Um mundo de descobertas através da leitura

Um mundo de descobertas através da leitura
Ana Carolina

Os textos publicados individualmente nesta página podem ser lidos reunidos nos volumes da coleção Memórias de Letramentos. Para adquirir seu e-book gratuito ou impresso  pelo preço apenas do serviço de gráfica, clique no banner ao lado ou no fim da página.


Ana Carolina de Oliveira, Itamarandiba/MG

Sou a irmã mais velha de cinco irmãos e, desde pequena, tive inúmeras atividades em casa, como ajudar a cuidar dos irmãos menores e nas tarefas domésticas. Sempre fui apaixonada por leitura, e ir para a escola era meu sonho. Mesmo antes de começar a frequentar a escola, minha mãe me ensinou o alfabeto e os números, e eu sempre tive muita curiosidade para aprender coisas novas, o que despertava meu interesse em aprender a ler e escrever.

Iniciei na escola aos cinco anos e me lembro de que, ao começar a aprender a ler, eu parava para ler todas as fachadas nas ruas e fazia minha mãe me esperar para terminar de ler. Assim como os livros e revistas aos quais tinha acesso em casa, na escola e na igreja, eu juntava as sílabas e nutria um grande desejo de aprender a ler. Recordo que tinha um relógio despertador com aquele toque estrondoso que me acordava todas as manhãs para ir à escola. Quando ele parava de funcionar ou a pilha acabava e eu perdia a hora de ir à escola, chorava muito porque não gostava de faltar às aulas; realmente amava estar ali para aprender.

O tempo passou, e eu passei a ler rapidamente, o que foi uma vitória, pois agora poderia mergulhar no mundo da leitura. Na escola, havia um dia de leitura na biblioteca em que cada aluno deveria ler um livro e contar à supervisora o que havia lido. Lembro-me de uma vez em que fui à biblioteca e li o livro tão rapidamente que me perdi na história e não consegui explicar corretamente para a supervisora, que me chamou a atenção por isso. O que mais amava ler eram as histórias em quadrinhos; eu me sentia vivendo aquelas narrativas. Minha mãe e minhas tias me incentivavam a ler, dando-me livros e gibis.

Quando me reunia com meus primos na roça, debaixo de uma árvore, brincávamos de escolinha, fazíamos a lição de casa e eu gostava de ler as histórias e livros da escola, assim como usar feijões para somar e subtrair, ensinando minha prima, que tinha dificuldade em matemática, porque eu amava ensinar e brincar de ser professora. Também ajudava meus irmãos a fazer a lição de casa, utilizando lápis nas contas, feijões e o que tínhamos disponível.

Eu lia muito, e isso contribuiu para que eu tivesse uma boa escrita em comparação aos meus colegas. Gostava tanto de escrever que até escrevia cartas para o namorado da minha tia a pedido dela, pois ela não gostava de escrever. Achava isso o máximo e, em toda oportunidade, estava eu lendo ou escrevendo. Também amava copiar no quadro quando a professora solicitava; assim, escrevia a matéria e depois transcrevia para o meu caderno, o que me proporcionava ter mais contato com a escrita e a leitura. No entanto, percebo que os professores da época incentivavam a leitura e a escrita, mas não nos ensinavam a interpretar, o que ocasionou uma deficiência, visto que toda leitura requer interpretação.

Mesmo gostando de ler, também amo matemática e me recordo de que, no terceiro ou quarto ano do ensino fundamental, a professora nos pediu um caderno para a tabuada. Durante um tempo, todos os dias, ela solicitava que fizéssemos os fatos de 2 a 9 de multiplicação e divisão, e ainda nos chamava para perguntar, o que contribuiu muito para meu desenvolvimento com os cálculos. Os trabalhos de matemática eu fazia com êxito e ainda ajudava os colegas.

Os anos se passaram e, bem jovem, comecei a trabalhar como babá. Todos os dias, lia histórias infantis para a menina que cuidava, com tanto amor e entrega que ela decorou todos os livrinhos. Ela pegava os livros e falava como se estivesse lendo, mas na verdade havia decorado as histórias de tanto que eu as contava para ela. As tardes eram maravilhosas, despertando nela o gosto pela leitura, e hoje ela é uma moça super estudiosa e dedicada aos estudos. Depois, trabalhei com a mãe dela, que era uma professora que tinha uma escolinha de reforço. Ali, eu ajudava a ensinar as crianças a fazerem suas lições e a estudar para as provas, o que me permitiu ter mais contato com livros e números. Muitos achavam que eu tinha jeito para professora, me incentivando a fazer pedagogia ou áreas afins.

O contato que tive com a leitura ao longo do tempo foi fundamental para minha jornada estudantil. No entanto, com o passar dos anos, ao parar de estudar e com a correria do dia a dia, fui diminuindo o interesse pela leitura, lendo apenas livros que me interessavam. Hoje, para mim, é um desafio conseguir me sentar, concentrar e ler um livro acadêmico, pois às vezes não compreendo por ser uma leitura mais formal. Isso se deve ao grande incentivo que tive para ler, mas não ao mesmo para interpretar o que lia. Assim como o contato com os números, aprendendo cálculos e equações diversas, saí do ensino médio sem aprender nada de gestão financeira e investimentos.

Observo que o ensino que recebi era mais teórico do que prático, e hoje isso faz falta na realidade em que vivo, pois o mercado de trabalho exige muito de nós, mas a escola nos ensina muitas coisas que nunca utilizaremos. Ao ingressar em uma faculdade ou tentar um concurso público, percebemos o quanto achávamos que estávamos preparados e descobrimos que não estávamos. O ensino oferecido até o ensino médio é bom, mas pode melhorar muito mais para que possamos sair mais bem preparados para o mercado de trabalho e/ou para a faculdade.



SOBRE A AUTORA:

Ana Carolina de Oliveira, de Itamarandiba/MG, é acadêmica da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM), onde cursa Pedagogia. Produziu este relato na disciplina Práticas de Leitura e Produção de Textos, ofertada de julho a novembro de 2024.


A orientação deste trabalho e a organização do e-book foram realizadas por Carlos Henrique Silva de Castro, Kátia Lepesqueur e Virgínia Batista.

Jornada tecnológica: da infância ao ensino contemporâneo

Jornada tecnológica: da infância ao ensino contemporâneo
Jane Beatriz Fernandes é acadêmica do curso Licenciatura em Educação do Campo (LEC), da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM). Jane é de Veredinha, Minas Gerais.

Meu primeiro contato com alguma tecnologia digital ocorreu em 2008, quando meus avós receberam um telefone fixo dos filhos que moravam em Belo Horizonte. Esse aparelho foi usado para falicitar a comunicação entre parentes de outras cidades e nossa família em Veredinha. Meu pai trabalhava fora, em outra cidade, e ligava para meus avós, minha mãe e para mim. Uma vez por dia, ele telefonava para nós através de um orelhão perto da casa que ele morava.

Minha mãe explicou que aqueles telefones eram um meio de comunicação à distância para que pudéssemos sentir meu pai próximo de nós. Naquela época, eu achava o telefone muito importante e diferente pois, além da comunicação oral, o outro meio que eu conhecia era através de cartas, que eu sempre fazia muitas para meu pai. Foi uma grande novidade para mim, durante a infância, um meio de comunicação imediato como a ligação por telefone.

Em 2010, minha mãe ganhou do meu pai um celular conhecido como “Nokia tijolão”, já que estava em outra cidade. Esse celular não possuía internet, sendo utilizado apenas para ligações. Aprendi não apenas a fazer ligações, mas também a enviar mensagens de texto. Com o passar do tempo, minha mãe ganhou outro telefone da marca Nokia, e o antigo ficou para mim. Comecei a utilizá-lo para conversar com familiares e amigos que também possuíam telefones.

Minhas interações com as tecnologias sempre foram positivas e moderadas. Minha mãe permitia que eu assistisse TV um pouco antes da aula e após chegar em casa, mas nunca antes de dormir para não prejudicar o sono. Durante minhas visitas à casa dos meus avós paternos, eles costumavam sintonizar a missa pelo rádio, enquanto os avós maternos preferiam ouvir modas de viola. Minha mãe considerava muito importante entender e saber usar os recursos tecnológicos que estavam sempre surgindo.

Aos doze anos de idade, ela me matriculou em um curso de informática para aprofundar o pouco que eu já sabia, pois eu mexia em um computador na casa de minha tia, que fazia licenciatura em Letras. Ela utilizava o computador para pesquisas, realização de trabalhos e atividades do seu curso. Aos treze, tive minha primeira rede social, o Orkut, uma febre na época, onde postava fotos, frases de músicas e sobre o cotidiano. 

Além do Orkut, criei uma conta no Facebook com ajuda de uma tia minha que morava em Curitiba, uma cidade no Paraná, e havia se mudado para minha cidade, introduzindo essa nova forma de comunicação para mim e minha família.

Em 2014, criei uma conta no Instagram para compartilhar fotos de momentos importantes. Além disso, baixei o WhatsApp no telefone e deixei de utilizar mensagens de texto por SMS, passando a enviar mensagens apenas pelo WhatsApp.

Minha mãe e minhas tias foram fundamentais para meu aprendizado com as tecnologias digitais, pois acreditavam que dominar esses avanços seria positivo para minha vida. Atualmente, uso frequentemente o WhatsApp e o Instagram para me comunicar virtualmente e compartilhar fotos e conteúdos de meu interesse. Para acompanhar as notícias diárias, acesso o site “g1.globo.com”.

Há diferenças no meu uso diário da tecnologia nas áreas acadêmica, profissional e pessoal. Normalmente faço uma distribuição de tarefas por horários para ter controle e organização, evitando o uso excessivo. Tenho participação ativa em redes sociais, compartilhando fotos e postagens que despertam meu interesse.

Contribuo com uma página do Instagram chamada “Girassol dos Vales”, que compartilha informações, trabalhos, cotidiano e vivências dos estudantes de Licenciatura em Educação do Campo. Nessa página, administro todas as postagens para alcançar o público desejado: futuros discentes e docentes interessados na licenciatura, ensino de alternância e na educação do campo. No WhatsApp, faço parte de grupos de troca de roupas, móveis, eletrônicos, entre outros, além de grupos familiares para facilitar a comunicação e grupos de interação do curso que estou cursando.

Antes do tempo universidade (TU), em minha comunidade, eu costumava acordar e acessar minhas redes sociais e e-mails, que traziam informações da universidade. Utilizava meu notebook para revisar trabalhos que seriam publicados antes do almoço. Por volta das 14:00 horas, reservava um tempo para assistir filmes ou séries na plataforma Netflix e, antes de anoitecer, registrava o que tinha sido feito no dia, como notas, trabalhos e provas dos estudantes que eu era professora, utilizando o diário online da escola.

Como futura educadora, pretendo utilizar, no atual cenário da educação contemporânea, tecnologias digitais que desempenhem papel de transformação e modernização do ensino. Hoje em dia, professores no geral, estão integrando ferramentas digitais em suas práticas pedagógicas para melhorar a eficiência do ensino, aumentar o engajamento dos alunos e facilitar a gestão de atividades educacionais.

Plataformas como o Google Meet ajudariam os estudantes a realizarem encontros virtuais para trabalhos e atividades coletivas, especialmente considerando o contexto do campo, que dificulta encontros presenciais.

Aplicativos de avaliação como o Quizlet e o Socrative seriam usadas para criar quizes interativos e avaliações formativas, oferecendo feedback imediato aos alunos para ajudá-los a identificar áreas de dificuldade e monitorar seu progresso. Recursos multimídia, como os do YouTube, poderiam aprimorar as aulas e facilitar a compreensão de tópicos complexos.

O uso das tecnologias para estudo, conversas, compras, entre outros, mudou completamente minhas práticas sociais, migrando todas as atividades diárias para as funções que o telefone oferece, como estudar, realizar pesquisas em artigos, tirar dúvidas com o Google e assistir a vídeos para compreender melhor os temas das disciplinas.

Pretendo criar um site ou uma página de publicações para estudantes e docentes, abordando temas diversos como sequências didáticas, histórias da comunidade onde moro, mestres de saberes e literatura local, por exemplo.

É claramente perceptível a diferença de usos entre culturas, amigos, familiares e comunidades, bem como entre diferentes gêneros e idades, devido aos recursos tecnológicos disponíveis para cada pessoa, à forma como acessam esses meios e à maneira como os utilizam. Meus sentimentos em relação às novas tecnologias são positivos, desde que saibamos utilizá-las de forma eficaz e crítica.

Na realização de trabalhos, o uso da Inteligência Artificial (IA), por exemplo, pode ser uma fonte de ideias valiosas, mas deve ser utilizada com sabedoria, pois absorve todo o conteúdo disponível na internet sem necessariamente considerar a qualidade das fontes. Fontes confiáveis como artigos, livros e revistas são essenciais para garantir credibilidade e evitar o risco de plágio.

Como futura educadora, planejo integrar essas tecnologias ao meu ensino, utilizando plataformas digitais para facilitar a aprendizagem, promover o engajamento dos alunos e tornar o processo educacional mais dinâmico e eficiente.

No âmbito pessoal, o episódio “Queda Livre” de Black Mirror me fez refletir sobre como as redes sociais, muitas vezes, nos levam a buscar validação através de uma vida perfeita. Assim como no episódio, onde as pessoas filtram apenas as partes positivas de suas vidas para obter aprovação digital, nas redes sociais modernas há uma tendência similar de exibir uma vida perfeita sem problemas.

Durante minha adolescência, eu me via comparando-me com outras pessoas , como suas viagens e experiências aparentemente extraordinárias, o que às vezes, me fazia sentir inadequada, com minha vida simples de estudante e “low profile” nas redes sociais. Com o tempo, percebi que as redes sociais eram um reflexo selecionado de algumas partes da vida real, onde as pessoas compartilham o que querem mostrar, muitas vezes buscando apenas engajamento, likes e aprovações.

