolescência. Foi um aprendizado que me deu um arcabouço gigantesco, por meio do qual adquiri conhecimento. Quero aprimorar cada dia mais. Hoje, estou cursando uma faculdade que sempre sonhei, que espero concluir e repassar meu conhecimento, com muito carinho, para meus futuros alunos.



[1] Pauliana Soares dos Santos é graduanda da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziu este relato na disciplina Prática de Leitura e Produção de Textos, ofertada no primeiro semestre de 2023. A organização e edição do material foi feita pelo Projeto de Extensão Aula Digital.

Este trabalho foi orientado pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro, com as ricas contribuições na revisão e organização do tutor Marcos Roberto Rocha.

Cultura Indígena e Saberes Tradicionais

Cultura Indígena e Saberes Tradicionais

Gabriela dos Santos Cardoso e Ester Almeida da Cruz *

É importante falar das lutas que os povos indígenas enfrentam há tantas décadas, pois a guerra pelos seus direitos ainda não acabou, e apesar de tudo que enfrentam continuam com suas culturas e saberes. Não é através da vitimização que se vai começar a respeitar os povos indígenas; é preciso conhecer e admirar as belezas de sua vasta cultura. Eles criaram o seu próprio mundo com o cultivo de vegetações, extração de mel e a caça de animais. Com isso, também têm conhecimentos sobre a floresta e a sua religião, que rege os seus modos de vida e a maneira de ver o mundo. Têm muito a nos ensinar, e assim, a valorização da cultura e dos saberes tradicionais.

Um conhecimento indígena que a maioria das pessoas conhece em relação à culinária é o uso da mandioca em nossa alimentação, o famoso “beiju” ou tapioca, que tem origem indígena e que hoje já foi gourmetizado na sociedade; muitos nem sabem qual é a origem dessa iguaria. É importante conhecer para desconstruir a ideia preconceituosa de que os “índios” são incapazes de manter a sua própria sobrevivência e precisariam dos brancos para ensinar a eles como viver. Mas a luta é contínua e incessante pelo respeito à sua cultura, religião e terra.

O documentário “A Última Floresta” mostra um pouco da história dos povos Yanomami através do ponto de vista deles. É um documentário co-escrito por Davi Kopenawa [1], líder Yanomami que luta para manter sua cultura, seu povo e sua terra. O líder indígena Dário Kopenawa, Vice-presidente da Hutukara Associação Yanomami, luta pelos direitos de seu povo e contra o garimpo ilegal e o desmatamento das florestas em território indígena (KOPENAWA; ALBERT, 2015, p. 547).

Os principais saberes indígenas estão ligados à compreensão que eles têm da natureza, que se manifesta no trabalho, na medicina, na construção das casas, na comida e nas bebidas, nas festas e ritos, e até na língua. Os povos indígenas organizam seus conhecimentos através da cosmologia ancestral, que garante e sustenta a possibilidade de vida. A base primordial para eles é a natureza/mundo (VIVEIROS DE CASTRO, 2015, p. 29) [2].

No ano de 2019, Alessandra Korap do povo Munduruku [3], do Tapajós no Pará, alertou o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro e o Congresso sobre o genocídio que estava acontecendo em terras indígenas, como líderanças de outros povos já estavam denunciando há muitos anos.

Em janeiro de 2023, saiu na mídia a morte de 570 crianças Yanomami ocasionadas pela fome, pelo descaso do governo e pela ganância de madeireiras e garimpeiros ilegais, segundo o Ministério da Saúde. Em 2022, foram registrados 11.530 casos de malária no DSEI Yanomami, resultado da falta de acesso a serviços básicos de saúde, somando isso à prática de garimpo ilegal, que espalha produtos tóxicos pelos rios, fonte da água que eles usam no dia a dia. No dia 20 de janeiro de 2023, o presidente Lula e ministros estiveram em Roraima para tomar algumas medidas a fim de amenizar os danos causados (ANDRADE, 2023) [4].

Dentre as ações, foi declarada Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional, criado o Comitê de Coordenação Nacional para o Enfrentamento à Desassistência Sanitária, distribuídas 5 mil cestas básicas e 200 latas de suplemento alimentar para crianças. A constituição de 1988 diz no artigo 231: [5]

São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens (BRASIL, 1988).

Infelizmente não vemos esse artigo ser levado a sério e com rigor. O Brasil está sendo, cada vez mais, devastado pelo extrativismo selvagem, pelas queimadas de florestas para transformá-las em carvão, ou abrir pasto para o gado, cana ou soja pelo agronegócio e pela exploração mineral. Na prática, muitas terras indígenas estão invadidas e os povos nelas encurralados, não têm contato com políticas governamentais de suporte à exploração em moldes sustentáveis (SOUZA LIMA; CASTILHO, 2013, p. 66) [6].

Há de se conscientizar a população sobre a situação, sobretudo a partir das escolas. A Lei 11.645 de 2008, no artigo 26, regulamenta que, nos estabelecimentos de ensino fundamental e médio, públicos e privados, “torna-se obrigatório o estudo da história e cultura afro-brasileira e indígena”. A lei encontra o objetivo de criar cidadãos conscientes dos diversos aspectos da história e das lutas dos povos indígenas e negros, resgatando as suas contribuições nas áreas sociais, econômicas e políticas pertinentes para a história do Brasil, dando reconhecimento da amplitude, da relevância e da beleza da cultura dos povos indígenas.

Por fim, é necessário compreender e valorizar as múltiplas culturas que existem sem reduzi-las ao folclore, sem fazer com que pareçam fatos curiosos e sem importância. Aprender sobre a cultura indígena é bom para refletir sobre o respeito às diferenças e sobre o etnocentrismo, que é a desconsideração das especificidades de outra cultura.


Referências

[1] KOPENAWA, Davi; ALBERT, Bruce. A queda do céu. Palavras de um xamã Yanomami. Trad. Beatriz Perrone-Moisés. Prefácio de Eduardo Viveiros de Castro. São Paulo: Companhia das Letras, 2015.

[2] VIVEIROS DE CASTRO, Eduardo. Prefácio. In: KOPENAWA, Davi; ALBERT, Bruce. A queda do céu: palavras de um xamã Yanomami. Trad. Beatriz Perrone-Moisés. São Paulo: Companhia das Letras, 2015a, p. 11-41.

[3] MUNDURUKU, Daniel. Mundurukando 2: sobre vivências, piolhos e afetos: roda de conversa com educadores. UK’A Editorial, 2017.

[4] ANDRADE, Tainá. Terra Yanomani tem 11 mil casos de malária relacionados ao desmatamento. Disponível em: https://www.correiobraziliense.com.br/brasil/2023/01/5067888-terra-yanomani-tem-11-mil-casos-de-malarias-relacionados-ao-desmatamento.html. Acesso em: 24 maio 2023.

[5] BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília: Senado Federal, 2014.

[6] LIMA, Antonio Carlos de Souza; CASTILHO, Sergio Ricardo R. Povos indígenas, preconceito e ativismo político: A luta contra a percepção colonial dos indígenas no Brasil contemporâneo. Indígenas no Brasil: Demandas dos povos e percepções da opinião pública, p. 65-84, 2013.




* Gabriela dos Santos Cardoso e Ester Almeida da Cruz são acadêmicas da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziram este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre de 2022 (janeiro a junho de 2023). Foram orientadas pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

Da leitura à superação: a jornada da minha vida

Da leitura à superação: a jornada da minha vida


Por Paula Maria do Nascimento [1]

Quando criança, não era comum ter acesso a livros, pois minha família não tinha hábitos de leitura e eu não tinha acesso a quase nenhum livro fora da escola. Porém, houve uma época em que ainda era possível encontrar alguns gibis. Lembro que colecionava figurinhas e, quando ia na banca de jornal comprá-las, aproveitava e já comprava alguns gibis.

Porém, ao longo dos anos, isso tem sido um problema no meu desenvolvimento de aprendizagem. Quando estamos inseridos no meio onde as pessoas não têm hábitos de leitura, isso acaba nos prejudicando de alguma forma.

Eu nunca gostei de ler, nem de estudar, e passei anos desperdiçando meu tempo com futilidades que teoricamente só atrasaram a minha vida. Na época, eu podia sim estudar ou ter acesso aos livros, pois morava em São Paulo e lá tinha muito mais informações e disponibilidade de conteúdo do que em outras cidades. Mas acredito que isso era algo de família mesmo. No entanto, num belo dia, depois que percebi as consequências dessa herança, quebrei todas essas barreiras que estavam entre mim e o aprendizado.

Mudei para Minas Gerais, para uma cidade pequena chamada Cachoeira de Pajeú. Lá havia uma biblioteca pública (nunca tinha visto uma biblioteca antes), à qual administro e na qual trabalho hoje junto com uma equipe de professores e técnicos. Quando conheci essa biblioteca, fiquei perplexa com a quantidade de livros e histórias que tinham lá e ficava ainda mais curiosa, (claro, nunca tinha visto uma na vida).

Enfim, comecei a pegar livros de romance, como da Rosana Rios, Nora Roberts, Paulo Coelho e Daniele Steele. Mas antes disso lembro que tive uma fase um pouco mística. Tinha uma coleção da Eddie Van Feu (queria ser wicca; para mais íntimos, bruxa). Então, ao longo do tempo o romance foi perdendo o espaço para os livros mais didáticos. Eu precisava fazer um concurso público municipal e tinha que voltar a estudar as antigas matérias da escola, das quais já não lembrava mais. Fiz e passei. Dali em diante fiquei constantemente em desenvolvimento.

Comecei a buscar livros mais técnicos e especializações voltadas para área de Ciência de Dados e Aprendizado de Máquina, livros de investimentos, desenvolvimento pessoal e, por fim, os que julgava necessários. A questão é que eu demorei muito para entender a importância da leitura. A prática é linda, mas deve estar em conjunto nas nossas vidas. É importante que você conheça outros pensamentos e outras ideias. Como vivemos sempre correndo contra o tempo, a leitura ainda é limitada. É por isso que acredito veementemente que a leitura deve ser a base de tudo.



[1] Paula Maria do Nascimento é graduanda da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziu este relato na disciplina Prática de Leitura e Produção de Textos, ofertada no primeiro semestre de 2023. A organização e edição do material foi feita pelo Projeto de Extensão Aula Digital.

Este trabalho foi orientado pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro, com as ricas contribuições na revisão e organização do tutor Marcos Roberto Rocha.

Padrões de Beleza e Saúde Mental: Múltiplas Violências em Jogo

Padrões de Beleza e Saúde Mental: Múltiplas Violências em Jogo

Gessica Gomes de Almeida e Josilaine de Jesus Guimarães Cândido*

 

A pressão estética tem se tornado cada vez mais presente nos dias atuais, e os padrões de beleza têm exercido um impacto significativo na saúde mental das mulheres. Esses padrões são permeados por ideais considerados de perfeição e, politicamente, têm causado múltiplas violências nos corpos historicamente subalternizados.

Neste artigo de opinião, exploramos algumas camadas dessas múltiplas violências associadas aos padrões de beleza e seu impacto na saúde mental das mulheres. Lançar um olhar, coletar dados e compreender as diferenças entre a pressão estética e o conceito de fobia, que são distintos, torna-se cada vez mais necessário nesse cenário de globalização informacional. É importante ressaltar que fobias sociais, como o racismo e a xenofobia, são conceitos diferentes da pressão estética.

Aqui, lançamos um olhar atento sobre a questão de como nossos meios e modos têm se tornado tóxicos, influenciados por um novo imperativo de imagem perfeita, sabidamente inalcançável, que se apresenta aos nossos olhos. Existem questões estruturais, como o racismo, que promovem a segregação, opressão e discriminação sistemáticas. Nesse contexto, o preconceito acaba por dar origem a uma nova estrutura de sentimentos: uma estrutura racista.

Por outro lado, quando falamos de fobia, não estamos tratando de pressão. Uma fobia é um meio de restringir que corpos tenham acesso ou sucesso em determinados espaços. Devemos, portanto, encarar a fobia como algo que impede experiências e restringe o acesso a espaços sociais. Falamos aqui sobre a falta de um espaço acolhedor para um corpo, o que torna sua vivência, acesso e permanência naquele espaço mais difíceis. Essa questão é uma criação sistêmica, uma configuração sistemática que nos leva a ver o mundo de uma forma padronizada.

A pressão estética também envolve aspectos de descaso e negligência. Ambos os fenômenos são tóxicos e perigosos, mas são distintos porque um constrói subjetividades, enquanto o outro é resultado de um processo específico, originado de uma indústria capitalista. Estamos falando dos corpos subalternizados, que, por meio de um esvaziamento estético, são tornados públicos, sujeitos à ditadura estética imposta pelo capitalismo. As mulheres crescem em espaços que as excluem, intimidam, oprimem ou negligenciam, e elas desenvolvem a sensação de que precisam fazer mais para serem amadas. Nesse contexto, não basta ser bonita; é preciso ser a mais bonita. Não basta ser inteligente; é preciso ser a mais inteligente. Isso é algo que todos os corpos subalternizados enfrentam em maior ou menor grau.

Existe um sentimento e um fenômeno social de descartabilidade, e as redes sociais são uma armadilha perigosa em nossa era. Elas são impulsionadas por algoritmos que apresentam mais daquilo que se vê. Portanto, se você curte fotos de pessoas esteticamente aceitáveis, sua linha do tempo será inundada com conteúdo relacionado a emagrecimento, treinamento de academia e suplementos. O algoritmo prioriza corpos hipersexualizados e hiperpadronizados. Pesquisas indicam que as pessoas passam em média até 5 horas por dia nas redes sociais.

Quais são os reflexos psicológicos de ser exposto a corpos padronizados durante 5 horas por dia? Ser bombardeado por um algoritmo que só mostra essa interface da internet, o simbólico nas redes sociais, nos aplicativos de bate-papo e nas bolhas sociais?

Um estudo da Universidade do Oeste da Inglaterra [1], em parceria com a Dove sabonetes, examinou como as jovens meninas de até 13 anos se sentem em relação à internet. Em 2018, 55% dos médicos nos Estados Unidos relataram que os pacientes os procuravam porque queriam se parecer mais com os filtros do Instagram e ficar mais bonitos em selfies. Dados da Revista Forbes mostram que, desde o início da pandemia, houve um aumento de 20% no uso de aplicativos de alteração de imagem.

Nos Estados Unidos, existe um diagnóstico chamado BBB, que se refere à disforia corporal. A projeção é que um a cada 50 norte-americanos tenha desenvolvido essa anomalia, que envolve a incapacidade de se reconhecer e sentir-se bem em seu próprio corpo.

Além dos efeitos psicológicos, os padrões de beleza também estão intrinsecamente ligados a questões sociais e afetivas. Mulheres que não se encaixam nesses ideais enfrentam preconceito e exclusão, o que afeta sua saúde mental. Questões de raça, idade, peso e deficiência também contribuem para a multiplicidade de desrespeitos e aumentam as formas de violência enfrentadas pelas mulheres.

Como chegamos a um ponto em que não reagimos a essa imposição de padrões inalcançáveis? A análise aponta um caminho, e precisamos estar atentos e fortes para não sermos transformados em mercadoria e para que nossos corpos não sejam vendidos para nós mesmos. É urgente e necessário criar ambientes mais seguros e acolhedores, considerando a toxicidade que permeia as relações sociais na contemporaneidade. 

 

Referências

[1] Diedrichs PC, Atkinson MJ, Garbett KM, Leckie G. Evaluating the “Dove Confident Me” Five-Session Body Image Intervention Delivered by Teachers in Schools: A Cluster Randomized Controlled Effectiveness Trial. J Adolesc Health. 2021 Feb;68(2):331-341. doi: 10.1016/j.jadohealth.2020.10.001. Epub 2020 Nov 24. Disponível em: https://ichgcp.net/pt/clinical-trials-registry/publications/67195-evaluating-the-dove-confident-me-five-session-body-image-intervention-delivered-by-teachers-in




* Gessica Gomes de Almeida e Josilaine de Jesus Guimarães Cândido são acadêmicas da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziram este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre de 2022 (janeiro a junho de 2023). Foram orientadas pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

Ensinos de uma vida

Ensinos de uma vida

Por Patrícia Tatiane Jorge Moreira Sena [1]



Não tenho lembranças da minha primeira infância com livros, contos e histórias na minha, mas lembro-me que sempre rezava antes de dormir, tínhamos uma televisão onde assistia aos desenhos animados e um quintal de terra onde brincava muito com os meus irmãos mais novos.

Não me recordo onde aprendi a ler, a contar e a reconhecer dinheiro, mas sei que após aprender a ler, sempre estava na biblioteca da escola pegando livros emprestados para levar para casa. Quando estava na terceira série ganhei vários livros de contos infantis e quando estava no final do na letivo da quarta série ganhei um prêmio por ter sido a aluna que mais leu livros na sala de aula e feito resumos das leituras.

Eu tinha muita facilidade em aprender os conteúdos ensinados na sala de aula, quando estava no fundamental I os professores eram bem dedicados e criativos no ensino; diferente de quando fui para o fundamental II e ensino médio, não havia a mesma dedicação e disciplina no ensino. Isso não ajudou na minha aprendizagem com cálculos mais complexos e fórmulas, o que é rápido para alguns para mim pode levar horas.

Sou apaixonada por livros de romances e suspense, quando estou lendo sinto que posso ser qualquer pessoa e estar em qualquer lugar, e essa é a magia de um bom livro. Faz quatorze anos que me formei e nesse ano de 2023 começo a fazer minha primeira graduação na área de exatas, o que é irônico, pois sempre me dei bem em humanas. Me considero uma pessoa dedicada, esforçada e muito capaz para novos desafios.



[1] Patrícia Tatiane Jorge Moreira Sena é graduanda da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziu este relato na disciplina Prática de Leitura e Produção de Textos, ofertada no primeiro semestre de 2023. A organização e edição do material foi feita pelo Projeto de Extensão Aula Digital.

Este trabalho foi orientado pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro, com as ricas contribuições na revisão e organização do tutor Marcos Roberto Rocha.

Recursos naturais, sustentabilidade e povos originários

Recursos naturais, sustentabilidade e povos originários

Jeferson Santos de Oliveira e Wesley Albert Ferreira*

Desde o século XVI, quando os portugueses invadiram as terras indígenas em busca de riquezas pela primeira vez, conflitos socioambientais têm assolado o continente e nosso país. O sistema capitalista explora o ambiente de maneira não sustentável desde o período da colonização. Segundo estudos realizados pelo IPAA em janeiro de 2023, vários fatores confirmam a exposição dos povos indígenas aos malefícios dos crimes ambientais. Atualmente, nos noticiários, encontramos evidências do genocídio que os povos Yanomamis vêm sofrendo desde a posse do novo governo.

Além dos danos causados aos povos indígenas e ao meio ambiente, os incêndios e o desmatamento contribuem para o aumento do aquecimento global, gerando um considerável desequilíbrio ecológico. A amplitude desse assunto se estende por várias áreas, mas aqui nos concentraremos em destacar as situações que afetam os povos originários.

O direito ao usufruto das terras nativas pelos povos que nelas habitam é, acima de tudo, um direito legítimo consagrado nos dispositivos jurídicos; portanto, qualquer exploração nessas áreas deve ser autorizada pelas instituições e, principalmente, estar em conformidade com o seu consentimento. O art. 231 da Constituição Federal de 1988 [1] defende essa pauta quando diz que

São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à união demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens.

§ 3º O aproveitamento dos recursos hídricos, incluídos os potenciais energéticos, a pesquisa e a lavra das riquezas minerais em terras indígenas só podem ser efetivados com autorização do Congresso Nacional, ouvidas as comunidades afetadas, ficando-lhes assegurada participação nos resultados da lavra, na forma da lei.  (BRASIL, 1988, grifo nosso).

Ainda sobre o direito à ocupação sociocultural dos povos indígenas, vale a pena ressaltar outro artigo da lei 231 na Constituição Federal [1], que trata dos saberes tradicionais e políticas públicas, conforme a seguir.

§ 1°. São terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as por eles habitadas em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as necessárias a sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições.

Nesse sentido, podemos perceber que é dever do Estado exercer a proteção ambiental, especialmente nos territórios indígenas. No entanto, o índice de exploração ilegal nesses territórios aumentou exponencialmente na última década, sobretudo no estado do Amazonas. Entre 2010 e 2022, houve o registro de cinco mil hectares de sua área devastada por garimpeiros, conforme as conclusões dos estudos de Silva e Cordeiro (2022, p. 25-32) [2] sobre terras indígenas. Diante disso, podemos imaginar a magnitude do conflito existente, uma vez que as comunidades estão enfrentando atualmente esse modelo capitalista, que prioriza o lucro em detrimento do direito de livre arbítrio dessas comunidades. Coloco “livre arbítrio” entre aspas, pois essas pessoas têm uma ligação muito profunda com esse território e, por isso, não aceitam a destruição de sua ancestralidade. Todo esse contexto levou a ministra dos povos indígenas, Sônia Guajajara, a declarar em rede nacional que “os indígenas estão em risco de sobrevivência devido aos crimes ambientais” [3].

No que diz respeito à tomada de território e ao desmatamento, os povos originários têm sido alvo de numerosos ataques e abusos de poder por parte de pessoas que se autodenominam proprietárias de suas terras. Grandes empresas ilegalmente desmatam essas vastas áreas e as convertem em monoculturas para exportação, como no caso da soja. Outras áreas na Amazônia são transformadas em pastagens para a criação de gado, enquanto outras sofrem com o garimpo ilegal. Todos esses ataques resultam na perda significativa da diversidade da fauna e da flora nativas.

Com base nisso, podemos compreender o tamanho do prejuízo causado a essas comunidades que dependem dessas áreas para obter grande parte de seus alimentos e seus remédios naturais, extraídos de plantas medicinais utilizadas na produção de chás caseiros para a cura de doenças.

Somente no final de 2020 é que medidas mais rigorosas dentro do Supremo Tribunal Federal foram estabelecidas para aqueles que exploram as terras sem autorização. Dessa forma, com o aumento da fiscalização nas áreas demarcadas, centenas de pistas de aviões ilegais, usadas para exportar minerais extraídos de garimpos, foram fechadas.

Além disso, através da Constituição Federal e do Estatuto do índio, foram implementados regimes de inclusão social para esses povos originários [4]. Embora essas ações foram empregadas politicamente e legitimaram várias pautas, ainda existem pessoas extremistas que violam tais leis. São comportamentos que geram conflitos. Para que haja diminuição da violência é necessária uma ação forte para mudar nosso sistema. Dentre as várias possibilidades, podemos começar apoiando as lutas dos povos originários, bem como conscientizando nossos jovens e toda a população sobre a importância dessas lutas. Só assim teremos cada vez mais pessoas dispostas a enfrentar as injustiças e construir o poder popular. Esperamos que as reflexões discorridas nestas linhas sirvam para abrir cada vez mais os olhos das pessoas que sofrem massivamente com violências, desrespeito, desigualdade, e várias outras injustiças.


Referências

[1] BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: Centro Gráfico, 1998.

