Por Alexandre dos Santos Baldaia [1]
Tenho vinte anos, nasci, cresci e resido atualmente na comunidade Quilombola do Paiol. Na minha infância tive poucas oportunidades de ler um livro ou mesmo de ter um, pois naquela época era tudo muito difícil. Minha família sempre morou no campo, assim não tive muitos contatos com a leitura. Apenas quando meus irmãos mais velhos começaram a estudar na escola do município, trazendo alguns livros didáticos para casa é que tive os primeiros contatos com os livros.
Como eles já sabiam ler, passaram a me ajudar a decorar o alfabeto e a escrever as primeiras palavras. Foi assim que aprendi a escrever meu nome, e sempre tive interesse em ler. Nesses livros didáticos também havia algumas histórias em quadrinhos, como “A turma da Mônica”, por exemplo, que eu tentava entender, porque ainda não sabia ler. Na minha infância, então, aprendi primeiro a ler as imagens: sempre que olhava qualquer tipo de figura, tentava descobrir uma posição crítica no texto, pensando sempre no que poderiam representar.e
Aos seis anos de idade ingressei na escola e com sete anos comecei a ler e a escrever. Foi muito difícil me adaptar àquele lugar e a usar o lápis. Cheguei a pensar, em certo momento, que não conseguiria aperfeiçoar a prática de leitura. No entanto, os professores sempre exigiam que eu e meus colegas lêssemos e escrevêssemos. Sempre nos passavam o alfabeto e, logo em seguida, tentávamos escrever nosso nome, o nome da cidade e da comunidade em que morávamos. Começar a ler foi a melhor experiência que tive, porque a cada dia eu procurava aperfeiçoar minha prática de leitura e, assim, fui aprimorando meus conhecimentos. Meus primeiros livros foram dados por minha mãe quando entrei na escola. Todos os anos, passava um homem vendendo alguns kits de livros perto de minha casa. Como minha mãe é religiosa, optou por comprar livros religiosos. Recordo-me que, do início ao final do Ensino Fundamental I, os professores sempre exigiam dos alunos que lessem livros durante a aula. Lembro-me que um desses livros era “O rato roeu a roupa do rei de Roma”.
Sobre o papel da escola no desenvolvimento da leitura, penso que tanto professores quanto diretores incentivam a leitura nos primeiros cinco anos iniciais do Ensino Fundamental I, mas depois passam a não dar valor à leitura, como se os alunos não necessitassem mais ler. Acredito nisto porque não os vi passando livros para leitura e discussão em sala de aula após o período mencionado. Na escola havia uma biblioteca, mas não podíamos pegar livros para ler. Também não podíamos levar livros para a casa, pois, segundo a escola, não tínhamos responsabilidade e poderíamos sujá-los.
Quando terminei o Ensino Médio, fiquei um período sem ter acesso a livros, pois trabalhava no campo e quase não tinha tempo para ler. Ao entrar na Universidade, comecei a ler alguns textos acadêmicos, assim voltei a ter o hábito de ler. No entanto, alguns desses textos são cansativos e difíceis de entender, mas sei que são necessários, pois a partir desses livros começamos a ter uma visão de mundo que será útil em minha vida profissional e social. As dificuldades que tive em ter um livro ou até mesmo para ler me fizeram perceber que a leitura não se realiza apenas oralmente; e que o letramento não é um processo de decorar o alfabeto ou ler. Entendi que o que está por trás disso tudo. Entendo que para me tornar um educador do campo é preciso buscar conhecer a realidade dos alunos e contextualizar o ensino.