Mudei e comecei a entender que é fundamental não me deixar influenciar demais pela comparação constante. Cada pessoa tem uma vida, cada pessoa tem uma maneira de lidar com a tecnologia diferente, sejam mais engajados ou não. Assim, tanto “Queda Livre” quanto minha experiência pessoal, destacam-se a importância de uma abordagem equilibrada ao utilizar as redes sociais, valorizando como hoje em dia as conexões reais e verdadeiras, não idealizadas, e mantendo uma perspectiva realista sobre a vida de cada um.

Recomendo o episódio ‘Queda Livre’ da série Black Mirror para uma reflexão sobre como as redes sociais moldam nossa busca por aprovação digital, mostrando tanto seu lado positivo quanto as armadilhas da comparação constante.

Vida: amor sem limites

Vida: amor sem limites

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Alice Cleia Lopes Pereira

Capelinha/MG

Nasci em uma família simples e humilde, e vou contar um pouco da minha história para vocês. Somos cinco irmãos, vindos de uma família simples. Desde pequenos, meus pais saíam cedinho para trabalhar. Conosco, em casa, vivia a minha avó, que era viúva; havia perdido o marido em um acidente no passado. Ela era nossa avó e babá ao mesmo tempo, e todos os dias, de manhã, meus pais, com aquela mesma rotina sofrida de trabalho duro na roça, saíam de casa bem cedo e só retornavam à tardezinha, com o sol se pondo. Vovó estava sempre ali, cuidando de nós.

Anos se passaram e aqui começa a fase mais empolgante e curiosa da vida de todos nós. Quando somos crianças, os pais chegam e falam com a gente: “Filho, te matriculei na escola. No ano que vem, você vai estudar.” Isso era no final do ano, para começar a estudar no início do próximo. A gente fica contando nos dedos cada dia e cada semana, ou seja, é um modo de dizer. Todo dia eu perguntava: “Mãe, que dia é hoje? Mamãe, falta muito para a escola começar?” A gente estressava a mãe tanto com as perguntas que ela quase dava umas varadas na gente.

Antigamente, em minha casa, o acesso a textos escritos era muito raro e difícil, pelo fato de morarmos em uma roça bem distante da cidade. O pouco acesso que tínhamos naquela época era através de livros e textos religiosos, como, por exemplo, a Bíblia.

Minha avó frequentava muito a igreja, como faz até hoje, e sempre recebia aqueles livrinhos de lições bíblicas. Então, levava para casa e nos dava para olharmos aquelas imagens de Jesus. Nós ficávamos tão felizes quando víamos e ouvíamos as histórias da arca de Noé, de Jesus e seus discípulos, Caim e Abel. Eu amava essas histórias, como a do irmão que tinha inveja do outro e acabou o matando, Sansão, e muitas outras.

Chegando ao fim do mês, meus pais iam à cidade fazer compras, e, como éramos cinco irmãos, havia aquela combinação: cada mês um de nós ia. Eu ia à cidade uma vez por ano e, quando chegava lá, via aqueles senhores de idade sentados nos bancos da praça, lendo aquele maravilhoso jornal. A gente, todo abobalhado, olhava com enorme curiosidade, perguntando por que os velhos ficavam escondidos atrás daquelas enormes folhas. Voltávamos para casa pensando naquilo tudo e contando os dias para voltar à cidade e ver aquela cena maravilhosa, que hoje, praticamente, no nosso dia a dia, não se vê mais.

Eu não gostava muito de ler, mas passei a conhecer a leitura e a gostar um pouco através de um livro chamado A Princesa de Théo, que uma colega havia me emprestado algum tempo atrás e contado uma parte do que acontecia no livro. Então, despertei o interesse em ler e gostei.

No ano de 2012, meu pai, Valdir Pereira Rodrigues, foi candidato a vereador. Gente, nessa hora eu falo que você sabe até quem é parente. As pessoas te menosprezam, te maltratam com palavreados, e outras usam a política para pedir. Entre esses constrangimentos todos, nos trajetos e caminhadas, tive a oportunidade de conhecer uma escritora maravilhosa: Marlene Mendes. Fui presenteada por ela com um de seus livros, Escrito no Olhar. Concluí então a leitura do livro que havia pegado emprestado anteriormente. Os livros publicados por ela são apaixonantes. Eu amava, e toda a juventude que lê também ama.

Voltando um pouco no tempo, sou de pouca memória, não me lembro muito bem de como e quando aprendi, mas lembro que eu já estava na escola e não conseguia somar nem diminuir. Minha mãe, para nos ajudar, ensinava a fazer uns risquinhos com o lápis e contá-los. Para diminuir, da mesma forma, ela fazia os risquinhos e apagava a quantidade que era para diminuir, contando quantos sobravam. E assim sucessivamente.

Quando cheguei à escola, tive uma dificuldade imensa de aprendizagem por ser tímida, e, até hoje, tenho essa dificuldade. Falando em somar e diminuir, me lembro de quando eu e meus irmãos íamos “catar café”. Na época, vendíamos o que chamávamos de “medidas”. Uma medida de café por 1 real. Quando chegávamos em casa, nossos pais ensinavam assim: “Tira 10 centavos para vocês comprar bala, vai dar três balas, o resto vocês juntam para comprar algo de mais valor quando forem à cidade.” Assim fomos aprendendo a somar com as moedas que guardávamos e a diminuir com as que tirávamos. A matemática, para mim, foi difícil, mesmo com os grandes esforços dos professores.

Tenho muito pouca lembrança de antes de frequentar a escola, de como aprendi a ler e escrever. As primeiras letras, lembro que minha avó, lendo o livro bíblico, nos ensinava as letras da capa do livro. E assim por diante, já comecei a ter curiosidade pelas letras e pelos números. Logo, os anos se passaram e era hora de começar a estudar. Comecei na escola com 7 anos de idade. Estava ali todo dia, mesmo sendo um sacrifício, como falei anteriormente. A escola era longe de casa, e não havia transporte coletivo.

Os anos foram passando, cada dia ficando mais difícil e mais cansativo, mas eu amava a nova experiência que era o estudo. Eram grandes as motivações dos professores, que estavam ali, tentando dar o máximo, impulsionando e ajudando da melhor forma, começando pelas histórias em tirinhas, frases e versos, para os alunos ficarem mais interessados pelo aprendizado.

Desde criança, eu “amava” ir à escola. No fundamental I, eu não podia perder um dia de aula. Eu chorava o dia todo; mesmo se fosse por doença, não queria saber. Com atestado em casa, minha mãe tinha que me deixar ir. Quando chegava à escola, passava mal e tinha que ficar esperando na secretaria até acabar a aula para ir embora. Junto, ia um bilhete para não deixar eu ir enquanto não melhorasse.

Já no fundamental II, as coisas se complicaram um pouco mais. Comecei a repetir de ano e a ter muita dificuldade no aprendizado. Eu estava chegando ao ponto em que o professor explicava a matéria, e eu não entendia nada. Nunca fui uma criança bagunceira na escola. Chegou a um certo ponto em que minhas notas escolares começaram a ficar muito baixas. Foi então que os professores começaram a reclamar para meus pais. Me lembro que, sempre que tinha reunião, eu apanhava ou ganhava um castigo, e isso só ia piorando cada vez mais.

Chegando ao ensino médio, ainda enfrentava a mesma dificuldade de aprender, guardar e memorizar as coisas. Um professor notou que, apesar de prestar atenção nas aulas e não brincar, minha nota era muito baixa. Ele percebeu que havia algo errado e me chamou em particular para ver o que estava acontecendo. Como eu disse a ele que não sabia o porquê, ele convocou meus pais sobre a situação e sugeriu procurar um tratamento para entender o que estava acontecendo. Passei então por um especialista em neuro e faço tratamento até hoje. Tomo medicamento para ansiedade, mas ainda não consegui superar essa parte do meu desenvolvimento e raciocínio. Tenho muita dificuldade.

No segundo ano do ensino médio, casei-me aos 16 anos e fui embora da minha cidade natal para Nova Serrana, à procura de emprego. Chegando lá, comecei a trabalhar durante o dia e estudar à noite, mas não consegui ir muito longe. Estava se tornando uma rotina muito cansativa e estressante a cada dia. Acabei abandonando os estudos.

Em 2012, retornei para minha terra natal. Estava desempregada, então comecei a me dedicar novamente aos meus estudos. Não estava trabalhando, mas tinha um filho pequeno, então foi um pouco complicado. Muitas vezes, tive que levar a criança para a escola, mesmo com o pai cuidando, mas a criança chorava muito. Com o apoio de toda a minha família, principalmente meu marido, que me apoia até hoje, estou onde estou. Só tenho que agradecer.

Sempre corro atrás para tentar melhorar minha leitura e escrita. Já fiz aulas para corrigir erros ortográficos, mas não tive sucesso. No início, a gente pergunta para que servem os números, mas, quando vamos crescendo e desenvolvendo, e precisando deles no dia a dia, sabemos o quão grande é a importância deles. Eles se tornam uma necessidade em praticamente tudo.

Agora que estou começando um novo nível da minha vida, com força e vontade para caminhar, aproveitar e desenvolver minha leitura e minha escrita, percebo que tudo na vida, nos primeiros dias, é complicado, até entendermos, compreendermos e pegarmos a prática dia a dia. As mudanças nas nossas vidas são novidades que vêm para renovar, trazer coisas novas e nos motivar.

Sempre que possível, tento me orientar, ler as matérias que os professores mandam, mesmo que, em um dia, já tenha esquecido tudo. Tenho preguiça, mas gosto de ler. Falando em texto, não só universitário, mas qualquer tipo de texto, tenho enorme dificuldade. Sempre há alguns gêneros adoráveis, como romance e relatos de viagens. A matemática, por sua vez, faz a diferença nas vidas de todos nós. Onde quer que se ande, precisamos dela. Gosto muito, mas não deixa saudades. Adoro a matemática simples, mas aquela matemática moderna de hoje, meu Deus, me deixa perdida.

Falando em condições financeiras, ainda não posso dizer muito sobre isso, pois não tenho um salário, não tenho uma renda, mas não sou aquela pessoa que gasta à toa, sem precisão. Consigo lidar em qualquer situação. Eu, particularmente, acredito que sim, administro muito bem. Não vou dizer 100%, mas 70% é o que afirmo hoje, na posição em que me encontro.



SOBRE A AUTORA:

Alice Cleia Lopes Pereira, de Capelinha/MG, é acadêmica da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM), onde cursa Pedagogia. Produziu este relato na disciplina Práticas de Leitura e Produção de Textos, ofertada de julho a novembro de 2024.


A orientação deste trabalho e a organização do e-book foram realizadas por Carlos Henrique Silva de Castro, Kátia Lepesqueur e Virgínia Batista.

Aprender a ler e escrever sem ter o que comer

Aprender a ler e escrever sem ter o que comer

Os textos publicados individualmente nesta página podem ser lidos reunidos nos volumes da coleção Memórias de Letramentos. Para adquirir seu e-book gratuito ou impresso  pelo preço apenas do serviço de gráfica, clique no banner ao lado ou no fim da página.


Abelino Reis Sales, Fronteira dos Vales/MG

Na minha vida, tudo começou de forma difícil. Nasci em uma pequena cidade do interior da Bahia chamada Itanhém. Aos 4 meses de idade, fui abandonado pelo meu pai, que nem sequer quis colocar o nome na minha certidão de nascimento.

Minha mãe e minha avó foram as minhas bases familiares. Mulheres analfabetas, lavradoras do campo, plantavam e colhiam frutas da roça para levar até o mercado municipal da cidade de Itanhém/BA e vendê-las. Com os lucros, podiam trazer o sagrado alimento para o humilde lar.

No deslocamento entre a roça e a cidade Itanhém/BA, por vezes, minha mãe contava histórias sobre mitos folclóricos. Eram quilômetros de caminhada a pé para chegar até a cidade, mas, fizesse sol ou chuva, as duas mulheres guerreiras ainda assim levavam no lombo do seu jegue uma criança e balaios com farinha de mandioca, entre outros itens, para vender.

Fui crescendo e observando o modo de vida sofrido que essas pessoas levavam; contudo, não tenho recordações do que ocorreu na roça, lembrando apenas da vida na cidade. Lembro-me de que, aos 6 anos, surgiram as lembranças da escola, dos amigos de infância e do trabalho árduo de minha mãe para que seu filho pudesse estudar. Por vezes, ela trabalhava em casas de família para trazer apenas um pouco de alimento para que eu pudesse ir à escola.

Lembro-me de que, naquela época, só poderia ir para a escola com uniforme, porém minha família não podia arcar com os custos. A solução eram as doações de uniformes de estudantes do ano anterior, que não lhes serviam mais. Com eles, eu me vestia e ia para o colégio. Outra motivação era a merenda, alimento que não tinha em minha casa.

Não gostava de faltar às aulas por nenhum motivo, pois ali encontrava colegas, brincadeiras e voltava para casa de barriga cheia. Na minha sala de aula, havia muitas pessoas com mochilas, estojos, cadernos de capa dura, canetas de colorir, tênis, entre outros objetos que eu não possuía. Meu material escolar era uma sacola de pano onde levava um caderno brochurão, lápis, borracha e apontador, que era um pedaço de ponta de faca.

Na época da minha escola, nos anos iniciais, não sofri bullying e, mesmo sendo negro, nunca me senti discriminado. Contudo, a única separação que existia era que a turma A era dos filhos de professores e a turma B, do restante dos alunos.

Certa vez, aos 10 anos, escrevi minha primeira carta para minha querida madrinha, que havia me pedido que escrevesse contando o que eu queria de presente no meu aniversário. Eu escrevi que queria um carrinho de mão para poder trabalhar e ajudar minha mãe. Ganhei o carrinho de mão e comecei a pegar feira para as pessoas idosas, ganhando minhas primeiras moedas. Com elas, podia comprar um pastel ou alguma guloseima no intervalo da escola.