[2] SILVA, Lucas Cordeiro. Terras indígenas: exploração do garimpo ilegal e suas consequências socioambientais. 2022. Trabalho de Conclusão de Curso. Universidade Federal do Rio Grande do Norte.

[3] Instituto de Pesquisa Ambiental do Amazonas: Documentário disponível no link https://globoplay.globo.com/v/11283413/

[4] SANTOS, André Leonardo Copetti; HOMERCHER, Pablo. Democracia, descolonização e ações afirmativas de inclusão política dos povos originários. Revista de Estudos Jurídicos da UNESP, v. 18, n. 27, 2014.



* Jeferson Santos de Oliveira e Wesley Albert Ferreira são acadêmicos da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziram este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre de 2022 (janeiro a junho de 2023). Foram orientados pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

Relembrando a trajetória do meu aprendizado

Relembrando a trajetória do meu aprendizado

Por Paloma Fagundes Serqueira [1]


Minha infância foi muito humilde e muito feliz. Cresci em uma zona rural, cujo nome é Bom Jesus, município de Monte Azul-MG, lugar de pessoas simples e muito acolhedoras. Morava bem perto da escola local. Mesmo sendo filha de pai analfabeto, minha vontade de aprender começou ainda muito nova. Aos 5 anos de idade comecei a ir à escola. Amava e não faltava nenhum dia. Nesse mesmo ano aprendi a ler. Minha mãe teve pouco estudo, mas sempre incentiva minha irmã e eu a estudarmos.

A escola só tinha duas salas. Por isso, estudavam duas turmas de série diferentes na mesma classe. Tinha uma professora chamada Terezinha, que era muito rígida e dava aula de ditado fora do horário escolar, e isso fez com que minha leitura e escrita ficassem cada vez melhores.

Ainda menina, com 7 anos, idade em que começava a catequese, também comecei a ajudar na igreja. Todos os domingos eu lia as preces. Foi quando tive um contato maior com a leitura, pois na escola não tinha biblioteca e o material usado eram somente as folhas que a professora entregava, xerocada nas máquinas conhecidas como mimeógrafos. Amava ajudar a professora. Sempre ficava aquele cheirinho de álcool.

Quando mudei para a quinta série, tive que trocar de escola, que ficava a 7 km de casa. Acordava todos os dias às 6 horas da manhã. Foi assim durante os 4 anos do Ensino Fundamental. Foi nesse período que descobri a aptidão pela Matemática, que era minha matéria predileta.

Para estudar no Ensino Médio era necessário ir todos os dias para a cidade. Eram 17 km só de ida. Foi um período muito cansativo. Porém, foi nesse tempo que mais me apaixonei pela leitura. No primeiro ano do Ensino Médio fiz amizades competitivas. Fazíamos competições para ver quem ia conseguir mais no ano. Lembro-me que li o livro “Auto da Compadecida”, do autor Ariano Suassuna, em um dia. Sinto saudades disso. Nos outros anos acabei deixando a leitura um pouco de lado devido a ter me mudado para a cidade. Trabalhava de dia e estudava à noite. O tempo era muito corrido e quando estava em casa só queria dormir.

A cada degrau que elevava na grade escolar aumentava a distância que era necessário percorrer para chegar. Com a faculdade foi da mesma forma: eram 60 km todos os dias para estudar. Fiz faculdade de Engenharia Civil na cidade de Mato Verde-MG.

Enfim, para estudar sempre tive que passar por muitos desafios e dificuldades, porém continuo acreditando que o estudo muda a vida e que todo esforço que fiz valeu a pena. Por isso, entrei no curso de Licenciatura em Matemática da UFVJM. Sei que o desafio é grande, mas também sei que vou aprender muito, ansiosa por todo esse novo trajeto que vem por aí.



[1] Paloma Fagundes Serqueira é graduanda da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziu este relato na disciplina Prática de Leitura e Produção de Textos, ofertada no primeiro semestre de 2023. A organização e edição do material foi feita pelo Projeto de Extensão Aula Digital.

Este trabalho foi orientado pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro, com as ricas contribuições na revisão e organização do tutor Marcos Roberto Rocha.

Feminicídio no Brasil

Feminicídio no Brasil

Fernanda Antonina e Maria Araújo *

O feminicídio é um crime que resulta na morte de mulheres, imposto a mulheres exclusivamente por sua condição de gênero. Apesar da existência de leis destinadas a proteger as mulheres contra crimes, essas leis não conseguem prevenir o feminicídio. As mulheres estão constantemente sujeitas a diversos tipos de violência em vários contextos, incluindo locais públicos e privados, no trabalho, nas ruas e, especialmente, em casa, por meio da violência doméstica, que frequentemente é perpetrada por seus parceiros atuais ou ex-parceiros.

Os números são grandes como mostra a matéria realizada pelo site do G1.

No primeiro semestre de 2022, 699 mulheres foram vítimas de feminicídio no Brasil, média de quatro mulheres por dia, de acordo com dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública obtidos com exclusividade pelo g1, Globo News e TV Globo. O número é o maior já registrado em um semestre e ocorre no momento em que o país teve o menor valor destinado às políticas de enfrentamento à violência contra a mulher.[1]

Apesar de existirem leis que protegem as mulheres, como a lei Maria da Penha e a lei do feminicídio, que entrou em vigor em 2015, os dados indicam que tais medidas não estão impedindo que os crimes aconteçam, pois é cada vez maior o número de ataques, denúncias e mortes de mulheres registradas no país.

No Brasil, o número de feminicídio cresceu cerca de 5%, se compararmos os anos de 2021 e 2022 . Diariamente, os noticiários de TV nos apresentam dados alarmantes, destacando, entre eles, casos recorrentes de mulheres sendo agredidas e mortas por seus companheiros e ex-companheiros, que, na maioria das vezes, não conseguem aceitar o fim do relacionamento e acabam cometendo crimes brutais contra elas.

Esses dados incluem mulheres de diversas idades, classes sociais e regiões, considerando que a violência afeta até mesmo mulheres que vivem em áreas rurais. Essa realidade torna o combate à violência ainda mais desafiador em certos casos, uma vez que a falta de informação em muitas regiões dificulta as denúncias e até mesmo a atuação da polícia e de outros órgãos de proteção.

A dificuldade de atuação policial pode ser agravada pelo fato de a vítima muitas vezes não saber reconhecer quando está sendo vítima de agressão. Isso ocorre porque, em muitos casos, mulheres criadas no campo têm uma interpretação de vida diferente, frequentemente associada à ideia de que o homem é a figura dominante em casa.
Consequentemente, muitas mulheres são vítimas frequentes de agressões por parte de seus companheiros, e a situação é ainda mais preocupante quando não contam com o apoio de seus pais, que também podem ter sido criados em uma cultura machista, na qual os homens são ensinados a acreditar que têm o direito de fazer o que quiserem. Essa mentalidade é transmitida de geração em geração, tornando-se algo que é considerado normal.

Essa situação representa um sério problema, pois coloca as mulheres em uma posição de submissão em relação aos homens. Por isso, é de extrema importância que a educação inclua temas como igualdade de gênero, pois isso ajudará na compreensão do papel e da importância das mulheres na sociedade, bem como no respeito ao próximo. Contribuirá para a criação de um mundo melhor, onde as mulheres serão tratadas com respeito e igualdade.

Apesar de vivermos em um país onde existem diversas leis que visam assegurar e proteger as mulheres, como a Lei do Feminicídio (Lei nº 13.104, de 2015), continuamos a presenciar inúmeras reportagens e artigos carregados de dados mostrando que essas leis de alguma forma não estão funcionando. Se estivessem surtindo efeito a realidade seria bem diferente.

O que está errado? A resposta para essa e outras questões talvez seja a falta de investimento e o descaso do estado com relação às políticas e programas que de fato devem amparar as mulheres que necessitam de apoio. Um exemplo deste descaso aconteceu no governo do ex-Presidente Jair Bolsonaro, com a “redução expressiva do investimento em políticas públicas de enfrentamento à violência doméstica e familiar” , como noticiou o site do G1.

Os casos de feminicídio no Brasil cresceram ainda mais durante o período da pandemia do COVID-19, considerando que as pessoas tiveram que ficar isoladas em suas residências por medidas de segurança. Durante o período “o Brasil contabilizou 1.350 casos de feminicídio em 2022 , um a cada seis horas e meia, segundo o fórum brasileiro de segurança pública”, como traz informação do site CNN Brasil. Diante dessa triste situação, espera-se que o atual governo possa investir mais na proteção e na garantia de leis para as mulheres, para que assim esses números de crimes possam diminuir com a mesma intensidade com que cresceram nos últimos tempos.

Apesar de existirem leis que protegem as mulheres, como a lei Maria da Penha e a lei do feminicídio, que entrou em vigor em 2015, os dados indicam que tais medidas não estão impedindo que os crimes aconteçam, pois é cada vez maior o número de ataques, denúncias e mortes de mulheres registradas no país. 

No Brasil, o número de feminicídio cresceu cerca de 5%, se compararmos os anos de 2021 e 2022[2]. Diariamente, os noticiários de TV nos apresentam dados alarmantes, destacando, entre eles, casos recorrentes de mulheres sendo agredidas e mortas por seus companheiros e ex-companheiros, que, na maioria das vezes, não conseguem aceitar o fim do relacionamento e acabam cometendo crimes brutais contra elas.

Esses dados incluem mulheres de diversas idades, classes sociais e regiões, considerando que a violência afeta até mesmo mulheres que vivem em áreas rurais. Essa realidade torna o combate à violência ainda mais desafiador em certos casos, uma vez que a falta de informação em muitas regiões dificulta as denúncias e até mesmo a atuação da polícia e de outros órgãos de proteção.

A dificuldade de atuação policial pode ser agravada pelo fato de a vítima muitas vezes não saber reconhecer quando está sendo vítima de agressão. Isso ocorre porque, em muitos casos, mulheres criadas no campo têm uma interpretação de vida diferente, frequentemente associada à ideia de que o homem é a figura dominante em casa.

Consequentemente, muitas mulheres são vítimas frequentes de agressões por parte de seus companheiros, e a situação é ainda mais preocupante quando não contam com o apoio de seus pais, que também podem ter sido criados em uma cultura machista, na qual os homens são ensinados a acreditar que têm o direito de fazer o que quiserem. Essa mentalidade é transmitida de geração em geração, tornando-se algo que é considerado normal.

Essa situação representa um sério problema, pois coloca as mulheres em uma posição de submissão em relação aos homens. Por isso, é de extrema importância que a educação inclua temas como igualdade de gênero, pois isso ajudará na compreensão do papel e da importância das mulheres na sociedade, bem como no respeito ao próximo. Contribuirá para a criação de um mundo melhor, onde as mulheres serão tratadas com respeito e igualdade.

Apesar de vivermos em um país onde existem diversas leis que visam assegurar e proteger as mulheres, como a Lei do Feminicídio [3] (Lei nº 13.104, de 2015), continuamos a presenciar inúmeras reportagens e artigos carregados de dados mostrando que essas leis de alguma forma não estão funcionando. Se estivessem surtindo efeito a realidade seria bem diferente O que está errado? 

A resposta para essa e outras questões talvez seja a falta de investimento e o descaso do estado com relação às políticas e programas que de fato devem amparar as mulheres que necessitam de apoio. Um exemplo deste descaso aconteceu no governo do ex-Presidente Jair Bolsonaro, com a “redução expressiva do investimento em políticas públicas de enfrentamento à violência doméstica e familiar”[4], como noticiou o site do G1. 

Os casos de feminicídio no Brasil cresceram ainda mais durante o período da pandemia do COVID-19, considerando que as pessoas tiveram que ficar isoladas em suas residências por medidas de segurança. Durante o período “o Brasil contabilizou 1.350 casos de feminicídio em 2022[5], um a cada seis horas e meia, segundo o fórum brasileiro de segurança pública”, como traz informação do site CNN Brasil. Diante dessa triste situação, espera-se que o atual governo possa investir mais na proteção e na garantia de leis para as mulheres, para que assim esses números de crimes possam diminuir com a mesma intensidade com que cresceram nos últimos tempos.


Referências

[1] https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/2022/12/07/feminicidios-batem-recorde-no-1o-semestre-de-2022-no-brasil-quando-repasse-ao-combate-a-violencia-contra-a-mulher-foi-o-mais-baixo.ghtml

[2] https://g1.globo.com/monitor-da-violencia/noticia/2023/03/08/brasil-bate-recorde-de-feminicidios-em-2022-com-uma-mulher-morta-a-cada-6-horas.ghtml 

[3] https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13104.htm 

[4] https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/2022/12/07/feminicidios-batem-recorde-no-1o-semestre-de-2022-no-brasil-quando-repasse-ao-combate-a-violencia-contra-a-mulher-foi-o-mais-baixo.ghtml

[5] https://www.cnnbrasil.com.br/nacional/com-isolamento-social-brasil-registra-um-feminicidio-a-cada-6-horas-e-meia/




*Fernanda Antonina e Maria Araújo são acadêmicas da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziram este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre de 2022 (janeiro a junho de 2023). Foram orientadas pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

Autobiografia do meu letramento

Autobiografia do meu letramento

Por Moisés Santos Silva [1]


Antes de frequentar a escola, ao qual me lembro de mínimos detalhes, não era muito comum ver pessoas estudando e escrevendo. Revistas e folhetos notavam pessoas lendo. Lembro também dos livros de músicas partitura/teoria do meu pai, que era ilustrado com diversas imagens de instrumentos musicais, notas, dentre outros. Em casa, minha mãe sempre procurou me ensinar o básico, como números e letras; entretanto quando entrei na escola tive certa facilidade em continhas, como de somar e subtrair.

Sobre a escrita nas séries iniciais a caligrafia não era muito boa, e um pouco mais a frente depois de aprender a escrever, sempre escrevia uma ou outra palavra faltando letra. A escola teve o papel fundamental na minha vida.

Minha vida escolar sempre foi em escola pública, nunca fui um aluno de gostar muito de leitura, sempre tive comigo que compreendia mais observando, assistindo. Em todas as escolas que estudei tinha biblioteca totalmente equipada com vários tipos de livros, lembro que em uma determinada escola no ensino fundamental a professora, usava o horário dela para o aluno ir a biblioteca escolher algum livro do seu gosto ler e posteriormente fazer um resumo para ser apresentado na frente, sempre tive muita vergonha de falar em público, era uma emoção e tanto apresentar resumo/trabalho.

No ensino médio, os professores “pegavam mais no pé” e sempre distribuía livros para os alunos para lerem em casa. Pediam resumos em datas como a semana da consciência negra, promoviam a hora da leitura com livros nessa temática, apresentações de teatro, redações com diferentes temas propostos pelo docente, dentre outras atividades. Ainda no ensino médio conseguir identificar que o meu pensamento de apreender mais somente assistindo ou observando, era meio que uma “desculpa”, para não ler, e que com a leitura conseguiria aprender muito, e através dela ter facilidade na escrita e na fala.

Em relação aos gêneros textuais na universidade, ainda tenho um pouco de dificuldade, principalmente em artigos, algumas palavras que não sei o significado dentre a forma correta de ler um texto universitário, mas desde que iniciei o curso, em qualquer tempo disponível leio os materiais complementares, já com um dicionário ao lado, também de vez em quando faço leitura de alguns artigos que procuro no Google acadêmico, para já ir me familiarizando com esses novos gêneros textuais.



[1] Moisés Santos Silva é graduando da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziu este relato na disciplina Prática de Leitura e Produção de Textos, ofertada no primeiro semestre de 2023. A organização e edição do material foi feita pelo Projeto de Extensão Aula Digital.

Este trabalho foi orientado pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro, com as ricas contribuições na revisão e organização do tutor Marcos Roberto Rocha.

Intolerância religiosa no Brasil

Intolerância religiosa no Brasil

Elizabeth Avelar de Freitas e Maria Isabel Beherendt*

A falta de empatia, a desinformação e o preconceito levam a ataques de alguns grupos religiosos contra outros. Nesse contexto, as religiões de matriz africana se tornam o principal alvo, principalmente do racismo, manifestando-se por meio de ataques físicos, verbais e psicológicos. Dados compilados pela Comissão de Combate à Intolerância Religiosa do Rio de Janeiro (CCIR) mostram que mais de 70% dos 1.014 casos de ofensas, abusos e atos violentos registrados no Estado entre 2012 e 2015 são direcionados aos praticantes das religiões de matriz africana [1].

O presente artigo aborda a intolerância religiosa e tem como objetivo, como o título adianta, afirmar que o Brasil é um país intolerante em relação às religiões de matriz africana. Busca-se, sobretudo, evidenciar a falta de empatia e respeito pelas escolhas do próximo, sendo o principal fator que perpetua essa intolerância o racismo. Isso ocorre devido à falta de conscientização e educação sobre questões raciais, bem como à manutenção de estruturas sociais que favorecem certas raças em detrimento de outras.

As religiões de matriz africana têm sofrido cada vez mais ataques racistas nos últimos anos, especialmente contra terreiros e seguidores dessas religiões.Dados do Disque 100, criado pela Secretaria Nacional de Direitos Humanos, apontam 697 casos de intolerância religiosa entre 2011 e 2015, com a maioria registrada nos Estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais. No Estado do Rio, o Centro de Promoção da Liberdade Religiosa e Direitos Humanos (Ceplir), criado em 2012, registrou 1.014 casos entre julho de 2012 e agosto de 2015. Desses casos, 71% foram contra seguidores de religiões de matriz africana, 7,7% contra evangélicos, 3,8% contra católicos, 3,8% contra judeus e sem religião, e 3,8% foram ataques à liberdade religiosa de forma geral[2].

Não é coincidência que a maioria dos ataques sejam feitos às religiões de matrizes africanas, diante do racismo que se mantém irredutível da nossa sociedade. Ataques como esse são resultado dos esforços diários dos racistas em reafirmar que tudo que vem do negro não presta, gerando ataques contra as culturas e religiões de matrizes africanas. Alguns não se intimidam em atacar, independente da lei, como a Igreja Universal do Reno de Deus[3]. Como braço comunicacional da igreja, em outubro de 1999, o jornal Folha Universal estampou em foto de capa foto da Yalorixá Gildásia dos Santos e Santos, a Mãe Gilda. Ao lado da foto, a manchete era: “Macumbeiros charlatões lesam o bolso e a vida dos clientes”. A casa da religiosa foi invadida e seu terreiro foi depredado, como informa Tokarnia (2015), em matéria da agência Brasil.

A Constituição Federal, conforme disposição do art.5°, inciso VI, garante a todos os brasileiros o direito de professar sua religião de acordo com suas convicções pessoais, sem que haja qualquer tipo de discriminação ou embaraço[4]. No entanto, ainda vemos ataques como os apresentados.

Com a diversidade de culturas e de religiões que há no Brasil, caberia algumas medidas educativas, como por exemplo: a escola trazer conteúdos sobre as religiões de matrizes africanas, com exemplos e espaço para debates com pessoas dessas religiões dentro da sala de aula e realizar atividades de valorização de culturas afro-brasileiras. Além disso, a sociedade deve ter mais respeito pelas escolhas do próximo. A intolerância religiosa é uma prática racista que precisa ser enfrentada por todos nós.

Combater o racismo é essencial para a construção de uma sociedade justa e igualitária. A discriminação racial é uma grave violação da dignidade humana, que causa prejuízos individuais e coletivos, impedindo o desenvolvimento social, econômico e cultural. É papel de todos nós combater o racismo por meio da conscientização, educação e ações afirmativas. Devemos respeitar e valorizar a diversidade étnica e cultural, promover a igualdade de oportunidades e reconhecer a contribuição histórica e atual dos povos afrodescendentes para a sociedade.

Ao referirmos a uma sociedade igualitária, democrática e justa em nossas relações de convivência, não podemos ignorar a opção da crença escolhida por cada cidadão. A intolerância religiosa é algo que afeta todo o contexto de uma sociedade e, não somente apenas a uma religião única. Mas, no atual momento que se perpassa a sociedade a religião mais perseguida e afetada são as denominadas Afro-Brasileiras, entre elas o candomblé.  


Referências

[1 e 2] https://www.bbc.com/portuguese/noticias/2016/01/160120_intolerancia_religioes_africanas_jp_rm

[3] Tokarnia, Mariana. No Dia de Combate à Intolerância Religiosa, líderes alertam sobre discriminação. Brasília, 2015.  https://agenciabrasil.ebc.com.br/direitos-humanos/noticia/2015-01/no-dia-de-combate-intolerencia-religiosa-lideres-alertam-sobre

[4] BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988.




* Elizabeth Avelar de Freitas e Maria Isabel Beherendt são acadêmicas da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziram este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre de 2022 (janeiro a junho de 2023). Foram orientadas pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

De volta à infância, primeiros passos da minha educação

De volta à infância, primeiros passos da minha educação

Por Marcelo Rodrigues de Souza [1]



Eu sou o terceiro filho de uma família de cinco pessoas. Minha mãe, Rosangela Rosa de Jesus, e meu pai, Gerson Rodrigues de Souza, não conseguiram concluir seus estudos devido às dificuldades enfrentadas na vida rural. Desde a infância, eles trabalhavam para ajudar meus avós nas despesas e, consequentemente, tinham pouco tempo para frequentar a escola, que era distante e de difícil acesso.

No entanto, quando mudamos para a cidade, meus pais fizeram todos os esforços para garantir que eu recebesse uma educação de qualidade, apesar de não saberem ler e escrever. Eles trabalhavam fora de casa durante todo o dia, mas matricularam-me em uma creche aos quatro anos de idade, onde tive meu primeiro contato com textos escritos. Lembro-me com carinho da minha professora da educação infantil, Olímpia, que contava histórias ilustradas, fixadas em um varal. Mesmo sem saber ler, eu prestava atenção às histórias para descobrir qual imagem seria fixada no varal.

Nos primeiros anos de minha educação, tive acesso a histórias clássicas como “Chapeuzinho Vermelho” e “Os Três Porquinhos”. Na terceira série do ensino fundamental, minha professora Rosalina ficou impressionada com meus desenhos ilustrando a história do “Patinho Feio”.

Nunca tive dificuldades com os números. Eu e meus irmãos e vizinhos brincávamos de contar pedrinhas e de jogá-las para o alto. Brincávamos de vender coisas, e cada um de nós tinha sua própria lojinha no quarto. Como ainda não sabíamos escrever aos 5 anos de idade, eu e meus irmãos tiveram a ideia de contabilizar tudo com feijões.

Ao chegar à escola, notei que o professor usava minhas atividades diárias como exemplos para explicar problemas matemáticos, como calcular a quantidade de pães que minha mãe havia pedido no mercado. Eu comecei a perceber que a matemática e a escrita estavam em todos os lugares.

Ao final do ensino fundamental, me apaixonei pelas histórias de Monteiro Lobato, que abordavam mitologia grega, como “O Minotauro” e “Os Doze Trabalhos de Hércules”. Essas histórias me ajudaram a compreender que há um mundo enorme a ser explorado.

As escolas em Malacacheta, minha cidade natal, possuíam bibliotecas repletas de livros incríveis e incentivavam a leitura, promovendo rodas de conversa para que contássemos o resumo das histórias.  As práticas com números na escola me ajudaram a investigar os fatos ao meu redor, a refletir sobre bons hábitos financeiros e a buscar soluções para problemas do dia a dia.

