O combate à cultura do estupro e os direitos de crianças e adolescentes

O combate à cultura do estupro e os direitos de crianças e adolescentes

Dos 159 mil registros feitos pelo Disque Direitos Humanos ao longo de 2019, 86,8 mil são de violações de direitos de crianças ou adolescentes, um aumento de quase 14% em relação a 2018. A violência sexual figura em 11% das denúncias que se referem a este grupo específico, correspondendo a 17 mil ocorrências. Em comparação com 2018, o número manteve-se praticamente estável, apresentando uma queda de apenas 0,3%. [1]

A cultura do estupro é um fenômeno que permeia a sociedade de diversas formas e está relacionado a uma série de questões estruturais e culturais que perpetuam a violência contra as mulheres. Em algumas localidades, vemos que o estupro se tornou até mesmo uma espécie de cultura, onde esse termo refere-se a um conjunto de crenças, comportamentos e práticas que normalizam e justificam a violência sexual contra mulheres, homens e até mesmo crianças, tornando-se um problema social generalizado e endêmico. A cultura do estupro faz vítimas no ambiente doméstico e até em espaços públicos, de diferentes formas. No machismo, encontra apoio com a culpabilização da vítima, a minimização do agressor, a objetificação das mulheres, a banalização da violência sexual e a aceitação.

Em meio a uma sociedade marcada pela cultura do estupro, as crianças são alvo fácil de abusadores, sejam familiares, conhecidos ou estranhos. Elas podem a qualquer momento sofrer impactos que mudam totalmente suas vidas, e o trauma vivido na infância leva a efeitos devastadores na saúde física e emocional dessas crianças, moldando sua visão sobre relacionamentos, intimidade e confiança. O impacto dessas experiências pode persistir por toda a vida, afetando negativamente suas escolhas, relacionamentos futuros e sua capacidade de se sentirem seguras e confiantes em sua própria sexualidade.

Para combater a cultura do estupro, é fundamental que a sociedade como um todo se engaje na reflexão sobre suas próprias atitudes e valores em relação à violência sexual, que se sensibilize para as consequências devastadoras desse tipo de crime e que assuma a responsabilidade de promover a igualdade de gênero e a dignidade das mulheres. Isso requer um esforço coletivo para desconstruir mitos, estereótipos e preconceitos que legitimam a violência e para construir novos modelos de masculinidade e feminilidade baseados no respeito mútuo, na empatia e na igualdade de direitos.

Em suma, a cultura do estupro é um problema social complexo e enraizado que requer uma abordagem sistêmica para ser superado. É preciso que toda a sociedade se mobilize para desafiar as normas e valores que sustentam a violência sexual, para promover a educação e a conscientização sobre a importância do consentimento e para criar um ambiente mais seguro e acolhedor para todas as pessoas, independentemente de seu gênero. A mudança é possível, mas exige o comprometimento de todos os indivíduos e instituições para construir uma cultura de respeito e dignidade para todas as pessoas.

A violência estrutural que acarreta estupro precisa ser mais trabalhada nas comunidades em geral, principalmente nas instituições escolares, uma vez que podemos ver que nos ambientes escolares, as crianças e adolescentes têm mais liberdade para dizer e se expressar sobre o que está acontecendo com eles, pois o acolhimento e a percepção de quem convive com as crianças são muito grandes, podendo identificar suas diferentes reações e comportamentos, e assim saber quando eles estão bem ou precisando de ajuda. Torna-se imprescindível que medidas efetivas sejam tomadas para combater a cultura do estupro e proteger as crianças de violências sexuais. Ações de prevenção e conscientização, tanto em nível individual quanto institucional, são fundamentais para promover a segurança e o bem-estar infantil. Investimentos em capacitação de profissionais da área de educação, saúde e assistência social são essenciais para a identificação precoce de casos de violência sexual e o encaminhamento adequado das vítimas para receberem o apoio necessário. Portanto, é fundamental reconhecer o impacto negativo que a cultura do estupro tem sobre o desenvolvimento das crianças, assegurando que elas tenham seus direitos protegidos e promovendo uma sociedade mais segura e igualitária para todos.

A cultura do estupro e a violência contra crianças são problemas graves que afetam as comunidades do campo. As disparidades econômicas, sociais e educacionais nessas regiões muitas vezes tornam as crianças mais vulneráveis a abusos e agressões. A falta de acesso a serviços de proteção e apoio, a normalização da violência e a perpetuação de estereótipos de gênero contribuem para a prevalência desses casos. Além disso, a falta de denúncia e a impunidade dos agressores também são fatores que perpetuam esses crimes. É fundamental que as comunidades do campo se mobilizem para enfrentar esses problemas, promovendo a educação sobre direitos e prevenção de abusos, incentivando a denúncia de casos e apoiando as vítimas. As autoridades locais e a sociedade civil também devem se envolver ativamente na proteção das crianças e na punição dos agressores. A conscientização e a ação coletiva são essenciais para erradicar a cultura do estupro e a violência contra crianças nas comunidades do campo, garantindo um ambiente seguro e saudável para o desenvolvimento de todos os indivíduos.

 

Referência

[1] Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania. Ministério divulga dados de violência sexual contra crianças e adolescentes. Disponível em: https://www.gov.br/mdh/pt-br/assuntos/noticias/2020-2/maio/ministerio-divulga-dados-de-violencia-sexual-contra-criancas-e-adolescentes. Acesso em 18/06/2024.




SOBRE AS AUTORAS

Katiane da Cunha Ribeiro e Larissa Emanuelly Santos Gomes são acadêmicas da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziram este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre letivo de 2023 (janeiro a junho de 2024). Foram orientadas pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

A terra é mãe, a terra é mulher: agroecologia e feminismo

A terra é mãe, a terra é mulher: agroecologia e feminismo

“Sem o feminismo, não há agroecologia”, frase encontrada em diversos movimentos e redes sociais. A agroecologia é uma ferramenta de empoderamento, o cuidado com a terra, o solo, uma forma harmoniosa de viver. Agricultoras e camponesas que lutam pela conscientização dos direitos das mulheres são protagonistas de suas próprias histórias à medida que batalham por políticas sociais, ambientais e econômicas. A agroecologia acolhe essa diversidade, com afeto e sabedoria ancestral, garantindo segurança alimentar e nutricional.

Segundo Oliveira (2005) [1], perceber o corpo por essa perspectiva leva à compreensão da diversidade corporal, tanto do ponto de vista biológico quanto dos múltiplos significados culturais, integrando-se ao seu ambiente ancestral. A mulher traz essa integração do corpo, vida, terra, natureza, maternidade, ação e luta. Como Oliveira nos mostra, em diversas experiências de movimentos sociais e vivências comunitárias, as mulheres protagonizam a luta agroecológica! Sendo maioria nos territórios, elas se articulam nas comunidades para debater questões de gênero, não apenas no campo, mas também na cidade. Como mulheres do campo, são lutadoras e feministas, protagonistas de suas próprias histórias.