Na quarta série, percebi que tinha facilidade em matemática, pois comecei a aprender a decorar a tabuada e a tirar as melhores notas da sala e do colégio. Com isso, comecei a ser mais bem visto pelos colegas, a ser admirado pelas meninas e a ganhar notoriedade.

Minha forma de aprender era prestando atenção e memorizando o que o professor falava em sala de aula, pois os livros naquela época eram comprados. Como eu não tinha condições financeiras, escrevia tudo no caderno para fazer uma boa prova. No ensino fundamental, começou uma revolução, pois no colégio começamos a ter aulas de inglês e informática, uma situação nova para mim. Alguns colegas tinham computador em casa, e eu, como sempre, não tinha nem televisão nem geladeira. Para aprender inglês, alguns colegas diziam que assistiam a filmes e ouviam músicas estrangeiras. Com certa razão, inglês não é o meu forte.

Era preciso vencer todos esses obstáculos que a vida colocava na minha frente; e eu, como sempre, uma pessoa destemida, encarava tudo isso sem medo e sem vergonha, mantendo o foco. Ano após ano, eu fazia mais amigos na escola e era convidado para ir à casa dos colegas fazer trabalhos escolares. Muitos queriam ficar perto de mim para receber “cola” nas provas de matemática. Certa vez, no ensino médio, já nas provas finais, quando eu, claro, já havia alcançado as notas para aprovação no terceiro bimestre, fiz a prova de duas colegas para que não ficassem de recuperação.

Uma vez, peguei recuperação em história, e foi aquele chororô, pois jamais tinha acontecido. Mostrei novamente a minha capacidade intelectual. Peguei um livro na biblioteca, estudei durante duas semanas e, no dia da prova, fiz 95 pontos; ou seja, minha dedicação foi determinante.

Estudar é prazeroso, e na época da minha escola não havia recursos tecnológicos para imprimir provas. Lembro-me de que precisávamos levar papel “chamequinho” para as professoras usarem em nossas atividades. As atividades eram primeiro datilografadas e, depois, passavam por uma máquina manual chamada mimeógrafo, que magicamente transferia a tinta de um papel para o outro. Às vezes, até os alunos ajudavam.

Na minha rua moravam duas professoras. Uma delas sempre me dava revistas velhas para eu ler e recortar para fazer alguns trabalhos escolares. A gente percebia o quanto era corrida a vida delas, pois chegavam em casa com aquele monte de provas para corrigir, além de fazer plano de aula para o dia seguinte; era um amontoado de material. Eu, certa vez, ajudei-as a corrigir provas.

Hoje, entendo por que nossos pais, parentes e professores sempre diziam que, para ter um futuro melhor, “tem que estudar”. Assim, fui estudando e cheguei à graduação. No ensino médio, quando saí do interior para procurar uma vida melhor em Belo Horizonte/MG, tive dificuldade em concluir o terceiro ano.

A escola ficava cerca de 4 quilômetros da minha residência e, como não tinha dinheiro para pagar o ônibus, era uma hora de caminhada entre carros, motos e caminhões, o que atrasou minha formação. Na cidade grande, há inúmeros desafios, e os professores já não eram tão acolhedores como no interior. Além disso, as pessoas eram desconhecidas, com relações mais complexas do que aquelas que a gente conhece desde a infância.

Foi com muita luta, determinação, coragem e sabedoria que a minha história de vida mudou para melhor. Foi através da educação que conheci uma amiga e colega de classe chamada Enedineia, que me apoiou quando morei em Belo Horizonte/MG. Após o ensino médio, comecei a estudar matemática com ela.

Ela desejava fazer o concurso da PMMG (Polícia Militar de Minas Gerais). Eu, como sempre, não tinha dinheiro para comprar a apostila. Aos sábados, após o meu trabalho, deslocava-me a pé para o bairro onde ela morava, a uns 5 quilômetros do meu, e ensinava matemática para ela, além de aprender mais com as apostilas.

Comecei a ver que as matérias exigidas não eram muito difíceis, e foi ali, todos os fins de semana, ensinando e aprendendo, que ela falou: “Você tem capacidade de fazer essa prova.” Fiquei pensando, mas não tinha dinheiro para pagar a inscrição nem computador para fazê-la. Criei coragem e pedi um adiantamento ao meu patrão. Com o dinheiro, fui a uma lan house e fiz a inscrição.

Novamente, com esforço e dedicação, e com os conhecimentos adquiridos no ano de 2006, em meu primeiro grande concurso, com mais de 50 mil candidatos inscritos, fiquei entre os 2 mil classificados e ingressei como soldado na PMMG. Estou na instituição há 18 anos, na atual função de sargento.

E aquelas palavras de minha mãe e dos professores sempre serão levadas enquanto eu viver: “Estude, estude!” Acredito que a mudança em cada um de nós depende de sacrifício, dedicação e força de vontade.



SOBRE O AUTOR:

Abelino Reis Sales, de Fronteira dos Vales/MG, é acadêmico da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM), onde cursa Pedagogia. Produziu este relato na disciplina Práticas de Leitura e Produção de Textos, ofertada de julho a novembro de 2024.


A orientação deste trabalho e a organização do e-book foram realizadas por Carlos Henrique Silva de Castro, Kátia Lepesqueur e Virgínia Batista.

Explorando o mundo tecnológico: minha primeira experiência

Explorando o mundo tecnológico: minha primeira experiência
Gessica Gomes de Almeida é acadêmica do curso Licenciatura em Educação do Campo (LEC), da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM). Gessica é do município de Cristália/MG.

Meu primeiro contato com alguma tecnologia digital foi em casa, quando meus pais me deram meu primeiro celular. Foi uma época de muita curiosidade e empolgação. Lembro-me como se fosse ontem quando o liguei pela primeira vez. A tela preta se transformou em um ambiente cheio de ícones e possibilidades. Foi mágico e um pouco confuso, mas a sensação de descoberta e novidade foi incrível.

No passado, costumava mandar SMS, pois não tinha dinheiro para colocar crédito, e jogava o joguinho da cobra. Com o tempo, essa atividade foi diminuindo até que se tornou algo que eu não faço mais. Lembro-me vividamente da primeira vez que baixei o Facebook. Foi uma colega minha que me ajudou, mas ela sabia minha senha e ficava acessando o meu Facebook, aceitando as pessoas sem me perguntar. Depois fui pegando a prática e aprendi a trocar a senha. Com o passar do tempo, eu baixei o WhatsApp. Foi incrível, na minha casa só eu tinha WhatsApp. Enviar minha primeira mensagem pelo “Zap” fez sentir como se tivesse o mundo ao alcance dos meus dedos. Entrar pela primeira vez no Facebook foi um pouco invasivo, mas também empolgante.

Minha família e amigos foram essenciais no meu processo de aprendizagem com as tecnologias digitais. Eles me ajudaram a superar desafios, entender novos conceitos e explorar todo o potencial que a tecnologia tem a oferecer. Uma coisa que mais gostava de fazer era passar trotes nas pessoas; na escola, era a melhor parte do dia, eu me divertia muito.

As páginas web, redes sociais e perfis que mais visito variam de acordo com meus interesses e necessidades. No entanto, algumas plataformas comuns que mais visito incluem redes sociais como Facebook, Instagram e WhatsApp. A escolha das páginas visitadas geralmente reflete meus interesses pessoais e profissionais. A única rede em que tenho contribuição é uma página no Instagram do nosso núcleo de alternância de Cristália, onde postamos tudo o que fazemos na prática de ensino.

Há diferenças significativas no uso diário de tecnologia em diferentes áreas da minha vida, como estudantil, profissional e atividade religiosa. Por exemplo, como estudante, a tecnologia é frequentemente utilizada para pesquisas, comunicação e produção de algum material. No ambiente profissional, a tecnologia desempenha um papel crucial em termos de comunicação, colaboração e produtividade.

Em atividades religiosas, a tecnologia que eu uso atende às necessidades da igreja, especialmente na comunicação. Cada área tem suas próprias necessidades no uso da tecnologia, adaptadas para cada momento em que preciso usar a tecnologia.

Minha participação em redes sociais envolve comentários, grupos de debates de colegas da faculdade. Eu não sou de postar comentários em notícias ou anúncios, mas às vezes curto a foto de alguma pessoa e até mesmo posto alguma foto de vez em quando. Gosto muito de compartilhar reels com minhas amigas e vídeos engraçados. Sou viciada em salvar figurinhas e compartilho com amigos e família. Lembro-me de que minha primeira Prática de Ensino foi em aulas virtuais, devido à pandemia. No primeiro momento, por falta de aceso, não pude me juntar com os professores e colegas.

Posteriormente, pude participar das tarefas que resultariam em um podcast. Foi uma experiência incrível e ao mesmo tempo desafiadora, pois não tinha noção de como fazer aquilo. Então procurei ajuda em uma rede social, o YouTube, onde pesquisei como fazer, qual aplicativo baixar, foi aí que deu tudo certo graças a Deus.

Na comunidade, as únicas tecnologias digitais a que tive acesso são meu celular e a televisão. Considerando um dia comum, como o domingo, dia 14/07/2024, a única tecnologia digital que tive acesso foi meu celular. A primeira coisa que fiz ao acordar foi mandar mensagem para minha mãe para ver como ela estava. Mais tarde, usei um editor de texto para fazer um trabalho da faculdade.

As novas tecnologias podem ser utilizadas para estudar, fazer compras online, entre outros. Eu acesso muito a Shein e o Mercado Livre para compras. A tecnologia digital transformou nossa maneira de comprar e interagir. As práticas sociais mudaram muito em função das tecnologias. Lembro-me que eu anotava meus contatos em uma caderneta, sem contar as receitas que eu tinha em um caderno de receitas. Hoje, com o uso da tecnologia, uso agenda digital e busco na Web o que eu quero fazer para comer.

No futuro, pretendo utilizar tecnologias digitais para aprimorar o aprendizado, explorar ainda mais recursos online para aprimorar meus conhecimentos e habilidades em diferentes áreas. As diferenças no uso de tecnologia entre gerações mais velhas e mais novas são significativas e influenciam diversos aspectos da vida cotidiana.

As pessoas mais velhas, como meu pai e meus avós, não tiveram acesso às tecnologias como temos hoje. Minha mãe aprendeu depois de velha a mexer no WhatsApp, que usa para mandar áudio para seus filhos e amigos, já que ela não tem nenhum estudo. Achei bem legal quando ela aprendeu a acessar o WhatsApp, algo que para ela foi muito inovador.

Por outro lado, as gerações mais novas estão imersas em um ambiente tecnológico em constante evolução. Com isso ,tem origem em uma nova cultura, a chamada cibercultura, na qual é possível estar conectado o tempo todo. Meus sentimentos em relação às novas tecnologias são positivos, pois elas têm o potencial de facilitar a comunicação e promover a inovação em diversos setores. A tecnologia digital abre portas.

As experiências mais positivas com as novas tecnologias incluem a melhoria da eficiência, a facilitação da comunicação e a inovação em diversos setores. Por outro lado, as experiências negativas podem estar relacionadas à falta de segurança, barreiras de acessibilidade e problemas de experiência para a maioria das pessoas.

Como professora, eu usaria e incentivaria o uso de tecnologias digitais para aprimorar o processo educativo, promover a participação ativa dos alunos e prepará-los para o mundo moderno. Para encerrar, deixo a indicação de um filem que gosto muito, X-Men, que pode ser assistido por todas as gerações e aborda temas como acessibilidade, diversidade e coexistência.

Apresentação

Apresentação

Logo abaixo pode ser lido o texto de apresentação do sexto volume da coleção Memórias de Letramentos. Cada um dos 50 textos serão publicados nesta página, além do formato e-book e impresso (clique no banner ao lado ou no fim da página.

É com satisfação que apresentamos uma nova coletânea de narrativas, a sexta da série, que reflete diferentes experiências de vida marcadas por práticas sociais com a leitura, a escrita, os números e as aprendizagens decorrentes. Trata-se de cinquenta textos que nos levam a refletir sobre a importância da educação em nossas vidas e o poder transformador da palavra escrita e da leitura de mundo.  Os autores e autoras são futuros pedagogos, estudantes da disciplina Práticas de Leitura e Produção de Textos, em que o processo de escrita e edição deste livro ocorreu. Neste volume, desde os primeiros anos de vida até os desafios da vida adulta, cada autor e autora compartilha suas memórias, aprendizados e reflexões sobre o papel da escola, da família e de suas relações sociais em suas trajetórias com as letras e os números.

Essas histórias vêm sobretudo de Minas, mas os cenários da Bahia e de São Paulo também têm espaço. As professoras e professores aparecem como os maiores influenciadores da leitura, junto a algum parente ou madrinha. Ganhando destaque especial nos corações, estão as professoras Clarisse, Dinorá, Lilian, Eriene, Eliana, a Tia Luiza e o Tio Zezinho. Entre os futuros professores, há filhos de professoras e uma escritora em formação, usuária bem-sucedida de ferramentas típicas da era digital, como Wattpad e Kindle. O acesso à leitura, às vezes, era dificultado até pela burocracia de uma biblioteca ou outra, mas elas também são cenário de lindas viagens e descobertas. As barreiras nunca foram poucas para grande parte desses sujeitos dos Vales de Minas, como o acesso, a timidez e até uma língua presa, mas a superação dos desafios dá o tom dos relatos aqui reunidos.