Quando ingressei na UFVJM, encontrei o que procurava: reflexões sobre atualidades, preparação para enfrentar a vida e solucionar problemas como desemprego, contaminação dos rios e epidemias, que senti falta durante o ensino médio.



[1] Marcelo Rodrigues de Souza é graduando da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziu este relato na disciplina Prática de Leitura e Produção de Textos, ofertada no primeiro semestre de 2023. A organização e edição do material foi feita pelo Projeto de Extensão Aula Digital.

Este trabalho foi orientado pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro, com as ricas contribuições na revisão e organização do tutor Marcos Roberto Rocha.

Agroecologia e Empoderamento Feminino no Campo

Agroecologia e Empoderamento Feminino no Campo

Juliana da Paz Ferreira*

A desigualdade de gênero e a violência contra a mulher são questões presentes em todos os lugares da sociedade, e na agricultura familiar não são exceção. Embora as mulheres representem uma parcela significativa da mão de obra na agricultura familiar, muitas vezes são excluídas dos processos decisórios e do acesso aos recursos e serviços essenciais. 

De acordo com Doss (2015) [1], as mulheres rurais são frequentemente excluídas dos processos de tomada de decisão e têm acesso limitado aos recursos produtivos, o que afeta sua produtividade e sua renda. A desigualdade de gênero na agricultura familiar pode ser observada em várias dimensões, como na divisão desigual do trabalho e dos valores atribuídos a ele, na ausência de programas de capacitação e assistência técnica voltados para mulheres e na baixa representação feminina em cargos de liderança em organizações e cooperativas rurais.

As mulheres geralmente são responsáveis pela maioria das tarefas domésticas e agrícolas, incluindo o cuidado dos filhos, a produção de alimentos e a criação de animais. No entanto, muitas vezes elas não têm voz ativa nas decisões importantes que afetam suas vidas e suas famílias. As mulheres frequentemente enfrentam barreiras para ter acesso a oportunidades e têm pouca representação nos espaços políticos e organizações sociais, limitando o potencial de crescimento econômico e sustentabilidade das comunidades rurais. As mulheres ainda ganham 19% a menos do que os homens no Brasil, de acordo com dados do IBGE.

Segundo a ONU Mulheres (2018) [2], a igualdade de gênero é um princípio fundamental da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável e é essencial para alcançar os objetivos de desenvolvimento sustentável. A independência feminina no Brasil tem crescido cada vez mais, destacando o papel da mulher na sociedade machista em que vivemos desde o início até os dias de hoje. Os movimentos sociais são protagonistas no fortalecimento das mulheres, quebrando o paradigma das desigualdades, conforme retratado por Cornwall (2018, p. 3) [3]. O autor enfatiza o empoderamento das mulheres trabalhadoras e empreendedoras dedicadas às suas famílias. Essas mulheres desempenham papéis importantes para a subsistência e economia familiar, muitas vezes não sendo reconhecidas nem mesmo pelos membros de suas famílias.

A representação dessas mulheres na política reflete uma desigualdade de gênero estrutural e histórica que precisa ser combatida. Segundo Vieira e Pessôa (2015) [4], a invisibilidade das mulheres rurais nas políticas públicas e na sociedade em geral é um obstáculo para a promoção da igualdade de gênero no meio rural. A inclusão das mulheres nos espaços políticos é fundamental para que suas demandas e necessidades sejam levadas em consideração nas decisões públicas. Além disso, a presença feminina na política é importante para promover mudanças na cultura política e ampliar o debate sobre temas que afetam a vida das mulheres, como a igualdade salarial, a violência de gênero e o acesso à saúde.

A presença das mulheres na política serve como exemplo para as futuras gerações, inspirando outras mulheres a se envolverem na política e na luta por seus direitos. De acordo com dados atualizados em janeiro de 2023, no Brasil, a representatividade feminina é de 17,7% na Câmara dos Deputados e 17,8% no Senado Federal [5]. Em relação aos governos estaduais, a plataforma registra que apenas 2 das 27 unidades federativas são governadas por mulheres. Embora a participação das mulheres na política tenha aumentado nas últimas décadas, ainda há uma grande desigualdade de gênero e o aumento da violência contra a mulher, principalmente no âmbito familiar.

Há um ditado popular que diz, “em briga de marido e mulher ninguém mete a colher”. Mas o fato não procede; devemos interferir sim. O Brasil está entre os países que mais matam mulheres. Além disso, ainda existem mulheres que se violentam emocionalmente para agradar aos outros ou a alguém específico. A violência contra a mulher no contexto do campo é um problema real e grave. As mulheres que trabalham no campo frequentemente enfrentam discriminação de gênero, desigualdade econômica e violência física e sexual por parte de colegas de trabalho, empregadores e até mesmo familiares. A falta de políticas públicas específicas para as mulheres rurais, a falta de acesso aos serviços de saúde e educação e a ausência de uma rede de apoio fazem com que essas mulheres estejam mais expostas à violência.

Para combater a violência contra a mulher e promover o empoderamento feminino no contexto do campo, é preciso desenvolver políticas públicas que promovam campanhas de conscientização sobre a violência contra a mulher no campo, com o objetivo de sensibilizar as comunidades rurais sobre o problema e incentivar as mulheres a denunciarem a violência e buscar ajuda. Investir em programas de capacitação e formação profissional para as mulheres rurais, com o objetivo de ampliar as suas oportunidades de trabalho e aumentar a sua participação na economia local, para que elas possam investir em suas atividades econômicas e fortalecer sua independência financeira.

Por fim, conclui-se que as questões relacionadas à violência contra a mulher e ao empoderamento feminino no contexto do campo são extremamente importantes e urgentes, pois afetam muitas mulheres rurais em todo o mundo. A violência e a discriminação de gênero têm efeitos negativos não apenas sobre as mulheres, mas também sobre suas famílias e comunidades, limitando o seu potencial de contribuição para o desenvolvimento local e sustentável.

 


Referências

[1] Doss, C. (2015). Women and agricultural productivity: What does the evidence tell us? rticipação em organizações em Minas Gerais: um estudo de caso. Revista Brasileira de EJournal of Development Studies, 51(8), 1016-1031.

[2] ONU Mulheres. (2018). Transformando promessas em ação: Igualdade de gênero na Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável. Brasília: ONU Mulheres.

[3] CORNWALL, A. Além do “Empoderamento Light”: empoderamento feminino, desenvolvimento neoliberal e justiça global. Cad. Pagu, Campinas, n. 52, e185202, 2018. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/18094449201800520002.

[4] Vieira, L. M. P., & Pessôa, V. B. (2015). Mulheres rurais e políticas públicas no Brasil. Revista Geográfica de América Central, 56E, 1-14.

[5] https://www.tse.jus.br/comunicacao/noticias/2023/Janeiro/tse-mulheres-portal-reune-estatisticas-sobre-eleitorado-e-participacao-feminina-na-politica




* Juliana Da Paz Ferreira é acadêmica da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziu este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre de 2022 (janeiro a junho de 2023). Foi orientada pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

Hoje vida, amanhã histórias e para sempre memórias

Hoje vida, amanhã histórias e para sempre memórias

Por Karine Pereira de Azevedo [1]

Karine logo


Tudo começou em 24 de novembro de 1996, quando nasci em Capelinha, no interior de Minas Gerais. Meu pai morava em uma zona rural da cidade, conhecida como Pontal (área da Aperam, empresa que, na época, chamava-se Acesita), onde fui criada até meus oito anos de idade. No ano de 2003, fui matriculada em uma escola municipal da zona rural no Distrito de Vendinhas.

Como entrei com sete anos de idade, já no 1° ano. Não comecei na pré-escola como todos, Graças a Deus. Sempre tive um fácil aprendizado, pois tive o auxílio da minha mãe. Lembro-me como hoje: ela tinha um livro que continha as sílabas para apreender a ler, e a que não esqueço é da palavra PATO, que no livro dizia: P-A PA, T-O TO, juntando = PATO. Não sei como eu sempre falava outra palavra, tipo RATO, e nunca acertava. Daí levava uns puxões de orelha e começava tudo novamente.

Aos oito anos de idade nos mudamos para Capelinha. E olha que loucura: fui morar numa rua abaixo da escola E. E. Profª. Hermínia Eponina. Cheguei já no meio do ano e foi difícil acompanhar. Foi um pouco difícil a adaptação, mas consegui. E o tempo foi passando e quando estava no quarto ano descobri que não gostava muito de Português, não me adaptava, pois minha “praia” eram os números. Quando o professor chegava e pedia uma produção de texto, confesso que não sabia por onde começar.

Para se ter uma noção de como era complicado o meu português, na escola tinha a famosa “sexta-feira da literatura”, quando eu sempre pegava livros, mas do mesmo jeito que os levava para casa, voltavam. Eu não lia nem o nome. Certo dia, como era para fazer o resumo de um livro que eu havia lido, cheguei diante da bibliotecária e disse: “Tia, a professora disse que é para fazer o resumo de um livro. Porém, de todos que peguei, não li nenhum”. Ela conversou comigo e disse que para eu começar a ler, que eu teria que pegar um livro cuja capa me cativasse. Então, achei um: O Jardim Secreto. Não vou negar que desse eu gostei. Parece que eu que estava vivendo a história. Porém, foi o primeiro e único livro que li até hoje. Eu declaro que não gostava, e nem gosto de ler.

A escola me ajudou muito em relação à gramática e produção de texto, e eu via diferença nas minhas redações para o ENEM. Com o passar dos anos também fui percebendo que não precisava somente da matemática para sobreviver, precisava muito mais do português. Precisava da escrita, da fala, da comunicação mais eficiente, nas redes sociais etc.

Minhas notas de português, na escola, só melhoraram no Ensino Médio. Em exatas sempre tirei total como prova do meu destino. Em 2014 concluí o Ensino Médio e, concomitantemente, me formei no curso Técnico em Contabilidade, sendo que hoje faço faculdade de Ciências Contábeis. Me formo neste ano e já faz cinco anos que trabalho com contabilidade. E acreditem: para complementar meu trabalho no Departamento Fiscal, na Soma Contabilidade, agora estou cursando Licenciatura em Matemática. No dia 13/04/2023 irei me apresentar na maior feira de negócios da minha região, uma das mais importantes de Minas Gerais: a FEIRAGRO. E olha que incrível: vou precisar do português para fechar negócios para a minha empresa.



[1] Karine Pereira de Azevedo é graduanda da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziu este relato na disciplina Prática de Leitura e Produção de Textos, ofertada no primeiro semestre de 2023. A organização e edição do material foi feita pelo Projeto de Extensão Aula Digital.

Este trabalho foi orientado pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro, com as ricas contribuições na revisão e organização do tutor Marcos Roberto Rocha.

Assédio sexual de crianças e adolescentes no campo

Assédio sexual de crianças e adolescentes no campo

Elisete Martins da Silva*

 

Casos de abuso sexual são visíveis na sociedade, e os índices de crianças e adolescentes que sofrem ou já sofreram algum tipo de abuso sexual são alarmantes. Segundo a Ouvidoria Nacional de Direitos, houve registro total de 7.447 denúncias de estupro no Brasil nos cinco primeiros meses de 2022, sendo 5.881 das vítimas crianças ou adolescentes, ou seja, quase 80% das denúncias [1]

As porcentagens são preocupantes e os centros urbanos tendem a registrar mais os casos de abusos. Nas comunidades rurais também há casos de assédio sexual, porém o tabu costuma calar os envolvidos. O problema se dá pelas restrições de maiorias dos pais ou familiares responsáveis de falarem sobre o assunto com as crianças, por ser considerado constrangedor, por desconhecerem uma maneia adequada de se falar, por serem conservadoras como as igrejas que frequentam, ou outro motivo qualquer. Fato é que a cultura brasileira não educa as crianças para uma sexualidade saudável na vida adulta.

Todavia, as crianças devem ser educadas de maneira que saibam que partes do seu corpo não devem ser tocadas, o que é assédio sexual e como reagir a esse tipo de abordagem, para que, assim, possam relatar casos, responsáveis, tirar dúvidas etc. Certamente seria mais fácil para as autoridades lidar com esse tipo de crime.

As comunidades rurais são formadas por grupos de famílias que normalmente realizam trabalho no coletivo, pois há sempre uma família ajudando a outra na execução das atividades. Com essa proximidade, comunidades do campo tornam-se lugares convenientes para o assédio e até mesmo o ato do abuso sexual. Na rotina da roça, as crianças ajudam na mão de obra e, com isso, estão expostas ao agressor, visto que todos estão envolvidos nas atividades e não têm em mente que algo assim possa acontecer, principalmente pelo fato de todos ali presentes serem conhecidos.

As escolas devem, cada vez mais, levar orientações sobre assédio sexual e como agir em relação a isso. De acordo com Correia, do site Brasil Escola (2022)[2],

A Orientação Sexual oportuniza uma parceria com a família e abre um espaço para que educadores e pais atuem juntos na formação de crianças e de adolescentes, aproximando a família e a escola num processo de interação. Além de possibilitar discussões que favoreçam o ambiente familiar e de sala de aula, melhora o relacionamento entre pais e educadores garantindo confiabilidade ao trabalho educativo.  

A implementação de ações abrangentes e eficazes para combater o assédio e o abuso sexual de crianças e adolescentes requer uma abordagem multifacetada que envolva tanto o ambiente educacional quanto o sistema legal. No âmbito escolar, é fundamental estabelecer um diálogo contínuo sobre o assédio sexual, por meio de palestras ministradas por profissionais capacitados, que possam fornecer informações sensíveis e esclarecedoras. Além disso, a distribuição de cartilhas de conscientização pode contribuir para disseminar informações relevantes e instruir os alunos sobre a prevenção e os recursos disponíveis. Para complementar essas medidas, é crucial disponibilizar apoio psicológico tanto para os estudantes como para seus pais, criando um ambiente onde preocupações possam ser compartilhadas e tratadas de maneira confidencial.

No entanto, o fortalecimento da proteção das crianças e adolescentes contra o assédio e o abuso sexual não deve ficar restrito ao âmbito educacional. É imperativo que a legislação seja revista e aprimorada para garantir maior rigor e agilidade nos processos judiciais relacionados a esses crimes. As autoridades competentes devem ser capacitadas a analisar cuidadosamente as evidências e tomar decisões adequadas de forma célere. Além disso, uma abordagem preventiva de base familiar também é essencial. Os pais devem ser incentivados a dialogar abertamente com seus filhos sobre assédio sexual, fornecendo informações claras e orientações de segurança. Ao mesmo tempo, os pais devem estar atentos a possíveis mudanças de comportamento, uma vez que essas alterações podem ser indicativas de que a criança ou adolescente está passando por uma situação de assédio ou abuso, exigindo uma intervenção imediata e de apoio.

Por fim, a luta contra o assédio e o abuso sexual de crianças e adolescentes demanda ações conjuntas no âmbito educacional e jurídico, abrangendo desde a conscientização e o suporte emocional até a reforma das leis e a promoção de um ambiente familiar de diálogo e prevenção. Somente com a convergência desses esforços será possível proporcionar um ambiente seguro e protegido para as gerações futuras.

Referências

[1] <https://www.gov.br/mdh/pt-br/assuntos/noticias/2022/junho/criancas-e-adolescentes-sao-79-das-vitimas-em-denuncias-de-estupro-registradas-no-disque-100>

[2] <https://meuartigo.brasilescola.uol.com.br/educacao/a-orientacao-sexual-deve-ser-uma-parceria-entre-escola-.htm>




*Elisete Martins da Silva é acadêmica da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziu este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre de 2022 (janeiro a junho de 2023). Foi orientada pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

Minha jornada e a escola

Minha jornada e a escola

Por Juliana Cardoso da Silva Vieira [1]



A minha jornada na escola começou quando eu era bem novinha, em torno de 2 a 3 anos de idade. Minha mãe, na época, trabalhava em uma creche e, às vezes, me levava junto. Com essas idas com a minha mãe para a creche eu já ia aprendendo algumas letras, números, formas dos desenhos etc. Assim que cheguei à idade para ingressar na escola, eu já estava um pouco mais avançada que as outras crianças, pois já sabia escrever meu nome e já conhecia as letras e os números

Pelo fato da minha mãe ser professora, livros e revistas era o que mais tínhamos em casa. Lembro-me que na 3ª série (hoje, quarto ano) a escola liberava alguns livros que tivéssemos interesse em levar para casa e quando fôssemos devolver o livro, deveríamos contar um breve resumo de como era a história que foi lida.

Porém, foi aos 20 anos que eu realmente comecei a gostar da leitura. Foi quando eu comprei meu primeiro livro. Lembro-me que folheando uma revista de uma determinada marca fiquei super interessada nesse livro e acabei comprando-o. Comprei o primeiro livro de uma coletânea de 12 exemplares: “A Garota do Calendário”, da autora americana Audrey Carlan. Assim fui pegando gosto pela leitura. Fiquei tão apaixonada pela coletânea que completei minha coleção em apenas um mês.

Com minha primeira coleção de livros completa, me apaixonei por mais dois livros: “Você acredita mesmo em amor a primeira vista?” e “Você acredita mesmo em segunda chance?”, da autora brasileira Fabiana Santina. Fiquei tão apaixonada que adquiri seus livros autografados.

Quando finalizei meu segundo grau, em 2014, ingressei na faculdade para cursar Bacharelado em Direito. No início, até que estava gostando, porém era muito cansativo, pois tínhamos que viajar 170 km para outra cidade todos os dias, para poder concluir a magistratura. Com três meses de curso tive que trancar a faculdade por não me identificar com o que estava estudando e também por não conseguir pagar os estudos.

Contudo, tive essa grande oportunidade de estar cursando um ensino superior em uma universidade federal. O curso me abriu um leque de oportunidades e deixou meu dia a dia no trabalho mais fácil e seguro. Afinal, trabalhar com a rotina burocrática não é nada fácil.



[1] Juliana Cardoso da Silva Vieira é graduanda da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziu este relato na disciplina Prática de Leitura e Produção de Textos, ofertada no primeiro semestre de 2023. A organização e edição do material foi feita pelo Projeto de Extensão Aula Digital.

Este trabalho foi orientado pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro, com as ricas contribuições na revisão e organização do tutor Marcos Roberto Rocha.

As dificuldades de uma gravidez na adolescência no campo

As dificuldades de uma gravidez na adolescência no campo

Por Joice Rocha Da Cruz e Leonel Lemes Pereira*

A gravidez na adolescência pode trazer grandes dificuldades na vida, especialmente para aqueles que vivem no campo. Quando uma adolescente engravida, ela pode enfrentar desafios financeiros, emocionais e sociais. No campo, essas dificuldades podem ser ainda maiores devido à falta de acesso a recursos e serviços essenciais. Financeiramente, a situação pode sobrecarregar a jovem e sua família. No campo, onde as oportunidades de emprego são limitadas, pode ser ainda mais difícil para a adolescente encontrar um trabalho estável que lhe permita sustentar a si mesma e ao seu bebê. Isso pode levar à dependência de ajuda externa, o que pode acarretar outras questões, como violência.

Segundo “Biblioteca virtual em saúde”[1], a gravidez precoce ocorre dos 10 aos 19 anos e é extremamente alta:

A taxa de gestação na adolescência no Brasil é alta, com 400 mil casos/ano. Quanto à faixa etária, os dados revelam que em 2014 nasceram 28.244 filhos de meninas entre 10 e 14 anos e 534.364 crianças de mães com idade entre 15 e 19 anos. Esses dados são significativos e requerem medidas urgentes.

É preciso ressaltar as causas da maior parte das gestações, como a falta de discussão sobre educação sexual, sobretudo em escolas que vêm sendo intimidadas por movimentos conservadores. O ensino sobre sexualidade é necessário não somente pela gravidez indesejada, mas também pela propagação de doenças sexualmente transmissíveis. É uma questão de saúde pública.

A evasão escolar é uma consequência, uma vez que a adolescente precisará cuidar de seus filhos. No campo, uma gravidez inesperada pode induzir ao êxodo rural, pois na necessidade de se manter, cais jovens e mães solo acabam abandonando a vida campesina em busca de trabalho nas cidades.

Socialmente, a gravidez na adolescência pode resultar em estigmatização, isolamento e adoecimento mental. No campo, onde as comunidades muitas vezes são pequenas e conservadoras, a adolescente pode enfrentar um julgamento severo por parte dos outros. Isso pode afetar sua autoestima e sua capacidade de se integrar socialmente, tornando mais difícil a busca por apoio.

É evidente a necessidade de refletir e discutir mais sobre essa situação, pois a omissão tem trazido consequências catastróficas. Muitas adolescentes estão passando por um período difícil, principalmente depois do COVID-19. Os casos de ansiedade só aumentaram, atingindo a maior parte da população jovem. Foi divulgada uma pesquisa chamada “Juventudes e a Pandemia: E agora?”, com o apoio da UNESCO e do UNICEF[2], na qual mais de 16 mil jovens foram entrevistados sobre saúde, educação, trabalho, democracia e redução das desigualdades. Para 63% dos participantes, a educação deve ser a prioridade dos governantes. Além disso, o fortalecimento do SUS, a recuperação econômica e ações contra a fome também são importantes. A pesquisa também mostrou que a saúde mental continua sendo afetada, com 63% relatando ansiedade e 47% solicitando acompanhamento psicológico na saúde pública.

Com todas essas questões, físicas, mentais e sociais, o apoio é essencial:

Na sociedade atual a adolescência é (…) uma etapa que exige um apoio maior por parte do poder público, família e sociedade em geral, que facilite a formulação de identidade, crescimento pessoal, intelectual, psicológico e de saúde (DIAS; TEXEIRA, 2010)[3].

A escola deve discutir e ensinar os alunos a se prevenirem e a terem uma vida sexual saudável. Uma outra discussão também importante é a violência sexual, que pode ser evitada a partir de educação sexual. Em acordo com toda essa discussão, torna-se necessário ter programas de prevenção da gravidez na adolescência e auxílio a adolescentes grávidas e mães solo. As secretarias de saúde devem atuar juntos às escolas, em parceria com outros agentes da comunidade que podem ajudar a diminuir o conservadorismo, os tabus e os preconceitos. O quadro só pode melhorar com a expansão do conhecimento sobre essa temática.

[1] https://bvsms.saude.gov.br/01-a-08-02-semana-nacional-de-prevencao-da-gravidez-na-adolescencia/#:~:text=Segundo%20a%20Organiza%C3%A7%C3%A3o%20Mundial%20de,com%20400%20mil%20casos/ano

[2] COVID-19: CRISE DE ANSIEDADE AFETARAM 63% DOS JOVENS NO ÚLTIMO SEMESTRE. Nações Unidas Brasil, 2022. Disponível em: <https://brasil.un.org/pt-br/201139-covid-19-crises-de-ansiedade-afetaram-63-dos-jovens-no-%C3%BAltimo-semestre>. Acesso em: 28 de março de 2023.

[3] DIAS, A. C. G. TEIXEIRA, M. A. P. Gravidez na adolescência: um olhar sobre um fenômeno complexo.2010. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/paideia/v20n45/a15v20n45.pdf>. Acesso em: 31 de setembro de 2023.