Elas levantam a bandeira do cuidado com a Mãe Terra, nossas sementes, nossa água. Têm a característica de sempre motivar outras mulheres contra a violência de gênero. O feminismo traz uma contribuição valiosa para a análise do conceito de patriarcado, revelando suas raízes históricas. Akotirene (2021) [2] destaca o quanto a luta das mulheres ainda enfrenta desafios significativos em relação à classe social, raça, periferia e negritude. Para as mulheres, o corpo também é um ponto de intersecção de várias categorias da dinâmica social, formando uma rede complexa de desigualdades e experienciando múltiplas colisões dos eixos estruturais de opressão da nossa sociedade, especialmente de gênero, raça e classe social. O papel subordinado da mulher e as diversas formas de opressão social que ainda enfrenta, de natureza patriarcal, perpetuam estereótipos paternalistas. Se não reconhecermos o papel e o trabalho das mulheres, não haverá agroecologia. Portanto, o desrespeito aos direitos das mulheres ainda é uma prática cotidiana.

Como educadores do campo, membros de movimentos sociais e sonhadores utópicos, precisamos trazer o feminismo e a agroecologia para as discussões nas escolas. É essencial fortalecer as práticas agroecológicas, fortalecendo espaços sociais e políticos, escapando dos espaços de opressão e melhorando a qualidade de vida das mulheres. Devemos inserir mais mulheres nos espaços políticos e de representatividade, não apenas na ação, mas também no papel.

O reconhecimento das lutas das mulheres e do feminismo na agroecologia se expandirá à medida que se tornarem pauta nas discussões dos espaços que ocupamos. Isso depende de um esforço da sociedade, especialmente dos homens, para compreender e contribuir para a redução da histórica desigualdade enfrentada pelas mulheres. Exige esforço das mulheres para desmistificar a desvalorização de seus trabalhos, historicamente menos valorizados em uma sociedade machista e patriarcal.

 

Referências

[1] OLIVEIRA, Eduardo David de. Filosofia da ancestralidade: corpo e mito na filosofia da Educação Brasileira. UFC. 2005. 353f. – Tese (Doutorado) – Universidade Federal do Ceará, Programa de Pós-graduação em Educação Brasileira, Fortaleza (CE), 2005.

[2] AKOTIRENE, Karla. Interseccionalidade. São Paulo: Pólen, 2019.




SOBRE A AUTORA

Karina Mendes é acadêmica da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziu este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre letivo de 2023 (janeiro a junho de 2024). Foi orientada pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

Agroecologia e os povos originários

Agroecologia e os povos originários

Os portugueses, por volta do ano 1500, ao afirmarem ter descoberto novas terras habitadas por nossos antepassados indígenas, acreditaram que conheciam a melhor forma de trabalhar a terra. Este modelo diferia radicalmente do praticado pelos povos originários, como registrado por Caminha (1500) [1], que escreveu:

Eles não lavram nem criam, nem há aqui boi, nem vaca, nem cabra, nem ovelha, nem galinha; nem nenhuma outra alimária que costumada seja ao viver dos homens; nem comem senão desse inhame que aqui há muito; e dessas sementes e frutos que a terra e as árvores de si lançam.

Foi implementado um novo modelo de plantação conhecido como monocultura, que evoluiu para a agricultura convencional que conhecemos hoje, eliminando vastas áreas da vegetação original para dar lugar a culturas isoladas como milho, feijão, soja, arroz, entre outras. Entretanto, ao longo dos anos, especialmente no século XXI, está se descobrindo que os portugueses estavam completamente equivocados, pois eram os povos originários que possuíam o conhecimento verdadeiro sobre o manejo da terra. Nas palavras dos invasores, implantaram um modelo de produção que visava ‘desenvolver’ as regiões do país. O modelo de exploração monocultural tornou-se um grande problema com o avanço das novas tecnologias, culminando na chamada revolução verde, um nome pomposo que escondia uma lógica de produção em larga escala, resultando em um aumento exponencial do desmatamento e das queimadas.

Com o tempo, começaram a surgir críticas ao modelo descrito acima, levando ao surgimento da agroecologia, um campo da ciência que busca estudar sistemas agrícolas sustentáveis. Na década de 60, o ritmo acelerado de crescimento da produção e do consumo estava prevendo catástrofes naturais e sociais que inevitavelmente levariam a uma série de desastres, conforme destacado no relatório Meadows de 1972, elaborado pelo Clube de Roma. A partir desse ponto, a questão ambiental passou a ser discutida em escala global, resultando no surgimento de diversos movimentos ecoambientalistas (Neto e Canavesi, 2002, p. 204) [2]. Como resultado, diversos modelos de produção começaram a ser desenvolvidos e modelados, incluindo a agricultura ecológica, sistemas agroflorestais, silvipastoris, agrossilvipastoris, permacultura, entre outros.

A problemática originada pelo modelo agroquímico de produção, que surgiu no final do século XIX, motivou a criação de movimentos contrários à devastação dos recursos naturais, centrados na busca por modelos alternativos de produção agrícola sustentável, como a agricultura biodinâmica, orgânica, biológica, natural, permacultura e, mais recentemente, a organo-mineral ou SAT (produção sem utilização de agrotóxicos). Tais modelos, embora variem em práticas e princípios orientadores, compartilham o ideal de sustentabilidade dos agroecossistemas (Lopes & Lopes, 2011, p.1) [3]. Atualmente, o sistema agroflorestal se destaca, pois visa produzir alimentos de forma harmoniosa com a natureza, adaptando-se ao ambiente sem destruir a vegetação local.

[…] o uso das florestas, ao longo da história, não pressupõe necessariamente a transformação delas em uma paisagem de monocultura, mas resultando em mosaicos de florestas manejadas e sistemas agroflorestais. (Neves, 2014, p.409) [4].

Os povos originários já desenvolviam modelos de produção agroecológicos, muito similares aos defendidos pela agroecologia hoje em dia. Há relatos de que cultivavam em meio à mata sem destruir a floresta local, sempre buscando manter a diversidade e a sustentabilidade ambiental. Portanto, acreditamos que os portugueses estavam equivocados ao afirmar que os índios “[…] não lavram […]” (Caminha, 1500) [1]. Pelo contrário, eles praticavam a agricultura de forma sustentável, um modelo que só recentemente foi reconhecido como o mais correto. Alves (2001, p. 15) [5] destaca a importância dos indígenas nesse contexto:

Os indígenas foram os pioneiros na implantação de sistemas agroflorestais na Amazônia, sendo reconhecidos por promover o adensamento de espécies como castanha-do-pará, cacaueiro e diversas palmeiras em diferentes locais da região.

É importante mencionar que se os seres humanos tivessem adotado modelos de produção sustentáveis desde tempos antigos, o planeta provavelmente não estaria enfrentando o atual aquecimento global tão acentuado. Ações humanas como desmatamento, queimadas e queima de combustíveis fósseis têm contribuído significativamente para altas emissões de gases como dióxido de carbono (CO2), metano (CH4) e óxido nitroso (N2O). Esses gases são responsáveis pelo efeito estufa, que por sua vez causa o aquecimento global e as mudanças climáticas.

Grande parte da comunidade científica acredita que o aumento da concentração de poluentes antropogênicos na atmosfera é a causa principal do efeito estufa, consequentemente do aquecimento global. (Silva; Paula, 2009, p.47) [6].

As mudanças climáticas afetam globalmente a vida de todos os seres vivos, alterando padrões climáticos como temperatura, umidade do ar e padrões de precipitação. Isso resulta em consequências como desertificação, extinção de espécies e desastres naturais significativos em várias partes do mundo. Segundo o Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas (2014, p. 25) [7],

Os cenários climáticos futuros indicam um aumento de eventos extremos de seca e estiagem prolongada, especialmente nos biomas da Amazônia, Cerrado e Caatinga, com acentuação a partir da metade e final do século XXI.