Sobre as experiências de leitura, os clássicos infantis e infantojuvenis são os mais citados, a exemplo dos gibis. Clássicos como nacionais como A Turma da Mônica, Sítio do Pica-Pau Amarelo e O Barquinho Amarelo perpassam as experiências literárias junto a clássicos universais do gênero como Chapeuzinho Vermelho, Pinóquio e João e o Pé de Feijão. Na infância, é notável como a Bíblia já faz parte da rotina da maioria das famílias. Mais tarde, sobretudo por influência da escola, outros clássicos e diferentes épocas foram apresentados à maioria dos autores desses 50 relatos. Do século IXX, são citadas as obras Dom Casmurro, Quincas Borba, Memórias Póstumas de Brás Cubas, Iracema, O Guarani e Senhora. Ora acompanham o nome do autor, ora o foco são as personagens e ó título da obra. Antes disso, apenas o shakespeariano Romeu e Julieta é citado. Do século XX aparecem autores de prosa e poesia como Clarice Lispector, Cecília Meireles, José Lins do Rego, Vinícius de Moraes, Jorge Amado e Maria José Dupré.

De maneira geral, autores e autoras demonstram orgulho de suas trajetórias e conquistas, como fazer o tão sonhado curso superior em uma instituição pública federal. É fundamental destacar a importância de trazer mais um grupo de narrativas dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri, regiões ricas em história, cultura e linguagem. Essas áreas, muitas vezes negligenciadas, possuem um vasto repertório de experiências que merecem ser compartilhadas.

Que este livro seja um convite para explorar as experiências e particularidades de letramentos de cinquenta autores e autoras, futuros professores e professoras, bem como celebrar essa diversidade de vozes, que se somam às outras 148 das cinco edições anteriores, enriquecendo nosso debate sobre aprendizagem e ensino das letras e sobre uma leitura mais genuína do mundo.

Carlos Henrique Silva de Castro, Kátia Lepesqueur e Virgínia Batista (Orgs.)

Outubro de 2024

Conectada desde a infância: como a tecnologia digital moldou minha vida

Conectada desde a infância: como a tecnologia digital moldou minha vida
Gabriela dos Santos Cardoso é acadêmica do curso Licenciatura em Educação do Campo (LEC), da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM). Gabriela é da Comunidade Quilombola do Paiol, município de Cristália/MG.

Meu primeiro contato com alguma tecnologia digital foi aos 11 anos. Minha mãe me presenteou com um celular Samsung com tema da Barbie e esse dispositivo não apenas facilitou a comunicação por ligação com ela, mas também marcou meu início no mundo digital. Além disso, ganhei um tablet para meu entretenimento, o que era muito útil, especialmente porque eu passava grande parte do tempo em casa sozinha enquanto minha mãe trabalhava.

Durante minha pré-adolescência e adolescência, esses aparelhos se tornaram ferramentas essenciais para mim. Eu os utilizava para realizar atividades escolares, como pesquisas para as tarefas de casa, além de me divertir com jogos online e assistir a vídeos no YouTube.

Atualmente, meu uso de tecnologias digitais expandiu-se significativamente. Uso-a diariamente para acessar notícias atualizadas, realizar pesquisas acadêmicas e concluir meus trabalhos do curso. Essas ferramentas digitais são muito importantes para me manter informada e também para a comunicação com minha família e amigos. Estou sempre atualizada sobre eventos que acontecem no mundo. As redes sociais que mais frequento são WhatsApp, Instagram e o X antes chamado de Twitter. No entanto, minha participação é principalmente como observadora nessas redes, preferindo manter um perfil mais discreto ou como chama nas redes sociais um perfil “Low profile”.

Acompanhando um dia da minha vida, utilizo a tecnologia digital desde o momento em que acordo pela manhã até a hora de dormir à noite. Sempre estou conectada e com meu celular em mãos. Pela manhã, enquanto tomo meu café, navego pelos sites para ver as últimas notícias do mundo e as fofocas que estão circulando. Durante o dia, continuo mexendo e entrando em redes sociais como WhatsApp, Instagram e outras. À noite, gosto de assistir a séries ou filmes na Netflix ou em outras plataformas.

Quando penso no futuro, tenho a intenção de continuar explorando novas tecnologias que possam aprimorar minha produtividade e adquirir novas habilidades. Quero aprender novas plataformas e ferramentas que facilitem ainda mais minha vida acadêmica, profissional e também proporcionem diversão e entretenimento nos momentos de lazer.

Observo diferenças significativas na forma como diferentes gerações em minha família e entre meus amigos utilizam a tecnologia. Por exemplo, meus avós usam tecnologia de maneira mais básica, limitando-se a fazer ligações, assistir TV e ver vídeos enviados em grupos ou por meio de aplicativos como TikTok e Kwai. Já os mais jovens, como meus amigos e colegas da faculdade, estão constantemente com seus celulares, não apenas para comunicação, mas também para aprender, pesquisar e se divertir. Eles postam fotos, interagem, comentam e curtem publicações.

Quando tenho algum trabalho acadêmico para fazer, reduzo o tempo nas redes sociais e foco em visitar sites com artigos, livros e documentos que me ajudem na realização das tarefas. Busco referências bibliográficas e assisto a vídeos online sobre o assunto. Durante o Tempo Universidade (TU) do curso da LEC (Licenciatura em Educação do Campo), utilizo bastante as tecnologias digitais e suas ferramentas para realizar atividades, trabalhos e apresentações em formato de seminários. Para criar slides de apoio nas apresentações, gosto de usar o aplicativo chamado Canva, que facilita muito o processo.

Minha jornada com as tecnologias digitais não apenas facilitou minha comunicação desde a pré-adolescência, mas também moldou minha percepção sobre elas desde cedo. A habilidade de acessar informações com um clique é incrível. No entanto, ao entrar na graduação, percebi que ainda tinha muito a aprender sobre ferramentas digitais específicas. Por exemplo, precisei aprimorar minhas habilidades para editar e trabalhar com planilhas no Excel. Sempre há algo novo para aprender com as novas tecnologias digitais.

Além das diferenças de idade, percebo que cada cultura utiliza a tecnologia de maneira distinta. Por exemplo, minha família que mora no interior de São Paulo tem hábitos diferentes dos meus familiares aqui em Minas Gerais. Em São Paulo, a tecnologia faz parte do dia a dia deles, sendo mais amplamente utilizada do que aqui em MG, onde vejo que é empregada de forma mais prática. Além disso, as diferenças de idade e gênero também influenciam bastante, com cada grupo preferindo certos tipos de aplicativos e plataformas.

Eu me sinto muito positiva em relação às novas tecnologias porque elas fazem uma diferença enorme na minha vida. Desde o primeiro celular que eu tive até as ferramentas que uso para estudar hoje em dia, elas facilitam minha comunicação, me mantém informada sobre tudo e ajudam muito na minha produtividade. Mas também reconheço que é um desafio ficar sempre atualizada com tantas mudanças e aprender novas coisas o tempo todo.

As minhas experiências positivas incluem o fácil acesso a informações e materiais educativos online, que são ótimos para aprender e na realização dos meus trabalhos acadêmicos. No entanto, às vezes as tecnologias podem causar problemas, como passar tempo demais online e esquecer de viver a vida fora das telas ou até mesmo desaprender a ler um livro físico. Também é importante lidar com conteúdos negativos que podem aparecer em redes sociais para aqueles que gostam de postar ativamente.

Como futura educadora do campo, vejo muitas oportunidades nas tecnologias digitais para transformar a forma como ensinamos. Pretendo usar plataformas online para compartilhar materiais, adaptando-os à realidade da escola e dos estudantes. Além disso, ensinar habilidades digitais importantes para o mundo atual é essencial, levando os multiletramentos para os alunos.

Os gêneros textuais são fundamentais no ensino de Linguagens, são dinâmicos e refletem as mudanças na sociedade e na tecnologia. Os tipos de textos que ensinamos, como cartas ou notícias, mudam ao longo do tempo. Por isso, é essencial não só ensinar os tipos tradicionais, mas também preparar os alunos para novos tipos de textos que surgem com a tecnologia. Isso inclui aprender a escrever e analisar sites e redes sociais. Essas práticas e atividades ajudarão a melhorar o uso e a escrita dos alunos nas tecnologias digitais.

As tecnologias digitais têm transformado significativamente minha vida, não apenas facilitando o acesso à informação, melhorando meus estudos e comunicação, mas também impactando aspectos emocionais e espirituais. Os filmes sempre desempenharam um papel importante para mim, seja como entretenimento ou fonte de reflexão profunda. Um filme que marcou positivamente minha jornada foi “As Aventuras de Pi”, pois me fez refletir profundamente sobre a vida e a fé.

As Aventuras de Pi” é uma obra que mergulha profundamente na jornada espiritual e emocional de seu protagonista, Pi Patel. Perdido no mar em um bote salva-vidas com um tigre de Bengala, Pi enfrenta desafios que testam não apenas sua sobrevivência física, mas também sua fé. A narrativa habilmente entrelaça elementos de diferentes religiões, destacando como a fé pode ser uma fonte de força e esperança inabalável, mesmo diante das circunstâncias mais extremas.

A fusão de efeitos visuais avançados com a narrativa envolvente de Yann Martel criou um mundo cinematográfico que não apenas ilustra os desafios físicos de Pi, mas também visualiza suas jornadas espirituais e emocionais de uma maneira muito emocionante. Deixo aqui a indicação do filme.

Relembrando a minha vida na escola

Relembrando a minha vida na escola

Os textos publicados individualmente nesta página podem ser lidos reunidos nos volumes da coleção Memórias de Letramentos. Para adquirir seu e-book gratuito ou impresso  pelo preço apenas do serviço de gráfica, clique no banner ao lado ou no fim da página.


Adenilda Alves dos Santos, Cristália/MG

No ano de 1994, quando eu tinha quatro anos, eu já frequentava a escola, pois morava na zona rural e minhas irmãs mais velhas iam para a escola e eu não queria ficar em casa; chorava se dissessem que eu não ia. Por isso, me matricularam depois de mais de dois anos de estudo. Na minha casa não havia acesso a textos, somente na escola onde a professora levava os livros.

A professora me incentivava muito. Quando completei sete anos, idade em que fui matriculada, já conhecia várias letras. Lembro que, entre seis e sete anos, tive uma tristeza inesquecível. Estava na escola com minhas irmãs quando um vizinho chegou à minha casa e descobriu que minha mãe havia falecido no chão. Ele gritou para a professora, que estava bem perto da escola, e ela nos dispensou. Ao chegarmos em casa, encontramos meu irmão, que tinha um ano e meio, chorando. Nesse dia, meu pai estava trabalhando.

Depois desse acontecimento, fiquei muito triste, e até hoje sinto essa tristeza. No entanto, devo me esforçar para me conformar. Com o passar dos anos, a tristeza aumentou, pois éramos muito crianças naquela época.

No ano em que comecei a ir à escola, ninguém veio me presentear com livros. Acho que na época era mais difícil, somente nossos professores os tinham. Lembro-me de que aprendi a contar aos sete anos. A professora usava caroços de milho e feijão para nos ensinar. Nessa idade, aprendi a contar até 20. Entrei na escola com quatro anos, mas me matricularam aos sete.

Lembro-me de que conheci as moedas antes de ir à escola, mas não sabia seu valor. Aprendi a conhecer o valor do dinheiro aos dez anos e, com oito, aprendi a ler as horas no relógio. Com dez anos, aprendi a somar e a subtrair, que chamamos de adição e subtração. Nossa, eu adorava e ainda adoro essas continhas!

Depois de algum tempo, comecei a aprender multiplicação e divisão, mas a divisão foi um pouco mais complicada. Eu gostava muito dos problemas matemáticos; achava muito fácil da primeira à quarta série. As continhas eram bem simples na quinta série. Na oitava série, achei mais ou menos, mas aprendi muito com os professores, que eram esforçados e queriam nos ver alfabetizados.

Meu pai não teve estudo suficiente para me ensinar, mas ele sabe ler, escrever e até fazer algumas contas. Nos letramentos matemáticos, me avalio de dez a oito pontos. Quando comecei a frequentar a escola, não sabia nenhuma letra. Apesar de ter iniciado muito jovem, quando completei sete ou oito anos, me dediquei muito a aprender. Tinha força de vontade de verdade. Lembro que a professora falava que ia fazer uma leitura; assim que terminava a aula, eu ia pelo caminho treinando a leitura, até mesmo as atividades que ela passava para mim. Entre os oito e dez anos, sentava debaixo de uma árvore para fazer as atividades, e fazia tudo antes de chegar em casa.

Nos primeiros anos de escola, eu era motivada a escrever. A professora me elogiava muito por isso. Gostava de escrever textos que continham rimas e me avalio no papel de escrita inicial de dez a oito pontos. No ensino fundamental, me lembro de textos e poemas, mas no ensino médio, devido ao número de livros, não consigo lembrar de tudo.

Na minha escola, no ensino médio, os professores nos davam liberdade para ir à biblioteca ler livros. Isso era muito enriquecedor para mim. Ao longo da minha vida escolar, houve mudanças na escrita; aprendi a escrever melhor. Na escola, escrevíamos rápido, devido ao pouco tempo, e as letras não ficavam muito legíveis. As práticas com os números faziam sentido, pois várias vezes surgiam necessidades de contar e conhecer os números.

Neste primeiro ano de universidade, por enquanto, não consigo explicar muito devido ao pouco tempo, mas creio que minha escrita e leitura vão melhorar. As mudanças trarão coisas positivas e negativas: a positiva é aprender mais do que já sei; a negativa é a dificuldade e tenho que não desistir diante delas.

Gosto muito de ler o que os professores orientam e faço o possível para isso. Não tenho tanta facilidade com os gêneros universitários. Ao longo da minha vida escolar, no ensino fundamental, línguas e matemática eram bem mais fáceis; já no ensino médio foi um pouco mais difícil, mas consegui superar e alcançar um pouco mais da média. Imagino que sou capaz de lidar com os desafios que envolvem números e letras.

