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Karina de Matos Fernandes, Itamarandiba/MG
Ah, que saudades que tenho do Aurélio, meu companheiro tão presente na minha vida escolar. Lembro de você como peça fundamental para o meu aprendizado. Hoje, vendo os avanços da tecnologia, fico triste em saber que as novas gerações não conhecem e jamais conhecerão você.
Hoje, as palavras não são mais as mesmas de antigamente; elas perderam algumas letras e é preciso decifrar qual a mensagem que as pessoas desejam passar. Temos “Blz”, “Ñ”, “Ss”, “Pq”, entre muitas outras, e algumas das quais precisamos pesquisar pra compreender.
Ah, que saudades da época da escola! Tantas lembranças: os dias de prova tinham cheirinho de álcool, pois o professor usava os famosos mimeógrafos. Alguns livros ficaram marcados na minha memória, como Os Capitães da Areia, um romance de Jorge Amado. Que estória! O livro relatava uma realidade dura, totalmente distante da minha.
Lembro-me também dos livros de pesquisa que tinham capa dura, de cor vermelha com letras douradas grafadas e centenas de páginas: os elegantes livros Barsa, as bibliotecas com aquelas prateleiras repletas de livros, mundos de experiências e histórias!
Tentando lembrar-me de memórias mais antigas, pois já estou “batendo na porta dos meus 40 anos”, precisei recorrer às informações da minha querida mãe. Eu comecei a estudar e a ter acesso às letras e números aos cinco anos de idade, na Escola Municipal de Educação Infantil de Santa Isabel, no estado de São Paulo. Quando aprendi a ler, todas as placas na rua me fascinavam, e minha mãe sempre brincava quando entrávamos no ônibus e dizia: “Filha, fica caladinha, senão precisaremos pagar a passagem!”
Uma coisa interessante sobre números: não me ensinaram o algarismo romano. Eu morava em outra cidade em São Paulo, e, na metade do ano letivo, mudamos para Minas Gerais, a “terra do queijo”. Passou despercebido pelos meus educadores o fato de essa matéria não ter sido incluída na minha grade curricular, pois se tratava de uma aluna em transição, e os conteúdos não foram os mesmos na mesma sequência entre as escolas.
Minhas experiências com dinheiro não são muito boas (risos). Lembro-me de que, ainda criança, meu pai me deu alguns cruzados e eu não queria gastar. Num belo dia de passeio, levei o meu dinheirinho e o perdi pelo caminho. Ali aprendi a não ter amor pelo dinheiro.
Há algumas memórias que vêm à mente quando me lembro dos meus boletins, todos recheados com notas acima de 20 e muitos totais de 25. Sempre muito estudiosa e inteligente, fui premiada em todos os bimestres.
Na escola, eu tive minha primeira experiência com plágio. Cada aluno teria que fazer uma frase para a formatura da oitava série, e as melhores frases seriam escolhidas. Para minha surpresa, quando recebemos os convites, que tinham o formato de um pequeno livro, minha frase estava estampada em uma das páginas e abaixo o nome da professora. Nesse momento, olhei com deslumbramento para a professora e disse: “Essa frase fui eu que escrevi!” Foi um misto de orgulho e alegria por ver ali o fruto dos meus pensamentos e decepção, pois não me foram dados os devidos créditos. Essa foi a primeira das muitas injustiças que a vida me reservava.
Na minha época, não era importante ser apenas inteligente; era preciso ter uma boa condição financeira. Há vinte e dois anos, não existia a possibilidade de estudo a distância como se tem hoje. Para buscar uma formação profissional, era preciso se deslocar para outra cidade, o que gerava custos. Com a mentalidade e os recursos dos nossos pais, o objetivo era apenas concluir o ensino médio e arrumar um bom emprego. Muitos de nós não tivemos a oportunidade.
Na minha época, não existia internet. Ela chegou à nossa cidade por volta de 2005, mas nem todos tinham acesso e a velocidade era ruim! Ainda lembro da conexão através de modem. A partir daí, ela cresceu e hoje está acessível em todo lugar. Confesso que ela nos deixou um pouquinho mais preguiçosos; já não usamos mais a escrita correta e nem paramos para pensar qual seria, pois o teclado do celular imediatamente se antecipa.
Nem lembramos mais da tabuada; não fazemos mais contas de cabeça, até para o ‘2 + 2’ precisamos da calculadora. Não pesquisamos mais em livros, pois o Google sabe de tudo, e agora, então, com a nova ferramenta, o ChatGPT, cada dia que passa nos leva à comodidade. As fórmulas que aprendemos na escola poucas ainda fazem sentido, mas aquela velha mentalidade de que não havia nada além do terceiro ano não me deixou aprofundar mais!
Ah, se essa geração soubesse a joia preciosa que tem na palma das mãos! A internet, de mãos dadas com a educação, pode nos proporcionar realizações de sonhos que antes eram inalcançáveis: um estudo de boa qualidade, onde você nem precisa sair de casa, com conteúdos de conhecimento usando a internet a nosso favor.
O que posso dizer a essa nova geração? Hoje tenho a oportunidade de cursar a minha tão sonhada faculdade, e meu conselho é: estudem, formem-se e tornem-se bons profissionais. Que essa vontade de conhecimento seja passada de geração a geração, e que a busca pelo conhecimento seja maior do que a busca pelos likes!
SOBRE A AUTORA:
Karina de Matos Fernandes, de Itamarandiba/MG, é acadêmica da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM), onde cursa Pedagogia. Produziu este relato na disciplina Práticas de Leitura e Produção de Textos, ofertada de julho a novembro de 2024.
A orientação deste trabalho e a organização do e-book foram realizadas por Carlos Henrique Silva de Castro, Kátia Lepesqueur e Virgínia Batista.