Os defensores do modelo agrícola convencional/monocultura geralmente são contrários aos modelos agroecológicos, devido aos altos lucros obtidos pela produção monocultural. Esses lucros beneficiam apenas pequenos grupos dominantes, enquanto a natureza e a maioria da população pagam o preço, mantendo esses grupos no poder continuamente. O capitalismo, um sistema baseado na propriedade privada e na busca incessante pelo lucro e acumulação de capital em forma de bens e dinheiro, influencia não apenas a economia, mas também aspectos políticos, sociais, culturais e éticos (Pena, 2024). [8]

Devido a isso, há poucos incentivos por parte das grandes potências para a implementação de modelos agroecológicos. Um dos poucos incentivos é o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA). Para evitar a perda de lucratividade e acesso a grandes extensões de terras, são feitas propagandas promovendo o agronegócio como solução para o ‘desenvolvimento’ do país, dificultando assim a difusão e a implementação de modelos agroecológicos. No entanto, esse modelo não é mais sustentável, pois a natureza tem mostrado sua resistência através das mudanças climáticas.

Existem inúmeros argumentos contra os defensores do agronegócio e a favor da agroecologia. Um deles é a afirmação de que os modelos agroecológicos demandam muito trabalho. De fato, muitos desses modelos são intensivos em trabalho, enfrentando desafios como a escassez de mão de obra atualmente disponível. No entanto, é crucial entender que o foco não deve ser o trabalho envolvido, mas a urgência da necessidade de adoção de modelos que minimizem os impactos das mudanças climáticas.

Outro argumento é que os modelos agroecológicos necessitam de recursos financeiros significativos. Embora seja verdade que há uma necessidade de financiamento substancial, é importante ressaltar que essa necessidade é exacerbada pelo próprio capital. Certamente vale a pena investir em agroecologia, pois ela não apenas promove práticas sustentáveis ​​e respeitosas ao meio ambiente, mas também preserva a saúde dos ecossistemas e das comunidades humanas que deles dependem.

 

Referências

[1] CAMINHA, Pero Vaz de. Carta de Pero Vaz de Caminha. 1500. Disponível em: https://www.cervantesvirtual.com/obra-visor/a-carta-de-pero-vaz-de-caminha–0/html/ffce9a90-82b1-11df-acc7-002185ce6064_2.html. Acesso em 18/06/2024.

[2] NETO, Canrobert Costa; CANAVESI, Flaviane. Sustentabilidade em assentamentos rurais: o MST rumo à reforma agrária agroecológica no Brasil. H. Alimonda (Comp.), Ecología Política. Naturaleza, sociedad y utopía, p. 203-215, 2002.

[3] LOPES, Paulo Rogério; LOPES, Keila Cássia Santos Araújo. Sistemas de produção de base ecológica–a busca por um desenvolvimento rural sustentável. REDD–Revista Espaço de Diálogo e Desconexão, v. 4, n. 1, 2011.

[4] NEVES, Pedro Dias Mangolini. Sistemas agroflorestais como fomento para a segurança alimentar e nutricional. Boletim Gaúcho de Geografia, v. 41, n. 2, 2014.

[5] ALVES, Raimundo Nonato Brabo. Características da agricultura indígena e sua influência na produção familiar da Amazônia. 2001.

[6] SILVA, Robson Willians da Costa; PAULA, Beatriz Lima de. Causa do aquecimento global: antropogênica versus natural. Terræ Didatica, v. 5, n. 1, p. 42-49, 2009.

[7] PBMC-Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas. Base científica das mudanças climáticas. Contribuição do Grupo de Trabalho, v. 1, 2014.

[8] PENA, Rodolfo F. Alves. “O que é capitalismo?”; Brasil Escola. Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/o-que-e/geografia/o-que-e-capitalismo.htm. Acesso em 08 de maio de 2024.

 



* João Edson Gomes e Edilson Pereira Ferreira Sena são acadêmicos da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziram este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre letivo de 2023 (janeiro a junho de 2024). Foram orientadados pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

Desigualdade salarial entre homens e mulheres

Desigualdade salarial entre homens e mulheres

Vivemos em uma sociedade onde as mulheres, além de trabalharem em seus empregos, também lidam com as tarefas domésticas. No entanto, um dos maiores desafios que enfrentam é a diferença salarial entre gêneros, pois os homens recebem significativamente mais, mesmo desempenhando a mesma função. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, no mês de julho de 2023, sancionou a lei nº 1.085 que garante a igualdade salarial entre os gêneros [1]. Esta lei é um direito que está previsto na Declaração Universal dos Direitos Humanos, no artigo 23, §2º, onde afirma que todo ser humano, sem qualquer distinção, tem direito a igual remuneração por igual trabalho. Infelizmente, não se observa o cumprimento desse direito na sociedade, como destacado em uma notícia publicada pelo G1 em 2022, que reportou uma diferença salarial superior a 20% [2].

Essa realidade, onde a mulher é menosprezada, é uma questão enraizada na história da sociedade há muito tempo, na qual a mulher é vista como um ser frágil, destinado apenas à procriação e à gestão doméstica. Infelizmente, essa percepção persiste nos tempos atuais, refletindo-se em uma diferença salarial cada vez mais presente e marcante.

No mesmo sentido, o site CONJUR (Consultor Jurídico), em 6 de dezembro de 2023, publicou que, de acordo com dados do IBGE, “as mulheres recebem salário 22% menor em comparação com os homens”. A disparidade salarial aumenta à medida que os cargos são mais altos – mulheres em posições de liderança chegam a receber cerca de 34% a menos do que os homens ocupantes do mesmo cargo [3] Se o direito das mulheres à igualdade salarial, quando estão na mesma profissão e função que os homens, não for respeitado, essa diferença só tenderá a aumentar. Dessa forma, o pensamento machista continuará prevalecendo, contribuindo para a desvalorização contínua da mulher.

Diariamente, as mulheres ouvem que não são capazes de realizar o que os homens fazem, sendo suas características físicas consideradas inadequadas para certas atividades. Essa visão masculina da mulher como um corpo delicado e frágil perpetua a desigualdade, mesmo quando elas possuem a mesma formação, idade e experiência necessárias para o trabalho. Infelizmente, esse pensamento machista persiste em muitas mentes, o que leva as mulheres a se sentirem oprimidas e desvalorizadas ao executar suas funções, sendo menos reconhecidas do que os homens que ocupam as mesmas posições.

Contudo, enquanto as mulheres continuarem expostas a essas situações, sem ver o reconhecimento de seu desempenho no trabalho, apesar de seus esforços diários, isso reforçará o mesmo pensamento machista de que não são capazes de competir em igualdade com os homens na mesma profissão. Esse é um pensamento enraizado por anos em uma sociedade machista, ao qual as mulheres estão submetidas diariamente.

Diante dos aspectos relacionados à desigualdade salarial entre mulheres e homens, é essencial promover atividades de conscientização nas escolas para que as crianças não cresçam com visões machistas. Educando futuros cidadãos para quebrarem esses paradigmas presentes na sociedade, tornamo-los capazes de compreender a desigualdade salarial e de se posicionarem contra os diversos pensamentos machistas que afetam até mesmo as escolhas profissionais das mulheres.