Lembro que, quando comecei a estudar no ginásio, na quinta série, na cidade de Cristália, andava a pé oito quilômetros para chegar até o ponto do ônibus escolar. Foi uma luta imensa. Saía de casa às nove e meia da manhã para chegar ao ponto às onze e meia e entrar na sala de aula às doze e meia. Isso durou três anos. Nos últimos anos, o carro chegava mais perto de casa, mas consegui vencer o ensino médio.

Hoje sou casada e tenho um esposo amigo e companheiro que sempre me apoia na faculdade. Ele me ajuda muito. Tenho três filhos: os dois primeiros são gêmeos e têm doze anos, e o outro tem cinco. Todos são apaixonados por estudar, assim como eu era na idade deles.



SOBRE A AUTORA:

Adenilda Alves dos Santos, de Cristália/MG, é acadêmica da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM), onde cursa Pedagogia. Produziu este relato na disciplina Práticas de Leitura e Produção de Textos, ofertada de julho a novembro de 2024.


A orientação deste trabalho e a organização do e-book foram realizadas por Carlos Henrique Silva de Castro, Kátia Lepesqueur e Virgínia Batista.

Do Nokia ao notebook: minhas memórias com as tecnologias digitais

Do Nokia ao notebook: minhas memórias com as tecnologias digitais
Cláudia Cristina Ribeiro é acadêmica do curso Licenciatura em Educação do Campo (LEC), da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM). Cláudia é de São Gonçalo, município do Serro, Minas Gerais.

Meu primeiro contato com a tecnologia foi marcado por uma época de simplicidade. Aos 11 anos de idade, utilizava o celular da minha mãe, um Nokia sem internet, que foi a porta de entrada para o mundo digital. O famoso “Nokia tijolão”, possuía o clássico jogo da “cobrinha”, um jogo simples que me proporcionava momentos de diversão.

Antes da popularização das redes sociais, meus dias eram preenchidos por outras formas de entretenimento. Eu ouvia todos os dias a rádio que meus pais ligavam enquanto preparavam o café da manhã, que os mantinham informados sobre as notícias diárias e as músicas do momento. Assistia a televisão, aproveitando os desenhos animados e os filmes da “sessão da tarde”.

Em 2012, a inauguração de uma lan house em minha comunidade, São Gonçalo do Rio das Pedras, marcou o início de uma nova fase. Foi ali o meu primeiro contato com o computador, o mouse e a internet. As redes sociais, o Orkut, MSN, Google e YouTube, marcaram a vida dos jovens naquela época. Eu me conectava com amigos, divulgava mensagens motivacionais, assistia videoclipes e acessava jogos. Meus amigos, que já dominavam a tecnologia, me auxiliaram no processo de manusear as redes sociais. Com o passar dos anos, minhas prioridades mudaram, e meu interesse por essas atividades diminuiu, enquanto outros interesses surgiram.

Ao completar 14 anos, ganhei meu primeiro celular, um presente de aniversário do meu padrinho. Em 2015, minha mãe me presenteou com um notebook, uma ferramenta que, embora eu não soubesse usar completamente no início, se tornou fundamental para assistir a filmes, ouvir músicas, fazer pesquisas e mergulhar ainda mais no universo digital.

Com o tempo muita coisa mudou e, hoje em dia, estou mais conectada à era digital; a tecnologia me acompanha desde a infância e continua presente na minha vida adulta. Por meio da tecnologia, acesso informações do dia a dia, mantenho comunicações, trabalho e estudo. Prefiro usar o WhatsApp para diálogos mais informais e os e-mails para manter-me conectada no trabalho e nos estudos.

Nas redes sociais, mantenho uma participação ativa, integrando grupos de WhatsApp dedicados a vendas, divulgação de notícias e informativos. Promovo votações em petições e, quando considero apropriado, faço comentários em publicações, especialmente quando acredito que minha opinião possa oferecer uma contribuição significativa.

Atualmente, a tecnologia é uma ferramenta essencial para a produção de trabalhos acadêmicos na minha graduação em Licenciatura em Educação do Campo (LEC). Utilizo-a para criar vídeos, podcasts, redigir trabalhos e participar de práticas de ensino e de outros projetos, como o Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID).

Na minha comunidade, um dia antes de vir ao TU – Tempo Universidade, estive em contato com a tecnologia em diversos momentos. Pela manhã, ao despertar, verifiquei as mensagens no celular e consultei meu horóscopo. Também chequei à caixa de e-mails, aguardando alguma informação nova sobre o TU. No trabalho, nesse mesmo dia, finalizei o fechamento do bimestre das turmas na escola em que atuo como professora, lançando as notas e editando documentos. Acessei o Instagram como parte da minha rotina diária para descontrair.

Além das diversas maneiras pelas quais utilizo a tecnologia, pretendo empregá-la para criar conteúdos educativos, pois estou me formando para trabalhar como docente. Tenho a intenção de produzir canais de revisão de textos e criar questões para vestibulares, visando ampliar o conhecimento na área. Também planejo contextualizar as aulas de Língua Portuguesa com o uso prático das tecnologias digitais, integrando-as na sala de aula. Em um século em que a tecnologia está cada vez mais presente no cotidiano das pessoas, é essencial que ela também faça parte do contexto escolar.

Assim, observo que a geração de pessoas mais idosas, muitas vezes, é menos familiarizada com as tecnologias digitais e, frequentemente, enfrentam dificuldades para manuseá-las de forma correta. Isso leva muitas dessas pessoas a optarem por métodos mais tradicionais, que consideram mais eficazes dentro de suas visões de mundo.

Entretanto, a geração mais nova, ao contrário dos idosos, é mais adepta das tecnologias digitais e a utiliza de forma natural, devido à sua maior abertura às novas ideias e mudanças. As crianças, que já nascem em um ambiente digital, se adaptam e se relacionam com facilidade com as tecnologias.

Em relação às tecnologias utilizadas no tempo da comunidade, houve mudanças notáveis no período do Tempo Universidade. Na minha comunidade, acessava diariamente o DED – Diário Escolar Digital, pois a ocupação principal era com o trabalho e os estudos acadêmicos. Atualmente, com o período de aulas presenciais, meu contato com as tecnologias se ampliou para incluir ferramentas como Google Classroom e Google Docs.

Com o passar do tempo, algumas práticas sociais mudaram em função da tecnologia. Nos meus estudos anteriores, tinha preferência por utilizar cadernos e livros físicos. Também produzia listas de compras de forma manual, uma vez que, na época, o acesso às tecnologias digitais era limitado.

Posteriormente, passei a me adaptar às tecnologias digitais e tenho utilizado o celular e o notebook para diversas atividades, como produzir trabalhos acadêmicos, realizar tarefas profissionais, criar listas telefônicas, agendar encontros, promover conversas e acessar aplicativos. O Google Maps, por exemplo, tornou-se uma ferramenta essencial para localizar e me orientar em diferentes lugares. Além disso, as compras online tornaram-se uma prática corriqueira, permitindo-me adquirir produtos sem sair de casa e frequentemente a preços mais justos. Essa percepção indica que as culturas também influenciam a forma como as pessoas lidam com as tecnologias digitais.

Em alguns lugares, as novas tecnologias são usadas predominantemente como meio de comunicação, enquanto em outros são utilizadas principalmente para fins profissionais. Embora a diferença de gênero não tenha um impacto significativo no uso das tecnologias digitais, as diferenças etárias têm uma influência considerável na maneira como as pessoas interagem com essas ferramentas.

Reconhecendo a facilidade com que as gerações mais novas se adaptam às tecnologias digitais, como futura docente, pretendo utilizar essas ferramentas de maneira estratégica e inovadora no processo de ensino. Incorporar tecnologias para gerenciar atividades, plataformas de criação de conteúdo digital e interativos para manter contato com estudantes e enriquecer a experiência educacional.

Com as tecnologias, somos capazes de proporcionar experiências cinematográficas ricas e imersivas, explorando uma vasta gama de filmes e vídeos que têm um impacto significativo em nossa educação.

As tecnologias não apenas nos permitem assistir e a participar de histórias inspiradoras, mas também nos capacita a explorar profundamente seus temas, universais ou locais, como perseverança, autodescoberta e superação de obstáculos.

Nesse contexto, gostaria de indicar um filme que marcou minha infância escolar: “Prova de Fogo: Uma História de Vida”. Este filme emocionante narra a jornada de Akeelah, uma jovem de 11 anos com um talento excepcional para soletrar, enfrentando desafios pessoais e sociais enquanto se prepara para um concurso de soletração.

Entre fitas e cliques: minha jornada com as tecnologias digitais

Entre fitas e cliques: minha jornada com as tecnologias digitais
Adylla Santos Baldaia é acadêmica do curso Licenciatura em Educação do Campo (LEC), da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM). Adylla vive na Comunidade Quilombola do Paiol, no município de Cristália/MG.

Minha jornada com as tecnologias começou de maneira bastante simples e nostálgica. Quando eu ainda era criança, meu primeiro contato com tecnologia aconteceu através de uma caixa de som antiga que meu pai tinha em casa. Essa caixa de som funcionava com fitas e discos , e meu pai tinha uma vasta coleção de músicas de diversos cantores. Eu passava horas ouvindo músicas do Luan Santana, explorando diferentes sons e estilos musicais. A caixa de som se tornou uma espécie de portal para mim, despertando um interesse precoce pelo mundo da tecnologia.

Antes de me envolver com tecnologias digitais, minhas interações eram principalmente com tecnologias analógicas. Na nossa casa, o rádio e a televisão eram as principais fontes de entretenimento e informação. Lembro-me de sentar com minha família para ouvir programas de rádio e assistir a novelas e noticiários na TV.

Em 2015, tive meu segundo contato significativo com a tecnologia digital quando minha irmã mais velha criou um perfil no Facebook para mim e me deixava mexer no celular dela. Essa experiência foi um marco na minha vida digital. Lembro-me com clareza do momento em que enviei minha primeira mensagem pelo celular, entrei no Facebook e fiz uma busca na Wikipédia. Cada uma dessas experiências foi marcante e abriu novas possibilidades para mim no mundo digital.

Minha irmã mais velha foi uma figura fundamental no meu processo de aprendizagem com tecnologias digitais. Ela não apenas criou meu perfil no Facebook, mas também me ensinou a usar o celular, a navegar na internet e a explorar as diferentes funcionalidades das redes sociais. Esse apoio inicial foi crucial para que eu me sentisse confiante e capaz de explorar o mundo digital por conta própria.

Atualmente, as plataformas sociais como Facebook, Instagram e WhatsApp são as mais frequentemente visitadas por mim. Uso essas redes para manter contato com amigos e familiares, acompanhar notícias e eventos, e participar de grupos de interesse. Além disso, contribuo ativamente com uma página no Instagram dedicada à minha comunidade, da qual sou integrante. Nesta página, compartilho regularmente fotos e vídeos que destacam aspectos culturais, eventos e histórias da nossa comunidade.

No último dia em minha comunidade antes de vir para a Universidade do Tempo Universitário (TU), utilizei principalmente o celular para comunicação e acesso às redes sociais. A televisão também fazia parte da rotina, fornecendo entretenimento e informações. Ontem, logo após acordar, a primeira tecnologia que usei foi o celular para verificar mensagens e atualizações nas redes sociais. Ao longo do dia, utilizei o computador para estudar e elaborar um slide no aplicativo Canva, e para acessar materiais didáticos online.

A transição do uso de tecnologias na comunidade para a TU foi significativa, pois o ambiente acadêmico exige um maior uso de ferramentas digitais para aprendizado e comunicação. Por exemplo, estudar agora envolve o uso de plataformas digitais e recursos online. Anotar telefones e fazer listas de papel foram substituídos por aplicativos de organização e notas. Marcar encontros e conversas também se tornaram mais fáceis e rápidas através de mensagens no WhatsApp e outras redes sociais.

Participei do PIBID (Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência), onde tive a oportunidade de trabalhar com vários mestres e mestras do saber. Durante esse período, produzi um vídeo sobre Dona Alvina, uma mestra produtora de esteiras de capa de bananeira. Para o vídeo, utilizei os aplicativos Caput e Canva. Busquei destacar a importância de preservar e valorizar os conhecimentos tradicionais, como os da Dona Alvina.

Embora eu já tenha explorado muitas possibilidades com tecnologias digitais, ainda pretendo expandir meu conhecimento e habilidades em áreas como programação, design gráfico e criação de conteúdo digital. Durante a minha trajetória, percebi diferenças significativas no uso de tecnologia entre gerações. As gerações mais velhas, como meus pais e avós, geralmente adotam uma abordagem mais limitada e cautelosa em relação às tecnologias digitais, enquanto as gerações mais novas, como meus irmãos e sobrinhos, estão mais integradas e são mais adeptas ao uso intensivo de dispositivos e redes sociais.

Tenho sentimentos predominantemente positivos em relação às novas tecnologias, pois oferecem inúmeras oportunidades de aprendizado, comunicação e entretenimento. No entanto, reconheço a necessidade de um uso consciente e equilibrado para evitar dependência e impactos negativos na saúde mental. As experiências mais positivas com tecnologias digitais incluem a facilidade de acesso à informação, a possibilidade de manter contato com pessoas distantes e a capacidade de aprender online. As experiências negativas envolvem a exposição a conteúdos prejudiciais, cyberbullying e perda de foco.

Como futura professora, pretendo integrar as tecnologias digitais de maneira significativa em minhas práticas pedagógicas. Ferramentas como plataformas de aprendizado online, aplicativos de organização e redes sociais educativas serão utilizadas para criar aulas mais dinâmicas e interativas, adaptadas às diferentes necessidades e estilos de aprendizagem dos alunos.

Acredito que essas ferramentas são fundamentais para enriquecer o processo de ensino e aprendizagem, estimulando a colaboração, a criatividade e o desenvolvimento de habilidades digitais essenciais para o século XXI.