*Joice Rocha Da Cruz e Leonel Lemes Pereira são acadêmicos da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziram este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre de 2022 (janeiro a junho de 2023). Foram orientados pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

A escola e mãinha

A escola e mãinha

Por Joice Chaves Ribeiro [1]



 Quando pequena, lembro-me de gostar de ir à escola, superanimada com a bolsinha de elefante, uniformizada e contente. Lá, sempre esteve presente como educadora, minha mãe, a referência de toda a minha vida. O contato com os livros, principalmente os de alfabetização, era comum, pois mãinha (forma como a chamo) dava aula para o magistério, preparando profissionais da educação infantil. Naquele tempo eu gostava muito de sublinhar os textos e atividades que eram passadas no mimeógrafo, vivenciando uma fantasia que levaram à autonomia na escrita e na leitura.

Na pequena cidadezinha de Bertópolis, divisa com a Bahia, foi onde iniciei minha vida escolar em 1996. Lembro-me das cartilhas nas quais havia pequenos textos ilustrados e organizados por ordem alfabética, da professora sorridente, dos colegas queridos e dos assombrosos ditados que eu morria de medo, pois apesar de gostar muito da escola, não conseguia acompanhá-la. Tive muita dificuldade com a leitura, consequentemente, não tinha um bom desenvolvimento com a maioria das disciplinas, isso foi mudando, quando na escola descobriu o meu problema de visão em um dos projetos de saúde. Aqui, permaneci até a antiga segunda série. Em 1999, mudamos para Almenara em busca de novas oportunidades, já que minha mãe havia perdido seu trabalho, fomos obrigados a sair de lá, vimos então para Almenara – a princesinha do vale. 

Nesta nova etapa, consegui mais desenvolvimento na escola. Meu melhor período foi o quarto ano, no qual tive uma professora de português de cara fechada, rechonchuda, baixinha, com olhos bem fitados atrás daqueles óculos, que sempre nos observava as falas, pronta para corrigi o “nois vai” e empregava o plural que sempre engolíamos, pegava no pé, ela com paciência, me tirou da inércia de uma leitura fragmentada, mas ainda assim, continuava com medo do ditado.

Nos anos finais do ensino fundamental continuava com os mesmos problemas: má leitura e muitos erros na escrita.  O guarani, de Jose de Alencar, foi o primeiro livro grande que li, leitura difícil, termos antigos, leitura rebuscada, diferente do meu vocabulário, comecei então a entender que a literatura não era apenas estórias e sim histórias de um conjunto de críticas e protestos enraizados de acordo com o tempo.

Já no ensino médio obtive mais postura de aluna, visto que melhorei, entretanto, as notas vermelhas me acompanhavam. Em meio a tantos medos com pouco interesse pela escola, fiz o vestibular com o incentivo de mãinha e para a minha surpresa, passei na Unimontes (Universidade Estadual de Montes Claros) em 2015. No curso veio um mundo de possibilidades, tornando-me a terceira melhor aluna da turma, adquiri o gosto pelo saber mesmo tendo ainda muita dificuldade no aprender. Tive como modelo uma colega com deficiência visual que aqui tem o pódio de primeira melhor aluna da turma, ao seu lado consegui desenvolver como uma pessoa escolarizada assimilando a importância do conhecimento, no qual as pessoas conseguem encontrar de modo significativo um equilíbrio para viver de forma que não há empecilhos e desculpas para a busca da formação. Com 29 anos formei no curso da disciplina que mais sofri e tive medo, Letras/ Português. Passei a gostar de literatura e a buscar o hábito da leitura. A curiosidade tornou-se a minha melhor aliada.

Hoje já atuo na área da educação e, algo que nunca imaginei, aquela pessoa que foi minha referência, lá do início, que eu queria tanto orgulhá-la, é minha colega de trabalho, além de ser minha mãinha.



[1] Joice Chaves Ribeiro é graduanda da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziu este relato na disciplina Prática de Leitura e Produção de Textos, ofertada no primeiro semestre de 2023. A organização e edição do material foi feita pelo Projeto de Extensão Aula Digital.

Este trabalho foi orientado pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro, com as ricas contribuições na revisão e organização do tutor Marcos Roberto Rocha.

Agroecologia: por uma vida saudável no campo

Agroecologia: por uma vida saudável no campo

Por Elisama de Sousa Ferreira e Eliude de Sousa Ferreira*

Trazemos aqui algumas reflexões acerca da agroecologia para a promoção da saúde e sustentabilidade no campo. ressaltando a significativa importância da preservação do ecossistema. Isso contrasta com a abordagem da revolução verde, que preconizava a modernização das práticas agrícolas por meio do uso de fertilizantes químicos, agrotóxicos e a expansão das áreas dedicadas à monocultura.

Trazemos aqui algumas reflexões acerca da agroecologia para a promoção da saúde e sustentabilidade no campo. ressaltando a significativa importância da preservação do ecossistema. Isso contrasta com a abordagem da revolução verde, que preconizava a modernização das práticas agrícolas por meio do uso de fertilizantes químicos, agrotóxicos e a expansão das áreas dedicadas à monocultura.

A agroecologia ocupa um espaço central na promoção de um estilo de vida saudável. Seminários como o intitulado “Direito Humano à Alimentação Adequada, Agroecologia e Saúde: Políticas Públicas para o Futuro”, promovido pela Fundação Oswaldo Cruz – Fiocruz em colaboração com associações e a Articulação Nacional de Agroecologia, têm abordado temas relevantes. Tais eventos levantaram questões sobre a necessidade de criação de políticas públicas para combater a fome, melhorar a qualidade da alimentação, lidar com as mudanças climáticas e reduzir as desigualdades sociais, reconhecendo os impactos diretos desses fatores na qualidade de vida das pessoas.

Além disso, é imprescindível direcionar a atenção para o risco à saúde dos agricultores, que enfrentam a exposição a insumos industrializados diretamente, além da alimentação, o que pode ter sérias consequências imediatas para suas vidas. Da mesma forma, a utilização de agrotóxicos nas plantações pode impactar a saúde de toda a comunidade local. Isso ocorre porque esses produtos não se restringem apenas às plantas ou ao solo onde são aplicados, sendo levados pelos rios durante os períodos de chuva. Pesquisa FAPESP (2018) afirma que “cerca de 200 mil pessoas morrem anualmente no mundo vítimas de envenenamento agudo por pesticidas – basicamente trabalhadores rurais.” Ou seja: é crucial considerar o ciclo completo de produção e todos os envolvidos, dos produtores aos alimentados.

A agroecologia é uma alternativa que se contrapõe ao uso excessivo de insumos industrializados e reconhece a necessidade da interação ecológica para obter resultados satisfatórios. Como afirma Azevedo e Pelicioni (2012)[1]:

A agroecologia seria a produção de alimentos de uma forma que produzisse uma boa qualidade de vida no final da cadeia, qualidade de vida para as duas pontas; para o agricultor evitando o uso de agrotóxicos e contaminação e para o consumidor, da mesma forma, produzindo um alimento saudável. (p. 292)

Mesmo cientes de que os insumos usados na monocultura podem causar mal à saúde da população, comumente vemos pessoas dizerem que a agricultura familiar não dá conta de produzir alimentos para sustentar a população mundial. Quando na verdade o que falta é adesão à agroecologia afirma Legnaioli no texto “Agroecologia: o que é e características – eCycle” [2]. Para a autora, a prática agroecológica tem capacidade de produzir ainda mais do que o agronegócio, com possibilidade de resultados satisfatórios do ponto de vista econômico, ecológico e social.  “A produção agroecológica tem capacidade para produzir cerca de 6 % a 10% a mais que o agronegócio.”

Logo o que falta é mudança no nosso sistema de produção. Como toda mudança tem seu ponto de partida, podemos iniciar com o esclarecimento da população, atuando primordialmente no ambiente da sala de aula. Podemos propor atividades aos alunos para que eles ampliem seu conhecimento acerca da produção agroecológica, expondo seus benefícios e fomentando a adoção de práticas sustentáveis. Além disso, é possível promover iniciativas educacionais com a participação tanto dos pais dos estudantes quanto da comunidade em geral.

Nesse contexto, um programa que se destaca é o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) [3], que não só proporciona fonte de renda, mas também assegura que os agricultores tenham canais para comercializar suas colheitas. A resistência para aquisição de hábitos saudáveis pode se dar pela falta de conhecimento. Assim, o mais viável é possibilitar que a informação alcance nossas comunidades, a fim de termos mais pessoas preservando o meio ambiente e sua saúde.


Referências

[1] https://www.ecycle.com.br/agroecologia/

[2] Azevedo E, Pelicioni MCF. Agroecologia e promoção da saúde no Brasil. Ver Panam Salud. Pública. 2012;31(4):290-5.

[3] https://www.gov.br/mds/pt-br/acesso-a-informacao/carta-de-servicos/desenvolvimento-social/inclusao-social-e-produtiva-rural/programa-de-aquisicao-de-alimentos-2013-paa




*Elisama de Sousa Ferreira e Eliude de Sousa Ferreira são acadêmicas da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziram este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre de 2022 (janeiro a junho de 2023). Foram orientadas pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

Minha evolução em leitura e escrita

Minha evolução em leitura e escrita

Por Jhonatan Oliveira Rodrigues [1]



Carrego comigo um grande afeto pelos gibis da Turma da Mônica, pois foi através deles que ingressei no mundo da leitura. Não sei dizer ao certo o que mais me chamou a atenção. Pode ter sido as cores cativantes ou até mesmo os personagens, mas em resumo todo o conjunto da obra me causou um imenso interesse e admiração.

No meu primeiro ano do Ensino Fundamental I realizei o reconto da fábula da Cinderela. Com apenas cinco anos tive meu primeiro trabalho escrito exposto para toda a escola. Tão pequeno e já me sentia um grande escritor. Mas foi no quarto ano que realmente tomei gosto pela escrita, por meio do “Projeto Compõe”. Durante todo o ano tínhamos algumas horas semanais dedicadas ao projeto, que consistia na elaboração de poemas e poesias. Essa foi uma etapa essencial em minha formação.

A partir do Ensino Fundamental II até o Ensino Médio não tinha o hábito de leitura frequente. Sinceramente, nunca tive interesse por contos fictícios. Costumava ler livros desse tipo somente quando era necessário, ou seja, quando os professores passavam atividades, como, por exemplo, fichas literárias. Quando já estava próximo de formar, durante a pandemia, encontrei uma motivação para melhorar meu hábito de leitura: a busca por conhecimentos, os quais realmente poderia aplicar em meu cotidiano, principalmente voltados para a área de finanças.

Hoje, sou universitário. A leitura e a escrita (direcionada aos estudos) voltaram a fazer parte do meu cotidiano. Nessa nova etapa todo conhecimento adquirido ao longo da minha formação será aplicado e melhorado com todo o aprendizado que está por vir.



[1] Jhonatan Oliveira Rodrigues é graduando da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziu este relato na disciplina Prática de Leitura e Produção de Textos, ofertada no primeiro semestre de 2023. A organização e edição do material foi feita pelo Projeto de Extensão Aula Digital.

Este trabalho foi orientado pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro, com as ricas contribuições na revisão e organização do tutor Marcos Roberto Rocha.

Agroecologia e antirracismo

Agroecologia e antirracismo

Por Leiliane Pereira de Oliveira Lima e Maria da Solidade Antonio de Souza *

A agroecologia e importantíssima na luta contra o racismo, estrutural e enraizado em nossa sociedade. Ela traz consigo narrativas de luta, resiliência e superação de um povo que, por anos, sustentou e nutriu as famílias brasileiras por meio de práticas culturais e conhecimentos ancestrais, gerando uma produção diversificada de alimentos de forma sustentável.

Entretanto, a população negra ainda enfrenta marginalização, afastamento dos processos de socialização e ausência de representatividade nos sistemas de poder. Essa realidade é uma herança da escravidão, que mesmo após a abolição, privou a população negra de direitos básicos, refletindo na ausência de políticas públicas voltadas para os escravizados e a falta de reforma agrária.

As comunidades Quilombolas representam uma das formas de resistência ao sistema escravocrata. Suas práticas tradicionais enraizadas na agricultura camponesa constituem a base da resistência no Brasil. A abordagem com que eles interagem com a terra, coexistindo de maneira harmoniosa, transcende o tempo, enfrentando as intempéries impostas pelo agronegócio. Nessa perspectiva, destaca-se a relevância de harmonizar o trabalho com a terra, respeitando seus recursos naturais, evitando assim desequilíbrios ambientais. O resultado é uma produção de alimentos saudáveis e a manutenção sustentável dos ecossistemas, sem a devastação das florestas.

Todo esse processo de luta, resistência e dor contribuiu para fortalecer o embate contra o racismo no contexto rural. Esse movimento ganhou ímpeto no movimento agroecológico, onde o racismo emergiu como temática central nos âmbitos políticos, culturais e científicos. Esse movimento também tem promovido a união entre quilombolas e indígenas, que compartilham a luta por seus direitos. A pesquisadora Fran Paula, engenheira agrônoma e mestra em saúde pública, conduziu estudos voltados para os povos quilombolas e indígenas, revelando um alarmante padrão de pulverização aérea sobre essas comunidades. Esse cenário ameaça as práticas agrícolas ancestrais, dificultando a produção e o consumo de alimentos saudáveis.

Desde a época da escravidão, a população negra tem enfrentado diversas formas de opressão. O acesso à terra, moradia e educação foi negado, manifestações claras do racismo estrutural que permeia nossa sociedade. Esse racismo enraizado transparece nas estruturas de direito, economia, ideologia e política. Ele se manifesta de maneira evidente nas práticas cotidianas, permeando hábitos e discursos, muitas vezes de forma inconsciente. A construção do Brasil foi permeada por ideias racistas, o que moldou profundamente nossa sociedade.

Os dados presentes na pesquisa “Atlas da Violência”, publicada pelo IPEA em 2021 , revelam a triste realidade: uma pessoa negra tem maior probabilidade de ser vítima de homicídio do que uma pessoa não negra. A violência letal contra pessoas negras e pardas em 2019 foi 162% maior em comparação às não negras. Vale ressaltar que pessoas negras representam 77% das vítimas de homicídio no país. Essa violência perpetua a reprodução de vidas, culturas, histórias e memórias, sobretudo nos quilombos. Infelizmente, a luta pela demarcação de terras quilombolas e o acesso a políticas públicas reparatórias ainda enfrentam desafios substanciais.

Diante de todo cenário, é incontestável que a luta contra o racismo deve ser disseminada em todos os âmbitos e movimentos. As comunidades quilombolas e indígenas não podem mais ser silenciadas, tendo seus direitos e dignidade usurpados. A mobilização e conscientização desses povos evidenciam a intersecção entre a luta antirracista e a agroecologia. Ambos almejam a preservação e proteção do meio ambiente, bem como a prática de agricultura de maneira harmônica. Nesse sentido, é imprescindível enfatizar que discutir agroecologia e agricultura familiar é, por extensão, abordar a luta antirracista. O Censo Agropecuário de 2017 revela que a maioria dos produtores rurais do Brasil é composta por negros, sendo 70% dos alimentos que chegam à mesa dos brasileiros provenientes da agricultura familiar.

Diante dessas reflexões, propõe-se ações voltadas à luta antirracista e agroecológica. Um primeiro passo seria introduzir esses movimentos nas escolas, promovendo palestras ministradas por entidades parceiras nessa batalha, como sindicatos de trabalhadores rurais, Emater e representantes de comunidades quilombolas e indígenas. Essas palestras teriam o intuito de elucidar os pontos abordados em cada argumento, contribuindo para disseminar o conhecimento sobre a história desses povos e seus direitos. Ademais, essa conscientização deve se estender às próprias comunidades quilombolas, indígenas e outras áreas rurais, a fim de empoderar essas populações, superando o medo, a falta de informação e os obstáculos que historicamente os impediram de reivindicar seus direitos.

Em síntese, a agroecologia está diretamente ligada à luta antirracismo, pois busca promover uma relação harmoniosa entre os povos e a terra, reacendendo práticas ancestrais e direitos usurpados. Nesse processo, a disseminação do conhecimento e a conscientização ganham proeminência, forjando uma sociedade mais justa, inclusiva e equitativa, onde as raízes da cultura e a dignidade de todos são preservadas.



*Leiliane Pereira de Oliveira Lima e Maria da Solidade Antonio de Souza  são acadêmicas da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziram este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre de 2022 (janeiro a junho de 2023). Foram orientadas pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

Reforma agrária e permanência no Campo

Reforma agrária e permanência no Campo

Por Edson de Souza Santos e Maria Eunice de Souza Franco*

Sempre haverá um povo com sede de trabalhar e fazer com que a terra cumpra sua função social, e isso só é possível com a garantia de que esse povo tenha acesso a essas terras. O campo é lugar de (r)existir, pois nele estão as nossas histórias, nossas marcas, nossas lutas.

No entanto, muitos moradores do campo têm experimentado desmotivação em relação à permanência nesses espaços, devido à inviabilidade de uma vida de qualidade nas pequenas propriedades. Observa-se a concentração expressiva de vastos territórios nas mãos de um grupo minoritário, enquanto a ampla maioria encontra-se desprovida de glebas. Aqueles que possuem uma fração de terra reduzida não dispõem das condições para gerar renda suficiente que lhes permita subsistir dignamente no campo.

Tal cenário propicia o êxodo rural. Como aponta Fonseca et al (2015, p. 234)[1]: “O processo de êxodo rural vem sendo ocasionado principalmente por parte da população da zona rural que saem do campo em busca de melhores condições de vida nas cidades, porém, esse processo gera vários problemas sociais”. Contudo, essa expectativa, muitas vezes, é apenas uma utopia, ou fantasia diante do desespero de quem vive com pouca ou sem nenhuma terra para tirarem o seu sustento. Esses, ao chegarem às urbes, deparam-se com uma realidade díspare, marcada por desemprego galopante, encargos onerosos e aquisições dispendiosas. Sem alternativa, ocupam áreas irregulares, propiciando o crescimento de favelas e o aumento da violência, entre outros dilemas.

Em face da frustração, muitos sucumbem à influência de substâncias entorpecentes, à prostituição, ao delito e a outras formas de criminalidade. Poderá ser resolvida essa mazela do êxodo rural? Será viável assegurar a permanência do homem no campo, coadunando qualidade de vida, dignidade e sustentabilidade? Acreditamos que seja possível sim, a partir de uma lógica agroecológica e a promoção da reforma agrária. Para diversas famílias, o campo ainda é o melhor lugar para se viver.

A reforma agrária seria uma solução na medida que se sabe que a principal causa do êxodo rural é a falta de terras para trabalharem e viverem com dignidade. No entanto, questiona-se por que o tema da reforma agrária não figura nas agendas do poder executivo, legislativo e judiciário. Estará tal omissão vinculada a um controle econômico e privado das políticas estatais? A morosidade na implementação das políticas de reforma agrária seria uma consequência da intervenção de agentes externos? É notório que a pauta da reforma agrária carece de protagonismo no âmbito político, possivelmente por não ser interessante aos grandes proprietários partilhar latifúndios entre os agricultores, principalmente aquelas componentes da “bancada ruralista”, conjunto de deputados e senadores que congrega os expoentes do agronegócio, ou seus representantes.

A reforma agrária emerge como alternativa promissora para os camponeses, incluindo ribeirinhos, quilombolas, indígenas e outros povos. Com acesso à terra, será possível trabalhar na perspectiva da agroecologia, com agricultura familiar, criação de peixes, apicultura, pecuária, entre outras alternativas de trabalhos. Acreditamos que o campo é lugar de (r)existir, e que nós povos campesinos, precisamos continuar lutando pelo acesso à terra.

A mobilização dos movimentos sociais ao longo dos anos 2000 conferiu impulso à luta pela terra. Conforme enfatizam Ferrante et al (2008, p. 28)[2], “o avanço da luta pela terra tem mantido a reforma agrária na pauta política do estado”, contudo, ainda não se concretizou integralmente. É imperativo enfatizar que a necessidade de reforma agrária transcende a mera posse de terra, abarcando também a disponibilidade de crédito, educação, saúde, habitação e todos os direitos correlatos, visando garantir uma vida digna e de qualidade no campo.

Diante destas questões, é preciso se pensar em políticas públicas e ações afirmativas imediatamente, como: incentivo à agroecologia; retomada dos territórios tradicionais e devolução às comunidades; assentamentos rurais e a reforma agraria. Essas são alternativas para o desenvolvimento sustentável, como prega a agroecologia. Com essas políticas, seria possível o reordenamento do uso das terras em benefício dos povos trabalhadores rurais e contribuir para sua permanência no campo, além de manter suas tradições.

Na comunidade desses autores, o Quilombo Marques, localizado no município de Carlos Chagas, houve uma significativa conquista em 22 de dezembro de 2022, quando obtiveram posse de parte de seu território. Por mais de uma década. A conquista representa a segurança de permanecer no território, especialmente para a juventude. Propicia, também, a prática da agroecologia, já que a terra oferece as condições necessárias, o que incentiva o desenvolvimento das lavouras. Com isso, viabiliza-se a sustentabilidade da terra e a geração de renda para a comunidade.

Em suma, a questão da permanência da população rural nas áreas agrícolas carece de ações coordenadas e políticas deliberadas. A efetivação da reforma agrária, associada ao fomento da agroecologia e à restituição de territórios tradicionais, aparecem como uma via promissora para a construção de um campo sustentável e economicamente viável, um espaço onde as comunidades possam não somente subsistir, mas também prosperar, preservando sua cultura e tradições.


Referências

[1]https://www.researchgate.net/publication/353243084_CAUSAS_E_CONSEQUENCIAS_DO_EXODO_RURAL_NO_NORDESTE_BRASILEIRO_CAUSES_AND_RURAL_EXODUS_AFTERMATH_IN_NORTHEASTERN_BRAZIL

[2]https://bibliotecadigital.economia.gov.br/bitstream/123456789/565/1/Reforma%20agr%C3%A1ria%20e%20desenvolvimento.pdf




*Edson de Souza Santos e Maria Eunice de Souza Franco são acadêmicos da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziram este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre de 2022 (janeiro a junho de 2023). Foram orientadas pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

Eu e a educação

Eu e a educação

Por Jeovana Cardoso Vieira [1]



Em minha infância era comum ter acesso a textos e livros, tanto didáticos quanto infantis, devido ao fato de minha mãe ser professora de Português. Tenho muitas lembranças dela preparando suas aulas, folheando seu material para assim decidir qual o tema da aula do dia seguinte. Sempre tive muita curiosidade. Por isso, estava sempre ao seu lado. Foi ela quem me presenteou com meus primeiros livrinhos, e fazia questão de todas as noites lê-los para mim.

Antes de minha entrada na escola, já tinha conhecimento de muitas coisas. Com 3 anos já conhecia todas as letras do alfabeto e, consequentemente, já sabia escrever o meu nome. Mais adiante, o nome de meus pais, irmã, avó etc. Também conheci os números, e, assim, descobri que 1 + 1 era igual a 2, e que 1 real com 1 real seria igual a 2 reais. Assim, comecei a ter um pouco de conhecimento sobre o dinheiro e seu valor, pois eu sabia que a moedinha de 50 centavos era o valor do meu chocolate favorito.