 

Referências

[1] https://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2023/07/03/lula-sanciona-lei-que-obriga-o-pagamento-de-salarios-iguais-para-homens-e-mulheres-na-mesma-funcao.ghtml

[2] https://g1.globo.com/trabalho-e-carreira/noticia/2022/04/20/pesquisa-mostra-os-cargos-com-maior-diferenca-salarial-entre-homens-e-mulheres.ghtml

[3] https://www.conjur.com.br/2023-dez-06/novas-medidas-de-igualdade-salarial-entre-homens-e-mulheres




SOBRE AS AUTORAS

Indiamara Cunha e Kátia Jesus são acadêmicas da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziram este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre de 2023 (janeiro a junho de 2024). Foram orientadas pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

Vulnerabilidade e gravidez precoce

Vulnerabilidade e gravidez precoce

Neste artigo queremos discutir a gravidez precoce [1] como uma das consequências da violência estrutural e institucional contra a mulher. A violência contra as mulheres é estrutural, pois se manifesta em todas as esferas sociais: na câmara dos deputados, nas delegacias policiais, nos espaços de trabalho público e privado e, principalmente, dentro do ambiente doméstico.

A violência contra a mulher também é institucional, pois quando imagens de policiais militares batendo em mulheres são divulgadas pela internet sem nenhuma consequência de punição, o Estado brasileiro normaliza este tratamento. O recado passado à sociedade é: “está autorizada a violência ao corpo feminino”. Nesse contexto, nota-se que a gravidez precoce é uma das faces da violência que a mulher sofre.

A violência contra o corpo feminino se manifesta de diferentes maneiras, resultando sempre na desvalorização da mulher socialmente e promovendo a precarização do seu corpo. Por exemplo, o salário feminino é inferior ao salário do homem na mesma atividade e na mesma empresa, uma violência que se manifesta de forma silenciosa e contínua. Todo mês, nos holerites, a mulher se sente diminuída.

Um dos dados que evidenciam isso é a diferença salarial: o rendimento das mulheres representa, em média, 77,7% do rendimento dos homens (R$ 1.985 frente a R$ 2.555), conforme a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad) de 2019 (CSJT, 2023) [2]. Não apenas as mulheres ganham menos nas estruturas sociais, mas também têm menores chances de ocuparem cargos de chefia. Os dados apontam para uma disparidade de gênero nas posições mais importantes dessas empresas. Apenas 17,4% das pessoas do sexo feminino possuem posição de destaque, como CFO (equivalente à diretora financeira) em bancos de investimento (Félix, 2024) [3].

Apesar de as mulheres serem maioria da população, a representação política feminina ainda é um desafio que parece estar longe de ser resolvido. Em João Pessoa, capital da Paraíba, a câmara municipal tem apenas uma vereadora. Podemos traduzir esta realidade na seguinte visão: quem toma conta do Brasil são os homens. Dentro do contexto da nossa discussão, fica a dúvida: para o homem, a gravidez precoce é um problema ou uma solução? Em 2018, foram eleitas 77 deputadas federais, 15% do total, o que, mesmo longe da paridade, representou um aumento expressivo em relação às eleições anteriores. Neste domingo (2), foram eleitas 92 mulheres para a Câmara e quatro para o Senado, totalizando 18% e 7%, respectivamente (Abreu, Mori, 2022) [4].

Dentro desta realidade, a sociedade tenta se contrapor, criando mecanismos legais que possam, de alguma forma, proteger as mulheres. Mas proteger de quem? Justamente dos homens. Alguns maiores exemplos são as delegacias especializadas e algumas leis. As Delegacias da Mulher são um espaço institucional especializado para socorrer mulheres que sofreram, ou ainda sofrem, violência por parte de homens (geralmente companheiros ou parentes). A Lei Maria da Penha define e criminaliza o feminicídio. Principalmente tirando da vítima a culpa do crime. A Lei Não é Não, por sua vez, busca proteger o corpo feminino da importunação e abuso em ambientes públicos.

Esta situação de vulnerabilidade autoriza, veladamente, o uso e abuso do corpo feminino. A menina adolescente se sente fragilizada diante do corpo masculino, sem condições de impor seus desejos e seus limites. A gravidez precoce não é apenas um trauma familiar nem uma ruptura de vida; é um caminho trilhado por muitas jovens. Neste contexto, a gravidez precoce faz parte de uma engrenagem social que normaliza esta situação. Talvez cumpra um papel importante na geração de mão de obra barata.

Referências

[1] https://ufmg.br/comunicacao/noticias/gravidez-na-adolescencia-uma-questao-de-saude-publica#:~:text=Segundo%20a%20Organiza%C3%A7%C3%A3o%20Mundial%20de,das%20mais%20altas%20do%20mundo.

[2]  CSJT. Desigualdade salarial entre homens e mulheres evidencia discriminação de gênero no mercado de trabalho. https://www.csjt.jus.br/web/csjt/-/desigualdade-salarial-entre-homens-e-mulheres-evidencia-discrimina%C3%A7%C3%A3o-de-g%C3%AAnero-no-mercado-de-trabalho. 2023.

[3] Félix, Thiago. Mulheres ocupam apenas 17% dos cargos de alto escalão em bancos de investimento, CNN, São Paulo, 2024.

[4] Abreu, Masra; Mori, Natalia. Como fica a representação feminina no Congresso Nacional a partir de 2023? Brasil de Fato, 2022.




SOBRE OS AUTORES

Graziella Rocha Baldaia e Clayton Fernandes são acadêmicos da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziram este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre de 2023 (janeiro a junho de 2024). Foram orientados pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

A polêmica da (des)criminalização do aborto

A polêmica da (des)criminalização do aborto

Os debates inerentes ao aborto são polêmicos, complexos e delicados, perpassando questões de cunho social, econômico, cultural, bioético, moral, religioso, ideológico, político e de saúde pública. Segundo Rocha (2015) [1], é comum o uso da palavra “aborto” para indicar a interrupção da gravidez. Contudo, do ponto de vista técnico, existe uma diferença entre aborto e abortamento. Conceitualmente, a Organização Mundial de Saúde (OMS) define o abortamento como a interrupção da gravidez até a 22ª semana, com produto da concepção pesando menos que 500g (BRASIL, 2012) [2]. Já o aborto é compreendido como o produto da concepção eliminado no abortamento. Pode ser classificado como espontâneo e provocado; o primeiro é interpretado como “natural” e é decorrente de inúmeras causas, enquanto o segundo é feito pela decisão da mulher (PEREIRA, 2018) [3].

No Brasil, a prática de interrupção provocada da gravidez é criminalizada, exceto nas hipóteses de gravidez decorrente de estupro, risco à vida da mulher e anencefalia do feto, previstas no Código Penal Brasileiro. Contudo, é de conhecimento geral que, mesmo com a proibição da prática, a interrupção da gravidez, para além das hipóteses previstas em lei, existe e é um fato social de ampla dimensão, sendo realizada, na maioria dos casos, em péssimas condições, colocando em risco a vida das mulheres (SANTOS, 2013) [4].