Pra terminar, recomendo um filme que eu mais assistia com meus irmãos na minha infância, e juntos adorávamos as aventuras e mistérios vividos pelas protagonistas. Confira o filme H2O o filme no YouTube, uma produção australiana que acompanha a história de três adolescentes que se transformam em sereias ao entrarem em contato com a água.

Minhas trajetórias de letramento

Minhas trajetórias de letramento

 

Sou uma mãe de 21 anos e venho de uma comunidade tradicional com poucas oportunidades de ingresso em uma universidade federal. Atualmente, estou cursando o sexto período do curso de Licenciatura em Educação do Campo e, ao relembrar as diversas dificuldades e escassas oportunidades de ter uma educação mais completa em minha casa, percebo o quão importante foi cada esforço e superação para alcançar esse objetivo.

Ao relembrar minha trajetória educacional, recordo-me de como o incentivo à leitura e à escrita era quase inexistente em meu ambiente social. Meus pais, por falta de paciência e tempo, não me apresentavam livros e textos. Foi somente no início da minha alfabetização que tive meu primeiro contato com a escrita. A partir daí, fui conhecendo e entendendo, aos poucos, alguns textos. Foi através da escrita que pude descobrir a magia das palavras

Meu primeiro contato com a leitura foi aos seis anos de idade, quando iniciei a fase de alfabetização. Aprendi a escrever meu nome e comecei a utilizar diversos objetos para praticar a escrita. Lembro-me de escrever na areia com um pedaço de madeira e até mesmo nas paredes da minha casa, o que causava brigas com meus pais. Desde criança sempre admirei o hábito da leitura e da escrita, porém, devido às condições financeiras e à falta de incentivo, não tive acesso a uma variedade de livros. Mesmo diante disso, fazia o possível para me envolver com a leitura, seja através de livros emprestados da biblioteca da escola ou de revistas antigas encontradas na casa dos meus avós.

Lembro-me de quando a escola proporcionou um projeto literário que se mostrou bastante acolhedor e me ajudou a melhorar minha leitura. Ele fez com que os estudantes viajassem e mergulhassem em um mundo que se interpreta por si só, pois a leitura tem o seu próprio método de ensinar, na perspectiva de ser libertadora.

O projeto desenvolvido na escola tem uma função especial na minha vida, pois amenizou os impactos gerados pela falta de contato com livros na minha infância. Acredito que a leitura possibilita a emancipação do cidadão, tornando as pessoas críticas e conscientes. Também creio que a literatura é um direito, como defendia Antônio Cândido. Mais do que decodificar signos, ler vai além da palavra escrita e deve promover a compreensão da realidade e permitir que o indivíduo se torne um agente transformador, social e cultural, em seu meio.

Foi através desses pequenos trabalhos desenvolvidos na escola e do curso da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), no qual estou inserida hoje, que fui ampliando meus horizontes e adquirindo novas habilidades. Vejo como a leitura e a escrita se tornaram ferramentas essenciais na minha jornada de aprendizagem e crescimento profissional e pessoal. Mesmo sem as mesmas oportunidades que muitos, percebi que o conhecimento adquirido através da leitura é algo que ninguém pode me tirar.

Hoje, olhando para trás, vejo o quanto a minha admiração pelo hábito de ler e pelo letramento foi fundamental para superar as adversidades e conquistar meus sonhos. Mesmo com poucas oportunidades, nunca deixei de acreditar no poder transformador da educação. Como futura educadora do campo, continuo buscando novas formas de me aprimorar e de compartilhar meus conhecimentos com os outros. A leitura e os letramentos me abriram portas e me mostraram que, com determinação e esforço, é possível ser uma cidadã mais criativa, crítica e reflexiva em relação às questões que me cercam.



SOBRE A AUTORA:

Maria Cláudia Barbosa Nogueira é acadêmica da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM), na Licenciatura em Educação do Campo. Produziu este relato na disciplina Gêneros Textuais/Discursivos, ofertada de julho a novembro de 2024.

 

 

 

Este trabalho foi orientado pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro e faz parte do livro Memórias de letramentos 5, que pode ser baixado gratuitamente. Clique na capa ao lado.

 

Para adquirir a versão impressa, a preço de custo, CLIQUE AQUI! 

Minhas vivências aprendendo

Minhas vivências aprendendo

 

 

Tenho 25 anos e sou natural da comunidade Quilombola do Peixe Bravo, localizada em Riacho dos Machados, Minas Gerais. Desde a infância, sempre fui uma pessoa curiosa, interessada em compreender o motivo das coisas, mesmo sem saber ler ou escrever. Desde cedo, já estava em contato com o significado das palavras, dos objetos e dos sentimentos ao meu redor.

Aos 4 anos, comecei a questionar a origem das palavras, observando minhas primas mais velhas indo à escola, fazendo tarefas de casa e utilizando materiais de papelaria. Eu tinha um grande desejo de acompanhá-las, mas naquela época era pequena demais para frequentar a escola. Como não podia frequentar a escola, uma das minhas primas me presenteou com um livro antigo para que eu pudesse rabiscar e estudar. Assim, mesmo sem ter aulas formais, eu aproveitava cada momento para explorar aquele livro: rabiscava, desenhava e tentava decifrar as letras e palavras ali escritas. Foi com ele que aprendi a contar os números. 

A sensação que tenho é que tudo isso aconteceu “ontem”. Quem poderia imaginar que um simples livro velho despertaria em mim tantos sentimentos e me motivaria a gostar do aprendizado. Um dos motivos pelos quais minha mãe relutava em me matricular na escola das minhas primas era a distância considerável que eu teria que percorrer. Eram vários quilômetros a pé até chegar ao ponto de ônibus, seguidos por mais horas de viagem até chegar à escola.

Quando completei cinco anos, minha mãe decidiu me matricular na escola, apesar de suas preocupações. Ela conversou com uma professora da escola e explicou que, apesar de minha vontade de estudar ser forte, ela tinha receios devido à longa caminhada até o ponto de ônibus.

Foi nesse momento que a querida professora Selma sugeriu à minha mãe que, se eu realmente queria estudar e já estava matriculada, ela poderia me levar até o ponto de ônibus e pedir a alguém que me acompanhasse dentro do ônibus. Assim, minha mãe fez. Quando ela voltou para casa, trouxe a notícia de que eu poderia ir para a escola todos os dias, na companhia das minhas primas.

Chegou o grande momento do primeiro dia de aula. Acordei cedo, cheia de empolgação, pedindo à minha mãe para me arrumar logo, pois estava prestes a realizar um sonho. Ao entrar na sala cheia de crianças, experimentei uma mistura de ansiedade, nervosismo e empolgação. A professora Selma, com seu sorriso acolhedor, ajudou-me a encontrar minha carteira e logo percebi que ali, naquele ambiente repleto de livros, quadros e lápis coloridos, eu estava exatamente onde sempre quis estar.

Lembro-me de ser a única na turma que sabia escrever meu nome corretamente, embora ainda não soubesse ler completamente. Foi minha mãe quem me ensinou a escrevê-lo em casa, o que me fez sentir inteligente desde cedo. Além disso, meus pais sempre me contavam histórias, discutiam passagens da Bíblia e tocavam músicas em CDs no rádio. Assim, quando entrei no “pré”, já conhecia algumas letras do alfabeto e alguns números. Na escola, me dediquei bastante e aprendi a ler minhas primeiras palavras com muito entusiasmo.

Quando entrei para o primeiro ano, meu desejo era continuar na mesma classe dos meus colegas, pois adorava aprender junto com eles. Já dominávamos melhor o alfabeto e conseguia facilmente formar palavras. Pouco tempo depois, já era capaz de escrever pequenos textos inspirados nas histórias que a professora contava em sala de aula. 

Foi nesse momento que descobri a biblioteca. Ela era pequena e ficava ao lado da sala, onde a professora nos levava para estimular nossos letramentos e também a nossa imaginação. Lá, tínhamos a oportunidade de escolher um livro por mês para levar para casa, cujas histórias compartilhávamos com a classe. Essa descoberta foi marcante para mim, pois sentia que podia viajar sem sair de casa. O universo dos livros se abriu diante de mim. 

No Ensino Fundamental II, vivi um período de transição marcado por uma mistura de sentimentos: não era mais tão criança, mas ainda estava longe de ser adulta. A pressão na escola aumentou significativamente, com mais atividades e provas mais exigentes, mas mantive minha determinação porque realmente gostava de aprender. Nessa nova fase, comecei a identificar as matérias que mais me interessavam, como português e história, enquanto outras, como Matemática, não despertavam tanto meu entusiasmo. No entanto, o apoio da minha turma de amigos foi fundamental. Lembro-me vividamente de escrever uma carta pela primeira vez, seguindo um modelo, o que foi bastante divertido e educativo.

Sempre tive o desejo de cursar uma faculdade. Esse sonho começou a se aproximar durante o ensino médio, quando as matérias se tornaram mais desafiadoras e a ansiedade tornou-se parte da minha rotina diária. Nesse momento, precisei aprender a lidar com essa ansiedade, então estabeleci um cronograma de estudos mais definido e reservei tempo de qualidade para passar com minha família e amigos, que me ajudavam a manter a calma.

No segundo ano do ensino médio, enfrentei uma mudança significativa ao me mudar para a cidade de Fruta de Leite – MG e passar a viver com minha avó para estudar na Escola Estadual Aníbal Gonçalves das Neves. Foi um período um tanto tenso devido ao recente falecimento do meu avô, além de estar longe dos meus amigos me deixou apreensiva.

Tudo se resolveu quando fiz novas amizades e com a companhia da minha avó, com quem passei momentos significativos, além de começar a me dedicar melhor aos estudos. Lembro-me vividamente de como a leitura foi fundamental nesse período. Era um momento reservado para mim e meus pensamentos. Uma professora, muito especial, sempre me indicava livros e filmes que ampliaram meu horizonte.

Me formar no ensino médio foi um momento muito gratificante, quando pude ver minha família orgulhosa e me sentir preparada para a próxima etapa. A nostalgia daquele tempo ainda persiste: a sala colorida, meus amigos e o apoio constante da minha família com as tarefas iam além das simples aulas.

Após a formatura, sabia que o próximo passo seria a faculdade. Embora inicialmente assustador, em 2021, decidi ingressar na Licenciatura em Educação do Campo na UFVJM, decisão que hoje me preenche de satisfação. A cada dia, me encanto mais com a complexidade dos estudos, explorando de maneira ampla e específica temas que sempre me fascinaram. Descobrir que há tanto a aprofundar nesses assuntos e ter a perspectiva de ensiná-los futuramente me inspira profundamente.

 

 

 



SOBRE A AUTORA:

Márcia Vicente de Sales é acadêmica da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM), na Licenciatura em Educação do Campo. Produziu este relato na disciplina Gêneros Textuais/Discursivos, ofertada de julho a novembro de 2024.

 

 

 

Este trabalho foi orientado pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro e faz parte do livro Memórias de letramentos 5, que pode ser baixado gratuitamente. Clique na capa ao lado.

 

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Construção dos meus letramentos: da infância à universidade

Construção dos meus letramentos: da infância à universidade

 

Aprender a “ler o mundo”, como dizia Paulo Freire, significa compreender os contextos e localizar-se no espaço social mais amplo, por meio da relação entre a palavra e o mundo. Na minha infância, comecei a ter percepção do “mundo”, das “coisas de adulto” com certa facilidade, pois a vivência diária com minha família me trazia muitos aprendizados, que eram um tipo de letramento vindo da visão “popular” de mundo que tinham.

Os ensinamentos sobre a forma de ver e entender as coisas se davam a partir dos conhecimentos que os mais velhos da comunidade tinham. Era muito comum ver as pessoas cantando, trabalhando e lendo, de forma que elas entendiam as coisas; muitos não liam letras do alfabeto, mas liam as imagens que estavam vendo, e demonstravam interpretações complexas daquilo tudo. No entanto, minha relação com o mundo da leitura e da escrita na minha infância era difícil, uma vez que poucos no meu entorno eram alfabetizados.

No momento desta escrita, estou com 25 anos e sou moradora da comunidade de Capivari, uma comunidade Quilombola localizada no município de Serro, no Vale do Jequitinhonha. Sempre fui uma menina muito estudiosa, apaixonada por leituras, linguagem, literatura e diversas outras formas de conhecimento. Cada uma dessas áreas me proporcionou enxergar diferentes aspectos de mim mesma e do mundo ao meu redor, ampliando minha visão de mundo, meus letramentos, meus significados. Também sou mãe de uma menina chamada Kemylly, que tem 5 anos de idade.

Venho de uma família formada por dez pessoas. Minha mãe, Enilce, tem 50 anos e cursou a escola até o 5º ano. Meu pai, Anirton, com 52 anos, também estudou até o 5º ano. Juntos, eles buscaram me ensinar o que sabiam, da forma que podiam. Somos seis irmãs, sendo que Katia tem vinte e sete anos e atualmente está cursando o ensino superior comigo. Na nossa infância, não tínhamos recursos para a educação e nem acesso à internet. Os poucos livros eram oferecidos pela prefeitura municipal, ou os livros religiosos. Lembro-me da escola pequena de tijolos de barro e telha de amianto, com apenas duas salas onde as aulas eram ministradas de forma multisseriada, com duas professoras de manhã e duas à tarde.

Durante esse tempo, as professoras eram muito atenciosas e nos ajudavam na leitura, na compreensão das imagens e outros elementos. Fiquei nessa escola até o 5º ano, pois a escola não oferecia os anos subsequentes. Assim, tivemos que ir para a comunidade vizinha para continuar nossos estudos até o segundo grau. Minhas irmãs Indiamara, Beatriz, Kassia e Berenice viveram suas experiências de estudo em um período em que a escola passou por reformas, tanto na estrutura física, quanto nos recursos disponíveis, incluindo acesso a mais livros e à internet.