Na escola, sempre fui a aluna que apresentava o trabalho do grupo, pois era melhor com a leitura e não tinha tanta vergonha de ir na frente da turma ler e explicar determinados temas. No Fundamental I e no Fundamental II, recordo-me que sempre trocava o horário do recreio pela biblioteca, pois adorava poder ajudar as bibliotecárias com os livros. No Ensino Médio, também trocava o recreio pelos livros, mas não pelos da biblioteca e sim pelos que eu mesma levava de casa. Admito que o hábito da leitura ajudou muito em minha vida escolar. Porém, não foi a escola em si que fez com que eu me apaixonasse pelos livros, e que assim fizesse eu ler um livro de mais de trezentas páginas em um único dia. Este mérito eu deixo a J. K. Rowling e sua saga de livros “Harry Potter” (2002 – 2007)”.

Minha matéria preferida na escola era Matemática. Era muito boa em Português e Literatura, porém meu coração era da Matemática. Fazia sentido para mim a prática com os números, e eu conseguia aplicá-las na vida real, em meu dia a dia.

Em meu primeiro ano de universidade noto as diversas coisas que deveria ter aprendido na escola, mas que não me foram ensinadas, como, por exemplo, declarar imposto de renda, fazer uma citação corretamente, quesitos econômicos e burocráticos, dentre outros. Acredito que devido a essa falha educacional eu possa acabar tendo dificuldades em administrar minha vida financeira futuramente. Contudo, sinto falta do que não aprendi e que possa ser de grande valia para minha vida acadêmica. Sei que a educação tem o poder de nos mudar e mudar o mundo, e espero fazer parte desta grande mudança durante minha trajetória como estudante.



[1] Jeovana Cardoso Vieira é graduanda da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziu este relato na disciplina Prática de Leitura e Produção de Textos, ofertada no primeiro semestre de 2023. A organização e edição do material foi feita pelo Projeto de Extensão Aula Digital.

Este trabalho foi orientado pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro, com as ricas contribuições na revisão e organização do tutor Marcos Roberto Rocha.

A revolução verde e o êxodo rural

A revolução verde e o êxodo rural

Por Madilene Geni Ferreira e Maria Flor De Maio De Jesus Silva*

A chamada “revolução” verde refere-se a um conjunto de mudanças que acarretou um problema estrutural na agricultura familiar, pois mudou o modelo de produção sem valorizar as culturas alimentares locais e diversificadas (Santilli, 2009) [1] . Com a promessa de resolver problemas e preservar a estrutura agrícola, a tal revolução chegou no Brasil por volta da década de 1960, porém promoveu o uso intensivo de insumos químicos na agricultura, contribuiu para o êxodo rural e a degradação ambiental.

Enquanto a agroecologia, na contramão, surge como uma alternativa para promover a agricultura sustentável e revitalizar o campo. Como afirma a autora Santili (2009) [1], “[c]om a chegada da revolução verde, a modernização do campo fez com que pequenos produtores fossem expropriados, dando lugar aos moldes empresariais de organização da produção.”

A nova estruturação trouxe efeitos negativos não são somente nas formas de produção, com a monocultura em substituição à diversificação e impactos ambientais, como também na alimentação, pois diminuiu a oferta de alimentos saudáveis e de qualidade, aumentando a fome no mundo. Esses são fatos importantes que as políticas públicas devem observar para assegurar alimentos de qualidade para todos e recursos para acabar com o êxodo rural. Outro ponto refere-se às relações de trabalho que sofreu mecanização e reduziu postos mão de obra.

A monocultura substituiu ecossistemas naturais e, com isso, tornou a produção agrícola mais vulnerável a pragas e doenças, desestruturou a mão de obra, as famílias envolvidas. Consequentemente, o mercado de alimentos, que tinha foco nos orgânicos, abriu espaço para mais alimentos transgênicos. Assim, as sementes que antes eram crioulas passam a ser transgênicas. As terras, que antes eram férteis para produção, tornam-se dependentes de adubos e fertilizantes químicos, que aceleram a produção para as exportações, mas esgotam a terra rapidamente. Esses fatores, combinados com a falta de incentivos para a permanência dos agricultores no campo, levaram a um êxodo rural em larga escala, com consequências sociais profundas.

A agroecologia surge como uma alternativa para promover a agricultura sustentável e revitalizar o campo. Ela é baseada em princípios de equidade, justiça social, sustentabilidade e respeito aos saberes e fazeres ancestrais dos povos do campo. Como explica Gusman and Molina (2005)[2] “O campesinato é, mais que uma categoria histórica ou sujeito social, uma forma de manejar os recursos naturais vinculados aos agroecossistemas locais e específicos de cada zona, utilizando um conhecimento sobre tal entorno condicionado pelo nível tecnológico de cada momento histórico e o grau de apropriação de tal tecnologia…”

A agroecologia propõe uma abordagem holística para a produção de alimentos, que considera a interação entre os seres humanos, os ecossistemas e as culturas, buscando sempre, promover a saúde da sociedade através de uma produção de alimentos de qualidade, garantindo a segurança alimentar. Busca, então, fazê-lo de forma sustentável, por meio não apenas de práticas agroecológicas, como a rotação de culturas, o uso de adubos orgânicos, o controle biológico de pragas e a integração lavoura-pecuária-floresta, mas também promovendo a conservação da biodiversidade, a revitalização e a valorização das culturas tradicionais do campo. Tudo isso fortalece a base familiar, o que fomenta a permanência das famílias no campo.

A participação do poder público, com iniciativas no desenvolvimento rural sustentável, tais com as agroecológicas que trazemos ao debate, pode promover a sustentabilidade ambiental, social e econômica, com inclusão social, redução de danos ambientais e nutricionais, oferta de alimentos saudáveis, garantindo a saúde da população. Dessa forma, são muito bem-vindas ações governamentais com enfoque agroecológico e fomento da agricultura familiar, tais como o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA)[3] e Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE)[4], que ajudam os produtores a fortalecerem suas produções de alimentos sustentáveis e, ainda, refletirem acerca das potencialidades e limitações da agroecologia.

Mesmo que de maneira incipiente, a agroecologia se apresenta como alternativa de um modelo hegemônico do agronegócio, de forma a valorizar o trabalho rural, que é mais que produzir, mas é também cultura, modo de vida e de trabalho, onde se articula e apoia a resistência do campesinato e, sobretudo, a insubordinação do homem do campo e transformação estrutural no modelo que é utilizado no campo, como forma de valorizar a cultura e a resistência do camponês. A adoção de práticas agroecológicas é essencial para enfrentar os desafios da agricultura moderna e garantir a permanência dos agricultores no campo.


Referências

[1] SANTILI, Juliana Agrobiodiversidade e o direito dos Agricultores. São Paulo, Petrópolis 2009.

[2] GUSMÁN, E.S. & MOLINA, M. G. Sobre a revolução do conceito de campesinato, Expressão São Paulo, 2005.

[3] https://www.gov.br/cidadania/pt-br/acoes-e-programas/inclusao-produtiva-rural/paa

[4] https://www.gov.br/secretariadegoverno/pt-br/portalfederativo/guiainicio/prefeito/trilhas-100-dias-de-governo/pnae-2013-programa-nacional-de-alimentacao-escolar




*Madilene Geni Ferreira e Maria Flor De Maio de Jesus Silva são acadêmicas da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziram este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre de 2022 (janeiro a junho de 2023). Foram orientadas pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

Agricultura familiar, agroecologia e sustentabilidade

Agricultura familiar, agroecologia e sustentabilidade

Por Diemerson Rocha da Cruz*

A agricultura familiar é um tipo de agricultura que se baseia em unidades familiares de produção, nas quais a família é a principal responsável pela gestão da propriedade agrícola e pela produção de alimentos. Caracteriza-se pela posse da terra, pelo trabalho familiar e pela transmissão intergeracional do conhecimento e das práticas agrícolas.

Por outro lado, a agroecologia é uma abordagem que busca promover a sustentabilidade agrícola, integrando princípios e práticas ecológicas, sociais e econômicas. Valoriza a conservação dos recursos naturais, a biodiversidade, a saúde dos ecossistemas e a equidade social. A agroecologia enfatiza a utilização de técnicas de manejo sustentáveis, como a rotação de culturas, o consórcio de plantas, a adubação orgânica e o controle biológico de pragas, entre outras.

A agricultura familiar desempenha um papel fundamental na preservação da biodiversidade, pois os agricultores familiares adotam práticas agrícolas promovem a conservação dos recursos naturais e a manutenção da diversidade biológica. Conforme destacou Silva et al. (2018)[1], a agricultura familiar contribui para a preservação da biodiversidade ao utilizar técnicas agroecológicas, como o manejo integrado de pragas, o uso de adubos orgânicos e a diversificação de culturas. Essas práticas auxiliam na redução da dependência de agroquímicos, protegendo a saúde dos ecossistemas e favorecendo a presença de espécies nativas, assim como a conservação da fauna e flora local.

Além disso, os agricultores familiares costumam manter áreas de vegetação nativa em suas propriedades, como fragmentos de florestas, matas ciliares e áreas de reserva. Esses espaços fornecem habitat e abrigo para diversas espécies de plantas e nimais, o que contribui para a manutenção da biodiversidade[2].

A preservação das sementes crioulas, variedades tradicionais adaptadas às condições locais, e sua manutenção e intercâmbio é uma prática comum na agricultura familiar, o que contribui para a preservação da diversidade genética das culturas agrícolas. Dessa forma, a agricultura familiar, por meio de suas práticas sustentáveis e do cuidado com os recursos naturais, desempenha um papel essencial na conservação da biodiversidade.

A agricultura familiar oferece diversos benefícios em comparação ao agronegócio. Estudos e pesquisas têm enfatizado esses benefícios, ressaltando a importância da agricultura familiar para a sociedade e o meio ambiente. Através da adoção de práticas sustentáveis, ela promove a preservação ambiental. Segundo um estudo realizado por Teixeira e Silva (2020)[3](…) a agricultura familiar é caracterizada por um menor uso de agroquímicos, favorecendo a preservação da biodiversidade e a conservação dos recursos naturais.”

Essas práticas agrícolas mais amigáveis ao meio ambiente contribuem para a manutenção dos ecossistemas e a proteção da flora e fauna locais. Além disso, a agricultura familiar desempenha um papel significativo na segurança alimentar e na promoção de uma alimentação saudável. De acordo com a pesquisa conduzida por Cruz et al. (2021)[4], ” … agricultura familiar é responsável por uma parcela considerável da produção de alimentos, especialmente de frutas, hortaliças e produtos orgânicos, contribuindo para a diversificação da dieta e o acesso a alimentos frescos e nutritivos”.

Essa diversificação de culturas e a produção local de alimentos desempenham um papel crucial na redução da dependência de alimentos processados e importados, promovendo uma alimentação mais saudável e equilibrada. Tais evidências reforçam a importância da agricultura familiar como uma alternativa mais sustentável, valorizando a preservação ambiental e a segurança alimentar em comparação ao modelo predominante do agronegócio.

No contexto brasileiro, a agricultura familiar estabelece uma relação muito mais favorável com ao ambiente em comparação a outros tipos de agricultura, que resulta de uma série de práticas e características tradicionalmente adotadas, que colaboram com a preservação dos recursos naturais e à sustentabilidade. Uma das principais diferenças está no uso de insumos agrícolas. Os agricultores familiares tendem a utilizar menos agrotóxicos e fertilizantes químicos quando comparados à agricultura de larga escala. Essa prática reduz a contaminação do solo, da água e do ar, o que contribui para a preservação da biodiversidade e proteção de ecossistemas. Além disso, a agricultura familiar valoriza a adoção de práticas agroecológicas, como o manejo sustentável do solo, a rotação de culturas, o plantio consorciado e a utilização de adubos orgânicos. Esses métodos favorecem a conservação do solo, melhoram sua fertilidade e reduzem a erosão, contribuindo para a saúde dos ecossistemas agrícolas.

Outro aspecto importante é a diversificação de culturas e a preservação da agrobiodiversidade. Os agricultores familiares cultivam uma variedade de espécies e variedades locais, promovendo a conservação da diversidade genética e contribuindo para a adaptação aos desafios climáticos e a resiliência dos sistemas agrícolas. Além dos já citados benefícios ambientais, essas práticas contribuem para a mitigação das mudanças climáticas, uma vez que se baseiam em sistemas produtivos mais resilientes e com menor emissão de gases de efeito estufa.

Atualmente, a agricultura familiar está recebendo maior atenção e reconhecimento, tanto por parte das políticas públicas, quanto da sociedade em geral. As políticas públicas voltadas para a agricultura familiar concentram-se em fornecer apoio e incentivos específicos para esse setor, com inciativas como o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) e o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA)[5]. Velhos conhecidos do campo, apesar da queda de verba dos últimos anos, esses programas têm sido (re)implementados para garantir o acesso a crédito, assistência técnica, mercados e compras públicas, fortalecendo, assim, a produção e a comercialização dos agricultores familiares.

No contexto das desigualdades sociais, a agricultura familiar desempenha um papel importante na geração de empregos e no desenvolvimento das comunidades rurais. Ela contribui para a fixação das pessoas no campo, o fortalecimento das relações comunitárias e a preservação das tradições culturais e conhecimentos tradicionais. Assim, é importante que a agricultura familiar receba mais atenção e valorização por meio de políticas públicas e programas específicos, que fortaleçam o setor, promovam sua sustentabilidade e reconheçam sua importância para a sociedade como um todo, tal como parece acontecer desde a ascensão do último governo federal.


Referências

[1] Silva, L. M. et al. (2018). Contribuição da Agricultura Familiar para a Biodiversidade. Revista Brasileira de Agroecologia, 13, 95-109.

[2] Schneider, S. et al. (2019). Agricultura Familiar e Biodiversidade: contribuições para uma agenda positiva de desenvolvimento. Revista de Política Agrícola, 28(3), 20-30.

[3] Teixeira, V. F., & Silva, C. M. (2020). Agricultura familiar e sustentabilidade ambiental: uma revisão sistemática da literatura.

[4] Cruz, G. C. et al. (2021). Agricultura familiar: importância para a segurança alimentar e nutricional.

[5] Ribeiro, V. M. (2018). Agricultura familiar no Brasil: ações governamentais e desafios na atualidade.




* Diemerson Rocha da Cruz é acadêmico da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziu este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre de 2022 (janeiro a junho de 2023). Foi orientado pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

A vida através de letras e números

A vida através de letras e números

Por Jairo César da Silva [1]



Na minha casa sempre existiram alguns livros da minha mãe. Na casa da minha tia, por ser professora, também havia algumas revistas e livros antigos, de estórias, fábulas, nos quais eu gostava de ficar olhando as figuras. Não entendia quase nada. Foi assim que se deu meu primeiro contato com livros, e, partindo daí, comecei a querer escrever. Com 4 anos, eu ficava tentando escrever com a ajuda da minha mãe, principalmente as letras do meu nome.

Quando comecei a estudar, foi espetacular, tudo era novo, tudo era diferente. Eu estudava no período vespertino e, quando chegava em casa, já ficava ansioso para chegar o outro dia e ir para o colégio. Meu pai comprou uma televisão algum tempo após eu iniciar os estudos. Quando eu terminava as tarefas escolares, minha mãe deixava eu assistir desenhos. Foi assim que comecei a aprender a contar até 10, pois nos desenhos tinha a brincadeira de esconde-esconde e os personagens contavam.

Sempre gostei de matemática. Meu pai me deu uma calculadora que utilizava no trabalho. Eu passava horas com o aparelho. Não compreendia o que estava fazendo, mas gostava dos números, de ficar apertando os botões e vendo os resultados que apareciam. As finanças, comecei a aprender com 6 anos. Quem nunca juntou moedas? Eu juntava no meu cofrinho. Comecei a entender sobre as notas um pouquinho mais tarde, com a ajuda da minha mãe. Quando comecei a aprender matemática na escola, perguntei à minha mãe se para formar 15 reais poderíamos utilizar uma nota de 1 real e uma de 5 reais, igual fazíamos na escola. E foi assim que ela me ensinou a somar e a saber o troco.

A escola foi de total importância para mim, pois aprendi sobre a cultura de muitos colegas, mesmo simples coisas como o dia a dia de todos, o que me ajudou a entender o porquê de outras coisas. A arte de escrever começou muito cedo. Produzíamos alguns textos, principalmente no Fundamental I e, às vezes, no Fundamental II. Ganhei um livro que continha 3 histórias. Eu li essas histórias várias e várias vezes. Imaginava os cenários, os personagens, o desenrolar dos fatos.

Hoje sinto que eu deveria ter feito uso ainda mais da prática de leitura, pois tudo parte dela. Para escrever bem, você precisa ler. Pelo fato de não ter praticado muito a escrita de textos durante a minha vida escolar, sinto uma dificuldade enorme hoje em produzir textos. Com relação a colocar a ideia no papel, eu consigo imaginar tudo; porém, quando vou transcrever, “trava”, não consigo exprimir as ideias que estão em minha mente. Sempre leio com o objetivo de melhorar a minha escrita. Eu gosto de artigos científicos, principalmente os que têm aplicação entre as exatas e o cotidiano. A forma como a matemática é utilizada para explicar questões diárias é fantástica.

No dia a dia, sinto uma falta enorme de alguns conhecimentos, principalmente de dominar melhor a escrita. É uma das maiores (senão a maior) dificuldade que tenho. Outro conhecimento que sinto falta é a parte de educação financeira, que deveria ser inserida nas escolas. Claro, as aulas de juros são aplicadas diariamente. No entanto, com relação às questões normais do meu dia a dia, precisei buscar o conhecimento em outros locais, sem saber até mesmo qual norte tomar. Essa parte do conhecimento eu sinto falta e sei que se tivesse acesso a algumas questões hoje em dia elas seriam resolvidas mais facilmente.

Enfim, a leitura e a escrita abrem portas, criam caminhos. O conhecimento é um presente que ninguém poderia tirar de você, e com ele você pode chegar aonde quiser, pois ele é como uma escada, de degrau em degrau você chega ao topo.



[1] Jairo César da Silva é graduando da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziu este relato na disciplina Prática de Leitura e Produção de Textos, ofertada no primeiro semestre de 2023. A organização e edição do material foi feita pelo Projeto de Extensão Aula Digital.

Este trabalho foi orientado pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro, com as ricas contribuições na revisão e organização do tutor Marcos Roberto Rocha.

Diversidade de famílias e famílias diversas

Diversidade de famílias e famílias diversas

Por Marília Gabriela Rodrigues da Silva e Vitória Cristina Alves *

É na família que se inicia a socialização fundamental para a formação dos indivíduos. No Brasil, há diversidades nas composições familiares, pois temos exemplos de famílias patriarcais, matriarcais, monoparentais, homoafetivas, anaparentais, matrimoniais, pluriparentais, dentre outras. Dessa forma, é excludente uma definição de família associada somente a casais heterossexuais.

Compreende-se que a ideia da família tradicional brasileira, tão discutida nos últimos anos, corresponde à antiga família patriarcal de origem colonial, onde o homem é o provedor da família e a mulher, assim como os filhos, estão submissos a ele. No entanto, como pontua Paiva (2016, s. p.)[1], “[p]ouco mais da metade (54,9%) das famílias no Brasil é constituída por um casal heterossexual com filhos. Os outros (45,1%) se desdobram em uma pluralidade de arranjos”. 

Ainda que de maneira sutil,  esse cenário começou a se modificar, pois já é possível perceber uma melhoria na igualdade de gênero, por exemplo, no mercado de trabalho, além da lei do casamento LGBTQIA+ e outras. Contudo, o mesmo não ocorre nos lares das famílias brasileiras, visto que as mulheres continuam sobrecarregadas pela jornada dupla, enfrentando tanto o trabalho formal quanto as tarefas domésticas, bem como os cuidados com os filhos. Trata-se da construção cultural brasileira, conforme Borsa e Nunes (2011, p. 32-33)[2], “[…] na família ocidental os papéis de homens e mulheres têm sido diferentes e essas diferenças se evidenciam, por exemplo, no fato de que o trabalho doméstico e o cuidado da prole continuam sendo atribuídos à mulher, prioritariamente”.

Ainda sobre a excludente definição de família, existe a Lei 9.278, de 10 de maio de 1996[3],  que reconhece como entidade familiar o convívio de um homem e uma mulher, o que reforçando uma única forma de composição familiar. No entanto, desde 2011 o casamento LGBTQIA+ é legalizado no Brasil. Mas o que se vê é que ainda existem preconceitos relacionados a esse grupo, alguns deles têm como base estereótipos e discriminações enraizadas, como supor que esses casais podem influenciar a identidade de gênero ou a orientação sexual do indivíduo adotado. Vale ressaltar as muitas adoções realizadas por pertencentes do público LGBTQIA+ e a alta demanda de crianças aguardando por adoção no Brasil. Dessa forma, é inadmissível que existam preconceitos acerca desse assunto, que quase sempre vem daqueles que dizem estar a favor da família.

Uma comissão especial das Câmara dos Deputados, em 24 de setembro de 2015, rejeitou uma ampliação para o conceito de família no Estatuto da Família (Projeto de Lei 6.583/13)[4] e manteve o entendimento legal de família apenas aquela formada por homem, mulher e filhos. Trata-se, claramente, de uma violação discriminatória e preconceituosa, pois milhões de brasileiros não se enquadram nessa definição. Como afirma Paiva (2016, s.p.)[5]:

Precisamos estar atentos para não tomarmos esse modelo imaginário como único, verdadeiro, correto e saudável. Se tomarmos assim, estaremos tratando todas as outras famílias como ‘desestruturadas ou em crise’ e tratando a diferença como desigualdade, o que leva a relações de assimétricas e não democráticas. A intolerância com a diferença leva à patologização, à judicialização e à criminalização dos diferentes.”

Apesar de já ser reconhecida pela justiça algumas composições familiares não “tradicionais”, diante da realidade, existe a necessidade de ampliar o conceito de família, pois é preciso uma lei que acolha e inclua todos os tipos de composições familiares, de todos os sujeitos. É indispensável que as famílias homoafetivas sejam incluídas no Estatuto da Família, para que, desse modo, seja possível refletir sobre essas diferentes configurações familiares dentro da escola, espaço importante de socialização do indivíduo. Esses conteúdos devem ser inseridos nos Planos de Cursos da educação do governo para reeducar os nossos jovens, a começar pela educação infantil, de forma singela, com atividades, por exemplo, onde as crianças possam identificar em qual composição familiar se enquadram e ampliar essas visões com os exemplos dos coleguinhas. No decorrer dos anos escolares questões mais complexas podem ser trabalhadas e debates são importantes para as grandes reflexões e reformas humanas, sobretudo de consciência.


Referências

[1] PAIVA, Thais. Por uma nova (e ampla) definição de família. Carta Capital. 2016. Disponível em: <https://www.cartacapital.com.br/educacao/por-uma-nova-e-ampla-definicao-de-familia/>. Acesso em: 10/03/2023. 