Grupos conservadores defendem a criminalização do aborto sob a pauta da moralidade religiosa e preceitos ideológicos, advogando em favor da proibição do aborto provocado, justificado pelo princípio da sacralidade da vida, cujo início ocorreria a partir da concepção. Portanto, quem aborta estaria tirando uma vida. Os argumentos sustentados pelos ativistas em favor da criminalização do aborto versam sobre a proteção ao feto/bebê considerado o mais vulnerável, além da promoção de medidas de auxílio às mães que não querem ter filhos, partindo do ponto de vista de que, ao invés de descriminalizar o aborto, deveriam ser criadas oportunidades para que as mulheres que pensam em realizar o abortamento possam ter as crianças com o amparo adequado, através de políticas de auxílio que proporcionarão condições dignas para a manutenção da gestação e para a saúde da mulher e do bebê.

Em contrapartida, grupos feministas e defensores da descriminalização do aborto, promotores de ações relacionadas à saúde da mulher, apontam a questão como um caso de saúde pública, argumentando que a prática é a razão para o elevado índice de mortalidade materna. O debate se articula no âmbito de diversas posições morais e conflitos legais, que se desdobram na perspectiva sociocultural e econômica. Ademais, os defensores da legalização do aborto argumentam que a previsão legal de proibição do aborto no Código Penal fere preceitos fundamentais da Constituição Federal, como o direito das mulheres à vida, à dignidade, à cidadania, à não discriminação, à liberdade, à igualdade, à saúde e ao planejamento familiar, entre outros. Ressaltam ainda que deveria ser garantido às mulheres o direito de decidir sobre o próprio corpo.

De acordo com um levantamento de dados feito pelo G1 na base de dados do DataSUS [5], no ano de 2020, o número de mulheres atendidas pelo Sistema Único de Saúde (SUS) em razão de abortos malsucedidos foi 79 vezes maior que o de interrupções de gravidez previstas pela lei. Segundo o levantamento, no período de janeiro a junho do mesmo ano, o SUS realizou 1.024 abortos legais em todo o Brasil e, no mesmo período, foram realizados 80.948 procedimentos de curetagens e aspirações, processos necessários para a limpeza do útero após um aborto incompleto, que são mais frequentes nos casos em que a interrupção da gravidez é provocada, ou seja, a necessidade é menor no caso de abortos espontâneos.

Fato é que existem muitas questões atreladas à legalização do aborto, e estas vão muito além da relação com o avanço científico e tecnológico. Esse embate se conecta a um sistema complexo que envolve posicionamentos sociais, políticos e religiosos. Ademais, a ideia de ser “contra” ou “a favor” do aborto é puramente individual e pautada nos ideais, valores e crenças de cada sujeito. Portanto, o tema será sempre rodeado de polêmicas em função da divergência de posicionamentos. Compreender e respeitar a diversidade de opiniões que permeiam o assunto é fundamental para a formação de um diálogo que considere os prós e contras apresentados por cada grupo, visando chegar a um consenso. Neste sentido, é fundamental considerar a realidade e as consequências da prática do aborto, principalmente no que tange à saúde da mulher.

Por fim, a legalização da prática abortiva no Brasil não será a solução para amenizar o número dos procedimentos que colocam em risco a integridade física e emocional da mulher. O ideal seria o investimento em políticas públicas de conscientização, promoção da educação sexual e do planejamento familiar, e acolhimento de mulheres em situação de vulnerabilidade, além de políticas de enfrentamento da desigualdade social. A prevenção do aborto inseguro depende de esforços de setores políticos, econômicos e sociais para garantir a ampliação do debate sobre o tema, pautado na conscientização e promoção da dignidade das mulheres.

Referências

[1] ROCHA, Wesley Braga et al. Percepção de profissionais da saúde sobre abortamento legal. Revista Bioética, v. 23, 2015. Disponível in: https://doi.org/10.1590/1983-80422015232077. Acesso em 20/03/2024.
[2] BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Prevenção e tratamento dos agravos resultantes da violência sexual contra mulheres e adolescentes: norma técnica / Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. – 3. ed. atual. Brasília: Ministério da Saúde, 2012. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/prevencao_agravo_violencia_sexual_mulheres_3ed.pd. Acesso em 20/03/2024.
[3] PEREIRA, Adriana de Jesus. O Papel do Profissional Enfermeiro Frente ao Aborto em seus Aspectos Jurídicos, Físico e Emocionais. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento, v. 07, 2018. Disponível em: https://www.nucleodoconhecimento.com.br/saude/profissional-enfermeiro. Acesso em 20/03/2024.
[4] SANTOS, Vanessa Cruz. et al. Criminalização do aborto no Brasil e implicações à saúde pública. Revista Bioética, v. 21, 2013. Disponível em https://www.scielo.br/j/bioet/a/3ZMrQd69ZnwWCGNXTsZzh7t/?lang=pt. Acesso em 05/05/2024.
[5] ACAYABA, Cíntia; FIGUEIREDO, Patrícia. SUS fez 80,9 mil procedimentos após abortos malsucedidos e 1.024 interrupções de gravidez previstas em lei no 1º semestre de 2020. G1. São Paulo. 2020. Disponível em https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/2020/08/20/sus-fez-809-mil-procedimentos-apos-abortos-malsucedidos-e-1024-interrupcoes-de-gravidez-previstas-em-lei-no-1o-semestre-de-2020.ghtml. Acesso em 05/05/2024.




SOBRE OS AUTORES

Gilvan Barrozo Dos Santos e Orlandina Aparecida Da Silva Rodrigues são acadêmicos da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziram este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre de 2023 (janeiro a junho de 2024). Foram orientados pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

A agroecologia e a voz das mulheres do campo

A agroecologia e a voz das mulheres do campo

No Brasil, a agroecologia é um instrumento de resistência na jornada de mulheres pretas e agricultoras. Observamos o quanto as mulheres sofrem com a desvalorização de seu ser e de seu trabalho, principalmente as mulheres do campo que são pretas e agricultoras, as quais passam o tempo todo cuidando dos filhos, arrumando a casa, trabalhando na roça e no quintal, cultivando. Mesmo com essa carga horária altíssima, cheia de tarefas, as mulheres têm seu trabalho desvalorizado e não reconhecido pela sociedade. Nesse cenário, a agroecologia se configura como um instrumento essencial, promovendo autonomias na trajetória das mulheres pretas agricultoras e importante e poderosa aliada na resistência e no empoderamento delas.

Ao longo da história, os homens são vistos como fortes e livres, enquanto as mulheres têm sido colocadas em uma posição de inferioridade, rotuladas como o sexo frágil e tendo seus trabalhos invisibilizados. Diante desse cenário, devemos considerar que o trabalho das mulheres do campo é de extrema importância para a contribuição da renda familiar, visto que, enquanto estão produzindo grãos, legumes, verduras, entre outros produtos, deixam de comprá-los. Dessa forma, a agroecologia surge como um instrumento crucial para as mulheres do campo conquistarem autonomia, permitindo-lhes romper com esse tratamento desigual. Através da agroecologia, elas podem evidenciar como seus trabalhos são fundamentais para a subsistência de suas famílias e das comunidades, ao mesmo tempo em que demonstram respeito pela natureza, lutam por justiça social, enfrentam o racismo, reivindicam seus espaços e direitos. A essência de seus trabalhos gera alimentos produzidos de forma orgânica e sustentável, o que contribui para a segurança alimentar da região.