Durante a minha infância, recordo-me com carinho do auxílio que minha irmã mais velha e minhas primas me proporcionavam ao compartilhar conhecimentos adquiridos na escola e em conversas com outras pessoas. Além disso, elas também me incentivavam a ler ao trazerem livros da escola para enriquecer meu aprendizado.

Logo após concluir meus estudos na escola da comunidade vizinha, ingressei na Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM), no curso de Licenciatura em Educação do Campo, com ênfase em Ciências da Natureza. Nesse ambiente acadêmico, tive a oportunidade de conhecer pessoas que desempenharam papel fundamental em minha formação, como professores, técnicos e principalmente os colegas, que me auxiliaram de maneira significativa ao longo desse processo.

Meu letramento no início foi difícil, pois a forma de estudar e como as coisas aconteciam eram novas para mim. Tive muita dificuldade em compreender as aulas e em me concentrar nas leituras e nos livros indicados pelo professor, devido à linguagem ser diferente do que eu estava acostumada. 

Durante meu curso, essa evolução gradual tornou-se evidente, especialmente a partir do quarto período. Com o auxílio dos colegas, pude compreender melhor as exigências do curso e as leituras necessárias. Isso me permitiu concentrar mais os meus esforços. Comecei a realizar não apenas as leituras obrigatórias em sala de aula, mas também as complementares, que foram fundamentais para minha formação. Percebi a existência de visões de mundo distintas, porém, ao mesmo tempo, semelhantes. Inicialmente, trazia o conhecimento popular como minha base principal, mas ao me inserir no ambiente acadêmico, fui integrando-o ao saber científico. Embora essas duas bases fossem diferentes, percebi que compartilhavam semelhanças essenciais. O conhecimento popular, embora não reconhecido pela ciência, mostrou-se igualmente valioso ao lado do conhecimento científico.

Durante minha trajetória formativa, participei de grupos de leitura, projetos de ensino, atividades de extensão como o projeto Vídeo Cartas, entre outros, nos quais a leitura desempenhava um papel central. A partir do quinto período, intensificou-se o contato com novas leituras, livros e autores, especialmente durante meu estágio, momento de significativo aprendizado.

No oitavo período, tive minha filha e concluí minha formação na área das ciências em 2020. Atualmente, estou cursando outra graduação na Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM), na área de Linguagem e Códigos. Nesta nova formação, tive a oportunidade de participar do PIBID, onde pude exercer funções que enriqueceram significativamente meus conhecimentos como futura educadora do campo. Além disso, essa experiência tem me permitido enxergar com maior clareza questões em minha comunidade que antes passavam despercebidas.

Hoje, só tenho a agradecer pelo processo de formação ao qual me inseri. Agradeço imensamente à minha família e a todos os colegas da Licenciatura em Educação do Campo, que me apoiaram e continuam me apoiando em cada etapa dessa jornada.



SOBRE A AUTORA:

Katiane da Cunha Ribeiro é acadêmica da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM), na Licenciatura em Educação do Campo. Produziu este relato na disciplina Gêneros Textuais/Discursivos, ofertada de julho a novembro de 2024.

 

 

 

Este trabalho foi orientado pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro e faz parte do livro Memórias de letramentos 5, que pode ser baixado gratuitamente. Clique na capa ao lado.

 

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Minha vida, meus letramentos

Minha vida, meus letramentos

Tenho 27 anos, sou da comunidade quilombola de Capivari, no município de Serro, ao pé do Pico do Itambé. Eu sempre fui uma menina curiosa desde cedo, um pouco tímida e acanhada, mas sempre em busca dos meus objetivos. Tive a oportunidade de ter contato com letramentos pela primeira vez através da televisão e do rádio, pois quando era criança gostava muito de assistir. Com o tempo passando e eu crescendo, passei a participar do teatro da comunidade, que se chama Quatro Gerações, onde minhas tias nos ensinavam através de canções, poemas e versos na produção oral.

Passado o tempo, comecei a brincar de casinha com minhas primas, que também me ensinavam a escrever. Como na época não tínhamos lápis nem caderno, pois os pais só os compravam quando íamos para a escola, usávamos pedaços de carvão e um pedaço de papelão. Eu gostava muito. Pegando em minha mão, mesmo com toda a dificuldade, as primas começaram a me ensinar, junto aos outros menores, a fazer os traços das letras que elas aprendiam na escola. Tinha hora que perdiam a paciência, aí era hora das brigas, mas logo passava.

E assim a vida foi seguindo. Aos 7 anos de idade, comecei a ir para a escola da minha comunidade, que atendia os estudantes até a 4ª série. Naquela época, a turma era multisseriada, com duas turmas juntas, quando comecei meu processo de alfabetização. As professoras eram muito prestativas e pacientes conosco. Naquele tempo, mesmo sem muitos recursos, sempre buscavam promover letramentos.

Quando começamos a aprender o alfabeto, lembro que a professora cantava assim conosco: “A de amor, B de baixinho, C de casa, D de docinho…” e no final… “…e X o que é que é: É Xuxa! E Z é zunzunzum.” Sim, ela ensinava cantando o abecedário da Xuxa. Começamos a escrever no caderno brochura de capa vermelha, que ficavam com as pontas das folhas dobradas com o uso, e um lápis preto. Era um lápis que vivia quebrando a ponta, mas era uma alegria ter aquele material. Como brincava muito com minhas primas, esse processo foi até fácil. Todos os dias estudávamos o alfabeto e a formação de sílabas e palavras, até conseguirmos aprender. Já nas aulas de matemática, lembro que a professora “cantava” a tabuada conosco para irmos aprendendo os números também através da música.

Como não havia biblioteca na nossa comunidade, lembro que o meu primeiro contato com um livro foi no catecismo, onde tive a oportunidade de tocar uma Bíblia Infantil pela primeira vez. Lembro que era de capa vermelha e suas páginas eram lindamente ilustradas. Com o passar do tempo, ganhei alguns livros infantis como Branca de Neve e os Sete Anões, Cinderela etc. Na escola também havia alguns livros que ficavam em um armário aberto, de fácil acesso. A maioria era de contos infantis ou didáticos. Nos reuníamos em grupos de até três pessoas para ler, pois não havia um livro para cada um; eram poucos. Lembro também que havia um dicionário Aurélio, que pegávamos para ler palavras novas.

Ao terminar a quarta série do ensino fundamental, fomos estudar na comunidade vizinha, chamada Milho Verde, onde fiquei até o 3º ano do ensino médio. Nessa escola, tive mais acesso a livros, pois já havia uma biblioteca maior com mais livros. A única professora que nos incentivava a ler foram a professora Antonina, que sempre nos pedia para ler alguma história, e o professor de geografia que era muito focado na escrita. Assim, o tempo foi passando e eu me formei.

Em 2013, a internet chegou na minha comunidade. Havia alguns poucos computadores que ficavam no centro comunitário, onde comecei a fazer pesquisas para o trabalho escolar. Ali comecei a desenvolver o que hoje chamamos de letramento digital. Depois que me formei, me afastei da escola por nove anos, pois comecei a trabalhar. Minha irmã Katiane sempre me chamava para fazer o vestibular da Licenciatura em Educação (LEC), mas eu nunca conseguia, por causa do trabalho. Em 2021 ela me chamou novamente, pensei bastante e decidi que era hora de voltar. Fiz a inscrição, a prova… cheguei em casa e falei com minha mãe: “Mãe, não vou conseguir, acho que fui mal na prova.” Quando chegou o dia do resultado, me surpreendi ao ver que tinha conseguido passar. Hoje estou aqui, em busca de construir novos conhecimentos para que, no futuro, eu possa ajudar os meus alunos e a minha filha Jasmim.



SOBRE A AUTORA:

Katia da Cunha Ribeiro Jesus é acadêmica da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM), na Licenciatura em Educação do Campo. Produziu este relato na disciplina Gêneros Textuais/Discursivos, ofertada de julho a novembro de 2024.

 

 

 

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Leituras de minha vida

Leituras de minha vida

Tenho 20 anos e sou da comunidade quilombola de Capivari, localizada no município do Serro, Minas Gerais. Embora tenha poucas lembranças do meu contato com a leitura antes da escola, sei que comecei a aprender com minha família. Assistia às apresentações do Teatro Quatro Gerações, um grupo da minha comunidade; no rádio, meu pai, todas as manhãs, sintonizava a FM 98, no programa do João de Nico.

Antes de entrar para a escola, tive meus primeiros contatos com a leitura através dos folhetos da igreja, do terço e do livro de músicas do teatro, com os quais eu interagia frequentemente. Gostava de desenhos na TV e acho que aprendi muito com as narrativas presentes neles. Meu primeiro contato com Ziraldo foi por meio do desenho animado do Menino Maluquinho, que eu não perdia. Com o Sítio do Pica-pau Amarelo conheci Monteiro Lobato.

Naquela época, eu não tinha tanto interesse pela leitura; queria aproveitar minha infância, e os livros não faziam parte dos meus hábitos. Quando entrei na escola aos 5 anos de idade, comecei a ter contato com livros que toda criança conhece, como histórias de fadas e contos clássicos, como Chapeuzinho Vermelho e Cachinhos Dourados. Mesmo assim, ainda não tinha muito interesse pela leitura, pois sempre gostei mais de matemática, já que tinha mais facilidade nessa área do que em português.

Meus primeiros contatos com a leitura aconteceram na escolinha que funcionava no centro comunitário da minha comunidade, enquanto a escola estava em obras. Esse contato inicial foi graças às aulas da tia Aparecida. Sempre tentei ler, mas preferia observar as palavras com os olhos, pois tinha grandes dificuldades na leitura.

Quando estava estudando com a professora Eni, comecei a frequentar o fonoaudiólogo para melhorar minhas habilidades de leitura. No entanto, tive que parar porque o atendimento deixou de ser oferecido na comunidade. Assim, precisei me esforçar por conta própria para melhorar nesse aspecto, e esse desafio continua até hoje.

Na escola de Capivari, havia um cantinho da leitura, mas não muitos livros, o que nos levava a ler principalmente textos impressos pelos professores ou encontrados nos livros didáticos disponíveis na escola. Ao contrário desse período, quando passei a estudar na escola de Milho Verde, no final do ensino fundamental e no ensino médio, tive a oportunidade de acessar uma maior variedade de livros para leitura. Mesmo assim, meu interesse pela leitura ainda era limitado.

Contudo, durante o oitavo ano do ensino fundamental, dei um passo diferente: fui até a biblioteca da escola e peguei um livro para ler. O livro se chamava “A Última Pedra”, mas não me lembro o nome do autor. Tentei começar a leitura, mas não consegui finalizá-la. Também tive contato com outros textos durante esse período, mas minha vontade de ler ainda não era grande. Talvez isso se devesse ao fato de já ter ouvido que eu “lia errado” ou por outro problema, algo que escutei no ensino fundamental e que me marcou. Sempre pensava: ‘E se eu começar a gaguejar ou ler errado? E se alguém rir de mim?’, passei um bom tempo com medo de ler em voz alta. Lembro até hoje de um dia em que fui ler na igreja e me olharam com cara de julgamento. Como eu era pequena, morria de vergonha de ler em público. Desde aquele dia, nunca mais quis ler na igreja.

Durante o ensino médio, tive a oportunidade de ter um professor que nos incentivava a ler: o professor Heráclito. Ele dedicava um dia da semana para a leitura, toda quinta-feira. Um dos livros que li nesse dia foi “Quatro Vidas de Um Cachorro”, de W. Bruce Cameron, e “Querido John”, de Nicholas Sparks, livros emprestados por uma colega de classe. Foi aí que me desafiei mais a ler. Quando fiz 18 anos, ganhei dois livros de presente: “Cidades de Papel” e “Sereia”, da coleção de uma amiga, Raquel, que conhecia desde criança. Também tive a oportunidade de participar de um encontro quilombola, onde ganhei mais um livro em um sorteio, ou, como falamos, “de sorte”. Assim conheci Lélia Gonzalez a partir do livro “Por um Feminismo Afro-latino-americano”.

A leitura estava presente em diversas disciplinas, como matemática e física. Para fazer cálculos, era preciso ler e escrever sobre eles. Além disso, os números romanos também exigiam, já usam letras ao invés dos números “normais” da matemática. Durante o tempo em que estive na escola, tanto no ensino fundamental quanto no médio, a leitura esteve sempre presente.

Infelizmente, finalizei meus estudos do ensino médio durante a pandemia de Covid-19, o que foi bastante desafiador. O incentivo que eu tinha dos professores deixou de existir e minha vontade de ler acabou ficando de lado naquele momento. No entanto, quando entrei para o curso da LEC, a leitura voltou a ser constante, desde quando entro na sala de aula até quando estou fora dela, tanto na faculdade quanto na minha comunidade.

A leitura tornou-se parte de mim novamente, especialmente agora que sou representante da diretoria da minha comunidade, ocupando um cargo onde a leitura é essencial para o desempenho das minhas funções. Percebo que sempre estou rodeada pela leitura e sempre estarei. Fico feliz em esperar o futuro com essa companhia.



SOBRE A AUTORA:

Indiamara Aparecida Ribeiro Da Cunha é acadêmica da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM), na Licenciatura em Educação do Campo. Produziu este relato na disciplina Gêneros Textuais/Discursivos, ofertada de julho a novembro de 2024.

 

 

 

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Uma jornada de descobertas

Uma jornada de descobertas

Tenho 21 anos e sou da cidade de Coronel Murta, localizada na região do Médio Jequitinhonha. Sou filha de pequenos agricultores rurais, Marlene e Manoel, que sempre me incentivaram a estudar. Desde cedo, aprendi a valorizar a educação como uma ferramenta essencial para o desenvolvimento pessoal e profissional. Meus pais, apesar das limitações e desafios enfrentados na vida no campo, nunca mediram esforços para apoiar meus estudos e me motivar a buscar sempre mais.