[2] BORSA, Juliane Callegaro. NUNES, Maria Lucia Tiellet. Aspectos psicossociais da parentalidade: O papel de homens e mulheres na família nuclear, 2011. Disponível em: <https://www.researchgate.net/publication/258032978>. Acesso em: 14/03/2023.

[3] Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9278.htm#:~:text=Dissolvida%20a%20uni%C3%A3o%20est%C3%A1vel%20por%20morte%20de%20um%20dos%20conviventes,destinado%20%C3%A0%20resid%C3%AAncia%20da%20fam%C3%ADlia.>

[4] Disponível em: <https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra;jsessionid=47FC186CDB5C27E515DF6EEB0712A562.proposicoesWeb2?codteor=1398893&filename=Avulso+-PL+6583/2013>

[5] Disponível em: PAIVA, Thais. Por uma nova (e ampla) definição de família. Carta Capital. 2016. Disponível em: <https://www.cartacapital.com.br/educacao/por-uma-nova-e-ampla-definicao-de-familia/>. Acesso em: 10/03/2023.




* Marília Gabriela Rodrigues da Silva e Vitória Cristina Alves são acadêmicas da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziram este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre de 2022 (janeiro a junho de 2023). Foram orientadas pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

Genocídio Indígena

Genocídio Indígena

Por Carla Batista Dias e Ingred Pereira da Silva*

O genocídio dos povos originários é causado principalmente pelos conflitos fundiários. Inúmeras vidas indígenas foram e são ceifadas no enfrentamento para proteger e defender suas terras, garantindo a permanência de seus povos nelas. Nos conflitos fundiários, ocorre um verdadeiro genocídio desses povos, que perdem a vida diretamente no confronto, usando seus corpos como barreira para enfrentar a invasão ou sendo assassinados por serem lideranças e usarem suas palavras como ferramenta de luta. Indiretamente, morrem devido aos danos e efeitos causados pelas invasões em suas vidas.

Esses conflitos nos quais os indígenas se envolvem com latifundiários, fazendeiros, madeireiros, garimpeiros (entre outros) ilegais são temas de debates diários significativos. Apesar dos constantes ataques, as lideranças indígenas resistem na luta, contando com o apoio de indigenistas, ONGs e outros parceiros que fortalecem o debate. Essa resistência é frequentemente afetada pelas ameaças e assassinatos dessas lideranças, estratégias utilizadas para silenciar e intimidar seus povos e comunidades, com o intuito de desencorajar a resistência e a perda de suas terras. Como resultado, esses invasores ilegais avançam e usufruem indevidamente da riqueza presente nas terras indígenas, afetando diretamente o modo de vida desses povos.

Os ataques ocorrem, na maioria das vezes, com a conivência do poder público, que, por interesses políticos, fecha os olhos quando deveria proteger e defender os povos originários. Como evidenciado pela reportagem do Brasil de Fato: “Confinados em pequenos territórios, os indígenas enfrentam o poder político e policial dos ruralistas e pagam com a vida.” A negligência e o descaso das autoridades fazem com que elas se isentem da responsabilidade que possuem. É nesse momento que tragédias e genocídios acontecem, como o que ocorreu com os Yanomami, conforme demonstra a reportagem de Andría Vedélio da Agência Brasil, que aponta um levantamento do Ministério da Saúde que “(…) registrou três óbitos de crianças indígenas nas comunidades Keta, Kuniama e Lajahu entre 24 e 27 de dezembro de 2022. No ano de 2022, foram registrados 11.530 casos confirmados de malária na terra Yanomami.”[1]

Além desses conflitos, os povos originários enfrentam notícias falsas que fortalecem a ação dos invasores, como uma fala do ex-presidente Jair Bolsonaro, numa tentativa de invalidar a luta dos indígenas por suas terras em nome do que considera um “avanço”: “Há muita terra para poucos índios. A minha decisão é não demarcar mais terras para os índios.”[2] Trata-se de uma inverdade, pois há indígenas para todas as terras, e a extensão da terra é um fator importante para que esses povos possam viver de acordo com suas tradições, as quais também preservam seus territórios.

Um avanço que indica dias melhores são os representantes políticos eleitos, como Sônia Guajajara, indicada ao Ministério dos Povos Originários no governo Lula. Isso marca um começo importante para o desenvolvimento de políticas públicas que garantam a vida dos povos originários em seus territórios. Esses representantes políticos, ao contrário do ex-presidente, devem promover e perpetuar o discurso da valorização e proteção desses povos, ampliando e valorizando projetos agroecológicos nos territórios indígenas e arredores, como o projeto Etno Desenvolvimento Ceará Indígena[3], que, com base na agroecologia, contribui para a preservação da cultura e saberes dos povos originários. Esses projetos também possibilitam que eles vivam da maneira tradicional, preservando suas identidades, a relação com a terra e a própria terra.

O posicionamento positivo do governo, principalmente por meio das declarações do Presidente da República, é fundamental para avançar e acabar com o genocídio indígena, garantindo a proteção dos povos originários. Além disso, é fundamental fortalecer a demarcação de terras dos territórios indígenas, com assistência social e sanitária nessas áreas, garantindo equidade e dignidade à população. Além disso, é importante fortalecer o debate e construir novas políticas públicas que contribuam para a defesa dos povos originários e garantam uma coexistência saudável com esses povos e territórios.

O território é de suma importância para os povos originários, pois faz parte de quem eles são, sendo uma extensão deles e de suas culturas. Como Marciane Tapeba defende em sua fala no texto publicado pela Associação para Desenvolvimento Local Co-produzido (ADELCO)[4]: “Para nós, povos indígenas, a maior bandeira é o território. E não apenas o território da terra, mas do bem-viver, do cultivo saudável, de viver em harmonia.

Referências

[1]Disponível em: <https://agenciabrasil.ebc.com.br/saude/noticia/2023-01/ministerio-da-saude-declara-emergencia-em-saude-em-territorio-yanomami>.

[2]Disponível em: <https://economia.uol.com.br/noticias/bloomberg/2019/08/30/bolsonaro-quer-rever-demarcacoes-muita-terra-para-pouco-indio.htm>.

[3]Disponível em: <https://adelco.org.br/geral/praticas-agroecologicas-mantem-tradicao-e-cultura-indigena/>.

[4] Disponível em: < https://adelco.org.br/geral/praticas-agroecologicas-mantem-tradicao-e-cultura-indigena/>




* Carla Batista Dias e Ingred Pereira da Silva são acadêmicas da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziram este relato na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre de 2022 (janeiro a junho de 2023). Foram orientadas pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

A tecnologia como parte das minhas aprendizagens

A tecnologia como parte das minhas aprendizagens

Por Ihuan David Gomes Ferreira [1]



A minha família gosta de dizer: “Quando você chegou do hospital pela primeira vez e entrou em casa, não tirava os olhos da TV”. Esse é um fato muito importante, já que alguns programas de televisão tiveram um papel significativo na minha educação. O acesso a materiais escritos era possível por meio da biblioteca municipal da minha cidade. Meus irmãos eram bons alunos, então um deles, em especial, sempre me incentivava a ler e até chegou a me dar alguns livros de presente, mas devo confessar que os desenhos animados eram mais atraentes.

O desenho que mais me chamava a atenção se chamava “Cyber Chase”, transmitido pela TV Cultura. Ele retratava problemas do cotidiano resolvidos através da matemática. Aquilo me fascinava. A excelente forma de ensinar e divertir garantia a minha permanência na frente da TV e influenciou o meu gosto pela matemática.

Por volta dos 6 anos de idade, quando comecei a ter que ir ao supermercado, que ficava próximo a minha casa (e como era de costume, o filho caçula quase sempre tinha a difícil tarefa de ir ao supermercado realizar pequenas compras ou até mesmo comprar alguns pães na padaria), fui estimulado a realizar pequenas operações matemáticas para conferir o troco. Com isso, consegui colocar em prática o que aprendia na escola e nos programas de TV aplicando a matemática em situações reais, em forma de operações.

Foi somente quando frequentei o primeiro ano do Ensino Fundamental que comecei a ler e escrever de forma adequada. O uso do caderno de caligrafia foi importante nesse processo, pois foi com a ajuda da minha professora do primeiro ano, e muita persistência da minha família, que consegui evoluir na escrita. Escrevia carta para a minha irmã contando como tinha sido o meu dia ou até demonstrando o quando gostava dela. Ela sempre as recebia muito feliz e lia com atenção. Algumas delas estão guardadas até hoje.

Nos anos iniciais éramos motivados a criar contos fictícios ou contos de fadas envolvendo criaturas que podiam ou não ser reais. Já nos anos finais, os textos eram mais voltados ao conteúdo de cada matéria, com o incentivo a estabelecer uma opinião e uma crítica sobre um determinado assunto. Por fim, o Ensino Médio era bem focado em textos dissertativos, visando preparar os alunos para o ENEM. Ao longo dos 3 anos eram debatidos métodos de escrita e regras que deveriam ser seguidas, fato que foi sem sombra de dúvidas essencial no momento da prova. A maioria dos professores influenciava os alunos a usarem os livros da biblioteca da escola, mas grande parte dos livros eram pouco interessantes aos adolescentes. Então, a professora do nono ano teve uma ideia: propôs que os alunos compartilhassem os seus livros com outros alunos, tendo ela como intermediária. Isso despertou em mim o interesse em uma famosa série de livros entre os meus colegas: tratava-se de “Percy Jackson e os Olimpianos”, de Rick Riordan, pela editora Intrínseca. Desde então, já li outras obras do autor, pois ele aborda um lado interessante de algumas mitologias.

Acredito que a vida universitária tenha me afetado de forma positiva, pois passei a ficar mais tempo lendo textos e estudando. As apostilas, verbetes, slides e cartilhas apresentadas, na maioria das vezes, suprem a informação necessária e as videoaulas disponibilizadas quase sempre são diretas e efetivas. Acredito que a tecnologia teve um papel importante na minha educação. É claro, em atividade conjunta com a escola e a família. A universidade, através da EAD, é uma nova etapa que dependerá de forma imensa dessa ferramenta. É claro que alguns conhecimentos de língua portuguesa ou matemática foram esquecidos, ou de alguma forma não estudados, mas sou muito grato a todas as oportunidades que me foram apresentadas e desejo continuar evoluindo não só como estudante, mas como pessoa e futuro profissional da área da educação.



[1] Ihuan David Gomes Ferreira é graduando da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziu este relato na disciplina Prática de Leitura e Produção de Textos, ofertada no primeiro semestre de 2023. A organização e edição do material foi feita pelo Projeto de Extensão Aula Digital.

Este trabalho foi orientado pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro, com as ricas contribuições na revisão e organização do tutor Marcos Roberto Rocha.

Da Escravidão à Agroecologia

Da Escravidão à Agroecologia

Por Maria Helena Ferreira Brito Santos Renato Aparecido Teixeira*

É importante que se esclareça que o trabalho escravo é uma prática que consiste na exploração de trabalhadores em condições desumanas e degradantes, sem o pagamento adequado e outros tipos de desrespeito aos direitos trabalhistas como locais insalubres, ausência de folgas e férias.

Obviamente, a escravidão é ilegal no nosso país, mas em sua forma “moderna”, que também viola os direitos humanos fundamentais, continua presente em diferentes esferas da sociedade (MIRAGLIA, et al. 2018)[1]A escravidão, no Brasil, remete à conquista dessas terras pelos portugueses no século XVI. A princípio, alguns indígenas foram escravizados, mesmo que com muita resistência. Depois foram os africanos trazidos à força para serem explorados em plantações de açúcar, tabaco, algodão, café e outras culturas. Hoje essas monoculturas são controladas, em grande maioria, pelo agronegócio.

Segundo Marquese (2006) [2], o tráfico negreiro atingiu seu auge entre os séculos XVIII e XIX, quando o Brasil se tornou o maior destino de escravos africanos nas Américas. Estima-se que cerca de 4 milhões de africanos tenham sido trazidos para o país durante o período de exploração portuguesa. Tratados como mercadorias, na condição de escravos, africanos de diversas etnias eram forçados a trabalhar em condições desumanas, sem direitos ou liberdade, cumprindo longas horas de trabalho, muitas vezes em condições insalubres e perigosas. Com frequência eram submetidos a castigos físicos e psicológicos severos.

A escravidão no Brasil foi teoricamente abolida em 13 de maio de 1888, com a assinatura da Lei Áurea pela Princesa Isabel (PINTO, 2021)[3]. No entanto, o gesto não significou a completa libertação dos escravizados, que foram deixados sem terra, sem educação, sem emprego e sem recursos para sobreviver. Ainda hoje, o legado da escravidão é sentido na sociedade brasileira, como as profundas desigualdades socioeconômicas que afetam negativamente e, sobretudo, a população negra, propiciando inclusive inúmeras formas de trabalhos análogos à escravidão.

No Brasil, o trabalho escravo é considerado crime pelo Art. 149 do Código Penal, onde aparece claramente a questão da “redução à condição análoga à de escravo”; alterado pela Lei 10.803, de 11 de dezembro de 2003[4]. O combate ao trabalho escravo é uma responsabilidade do Estado, mas também cabe à sociedade, sobretudo trabalhadores e empresas, assumir um papel ativo na luta contra essa prática, por meio da conscientização e medidas concretas para sua erradicação.

No agronegócio brasileiro, o trabalho escravo é um problema crônico, percebido desde a era colombiana e que afeta milhares de trabalhadores no país, ainda hoje. Segundo a Organização Internacional do Trabalho – OIT (2021)[5], milhares de pessoas, nas zonas urbanas e rurais, ainda são exploradas, por meio do trabalho forçado, da servidão por dívida, da submissão a condições degradantes de trabalho e de jornadas exaustivas.

Segundo dados da Agência Brasil (2023) [6], em 2022 foram resgatados 2.575 trabalhadores em condições análogas à escravidão em atividades relacionadas ao agronegócio. Entre as atividades com maior incidência de casos, destacam-se a produção de grãos, cana-de-açúcar, pecuária e a colheita de café, frutas e verduras.

A OIT (2021) [5] traz ainda que, entre 1995 e 2020, foram registrados mais de 55 mil trabalhadores resgatados em todo o país, sendo que cerca de 30% deste quantitativo estavam em atividades ligadas ao agronegócio. Além disso, os estados com maior número de casos de trabalho escravo são Minas Gerais, Pará, Mato Grosso e Goiás.

A pressão econômica exercida por grandes produtores que utilizam mão de obra análoga à escravidão muitas vezes dificulta a adoção de medidas que possam garantir condições de trabalho dignas para os trabalhadores do campo. Por isso, é importante perceber que a sociedade capitalista é refém do consumismo, não se importando com a origem e modo de produção do que consome diariamente.

Em uma perspectiva educativa baseada na agroecologia, em uma abordagem holística e que busca promover a sustentabilidade ambiental, social e econômica na agricultura (ARAUJO, 2020)[7], é possível elaborar e distribuir produtos educacionais, como uma “Cartilha”, com enfoque em conscientizar e desnudar o trabalho análogo à escravidão, principalmente no meio rural. Uma “cartilha”, ou materiais informativos similares, poderiam ser disseminados por setores como da educação formal, em escolas da Educação Básica no Campo e na Cidade, órgãos públicos pontos de acesso a público numeroso, Sindicatos, ONGs e outros parceiros diversos, de acordo com os contextos locais. Se existem grandes programas de materiais didáticos no país, a exemplo do Programa Nacional do Livro Didático (PNLD), não cremos que seria um problema logístico e financeiro produzir um material voltado para conscientizar as pessoas sobre o trabalho análogo à escravidão no agronegócio e para promover a agroecologia como uma alternativa sustentável e socialmente justa para a agricultura. A questão pode ser política.


Referências

[1] MIRAGLIA, Lívia Mendes Moreira et al. Trabalho escravo contemporâneo: conceituação, desafios e perspectivas /Lívia Mendes Moreira Miraglia, Julianna do Nascimento Hernandez, Rayhanna Fernandes de Souza Oliveira (organizadoras). – Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2018. 240 p. : il. ; 23 cm. – (Série Estudos do PPGD – UFMG).

[2] MARQUESE, Rafael de Bivar. A dinâmica da escravidão no Brasil: resistência, tráfico negreiro e alforrias, séculos XVII a XIX. Scielo – São Paulo. Disponível em: https://www.scielo.br/j/nec/a/xB5SjkdK7zXRvRjKRXRfKPh/. Acesso em: 26 de mar. de 2023.

[3] PINTO, Patrícia Duarte. Narrativas da abolição da escravidão no Brasil em livros didáticos de história (1889-1930). 2021. Dissertação de Mestrado. Universidade Federal de Pelotas.

[4] BRASIL. Lei nº 10.803, de 11 de dezembro de 2003. Altera dispositivos do Decreto Lei nº 2848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, e dá outras providências. Disponível: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/2003/L10.803.htm#art149. Acesso em: 27 de mar. de 2023.

[5] OIT. Organização Internacional do Trabalho. Manifesto digital do MPT, OIT e Unicamp mobiliza artistas no combate ao trabalho escravo no Brasil. Disponível em: https://www.ilo.org/brasilia/noticias/WCMS_767652/lang–pt/index.htm.Acesso em: 27 de mar. de 2023.

[6] CORRÊA, Gabriel. Trabalho escravo: 2.575 pessoas foram resgatadas em 2022. Agência Brasil. Publicado em 25/01/2023 – São Luís. Disponível em: https://agenciabrasil.ebc.com.br/direitos-humanos.  Acesso em: 26 de mar. de 2023.

[7] ARAUJO, Keila Cássia Santos et al. Tecendo saberes com educadoras e educadores–uma proposta de Educação e Agroecologia. Cadernos de Agroecologia, v. 15, n. 2, 2020.




* Maria Helena Ferreira Brito Santos e Renato Aparecido Teixeira são acadêmicos da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziram este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre de 2022 (janeiro a junho de 2023). Foram orientados pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

Os povos tradicionais, o direito de modos de vida próprio e a nossa realidade

Os povos tradicionais, o direito de modos de vida próprio e a nossa realidade

Por Ana Roberta Cléo dos Santos Ferreira e Claudemar Alves Ferreira*

Quilombo de Raiz / Presidente Kubitscheck-MG

No decreto n° 6.040, de 7 de fevereiro de 2007[1], artigo 2º, está expresso que os povos tradicionais têm o direito de ter seus modos próprios de vida. Mas percebe-se que, na prática, o direito assegurado. Esse cenário só está assim por ação de mineradoras, garimpos ilegais e agronegócio nos territórios nos quais, teoricamente, os modos de vida tradicionais deveriam estar protegidos.

Os povos de comunidades tradicionais carregam em suas memórias, e sobretudo em suas práticas cotidianas, seja no plantio, ou no feito do alimento, tradições de suas ancestralidades, relacionadas às condições social, econômica e cultural, que sem um ambiente ecologicamente equilibrado fica inviabilizado. Têm um modo de fazer, ser e viver próprio, definido pelas relações territoriais, preservação da memória, saberes tradicionais diversos, mas sobretudo no uso de recursos naturais, ou seja, todo um patrimônio cultural material e imaterial historicamente construídos. E se reconhecem como um grupo, que são portadores de uma identidade própria e que deve ter seus direitos preservados, tal como aponta o Decreto 6040[2], no seu Inciso I, do art. 3.º, de 7 de fevereiro de 2007, que define comunidades tradicionais:

 (…) grupos culturalmente diferenciados e que se reconhecem como tais, que possuem formas próprias de organização social, que ocupam e usam territórios e recursos naturais como condição para sua reprodução cultural, social, religiosa, ancestral e econômica, utilizando conhecimentos, inovações e práticas gerados e transmitidos pela tradição.

Esse mesmo decreto garante que essas identidades e modos de vida sejam garantidos, no seu artigo 2º que diz:[3] “Reconhecer, proteger e promover os direitos dos povos e comunidades tradicionais sobre os seus conhecimentos, práticas e usos tradicionais”. No entanto, para comunidades como o Quilombo de Raiz, no município de Presidente Kubitscheck/MG, onde vivem estes autores, a lei fica somente no papel, pois o direito da terra é de grandes fazendeiros. Com isso, os moradores do Quilombo de Raiz tiveram o acesso privado a essas terras, o que garantiria sua relação territorial e seus modos de próprios de vidas, pois é nessas terras que faziam suas atividades tradicionais como apanhar flores de sempre-vivas, lenha e esterco, coletar ervas medicinais etc.

Com a presença dos “homens de poder”, os moradores da comunidade encontram-se encurralados em seu próprio território, que tem grande valor patrimonial e cultural. Como resultado da ação externa tão perto, a comunidade perdeu muito do seu vínculo cultural com tradições dessas terras. O que contraria o artigo 225 da Constituição Federal de 1988[4] que afirma: “Todos têm o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo essencial à sadia qualidade de vida.”

Atualmente, 90% do território do Quilombo de Raiz encontra-se nas mãos de grandes donos de empreendimentos, que fazem desse território uma grande fonte de renda com a monocultura de eucalipto e a mineração, ignorando os vastos prejuízos aos verdadeiros donos e posseiros das terras, o povo quilombola. O território onde era feita a coleta de sempre vivas, frutos do cerrado, ervas medicinais entre outros, uma das formas de sustentos da comunidade, hoje está coberto pela monocultura de eucalipto e área restrita de acesso pela mineradora.        

No Brasil, são vários os direitos das comunidades tradicionais que são violados, tal como o exemplo dado. Infelizmente, a maioria desses territórios está nas mãos de grandes fazendeiros que têm apoio político. Esses, sem conhecer a realidade desses territórios ou com interesses particulares, liberam licenças de exploração das áreas, que muitas vezes resultam em grande prejuízo e destruição para a população local. Destroem o coração de um povo que vive e depende desses espaços para sobreviver, mas perdem até a dignidade. Quando chegam a promessa é sempre de trazer benefícios, o que de fato nunca acontece, pois objetivo de sempre é extrair recursos naturais para vender.

Outro exemplo de domínio de terras e destruição de população e culturas recente é o caso das terras indígenas ianomâmi, no norte do país. Ao invés de benefícios, segundo noticiado largamente[5], os invasores levaram a esses povos doenças, desnutrição, poluição de águas, abusos de toda sorte, inclusive sexual. Assim vão acabando com a memória daquele povo e de muitos outros, que em cada pedaço de seus territórios têm uma parte de suas histórias.

Na ausência de uma atuação política institucional forte, como vimos nos últimos anos de governo que permitiu que a tragédia se abatesse sobre os ianomâmis, a população deve buscar novos recursos e parcerias para reivindicar os direitos e fortalecer suas lutas. É importante, também, realizar debates nas comunidades sobre seus direitos, de maneira crítica e biscando entender o que está sendo ou pode ser violado. Há em algumas comunidades protocolos de defesa dos principais direitos, mas cabe aos moradores entenderem esses protocolos, as leis que os regem, e tê-los em mãos para buscar ajuda de autoridades sempre que necessitarem, no caso de violação dos territórios e outras violências.


[1] Disponível em <https://presrepublica.jusbrasil.com.br/legislacao/94949/decreto-6040-07>. Acesso em 10 de fevereiro de 2023.

[2] [3]Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2007/Decreto/D6040>. Acesso em 30 de janeiro de 2023.