O trabalho sobre agroecologia produzido como conclusão de curso, intitulado “Mulheres Rurais e Seus Quintais Produtivos: Empoderamento Feminino, Sustentabilidade e Segurança Alimentar”, de Carolina Azevedo de Brito (2020) [1], apresenta que a segurança alimentar torna acessível a todos a obtenção de alimentos, visando garantir uma vida saudável à sociedade, permitindo o acesso a uma alimentação adequada por meio de recursos locais de forma constante e sustentável. Como exemplo de um trabalho sustentável que gera segurança alimentar, podemos citar o trabalho realizado pelo Coletivo de Agroecologia Quilombo Ausente Feliz, da comunidade Quilombola de Ausente/Serro-MG, em que as mulheres produzem alimentos saudáveis e agroecológicos para o sustento da família e para vendas no entorno da comunidade. Nesse processo, elas se empoderam, tornando-se referências na luta por reconhecer o contexto em que estão inseridas e demonstrando que esse trabalho também é uma forma de resistência contra o racismo estrutural, reafirmando suas raízes e identidade, além de promover uma boa alimentação. Vale ressaltar que, além da produção para a venda e consumo próprio, em muitas comunidades do campo há também relações de doações e trocas de alimentos.

O texto “Cadernetas agroecológicas e as Mulheres do Semiárido: de mãos dadas fortalecendo a agroecologia” do Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola (FIDA, 2020) [2] aborda a informação, com base no censo de 2010, de que o quantitativo de mulheres que se encontram chefiando os lares e desempenhando outros trabalhos não trouxe visibilidade para elas. Portanto, conclui-se que, na maioria das vezes, não há políticas públicas exclusivamente destinadas às mulheres agricultoras para que as auxiliem na busca por melhores condições de trabalho e segurança. Percebe-se isso porque essas mulheres há muito tempo vivem rodeadas de violência doméstica, resultante do machismo, entre outras questões.

Em outra realidade, como em comunidades rurais do município de Serro-MG, por exemplo, dentre todos os programas governamentais e não governamentais, são as mulheres que participam ativamente. Com isso, observamos que a agroecologia/agricultura familiar tem sido uma forma de quebrar esse modelo, pois atualmente, por meio de movimentos sociais e projetos, elas têm acesso a formações políticas, sociais e econômicas, que contribuem para sua autonomia e independência. Tudo isso fortalece o reconhecimento de suas identidades enquanto mulheres tradicionais, quilombolas, campesinas que enfrentam diariamente conflitos com grandes empreendimentos minerários que estão chegando na região.

A agroecologia tem sido uma ferramenta muito utilizada pelas mulheres no enfrentamento do racismo estrutural. O texto “Agrofloresta, feminismo e agroecologia: entrelaçando saberes e fazeres das mulheres” de Lobo e Curado (2022) [3] aponta que a agroecologia é vista como um caminho em oposição à conjuntura racista e capitalista que vivenciamos na sociedade, por meio de diversas frentes de luta como: manifestações públicas, compartilhando e dando visibilidade aos saberes das comunidades e das mulheres, produzindo alimentos saudáveis, entre outras coisas. Dessa forma, com muita luta e resistência, as mulheres têm conquistado cada vez mais seu lugar de fala, mostrando o quanto seu trabalho tem importância para o mundo. Além disso, as mulheres do campo têm soltado cada vez mais sua voz através da participação em movimentos sociais, comunitários e projetos de vendas coletivas formados por mulheres.

No site da revista UOL, no texto intitulado “Bolsonaro defende agronegócio e consumo de carne ‘de segunda a domingo’” por Ricardo Brito (2022) [4], há uma fala do ex-presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, que diz, “investir no agronegócio é um bom negócio e, para mim, carne fica de segunda a domingo, desde que tenha à disposição para a gente comprar, obviamente, e recurso para tal”. Essa fala do ex-presidente defende o capital pelo fato de ser um setor que gera dinheiro rápido, uma vez que envolve projetos de grande porte e grandes empresários, os quais visam somente o lucro. Investir no agronegócio concentra recursos e poder nas mãos de poucos, gerando, assim, desigualdade social e econômica. O agronegócio, com suas produções intensivas, provoca grandes impactos no meio ambiente, como desmatamento e poluição decorrente do uso excessivo de substâncias químicas. Isso compromete a saúde pública, uma vez que o consumo de alimentos ultraprocessados e com agrotóxicos aumenta. E afeta também o bem-estar dos animais devido às condições precárias em que são mantidos, e a qualidade das plantações. Assim, percebe-se que o agronegócio não se mostra como uma produção sustentável, tampouco de boa qualidade. Ao contrário, a agroecologia é baseada na sustentabilidade, prezando pela qualidade dos alimentos e pelo bem-estar social, comunitário e coletivo. E a mulher do campo agricultora tem um papel fundamental nessa forma de produção agroecológica.

Enfim, é de suma importância trabalhar essas questões da resistência da mulher por meio da agroecologia, tanto no ambiente escolar quanto com os jovens das comunidades rurais. Promover momentos de debates sobre o tema, desenvolver atividades com os alunos e jovens das comunidades e realizar intercâmbios entre escola e territórios, de forma a explicar aos alunos e jovens que o trabalho das mulheres, assim como o trabalho dos homens, tem importância e deve ser reconhecido e valorizado.

Referências

[1] BRITO, Carolina Azevedo de. Mulheres Rurais e Seus Quintais Produtivos: empoderamento feminino, sustentabilidade e segurança alimentar. 2020, 21f. Trabalho de Conclusão de Curso (Especialização em Gestão Ambiental de Municípios) – Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia da Paraíba, Princesa Isabel-PB. Disponível em: https://repositorio.ifpb.edu.br/jspui/bitstream/177683/1607/1/CarolinaBrito_MULHERES%20RURAIS%20E%20SEUS%20QUINTAIS%20PRODUTIVOS.pdf. Acesso em: 23 de Março de 2024.
[2] FUNDO INTERNACIONAL DE DESENVOLVIMENTO AGRÍCOLA (FIDA). Cadernetas agroecológicas e as mulheres do semiárido de mãos dadas fortalecendo a agroecologia: resultados do uso das cadernetas nos projetos apoiados pelo FIDA no Brasil de agosto de 2019 a fevereiro de 2020. Salvador, Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola (FIDA), 2020, 232 p.
[3] LOBO, Natália; CURADO, Isabela. Agrofloresta, feminismo e agroecologia: entrelaçando saberes e fazeres das mulheres. Capire, 2022. Disponível em: https://capiremov.org/experiencias/agrofloresta-feminismo-e-agroecologia-entrelacando-saberes-e-fazeres-das-mulheres/ . Acesso em 23 de março de 2024.
[4] BRITO, Ricardo. Bolsonaro defende agronegócio e consumo de carne ‘de segunda a domingo’. UOL, 2022. Disponível em: https://economia.uol.com.br/noticias/reuters/2022/01/06/bolsonaro-defende-agronegocio-e-consumo-de-carne-de-segunda-a-domingo.htm . Acesso em: 24 de Março de 2024.




SOBRE AS AUTORAS

Elizete Pires de Sena e Luciene A. C. Viríssimo Brandão são acadêmicas da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziram este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre de 2023 (janeiro a junho de 2024). Foram orientadas pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

Feminicídio e violação dos direitos das mulheres

Feminicídio e violação dos direitos das mulheres

No Brasil e em muitas partes do mundo, as mulheres enfrentam diariamente uma ameaça que não deveria existir no século XXI: o feminicídio. Esse termo, criado para descrever o assassinato de mulheres por razões de gênero, reflete uma realidade brutal que permeia nossa sociedade. É uma violação flagrante dos direitos humanos e uma triste evidência da persistência do machismo e da misoginia em nossa cultura.

A Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006) e a Lei do Feminicídio (Lei nº 13.104/2015) tipificam esse crime como homicídio qualificado quando a vítima é morta em razão de seu gênero. Ao violar direitos fundamentais, como o direito à vida, à integridade física e à igualdade de gênero, o feminicídio contraria diversos artigos da Declaração Universal dos Direitos Humanos, incluindo os artigos 3º, 5º e 7º. Conforme Pires e Perregil [1] (2021) é essencial compreender esse crime como uma clara violação ao direito à vida, à segurança e à igualdade, princípios fundamentais que são sistematicamente desrespeitados quando uma mulher é vítima desse crime brutal. Nesse sentido, assumir uma posição contrária ao feminicídio é uma questão de coerência com os valores democráticos e humanistas que regem nossa sociedade.

O feminicídio é uma dura realidade em nossa sociedade contemporânea, representando uma das mais cruéis violações dos direitos humanos das mulheres. Não se trata apenas de um crime comum, mas de uma manifestação clara da desigualdade de gênero e da violência contra as mulheres. Refere-se a uma forma específica de violência de gênero, motivada pelo machismo e pela misoginia arraigados em nossa sociedade. Portanto, exige medidas específicas e uma abordagem diferenciada por parte das autoridades e da sociedade como um todo. Essa triste realidade demanda ação urgente e decidida para ser erradicada.

Os números crescentes de feminicídios no Brasil não podem ser ignorados. De acordo com o G1 (2022) [2], a cada seis horas, uma mulher perde sua vida vítima desse crime brutal, deixando um rastro de dor e sofrimento para trás. Diante desse contexto, Nascimento (2023) [3] afirma que não podemos deixar de considerar o impacto devastador desse crime não apenas nas vítimas, mas também em suas famílias e na sociedade como um todo. Além do trauma emocional profundo que afeta as famílias das vítimas, o feminicídio também contribui para a perpetuação do medo e da insegurança entre as mulheres.

Diante dessa alarmante realidade, é necessário adotar uma postura firme e comprometida na luta contra essa forma extrema de violência de gênero. O reconhecimento inequívoco de que tal crime é uma violação dos direitos humanos das mulheres e uma manifestação clara da desigualdade e opressão de gênero é imprescindível. Não podemos mais aceitar passivamente sua ocorrência ou tratá-lo como apenas mais um crime. É imperativo que nos posicionemos de forma clara e inequívoca contra ele, defendendo a igualdade, o respeito e a dignidade das mulheres em todas as esferas da vida. Não se pode negar que o feminicídio é uma manifestação direta da desigualdade de gênero e do machismo estrutural que permeia nossa cultura. Ele reflete a ideia profundamente arraigada de que as mulheres são vistas como seres inferiores, cujas vidas têm menos valor do que as dos homens. Portanto, combatê-lo significa desafiar e transformar essas estruturas de poder desiguais que perpetuam a violência de gênero.

Defender a justiça e a responsabilização dos agressores é fundamental. Garantir que aqueles que cometem feminicídio sejam devidamente punidos é crucial para enviar uma mensagem clara de que esse tipo de violência não será tolerado em nossa sociedade. Isso envolve não apenas a aplicação rigorosa da lei, mas também a promoção de uma cultura de respeito pelos direitos das mulheres e de rejeição à violência de gênero em todas as suas formas. Para lidar com isso, é importante investir em medidas preventivas e educacionais para combater o feminicídio. Isso inclui programas educacionais que promovam a igualdade de gênero, o respeito mútuo e a não violência desde cedo, bem como políticas públicas que garantam o acesso das mulheres à justiça e aos serviços de proteção. Somente através de uma abordagem abrangente e multidisciplinar poderemos efetivamente enfrentar o feminicídio e construir uma sociedade mais justa, igualitária e segura para todas as mulheres.

Infelizmente, ainda existem vozes que minimizam sua gravidade e desconsideram suas motivações. A exemplo do ex-presidente Bolsonaro, que, de acordo com o Carta Capital (2018) [4], tratou esses crimes como algo corriqueiro, evidenciando a falta de empatia e compromisso político que pode perpetuar essa violência. No entanto, não podemos nos deixar abater por discursos que tentam normalizar o feminicídio. Devemos nos unir em torno desse objetivo comum e trabalhar incansavelmente para erradicar essa forma de violência de gênero. Isso requer uma ação conjunta e coordenada entre o Estado, as organizações da sociedade civil e a população em geral.

Para avançarmos nessa luta, é fundamental promover o diálogo e a colaboração entre os diversos setores da sociedade. Somente assim poderemos efetivamente enfrentar o feminicídio e construir uma sociedade mais justa e igualitária, onde todas as mulheres possam viver livres do medo e da opressão. Resta claro que o combate ao feminicídio é uma questão de direitos humanos e de justiça social. Devemos nos manter firmes em nossa determinação de erradicar essa epidemia de violência de gênero e garantir que todas as mulheres possam viver com dignidade e segurança. Juntos, podemos e devemos fazer a diferença.

Referências

[1] https://innocenti.com.br/a-importancia-da-luta-em-defesa-e-garantia-dos-direitos-humanos-das-mulheres/#top

[2] https://g1.globo.com/monitor-da-violencia/noticia/2023/03/08/brasil-bate-recorde-de-feminicidios-em-2022-com-uma-mulher-morta-a-cada-6-horas.ghtml

[3] https://sites.uel.br/lesfem/nada-e-como-a-mae-a-vida-de-criancas-e-adolescentes-orfaos-do-feminicidio/

[4] https://www.cartacapital.com.br/blogs/brasil-debate/o-discurso-que-legitima-o-feminicidio/




SOBRE AS AUTORAS

Elidiana Martins da Silva e Márcia Vicente de Sales são acadêmicas da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziram este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre de 2023 (janeiro a junho de 2024). Foram orientadas pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

Educação sexual e responsabilidade

Educação sexual e responsabilidade

Desde a década de 1970, segundo Juliane Pariz, Celito Francisco Mengarda e Giana Bitencourt Frizzo (2012) [1], a maternidade na adolescência vem sendo identificada como um problema de saúde pública. Complicações obstétricas com repercussões para a mãe e o recém-nascido, bem como problemas psicológicos, sociais e econômicos, têm fundamentado essa afirmação, evidenciando a gravidez na adolescência como um fenômeno complexo e preocupante, pois esta é uma fase de descobertas e mudanças, tanto físicas quanto emocionais. Nesse contexto, os adolescentes muitas vezes estão expostos a situações de risco, incluindo relações sexuais sem proteção, ocasionando um desafio tanto para os adolescentes quanto para a sociedade em geral. As ações voltadas para lidar com essa temática têm se apoiado em resoluções fundamentadas em políticas educacionais de educação sexual.

É imprescindível que haja Educação Sexual nas escolas para que os adolescentes tenham acesso a informações sobre métodos contraceptivos e todas as consequências de uma relação desprotegida, como DSTs e gravidez indesejada. Assim, esses jovens podem desenvolver uma sexualidade responsável, na qual tenham autonomia e garantia de seu bem-estar. Fornecendo informações precisas e abrangentes sobre educação sexual aos adolescentes, reduziremos os índices alarmantes de gravidez na adolescência.

De acordo com as informações disponíveis no site do Gov.br [2], diariamente, 1.043 adolescentes no Brasil se tornam mães. A cada hora, ocorrem 44 nascimentos de bebês cujas mães são adolescentes, com duas dessas jovens tendo entre 10 e 14 anos de idade. Esses dados foram obtidos por meio do Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos (Sinasc), uma ferramenta do Sistema Único de Saúde (SUS). Esses fatos apontam um grande problema, pois, segundo Marta Edna Holanda Diógenes Yazlle (2006), [3] a gravidez neste grupo populacional vem sendo considerada, em alguns países, um problema de saúde pública, uma vez que pode acarretar complicações obstétricas, com repercussões para a mãe e o recém-nascido, bem como problemas psicossociais e econômicos.

Nesse contexto, a educação desempenha um papel crucial, fornecendo informações precisas sobre saúde sexual e capacitando os jovens a possuírem habilidades de tomada de decisão e autoconhecimento, fundamentais para promover escolhas saudáveis e responsáveis, auxiliando na prevenção de gravidezes não planejadas. Portanto, investir em programas educacionais abrangentes que abordem questões ligadas à sexualidade é de suma importância para enfrentar esse desafio e garantir um futuro mais promissor para os jovens brasileiros.

Em revisão crítica da literatura, Ana Cristina Garcia Dias e Marco Antônio Pereira Teixeira (2010) [4], constataram que a gravidez precoce acarreta aumentos significativos nos riscos de mortalidade, tanto para a mãe quanto para o bebê, além de elevar as chances de parto prematuro, anemia, aborto espontâneo, eclâmpsia e depressão pós-parto. Adicionalmente, segundo Ana Cristina Garcia Dias (2010), há impactos sociais consideráveis, como o abandono dos estudos, desorganização familiar, afastamento do convívio escolar, isolamento social e dificuldade de inserção no mercado de trabalho. O contexto individual e familiar também é profundamente afetado, gerando um abalo emocional.

No entendimento de Leila Maria Vieira, Sandra de Oliveira Sales, Adriana Aparecida Bini Dória e Tamara Beres Lederer Goldberg (2006), [5] métodos de prevenção da gravidez e dos perigos associados ao sexo sem proteção são essenciais para que os jovens experimentem uma sexualidade saudável e responsável. Isso garante a prevenção tanto da gravidez não planejada quanto das doenças sexualmente transmissíveis e promove o direito humano à expressão sexual separada da reprodução, permitindo uma maior liberdade nesse aspecto da vida. As instituições de ensino, sendo grandes parceiras dos alunos e o lugar onde passam boa parte do tempo, podem atuar como mecanismos de inserção do assunto, trazendo palestras educativas que já são realizadas pelas entidades públicas, além de uma preparação estrutural do corpo docente, valorizando, dessa forma, o corpo do adolescente e o desenvolvimento do pensamento crítico.

Segundo César Aparecido Nunes (1987) [6], a temática da sexualidade é constantemente controversa, pois abarca uma variedade de questões, desde aspectos religiosos até considerações éticas, abrangendo diversas perspectivas. Ao abordar esse assunto, muitas pessoas tendem a associá-lo exclusivamente ao ato sexual. Entretanto, o conceito de sexualidade é muito mais amplo e não se limita apenas a isso, podendo também englobar aspectos relacionados à saúde. De acordo com Gabriela Cabral da Silva Dantas (2024) [7], isso implica na responsabilidade individual de cuidar do próprio corpo, a fim de evitar situações indesejadas no futuro, como a contração de doenças ou uma gravidez precoce e indesejada. Portanto, ao integrar a educação sexual no currículo escolar de forma abrangente, as instituições de ensino não apenas contribuem para o desenvolvimento integral dos estudantes, mas também desempenham um papel crucial na redução dos índices de gravidez na adolescência e na promoção da saúde sexual e reprodutiva.

Para mudar esse contexto, a escola deve trabalhar a educação sexual respeitando a faixa etária das crianças e adolescentes, abordando o respeito ao próprio corpo, ao corpo do outro e à sexualidade de modo pedagógico, envolvendo aspectos da vida como questões emocionais, sensações corpóreas, afeto, razão, amizade e gênero. Cabe aos profissionais a maneira de introduzir e abordar o tema de forma inteligente e aberta, quebrando tabus e preconceitos entre os jovens. Na maioria dos casos, os pais e responsáveis não têm informação suficiente para assumirem essa demanda. Por meio das Secretarias de Educação dos Estados e do Distrito Federal, o Ministério da Educação (MEC), em parceria com o Ministério da Saúde, deve oferecer programas de formação continuada para os professores, capacitando-os para abordar os temas de forma sensível, inclusiva e baseada em evidências científicas. As Secretarias de Educação dos Estados devem estabelecer parcerias com profissionais de saúde, como enfermeiros e psicólogos, para oferecer orientações e informações especializadas aos alunos, bem como realizar campanhas de prevenção e conscientização. Dessa forma, o MEC deve avaliar regularmente a eficácia das iniciativas implementadas por meio de pesquisas, questionários de satisfação e análise de indicadores de saúde e bem-estar dos alunos, ajustando as estratégias conforme necessário.

A educação sexual será o melhor método contraceptivo, pois os métodos tradicionais não são usados pelos adolescentes, contribuindo para a redução da gravidez precoce. É importante que todas as ações sejam desenvolvidas de forma colaborativa, envolvendo não apenas os professores e a equipe escolar, mas também os alunos, os pais/responsáveis e outros membros da comunidade, para garantir uma abordagem abrangente e sustentável da educação sexual na escola.

Referências

[1] PARIZ, J.; MENGARDA, C. F.; FRIZZO, G. B. A Atenção e o Cuidado à Gravidez na Adolescência nos Âmbitos Familiar, Político e na Sociedade: uma revisão da literatura. Saúde e sociedade, São Paulo, 2012.

[2] HOSPITAL UNIVERSITÁRIO DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO MARANHÃO (HU-UFMA). Por hora, nascem 44 bebês de mães adolescentes no Brasil, segundo dados do SUS. Gov.br, 2023. Disponível em: <https://www.gov.br/ebserh/pt-br/comunicacao/noticias/por-hora-nascem-44-bebes-de-maes-adolescentes-no-brasil-segundo-dados-do-sus>. Acesso em: 19 de fevereiro 2024.

[3] YAZLLE, Marta Edna Holanda Diógenes. Gravidez na adolescência. Revista Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia, v. 28, 2006.

[4] DIAS, Ana Cristina Garcia; TEIXEIRA, Marco Antônio Pereira. Gravidez na adolescência: um olhar sobre um fenômeno complexo. Ribeirão Preto: Paidéia, v. 20, 2010.

[5] VIEIRA, Leila Maria et al. Reflexões sobre a anticoncepção na adolescência no Brasil. Revista Brasileira de Saúde Materno Infantil, v. 6, 2006.

[6] NUNES, César Aparecido. Desvendando a sexualidade. Campinas: Papirus, 1987.

[7] DANTAS, Gabriela Cabral da Silva. Educação Sexual – Brasil Escola. Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/sexualidade/educacao-sexual.htm. Acesso em 29 de fevereiro de 2024.




SOBRE OS AUTORES

Claudiana Silva Sincurá e Edmilson Oliveira Silva são acadêmicos da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziram este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre de 2023 (janeiro a junho de 2024). Foram orientados pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.