[4] Disponível em:<https://www.jusbrasil.com.br/topicos/10645661/artigo-225-da-constituicao-federal-de-1988>. Acesso em 05 de fevereiro de 2023.

[5] Disponível em:<https://noticias.uol.com.br/colunas/jamil-chade/2023/01/23/governo-bolsonaro-disse-para-onu-que-ianomamis-estavam-sendo-atendidos.htm>. Acesso em 29 de janeiro de 2023.




*Ana Roberta Cléo dos Santos Ferreira e Claudemar Alves Ferreira são quilombolas do Quilombo de Raiz e acadêmicos da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM). Produziram este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre de 2022 (janeiro a junho de 2023), orientados pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

Minhas experiências iniciais com letramentos

Minhas experiências iniciais com letramentos

Por Gracieth Pereira Nascimento [1]



 

Na minha infância não era comum o acesso a textos escritos, como livros em minha casa, meus pais não gostavam de estudar. O meu Pai, que trabalhava como motorista, do Ministério da Saúde, sempre levava cartilhas do trabalho. Tive acesso a cartilhas sobre a erradicação do barbeiro (Doença de Chagas); Esquistossomose (Barriga d’água); Febre amarela que é transmitida por mosquitos (vacinação); Dengue: orientação, erradicação do mosquito e tratamento.

Logo que entrei na escola com sete anos, comecei a ter acesso a livros, eu amava ler as estórias, fazer cópias, ganhei alguns livros como: Bolha de sabão e um livro de conto de fadas. Foi passando o tempo e na escola conheci uma colega que era muito bem de vida, e quando ia brincar na casa dela, me deparei com muitas revistinhas em quadrinhos, e ali começou um desejo grande por ler revistas em quadrinhos da turma da Mônica. Li muitas, e pegava emprestado por semana. Teve até um fato engraçado: O meu irmão menor quando tinha uns três anos tinha nojo de língua, ninguém podia dar língua pra ele que ele vomitava, uma vizinha que tinha a minha idade sabia que eu gostava de revistinha, foi na minha casa e me chamou para darmos língua para meu irmão, eu falei que não ia dar, pois minha mãe iria me bater, aí ela disse que iria me dar revistinhas e eu aceitei. Não me lembro se apanhei, mas lembro da voz brava da minha mãe a me chamar.

Tanto a família quanto a escola têm um papel importante no ensino da matemática, pois os pais devem instigar a criança desde pequeno a contar, ensinar, os valores do dinheiro com brincadeiras de vendinha utilizando dinheirinho de brincadeira, criando uma loja fictícia onde a criança vende os seus brinquedos recebe e passa o troco. A escola tem o papel de ensinar, mas o aprendizado vem quando a criança pratica, estuda, resolve exercícios de maneira autodidata, nos anos iniciais com o auxílio dos pais.

Na escola pública que estudei o ensino era voltado para a prática. Lembro-me de uma disciplina práticas agrícolas que era ensinada tudo sobre como fazer canteiro, cultivar legumes e verduras, e tudo seriam utilizados na própria escola.

A Biblioteca era cheia de livros e era uma rotina o acompanhamento dos livros didáticos de todas as matérias. Os hábitos de leitura quando estamos na escola nem se compara quando entramos na Universidade, é muita leitura e escrita, o que é muito bom para uma aprendizagem crítica. Acredito ser muito positivo. Inclusive tenho lido outros artigos e apostilas além dos indicados pelos professores. Senti o nível bem alto da Universidade. Por isso tenho dificuldades nos conteúdos de língua e Matemática que não aprendi no ensino médio. Também não tive aulas de administração de finanças, nem na escola e nem na vida, por isso considero que não administro bem minhas finanças. Muitas coisas como imposto de renda aprendi bem depois da escola.

Esse foi o meu relato de letramentos iniciais, muitas das situações não foram como sonhei, mas lutei muito para vencer a dificuldade de entrar em uma faculdade, e quando olho para trás, fico feliz em ver que a maioria das matérias que aprendi, de maneira autodidata, como matemática e a química não esqueço.



[1] Gracieth Pereira Nascimento é graduanda da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziu este relato na disciplina Prática de Leitura e Produção de Textos, ofertada no primeiro semestre de 2023. A organização e edição do material foi feita pelo Projeto de Extensão Aula Digital.

Este trabalho foi orientado pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro, com as ricas contribuições na revisão e organização do tutor Marcos Roberto Rocha.

Agroecologia e combate ao racismo

Agroecologia e combate ao racismo

Por Sabrina Santos Esteves e Ilza Fernandes de Oliveira*

Imagem criado pelo Bing IA,, com prompt deste ´projeto

O movimento agroecológico é muito importante no combate ao racismo, pois, além de acolher práticas de agricultura tradicional,  é antirracista na medida que é responsável por amenizar desigualdades sociais, contribuindo para o sustento de grupos mais vulneráveis, como comunidades quilombolas, indígenas, campesinas e ribeirinhas. Assim, a agroecologia é importante não só para a sustentabilidade, mas para promover o respeito às diversidades étnico-raciais com valorização, no Brasil, dos indígenas, negros e mestiços. Os movimentos devem ser entendidos juntos, pois se fortalecem e têm um diálogo histórico e coerente.

A cultura agroecológica promove a coletividade e a diversidade, viabiliza a igualdade de gêneros, possibilita espaços que valorizam os saberes populares e culturais, assim como são parte da produção de alimentos orgânicos para o sustento de famílias carentes. Quando falamos em agroecologia, é imprescindível não ter como lembrança, a imagem de pessoas negras, e qualquer prática cultural que possui vestígios desses grupos, não possuem muito prestígio , se sujeitando a sofrer vários ataques preconceituosos e racistas, inclusive de poderes econômicos que visam lucrar, por meio do desmatamento, monocultura e destruição dos solos com queimadas e agrotóxicos, deixando famílias dependentes, com seus territórios improdutivos, sendo a maioria de pardos ou negros, grupo majoritário entre as classes sociais mais baixas como se sabe.. Por isso resistir pela valorização da agricultura familiar, sustentável é considerada também uma luta antirracista. Como aponta Amorim (2022)[1]:

Em novembro, quando é comemorado o Dia da Consciência Negra, é preciso lembrar que falar sobre agroecologia e agricultura familiar também é falar sobre antirracismo. De acordo com o Censo Agropecuário de 2019, a maioria dos produtores rurais do país são negros. Em números absolutos, há 2,6 milhões de negros e 2,2 milhões de brancos.

A mulher negra, nos grupos tradicionais da agroecologia, tem um protagonismo muito forte, onde se tornam atuantes na produção de saberes e tecnologias relevantes para o processo de transformação social, como por exemplo na comunidade Macaúbas Palmito, localizada no município de Bocaiúva, que busca desnaturalizar o racismo e promover atitudes de conscientização, desenvolvendo ações que podem amenizar a desigualdade, e possibilitar melhores condições de vida para sua população. Reforçamos também a ideia de que é necessário fazer uma ressignificação da leitura histórica dos negros, tirando a imagem da escravidão, pois até os dias de hoje essa população sofre vários ataques violentos e preconceituosos, além de serem excluídos do meio social pelo sistema que concentra o poder na mão de poucos abastados, justamente aqueles cujos ancestrais, há pouco mais de cem anos, foram responsáveis pela escravidão.

As comunidades quilombolas são um grande símbolo de resistência a  essas classes dominantes, na medida que mantém sua diversidade em termos de culturas de plantio, de preservação da terra, valores, relações de trabalho etc. Nos quilombos, a agricultura local é de grande relevância para alimentação, saúde e sobrevivência das famílias daqueles territórios, além de compartilhar de práticas sustentáveis que ajudam na preservação do ambiente.  E o descaso das lutas desses quilombos por demarcação de terras ainda é muito grande em nosso país, pois as políticas públicas que dão assistência a esses grupos ainda são muito escassas. Segundo Catucci e Souza (2022)[2]:

O campo brasileiro é composto por maioria de trabalhadores negros, mas grande parte das terras não está sob sua posse. Além disso, quanto maior o território, maior o número de brancos proprietários. Em grandes propriedades, com área equivalente a cerca de 10 mil campos de futebol, 79,1% dos donos são brancos, enquanto apenas 17,4% são pardos e 1,6% são pretos, aponta o Censo Agropecuário 2017 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). 

O agronegócio usa tecnologias que visam a inovação e a melhora na produtividade, mas na realidade é um fator que afeta bastante o campo agroecológico, com a inserção de máquinas que destroem os solos e promovem a desmatação. Os grupos que compõem esse meio, além de visar mais os benefícios econômicos e lucrativos, acabam explorando o trabalho da população vulnerável, o que contribui para o nível de desigualdade social.

O agronegócio é responsável pela extração limite dos recursos naturais, a exploração do trabalhador, e o incentivo ao consumo excessivo. Esse sistema traz semelhanças do “racismo estrutural”, com vestígios do colonialismo, que é responsável por dividir e organizar raças, gêneros, saberes e culturas.  Essas práticas foram originadas da cultura europeia, em que o trabalho escravo era um dos pilares do poder econômico, mostra também como determinadas classes sociais sofrem opressão e exploração por parte das classes dominantes. O agronegócio contribui para o “racismo fundiário”, pois a maior parte das terras para produção agrícola estão concentrada nas mãos de proprietários brancos que utilizam desses espaços para exportações, promovendo a monocultura e destruição do meio ambiente, enquanto os negros possuem hectares de terras menores, para o plantio do sustento familiar. Como aponta Amorim (2022) [1]:

(…) é observado, é possível perceber as heranças históricas presentes até hoje. Os negros produtores rurais são maioria apenas nas terras com menos de 5 hectares. A partir desse número e, principalmente, de 20 hectares para cima, os brancos são maioria absoluta. Ou seja, aos produtores pretos é permitido apenas o acesso a terras menores e, consequentemente, os grandes produtores, donos do agronegócio do país, são os latifundiários brancos. 

A concentração de terras na mão de poucos brancos no Brasil é resultado da forma que a abolição da escravidão foi feita, que excluiu essa população de seus direitos, deixando muitas das vezes reféns de proprietários opressores.

Pensando em todo esse discurso sobre a temática que a agroecologia ajuda a combater o racismo, consideramos a escola como um dos ambientes importantes de transformação social dos sujeitos. Nesse espaço privilegiado, junto com a comunidade, talvez fossem possíveis intervenções como desenvolver projetos de conscientização socioambiental e de valorização do trabalho comunitário, intensificando métodos e princípios da agricultura familiar. Outra possibilidade é organizar trabalhos com a temática agroecologia e racismo dentro das escolas e comunidades, para preservação do contexto cultural e fortalecimento de suas identidades, e viabilizar palestras sobre agroecologia e alimentação saudável. Concluímos reforçando que são extremamente importantes tais atividades educativas, tornando o processo de formação dos estudantes mais rico e significativo.


Referências citadas no artigo

[1] AMORIM, Roberta, Ana. A luta pela agroecologia também é uma luta antirracista. CAATINGA. Disponível em: <https://caatinga.org.br/2022/11/17/a-luta-pela-agroecologia-tambem-e-uma-luta-antirracista>. Acesso em: 25/07/2023.

[2] CATUCCI, Anaísa e SOUZA, Vivian. Racismo fundiário: negros são maioria no campo, mas têm menos terras do que brancos. G1. Disponível em: < https://g1.globo.com/economia/agronegocios/noticia/2022/11/20/racismo-fundiario-negros-sao-maioria-no-campo-mas-tem-menos-terras-do-que-brancos.ghtml>. Acesso em: 25/07/2023.



*Sabrina Santos Esteves e Ilza Fernandes de Oliveira são acadêmicas da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziram este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre de 2022 (janeiro a junho de 2023). Foram orientadas pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

Agroecologia e Empoderamento Feminino

Agroecologia e Empoderamento Feminino

Por Alcione Aparecida Ferreira e Claudiana Aparecida de Paula*

A agroecologia compreende modelos alternativos de manejo, plantio e cultivo da terra, baseados em práticas sustentáveis e ecológicas. Esse modelo de produção difere significativamente do uso de fertilizantes e defensivos agrícolas, por exemplo. Um dos objetivos da agroecologia está relacionado ao uso e à conservação dos recursos naturais. Dessa forma, as práticas agroecológicas buscam respeitar o tempo e os limites da terra, utilizando adubo orgânico, cobertura do solo e consórcio de culturas. Como resultado, os alimentos cultivados são saudáveis para consumo e venda, o que contribui para a renda e sustento de muitas famílias rurais.

De acordo com o site Brasil Ecológico[1], o interesse por alimentos saudáveis e livres de contaminantes tem impulsionado o crescimento do consumo de produtos orgânicos no Brasil e no mundo. Em menos de uma década, o número de produtores orgânicos registrados no Brasil triplicou, segundo levantamento do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa). Em 2012, havia quase 5,9 mil produtores registrados no país, e até março de 2019, esse número já ultrapassava 17,7 mil, representando um crescimento de 200%. No mesmo período, o número de unidades de produção orgânica no Brasil aumentou de 5,4 mil em 2010 para mais de 22 mil no ano passado, uma variação de mais de 300% (BRASIL ECOLÓGICO, 2019).

Observa-se que os produtos orgânicos, que anteriormente eram consumidos apenas pelos próprios produtores, estão sendo cada vez mais valorizados por diferentes grupos de pessoas no Brasil e no mundo, o que aumenta o número de produtores que adotam práticas e métodos agroecológicos.

A agroecologia não se limita apenas à produção e ao cultivo da terra, mas também dialoga com questões políticas e sociais. Em sua maioria, essas práticas são conduzidas pelas mulheres, o que contribui para a emancipação e empoderamento das mulheres do campo, cujo papel tem sido cada vez mais visível e valorizado pela sociedade. Grande parte da renda familiar é gerada pelo trabalho e esforço delas, o que lhes proporciona poder, aprendizado e pensamento crítico. Como mencionado por Farias e Schawade (2020)[2], “elas também garantem uma renda maior para a família por meio da comercialização dos produtos excedentes ao consumo próprio, além de buscarem a autonomia financeira.” O empoderamento feminino fortalece e encoraja as mulheres na luta por seus direitos de igualdade e crescimento perante a sociedade, além de proporcionar aprendizados valiosos para as novas gerações. Empoderar as mulheres, que segundo o site Varejo S.A.[3], representam a maioria no Brasil e são responsáveis por quase metade das famílias, pode resultar no desenvolvimento socioeconômico e ambiental do país.

No entanto, mesmo sendo sustentável, as pessoas que aderem ao modelo agroecológico enfrentam algumas dificuldades, como a falta de apoio da família, que muitas vezes não contribui nem na produção agrícola nem nas tarefas domésticas. Outras dificuldades recorrentes estão relacionadas à análise de custos, problemas de gerenciamento e dificuldade de competir no mercado com produtos de baixa qualidade que são vendidos a preços inferiores.

É de suma importância que os órgãos públicos estudem e trabalhem com políticas públicas voltadas para as práticas agroecológicas, de forma a esclarecer e incentivar as pessoas a consumirem alimentos saudáveis, livres de fertilizantes e agrotóxicos. Isso é fundamental, pois contribui para a economia em saúde e deveria ser um direito de todos. Além disso, é importante abordar o tema da agroecologia nas escolas e comunidades, apresentando os benefícios dessas práticas. Oferecer cursos para a comunidade escolar que ajudem na compreensão e no planejamento coletivo ou individual do cultivo e gerenciamento dos negócios, bem como buscar assistência técnica que auxilie na produção e no gerenciamento. Grupos de trabalho, coordenados por agentes locais como prefeituras ou CRAS, podem incentivar parcerias entre os produtores para a produção e comercialização de seus produtos, além de participar de projetos e editais que fortaleçam as práticas agroecológicas.


Referências utilizadas no texto

[1] <http://www.agroecologia.gov.br/noticia/em-7-anos…>

[2] <https://olma.org.br/2020/07/14/feminismo-e-agroecologia/>

[3] <https://cndl.org.br/varejosa/author/fernanda/>



*  Alcione Aparecida Ferreira e Claudiana Aparecida de Paula são acadêmicas da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziram este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre de 2022 (janeiro a junho de 2023). Foram orientadas pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

Pensando a leitura e a escrita

Pensando a leitura e a escrita

Por Gabriel Philipe de Souza Chacara [1]



Nos anos dois mil, logo quando comecei a ter percepção das coisas, era comum observar meu pai lendo jornais e noticiários impressos. Na época, ele era funcionário da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos. Apreciava as imagens ali presentes de jogadores de futebol, gráficos sobre economia, imagens de crimes da época, mesmo sem entender. Minhas tias sempre contavam histórias, e chamava a minha atenção gritando “GABRIEL PHILIPE DE SOUZA CHACARA”, o que facilitava o entendimento aos comandos e saber o meu nome completo.

A curiosidade, desejo intenso de ver, ouvir, experimentar algo novo, desconhecido, sempre tomou conta da minha pessoa. O superlativo deste adjetivo “curioso”, fez com que de forma precoce eu decorasse os numerais e a escrita do meu nome. Era comum aos 4 anos já escrever frases como “Mãe, você é a melhor mãe do mundo”. E minhas tias paternas diziam: – a grafia dele é parecida ao do avô (in memoriam), e ficavam saudosas.

A minha avó materna sempre muito fervorosa, comumente lia a bíblia e contava histórias sobre Deus e Jesus Cristo, me lembro do livro ela me presenteou, cujo nome é “Meu livro de Histórias Bíblicas”, eram um conjunto de 116 histórias belamente ilustradas, totalmente de acordo com a bíblia e fáceis de entender. Ali comecei a compreender a minha existência e importância no mundo, entendia através de imagens relatos desde a criação até o dilúvio. Já as minhas tias avós maternas são apaixonadas por livros de romance, estantes lotadas de livros que passávamos tempos olhando e procurando juntar as palavras para tal compreensão. Quando aprendi a ler, logo depois foi o lançamento do livro “cinquenta tons de cinza”, minha tia Elane disse para mim e minhas primas: “Esse aqui vocês ainda não podem ler”.

Já na pré-escola veio as paixões das músicas didáticas que passávamos o final de semana inteiro cantando para meus pais como “Jesus Cristo está passando por aqui” e Meu lanchinho, meu lanchinho, vou comer… CDs e DVDs do palhaço local da cidade de Teófilo Otoni chamado de Perna Bamba, tocavam horas sem parar, junto ao sítio do pica-pau amarelo e o meu predileto o Teletubbies. A imagem do nascer do sol juntamente aos quatro ursinhos dançando chamavam muito a minha atenção. Já o Alvin e os esquilos me ensinaram que mesmo sendo diferente, conseguimos ser o que queremos ser, basta força de vontade. Outra característica minha é ser muito competitivo, a gana e o desejo de estar em destaque me fazia ser dedicado a aprender de forma rápida os numerais e letras, já chegava da escola realizando as atividades, e sempre ajudava, ou tentava ajudar minhas primas mais novas nas atividades escolares delas.

Estudei durante um tempo em uma escola que tinha uma participação de uma instituição APJ (Aprender juntos), onde mensalmente um voluntário ia caracterizado de um certo personagem e contava histórias que prendia nossas atenções. Reconhecer dinheiro foi de forma bem prematura. Assim que consegui independência de andar e me comunicar, eu já ia nas mercearias bem próximas de casa, comprar o que fora pedido por meus pais, e sempre perguntava: “Tem troco seu moço?”. Aos seis anos já somava e diminuía, começara ali a realizar as contas básicas solicitadas na escola e quando brincávamos de escolinha (eu e minhas primas). A matemática só se tornou um impasse na minha vida quando apareceu funções do segundo grau e logaritmos.

Avaliar o papel da escola e da família nos seus letramentos matemáticos iniciais é como dizer que uma equipe deve ser constituída, a escola fornecendo o modelo didático e a família cobrando e incentivando e elencando as dificuldades. Neste contexto pós pandemia, fica difícil avaliar, pois é notório o déficit de aprendizagem dos educandos no período remoto. A família deve-se posicionar de forma eximia nos estudos dos filhos não deixando o papel de alfabetização e aprendizagem geral somente com a escola. Na escola, lembro-me de sentir preguiça em escrever, mas por ser competitivo, sempre queria ser um dos primeiros a copiar os textos literários e crônicas.

A escola é essencialmente fundamental na introdução dos letramentos nos anos iniciais, pois conduz de forma cientifica como se deve ser alfabetizado. Os textos que lia e produzia no ensino fundamental I, eram sobre histórias sobre Dona Benta e Barnabé, já no ensino médio Livros literários como de Machado de Assis, Dom Casmurro e Memórias Póstumas de Brás Cubas. Estudei em colégios que de forma privilegiadas eram providas de bibliotecas com rico acervo bibliográficos e éramos incentivados a leitura mediante relatórios das obras lidas. Portanto, trago comigo o ideal que a leitura tem o poder de expandir o vocabulário, com palavras diferentes e sinônimos, uma linguagem falada e escrita culta. Em cada fase do meu desenvolvimento tive a sensação de que a leitura me roubava a ignorância inerte ao ser humano, e comecei a ler e interpretar, conseguindo me posicionar como ser pensante e crítico em sociedade. Já na universidade como acadêmico, a leitura me impulsiona a interpretação da ciência proposta nas disciplinas, podendo afirmar que o sujeito que tem o hábito de leitura se torna familiarizado com qualquer tipo de obra escrita.

Autonomamente leio os artigos solicitados pelos docentes do curso de licenciatura em química, pois sinto-me facilidade em aprender lendo. Paralelo os gêneros que tenho lido são sobre romances, autoajuda e livros sobre saúde por ter uma formação graduação em Enfermagem. Ler sobre saúde e bem-estar é um hobby constante. Já sobre as questões financeiras, fiz alguns cursos como o de auxiliar administrativo e empreendedorismo, sempre fui um bom empreendedor, e um péssimo administrador. Já vendi chup-chup, brigadeiros, doces e roupas, sempre lutei, batalhei, corria contra o tempo. Soube através do meu esforço estudo e trabalho o que era ter tudo, mas também sei o que é não ter nada. Continuo advogando do princípio de que a educação me ajudará a contribuir na transformação da sociedade desigual a qual encontramos.



[1] Gabriel Chacara é graduando da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziu este relato na disciplina Prática de Leitura e Produção de Textos, ofertada no primeiro semestre de 2023. A organização e edição do material foi feita pelo Projeto de Extensão Aula Digital.

Este trabalho foi orientado pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro, com as ricas contribuições na revisão e organização do tutor Marcos Roberto Rocha.

Racismo estrutural e transformação: realidade brasileira

Racismo estrutural e transformação: realidade brasileira

Tiago Aparecido da Silva*

 

No Brasil, o preconceito racial é evidente, construído desde a época da escravidão, quando a sociedade colocava aqueles considerados de “raça negra” na subalternidade. Isso resulta em altas porcentagens de mortes na população negra e desigualdades em todas as estruturas de poder, empregos e relações econômicas, conforme destaca Silvio Almeida, em entrevista a Djamila Ribeiro, 2020[1], “não existe racismo que não seja estrutural”.

A ausência de pessoas negras em cargos de liderança nas grandes empresas reforça a percepção da desigualdade. Há segregação até em locais públicos, como estádios, onde torcedores arremessam bananas em campo com o intuito de insultar jogadores negros chamando-os de macacos, uma situação que infelizmente ocorre com frequência. Nas novelas, a representação da maioria das empregadas domésticas como negras também ilustra esse cenário.

A desigualdade de oportunidades e renda acentua o abismo social entre brancos e negros, como reportado em 2018 pelo jornalismo do G1[2]. Os empregos considerados de elite são predominantemente ocupados por brancos, enquanto os negros têm maior presença em trabalhos mais precários e de baixa formação.

Dados revelam que, em média, 87% das vagas de professores de medicina, engenharia aeronáutica, odontologia, piloto de aeronáutica, matemática do ensino superior e projetista de máquinas são ocupadas por pessoas brancas. Por outro lado, 85% dos negros atuam em trabalhos como cultivo de dendê, trepadeiras frutíferas, criação de camarões, cultura de cacau, agente de higiene e segurança, cultura da cana de açúcar, técnicos de linhas elétricas e telefônicas. Isso mostra que os negros ainda enfrentam trabalhos árduos e com pouca formação no Brasil, evidenciando a desigualdade na distribuição de cargos e serviços superiores.

Em relação à escolaridade, embora os negros representem 54% da população brasileira, são minoria nas escolas, ocupando apenas 45,2% das vagas. Outra constatação da pesquisa é que 60% dos negros eram serventes em obras, enquanto 52% dos brancos ocupavam o cargo de mestres da obra. Essa desigualdade se estende aos sistemas prisional e judicial do país, refletindo o racismo arraigado na sociedade brasileira. Segundo o portal do Superior Tribunal de Justiça (2022)[3],

[…] o racismo estrutural está presente na atividade policial e no sistema de Justiça criminal brasileiro; afinal, os jovens negros são os maiores alvos dos agentes de segurança. Segundo o estudo, o percentual de negros entre as pessoas que já foram abordadas pela polícia chega a 63%, contra 31% de brancos, na cidade do Rio de Janeiro – cuja população total se divide em 51% de brancos, 48% de negros e 1% de outras raças. Dos que já sofreram abordagem policial mais de dez vezes, 66% são pretos ou pardos.

Esses números confirmam que, no Brasil, os que mais sofrem com a força policial são os negros, provavelmente devido a construção cultural que sempre marginalizou e associou a população negra com algo ruim. Isso vem desde a escravidão, pois a justificativa para a sua ocorrência era que os negros eram diferentes dos brancos, eram “raça” inferior, selvagens como aparece na carta de Pero Vaz de Caminha a Don João. Logo, estavam livres para escravizá-los. Após a abolição, a exploração e o preconceito não mudaram e reflete nos dias atuais. Tudo que vem do negro ainda é ruim e demonizado pela sociedade, sua dança, sua música, seu modo de vestir, suas crenças.  

É necessário que haja representatividade negra em todos os setores e locais, especialmente naqueles onde são tomadas as principais decisões sobre o país e a população. Ninguém melhor que um negro com consciência de classe para falar sobre o que um negro vive no Brasil. Nos lugares certos, poderão criar novas políticas públicas que visem à igualdade racial e à justiça social, com ampliação de oportunidades desde a educação infantil.


Referências citadas no texto

[1] Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=ZADKtsNnx74>. Acesso em: 23/03/2023.

[2] GOMES, Helton Simões. Brancos são maioria em empregos de elite e negros ocupam vagas sem qualificação. G1, 2018. Disponível em: <https://g1.globo.com/economia/noticia/brancos-sao-maioria-em-empregos-de-elite-e-negros-ocupam-vagas-sem-qualificacao.ghtml>. Acesso em: 23/03/2023.

[3] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Notícias. O negro como alvo: a questão do racismo estrutural nas investigações criminais. Brasília DF: Superior Tribunal de Justiça, 2022. Disponível em: <https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/2022/20112022-O-negro-como-alvo-a-questao-do-racismo-estrutural-nas-investigacoes-criminais.aspx>. Acesso em 20/03/2023.




* Tiago Aparecido da Silva é acadêmico da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziu este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre de 2022 (janeiro a junho de 2023). Foi orientado pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

Dos gibis aos números

Dos gibis aos números

Por Filipe de Jesus Rametta [1]



Durante minha infância, uma lembrança marcante em relação aos textos escritos que posso descrever é preenchida pelos gibis da famosa Turma da Mônica. Minha mãe, leitora voraz das histórias da turminha, mantinha um armário repleto de gibis, frequentemente revisitado por ela. Não me era possível ser indiferente a esta situação: me apaixonei pelos gibis sem me dar conta, de modo a ficar tardes inteiras no quarto de minha mãe lendo e relendo sobre os planos infalíveis do Cebolinha, as invenções fajutas do Franjinha, dentre outras tantas aventuras.

Por vezes surgiam gibis do Tio Patinhas, Pateta ou outras personagens, mas a Turma da Mônica tinha seu lugar reservado nas preferências de minha mãe e minha. Acredito que o contato com os gibis me abriu portas na escola. Tinha prazer em realizar atividades que envolviam leitura de livros, o que considero primordial para o aprendizado. Lembro que gostava de frequentar a biblioteca da escola e ficar olhando os livros nas prateleiras, ainda que não fosse ler algum naquele momento.

No que diz respeito aos números, mais uma vez minha mãe me encaminhou com excelência. Sendo professora de Matemática, me vez conhecer a mais interessante das ciências e me apaixonar por sua abstração. Matemática, desde que me entendo por gente, tem sido minha disciplina preferida. Optar pela graduação nessa área do conhecimento não foi surpresa para ninguém.



[1] Graduando da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM), produziu este relato na disciplina Prática de Leitura e Produção de Textos, ofertada no primeiro semestre de 2023. A organização e edição do material foi feita pelo Projeto de Extensão Aula Digital.

Este trabalho foi orientado pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro, com as ricas contribuições na revisão e organização do tutor Marcos Roberto Rocha.

O machismo é prejudicial aos homens

O machismo é prejudicial aos homens

Airton Alves Chaves Junior e Alexandre dos Santos Baldaia *

 

 


O machismo prejudica a socialização e o bem-estar de mulheres e homens e afeta relações familiares e interpessoais. Enquanto os danos para as mulheres são conhecidos, pouco se discute sobre o impacto na vida e na saúde dos homens.

 Como nos alerta Santos (2021)[1]:

(…) aspectos negativos do processo de socialização masculina são o estímulo a comportamentos de risco como prova de masculinidade, o afastamento das práticas de cuidado e convivência no ambiente familiar e doméstico, a ausência de contato ou negação de emoções que conotem fraqueza ou fragilidade.

No imaginário popular, a ideia de masculino está ligada ao ato de prover e proteger, bem como mostrar força e reprimir emoções que possam demonstrar vulnerabilidade. Na cultura machista, é comum a crença de que homens fortes, como esperam, não choram, não sofrem e devem ser fortes.

Essa mentalidade machista reprime, humilha e afeta a saúde mental e física dos homens, o que resulta em outros problemas associados à masculinidade violenta. Sousa (2005) revela que: “No Brasil, os homens vivem, em média, sete anos a menos que as mulheres e esse número, certamente, está ligado à toxicidade da masculinidade”.[2] O autor também cita algumas estatísticas:

Dos 15 aos 19 anos, os homens morrem 6.3 vezes mais que as mulheres; dos 20 aos 24 anos suas taxas são 10.1 vezes maiores que as das mulheres. Nos homicídios esse risco é de quase 12 óbitos masculinos em relação a cada morte feminina (SOUSA, 2005).

Existe certo consenso que o machismo mata os homens, principalmente, por três motivos: descaso com a saúde, relação perigosa com álcool, direção agressiva. A negligência em relação à saúde masculina é frequente, o que inviabiliza diagnósticos mais prematuros, profilaxia, controles, que diminuíram a mortalidade de diversas doenças, e diminui a expectativa de vida. Segundo Tenório (2019)[3], “[n]o Brasil, quase 40% dos homens até 39 anos e 20% daqueles com mais de 40 só vão ao médico quando se sentem mal. Boa parte deles não tem ideia de como anda o coração nem faz exames cardiológicos”.

Existe um senso comum de que o machismo é benéfico para os homens, pois supostamente eles não sofrem, não são frágeis ou adoecem. No entanto, essas ideologias são mentirosas e prejudiciais, pois práticas com graves consequências tanto para os homens quanto para a sociedade.

Para reduzir o machismo, é fundamental discutir e refletir sobre a cultura machista tóxica e o papel de homens e mulheres nas divisões do trabalho, incluindo tarefas domésticas, democracia, práticas agroecológicas, entre outros aspectos. Nesse sentido, é possível propor intervenções, como projetos que abordem questões relacionadas à saúde masculina em diferentes espaços e contextos, como comunidades e escolas. Um exemplo de campanha que já traz práticas nesse sentido e pode ser estendido ao longo do ano é a Novembro Azul, que busca conscientizar sobre a saúde masculina e promover discussões sobre as causas e consequências do descaso em relação à saúde.


Referências citadas no texto

[1] https://www.bulbapp.com/u/machismo-masculinidades-ressocializa%C3%A7%C3%A3o-do-autor-de-viol%C3%AAncia-contra

[2] https://www.scielo.br/j/csc/a/5QrxkHxfMdzwgCRVjPXf8yh/?lang=pt#

[3]  https://saude.abril.com.br/medicina/pesquisa-mostra-onde-os-homens-pisam-na-bola-com-a-saude/?_gl=1*d5gsl1*_ga*SFRibmxKT0RfRHlfSmtZNWhDVFlWNDNad1EtMnQ4cmxrRTRQNlI3NGx0SndnQ0p2bDdTdEdqbFhQR05Ua1JtRA




* Airton Alves Chaves Junior e Alexandre dos Santos Baldaia são acadêmicos da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziram este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre de 2022 (janeiro a junho de 2023). Foi orientado pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

Escalada de um sonho

Escalada de um sonho

Por Fabiana Lima Pereira [1]



Muitas as lembranças da vida, entre elas algumas que tiveram grande relevância, sempre irei carregar, pois não teria como esquecê-las. Desde muito cedo uma criança que sonhava em conquistar o mundo, que sempre ouvia dos pais que deveria estudar e o mundo aos meus pés.

A minha alfabetização começou no berço familiar, aos meus 4 ou 5 anos de idade minha mãe me ensinava a escrever meu próprio nome e ler de acordo ela sabia, pois com baixo de nível de escolaridade e meu pai analfabeto era um grande desafio, porém mesmo assim quando comecei a frequentar uma sala de aula já sabia um pouco do básico como meu nome e alguns números. Nascida e criada em Zona Rural, nosso acesso a livros e textos eram muito restritos, internet então nunca se ouvia a respeito, mesmo assim tenho lembranças muito boas, era apaixonada por histórias em quadrinhos e gibis entre elas eu tinha coleção de várias revistas da Turma da Mônica e também amava o Sítio do Pica-Pau Amarelo, além de ter inúmeras revistas de colorir, e ter como primeira referência de livro a Bíblia Sagrada.

Ainda na infância na minha primeira escola, pude ter acesso a outros gêneros textuais, principalmente literários, e ter acesso a mais conteúdos de escrita e leitura. Nos primeiros anos em ambiente escolar começou minha relação com a escrita, escrevia várias cartinhas para as amigas e às vezes até de amor, os anos passaram e depois de 5 anos me mudei de escola para fazer o Ensino Fundamental II, saindo de casa as 11:30 e chegando as 18:30 durante 4 anos, nessa nova escola as oportunidades cresceram para me aperfeiçoar com novas técnicas e professores mais capacitados e aumentei meus conhecimentos, fiz amizades lindas e troquei experiências incríveis.

No mesmo período comecei a escrever poemas, principalmente exaltando a beleza da minha cidade, e eu sonhava em publicar um dia. Fui premiada várias vezes por elaboração de redação, textos e poemas, em projetos de incentivo a escrita e leitura. Nesse período comecei a entender, o real valor das coisas e comecei a vender perfumes e maquiagem na escola para comprar lanche e outras coisas, sempre fui uma aluna disposta a aprender e gostava muito de estudar, nunca tive muita dificuldade em aprender e sempre quando surgia dúvidas ia em busca de respostas, sempre gostei muito de matemática então me dedicava muito a essa disciplina.

No ensino médio me mudei para outra escola, no início tive muito medo dessa fase, porém venci. As disciplinas aumentaram mesmo com dificuldade criei amor por elas, gostei muito da Química e continuei a gostar também de matemática. Nesse período cresceu muito a vontade de fazer um curso superior, e em busca de novos horizontes eu lia e escrevia muito, dos clássicos aos modernos a paixão por livros aumentou, e o romance passou a ser meu gênero preferido.

Agora na universidade pude perceber que as leituras precisam de maior atenção e melhor interpretação, ver realmente o que as entrelinhas nos diz. Cada pequeno passo que dei até aqui foram centímetros da minha escalada de um dos meus maiores sonhos. Concluo esse pequeno relato exaltando o orgulho imenso de cada desafio vencido, o quão maravilhoso é mostrar que uma menina podia correr atrás de seus sonhos e estar hoje em uma Universidade. Imenso prazer em carregar o nome da minha pequena e amada cidade – Rio Pardo de Minas, norte do estado de Minas Gerais – que me proporcionou o que tinha de melhor, gratidão por cada instituição de ensino que me acolheu assim como a UFVJM, quem sabe após minha licenciatura o sonho de publicar poemas também seja realizado.



[1] Fabiana Lima Pereira é graduanda da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziu este relato na disciplina Prática de Leitura e Produção de Textos, ofertada no primeiro semestre de 2023. A organização e edição do material foi feita pelo Projeto de Extensão Aula Digital.

Este trabalho foi orientado pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro, com as ricas contribuições na revisão e organização do tutor Marcos Roberto Rocha.

Agroecologia, soberania e segurança alimentar em comunidades quilombolas

Agroecologia, soberania e segurança alimentar em comunidades quilombolas

Por Sunamita Nelma Ferreira Alves *

A agroecologia abrange diversas práticas agrícolas que asseguram a soberania e a segurança alimentar nas comunidades Quilombolas. A abordagem para lidar com a terra pode variar conforme a região, povo e condições climáticas. Contudo, um fator crucial para determinar qual prática adotar é a cultura de plantio local, que se relaciona com os conhecimentos transmitidos pelas gerações anteriores. O modo de plantar e cultivar a terra visando uma produção ecológica, em que as famílias assumem o protagonismo, resulta em alimentos saudáveis e contribui para uma melhor qualidade de vida.

A agroecologia é amplamente aplicada nas terras Quilombolas do Brasil, geralmente em pequenos quintais ou roças de toco. Essa prática está centrada na preservação da natureza e na garantia da segurança alimentar das famílias. O manejo do solo adotado nas comunidades Quilombolas consiste em produzir na estação apropriada o que a terra naturalmente oferece, utilizando poucos ou nenhum fertilizante. Essa abordagem está intrinsecamente relacionada aos povos do campo e às tradições que mantêm vínculos com a terra e seus territórios. Os habitantes dessas áreas reconhecem-se como parte do ambiente de plantio, conhecendo cada lugar pelo nome, em que cada denominação carrega o peso de uma história ancestral.

As práticas agroecológicas constituem uma parte essencial da cultura na comunidade Quilombola de Raiz, garantindo a soberania alimentar para sua população. A arte de escolher quais alimentos produzir, como produzi-los e como distribuí-los é um aspecto crucial para determinar quais alimentos serão consumidos, assegurando, assim, a segurança alimentar e nutricional.

Ao falar em alimentos nutritivos, a agroecologia emerge como o caminho para uma vida saudável e a conquista da soberania alimentar. Os povos Quilombolas, enraizados em suas culturas, adotam práticas comuns para o desenvolvimento da agricultura de forma sustentável e ecológica, fundamentada em princípios sólidos, historicamente construídos. Segundo Primavesi (2008, p. 3) [1]:

A Ecologia se refere ao sistema natural de cada local, envolvendo o solo, o clima, os seres vivos, bem como as inter-relações entre esses três componentes. Trabalhar ecologicamente significa manejar os recursos naturais respeitando a teia da vida. Sempre que os manejos agrícolas são realizados conforme as características locais do ambiente, alterando-as o mínimo possível, o potencial natural dos solos é aproveitado. Por essa razão, a Agroecologia depende muito da sabedoria de cada agricultor desenvolvida a partir de suas experiências e observações locais. 

A produção e manejo do solo são variáveis de acordo com a região e cultura. Encontramos cultivos em quintais, hortas isoladas, campos de produção e pequenos quintais. Algumas produções são completamente naturais, enquanto outras dependem da estabilização do solo, da matéria orgânica presente no local de plantio, do tipo do terreno e sua localização geográfica, seja plano ou em colinas. No Quilombo de Raiz, situado na porção meridional da Serra do Espinhaço, onde esta autora reside, não é diferente.

Em meio ao cerrado, próximo à nascente do rio Jequitinhonha, para garantir a segurança alimentar das famílias que ali residem, são utilizadas práticas agroecológicas, como o cultivo em pequenos quintais e roças de toco. Esses espaços são escolhidos por possuírem maior quantidade de matéria orgânica e geralmente ficam próximos a afluentes de água, proporcionando um solo mais fértil e produtivo. O desbravamento desse espaço é realizado com respeito à natureza, e o cultivo pode durar de um a dez anos, momento em que o agricultor, com seu conhecimento acumulado, compreende a necessidade de descanso do solo, migrando o plantio para um novo local semelhante, permitindo que o solo descanse e recupere suas características naturais.

Esse manejo está intrinsecamente ligado à cultura e assegura a soberania alimentar no Quilombo. As famílias produzem seguindo conhecimentos transmitidos de geração para geração. Os plantios são realizados de acordo com as fases da lua, que, segundo os agricultores, exercem uma influência significativa sobre a produção, conforme a sabedoria transmitida pela agricultura tradicional. Em entrevista para este projeto, uma agricultora que preservaremos a identidade relata:

Nós fazemos as plantações tanto nas roças como também nas hortas segundo as fazes da lua, o que se produz na horta são hortaliças diversas e essas necessitam da fase certa da lua para um bom resultado, hoje se vê muito dizer que isso não interfere e que também não tem nada a ver, que se plantar de qualquer forma vai produzir, porém segundo a nossa experiência isso não funciona, se plantados em lua errada o resultado jamais será o mesmo. As roças por exemplo, uma grande plantação de milho, feijão ou mandioca, pode dar caruncho, broca e perder muito daquela plantação, a batata doce por exemplo, fica amarga e cheia de caruncho além de cair muito na produção.

Ao analisar o relato da agricultora, é possível identificar as particularidades da produção exclusiva do Quilombo de Raiz. Esse quilombo, localizado em meio a colinas, adota uma produção inteiramente orgânica, o que garante alimentos de qualidade nas mesas das famílias. Para alcançar o equilíbrio entre a produção e o manejo de pragas, é necessária muita sabedoria, pois compreendem que nenhuma forma de vida deve ser exterminada e que há uma ampla cadeia natural em jogo. Portanto, a decisão de não utilizar produtos sintéticos para a proteção e controle de pragas requer um vasto conhecimento tradicional, transmitido de forma oral.

Vale ressaltar que nesse Quilombo, as famílias realizam as plantações em trabalho conjunto, onde todos colaboram: homens, mulheres e crianças, todos participam ativamente no processo da produção. É um quilombo liderado por mulheres jovens e essa liderança aparece em todas as partes, desde o momento de buscar políticas públicas para a produção até os projetos de escoação dos produtos. Essas lideranças buscam projetos para escoação como Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) [2]. O programa da esfera federal realiza a compra da produção agrícola de muitas famílias, a fim de alimentar outras. Assim, além de garantir a renda de muitas comunidades, o PAA acaba com a fome de inúmeras famílias, com uma boa oferta de alimentos saudáveis. Há também o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) [3], que, diferentemente do primeiro, garante a segurança alimentar nas escolas, mas também compra os alimentos produzidos pela agricultura familiar.

Assim como em outras comunidades Quilombolas, no Quilombo de Raiz, as mulheres assumem a dianteira nas múltiplas tarefas, buscando constantemente meios de sustentar a renda da comunidade. Embora todos desempenhem seu trabalho, são elas que se destacam nessa busca. A prática da agricultura é comum nesse cenário, e o manejo ecológico do solo assegura a soberania alimentar na comunidade. Através da agroecologia, o solo ganha vida e se torna nutriente. Como afirma Primavesi (2008, p. 3) [1]:

Um solo vivo pressupõe a presença de variadas formas de organismos interagindo entre si e com os componentes minerais e orgânicos do solo. Essa dinâmica biológica exerce uma função essencial na agregação do solo, de modo a torná-lo grumoso e permeável para o ar e para a água. Além disso, são esses organismos que mobilizam os nutrientes e os disponibilizam para as plantas.

É notável a relevância da produção agroecológica nas terras Quilombolas, pois proporciona a soberania alimentar para diversas famílias e instituições públicas, como escolas, uma vez que os alimentos provenientes da agroecologia garantem a segurança alimentar. Ao contrário de todo este movimento pela saúde, condições de trabalho e sobrevivência da população, temos uma luta política que perpassa falas contra a demarcação de terras quilombolas pelo ex-presidente da república e um movimento pela aprovação do marco temporal, que, na prática impediria novas demarcações no país, como pode se acompanhar na imprensa.

É um absurdo a defesa de pautas desse tipo, pois há uma dívida histórica e um genocídio desses povos que não cessaram. Adicionalmente, quem sustenta o Brasil são os PCTs (Povos de Comunidades Tradicionais) e quilombolas. A demarcação dessas terras é garantida na legislação brasileira na Organização Internacional do Trabalho – OIT 169 [4] , no plano nacional de PCT. Portanto, cabe ao Estado garantir tais direitos e agir em favor dos povos que trabalham pela manutenção da terra e pela soberania alimentar.

Compete aos povos tradicionais a luta pela implementação das políticas públicas, enquanto cabe ao Estado a execução dessas mesmas políticas, visando alcançar a soberania alimentar. Para a aplicação efetiva de uma política de segurança e soberania alimentar, baseada na agroecologia, é imprescindível que os povos tradicionais e Quilombolas tenham acesso à terra. A tradição não pode ser dissociada do território, pois a disponibilidade de alimentos e água de qualidade nas mesas é resultado do cuidado e do cultivo realizado pelos quilombolas e povos tradicionais em seus territórios, assegurando, assim, a soberania alimentar.


Referências citadas no texto

[1] https://www.bibliotecaagpta.org.br/agricultura-novo/agroecologia-artigos/

[2] https://www.gov.br/pt-br/noticias/agricultura-e-pecuaria/2020/01/entenda-como-funciona-o-programa-de-aquisicao-de-alimentos

[3] https://www.gov.br/fnde/pt-br/acesso-a-informacao/acoes-e-programas/programas/pnae

[4] https://portal.antt.gov.br/conven%C3%A7cao-n-169-da-oit-povos-indigenas-e-tribais

 



* Wesley Moreira dos Santos Paranhos é acadêmico da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziu este relato na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre de 2022 (janeiro a junho de 2023). Foi orientado pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.