Minha jornada com os letramentos começou de forma simples com os recursos disponíveis em casa: revistas e cadernos antigos dos meus irmãos se tornaram meus primeiros materiais didáticos. Desde cedo, eu adorava brincar de “aulinha”, mesmo sem ainda saber ler. As letras começaram a se tornar familiares, principalmente porque minha irmã me ensinava pacientemente. Mesmo sem estar oficialmente matriculada, eu frequentava a escola da comunidade. As professoras, de maneira gentil, me entregavam atividades simples como letrinhas para colorir, o que gradualmente me aproximou do mundo das palavras.

Aos seis anos, finalmente fui matriculada na Escola Municipal Manoel Costa Barreto, localizada na comunidade Olhos D’Água. O primeiro dia de aula foi uma explosão de emoções, meu coração parecia querer saltar do peito, pois ali começava uma longa jornada educacional. A professora Udilene, com sua paciência e dedicação, foi essencial para guiar-me nesse caminho inicial. No segundo ano, algo mágico aconteceu: aprendi a ler e adorava me sentar no cantinho de leitura e imergir nas histórias em quadrinhos da Turma da Mônica. Era um verdadeiro encanto. Sempre comparava as aventuras da Vovó Bastião comendo feijão com as histórias do meu avô, que também se chamava Bastião.

Em 2014, dei início ao sexto ano na escola municipal do distrito de Freire Cardoso, localizado em Coronel Murta. Essa nova fase trouxe consigo desafios significativos. O transporte escolar me levava diariamente por quilômetros de distância, atravessando estradas poeirentas e muitas vezes áridas sob o sol escaldante, tornando o retorno para casa uma verdadeira luta diária. As condições climáticas severas e a longa jornada afetavam não apenas o meu ânimo, mas também a disposição dos colegas. Em alguns dias, a merenda escolar, por mais que fosse bem-vinda, não era suficiente para nutrir-nos adequadamente, resultando em mal-estar durante a volta para casa. Esses desafios cotidianos moldaram não apenas a minha resistência física, mas também fortaleceram o meu compromisso com os estudos e a determinação em superar adversidades.

Apesar das dificuldades enfrentadas na escola do distrito de Freire Cardoso, em Coronel Murta, durante o sexto ano em 2014, essa experiência deixou marcas profundas em minha vida acadêmica. No entanto, lamentavelmente, o ensino de português não alcançou o padrão desejado. A professora concentrava-se excessivamente na gramática, deixando a leitura em segundo plano, o que limitava nosso desenvolvimento linguístico e cultural. Felizmente, por iniciativa própria, muitos alunos buscavam enriquecer seus conhecimentos frequentando a biblioteca da escola. Lá, descobrimos novos mundos através dos livros, expandindo nossos horizontes para além das limitações do currículo escolar. Essa autonomia na busca pelo conhecimento não só complementava, mas também compensava as lacunas no ensino formal, preparando-nos melhor para os desafios futuros na educação e na vida.

Minha trajetória no mundo do conhecimento começou de forma única. Desde cedo, descobri que tinha facilidade com as partes gramaticais da língua, mas ao mesmo tempo, a literatura, que sempre me cativou, acabou perdendo espaço para o foco nas disciplinas exatas. Os elogios dos professores de matemática eram como notas musicais para mim, embora minha timidez muitas vezes me limitasse a expressar plenamente meu potencial. Foram quatro anos intensos de esforço e aprendizado, nos quais busquei equilibrar minha dedicação aos estudos gramaticais com o desafio constante das ciências exatas. A cada conquista e desafio superado, percebia que essa jornada não apenas fortaleceu minha base acadêmica, mas também moldou minha perseverança e determinação para enfrentar novos desafios no futuro.

Em 2018, tudo mudou. Ingressei no ensino médio na Escola Família Agroecológica de Araçuaí. Enfrentei o desafio de estar longe da família, o que foi difícil no início, mas consegui me adaptar. Houve momentos em que pensei em desistir, mas a motivação para continuar meus estudos sempre prevaleceu. A escola tinha uma abordagem pedagógica inovadora, focada na agroecologia e na sustentabilidade, o que me permitiu aprender não apenas o currículo tradicional, mas também práticas agrícolas sustentáveis e gestão ambiental. Tive a sorte de contar com professores de alta qualidade, que, apesar de alguns deslizes, sempre me incentivaram e apoiaram. 

Além das aulas teóricas, participei de várias atividades práticas e projetos comunitários, que fortaleceram meu entendimento sobre a importância da agricultura sustentável para a comunidade local. Fiz amizades valiosas, que me ajudaram a superar a saudade de casa e contribuíram para meu crescimento pessoal.

Essa experiência me proporcionou um crescimento pessoal significativo e solidificou minha determinação em buscar meus objetivos acadêmicos e profissionais. A convivência com colegas e professores me ensinou a importância da cooperação e do trabalho em equipe, habilidades que levarei comigo para o futuro.

A parte mais complexa? Formar-me durante a pandemia. Não foi apenas difícil para mim, mas para meus colegas, professores e o mundo inteiro. A EFA se tornou uma das minhas maiores conquistas. O período de alternância, com quinze dias na escola e quinze em casa, proporcionou uma educação diferenciada. Lá, o jovem do campo convive com a sustentabilidade, a liderança e a formação crítica.

No ano de 2021, realizei minha inscrição para o vestibular da Licenciatura em Educação do Campo (LEC). Hoje, estou aqui, enfrentando mais uma nova jornada na área de Linguagens e Códigos. Embora não seja minha zona de conforto, estou determinada a aprimorar meus conhecimentos e expandir minhas habilidades. Essa escolha representa um passo significativo na minha trajetória. A licenciatura em Educação do Campo me oferece a oportunidade de aprofundar meus estudos em linguagens e códigos, áreas fundamentais para a comunicação e a educação. Estou ciente dos desafios que essa nova etapa traz, mas acredito que cada obstáculo superado me fortalece e fortalecerá ainda mais. Entre lembranças e saudades, compartilho minha jornada de letramentos, uma jornada de descobertas.



SOBRE A AUTORA:

Elidiana Martins da Silva é acadêmica da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM), na Licenciatura em Educação do Campo. Produziu este relato na disciplina Gêneros Textuais/Discursivos, ofertada de julho a novembro de 2024.

 

 

 

Este trabalho foi orientado pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro e faz parte do livro Memórias de letramentos 5, que pode ser baixado gratuitamente. Clique na capa ao lado.

 

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Meu desenvolvimento com a prática da leitura e da escrita

Meu desenvolvimento com a prática da leitura e da escrita

Na infância, não havia livros nas estantes de casa. Apenas canetas e panfletos da igreja preenchiam os espaços, com riscos e linhas deixados por mim e minha irmã no rosto de cada personagem. Em alguns domingos, na comunidade rural onde morávamos, diversas associações realizavam reuniões para ajudar famílias pobres que não podiam comprar materiais ou brinquedos para seus filhos. Lembro-me também de quadrinhos e livros sobre a Arca de Noé e Sansão que levávamos para casa. Quando chegávamos em casa, nos entregávamos à imaginação, já que não sabíamos ler.

Iniciei a pré-escola aos quatro anos sem estímulo para ler ou escrever. Ao chegar à escola, sentia vergonha de interagir com os colegas. Durante dois anos, não falei com ninguém. Os professores não interagiam, e saí da pré-escola sem nunca ter usado a própria voz. Às vezes, tinha dificuldades para ir ao banheiro e precisava esperar pelo lanche, o que resultava em constrangimentos na sala de aula. Nessa fase, as professoras ajudaram minha mãe a buscar ajuda médica, já que meu ‘atraso’ estaria afetando minha aprendizagem nas aulas.

Até o segundo ano da pré-escola, ainda não sabia o alfabeto. Foi uma fase de descoberta das dificuldades em socializar. Aprendi a escrever o nome na fase introdutória, com a ajuda dos professores, que seguravam minha mão para eu formar as letras e as palavras. Na perspectiva de ajudar, as professoras faziam um caderno de caligrafia para ligar pontos e formar palavras. Esse caderno era feito à mão, devido à falta de recursos na escola. Elas escreviam pequenos textos de forma pontilhada, para que eu pudesse desenhar por cima e formar as palavras. Mesmo mudando de escola e de professores, continuei recebendo suporte de uma fonoaudióloga e uma psicóloga.

Essa ajuda psicológica contribuiu para que eu pudesse ter foco e desenvolver o raciocínio lógico. As consultas eram realizadas a cada 15 dias, onde eu fazia montagens de quebra-cabeça, visualização e interpretação de cores e formação de palavras. Pelo fato de meus pais se considerarem analfabetos na época, acreditavam que os filhos teriam o mesmo pensamentos e atitudes que eles. O estímulo e a valorização da leitura eram nulos; a realização das atividades até essa fase não teve ajuda deles.

Após essa fase introdutória, as visitas semanais à biblioteca começaram no primeiro ano, permitindo contato inicial com livros e escrita. Durante o segundo e terceiro ano, as matérias ficaram mais difíceis e tive que me adaptar. No final do terceiro ano, fui reprovado por falta de preparo para o quarto ano. Inicialmente, foi difícil me ajustar à nova turma, mas com o tempo comecei a levar livros da biblioteca para casa, incluindo gibis e histórias da Bíblia, que eram mais fáceis de compreender.

Nessa fase também houve a inserção do trabalho com números. De início, contávamos até 3 e posteriormente até 10. Quando pulava algum dedo e chegava ao final com 9 números, causava estranhamento; os dedos acabavam e eu não sabia o que fazer. Sempre me enrolava no numeral 7, pois o dedo que seria o 2 da mão esquerda se tornava o número 7. Inicialmente, aprendi a contar até o número 10, depois 100, 200 e, com custo, até 1.000.000.

No quinto ano, começamos a fazer redações e até ganhei um prêmio por uma delas. Foi no final do fundamental 1 que a leitura começou a se consolidar, embora ainda com dificuldades na escrita.

No ensino fundamental 2, iniciaram-se aulas de inglês, novas matérias e novos colegas. A escola tinha uma biblioteca grande, e a professora, como forma de incentivo à leitura, nos fazia levar alguns livros durante os bimestres para casa, desenvolvia questões sobre os livros nas provas e organizava rodas de conversa para discuti-los. No dia da apresentação, sempre virava o rosto; calafrios de medo me faziam suar. Às vezes, era proposto escrever algumas linhas da parte que mais havia gostado da leitura. Eu sempre escrevia umas seis linhas. As obras que melhor me recordo são Dom Casmurro, Iracema, O Cortiço, mas houve diversas outras.

No ensino médio, li livros mais extensos, porém em menor quantidade. Aprendi a calcular juros, o que trouxe uma perspectiva boa e contribuiu para meu primeiro emprego, escrevi redações e cartas formais. Com a pandemia, a leitura foi deixada de lado até o início das aulas na faculdade, o que retornou quase dois anos depois.

No início das aulas na universidade, houve um certo estranhamento devido ao tipo de leitura. Em minha concepção, as leituras seriam baseadas em obras literárias brasileiras simples, como as que fazíamos na escola. Isso contrariou minha expectativa, pois os professores já esperavam que os alunos tivessem contato com obras mais complexas. Os diálogos com pensamentos científicos e filosóficos mudaram a percepção e minha mentalidade enquanto estudante, antes pouco crítico. A escrita melhorou devido às regras gramaticais, concordância e o uso do plural, algo que na prática com textos mais formais se mostra tão importante.

Atualmente, leio diariamente jornais e revistas online, e por vezes vou até a biblioteca municipal do bairro onde moro ou até a biblioteca universitária e pego algum livro. Pretendo cultivar o hábito de leitura diária e manter-me atualizado, pois esse mecanismo desenvolve o pensamento crítico e muda a mente do cidadão. A leitura crítica mudou minha concepção da realidade e tornou-se uma forma de interação com o mundo, levantando questões que antes não faria ou não consideraria importantes no cotidiano. Com essa nova visão, muitos assuntos se transformaram e ganharam uma perspectiva e entendimento diferentes. As aulas de matemática contribuíram para que na realidade o cálculo dos juros sobre as faturas e contas pudessem ser entendidos ou servissem de base para os estudos de futuros conhecimentos.

Minha trajetória de aprendizado foi marcada por desafios e superações. Desde a infância sem estímulo para a leitura até o desenvolvimento gradual de habilidades fundamentais na escola, cada etapa contribuiu e contribuirá significativamente para minha contínua formação. O apoio de professores, o incentivo à leitura e a ajuda psicológica foram essenciais para o meu progresso. A introdução ao universo dos livros e o trabalho com números moldaram minha capacidade de raciocínio e compreensão.

Atualmente, a leitura diária, aliada às visitas frequentes às bibliotecas, fortalece meu hábito de me manter informado e aprimorar meu pensamento crítico. A leitura crítica, em particular, revolucionou minha percepção da realidade, permitindo uma interação mais profunda e questionadora com o mundo ao meu redor. Em suma, minha jornada acadêmica e pessoal destaca a importância da persistência, do apoio e da leitura no desenvolvimento integral do indivíduo.



SOBRE O AUTOR:

Edmilson Oliveira Silva é acadêmico da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM), na Licenciatura em Educação do Campo. Produziu este relato na disciplina Gêneros Textuais/Discursivos, ofertada de julho a novembro de 2024.

 

 

 

Este trabalho foi orientado pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro e faz parte do livro Memórias de letramentos 5, que pode ser baixado gratuitamente. Clique na capa ao lado.

 

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Palavras e passados: recordações literárias

Palavras e passados: recordações literárias

 

 

As memórias são janelas para o passado, pois revelam os caminhos que trilhamos e os momentos que nos moldaram. Elas carregam consigo as experiências, emoções e aprendizados que construíram nossa identidade ao longo dos anos. Em um mundo cada vez mais acelerado, revisitar nossas memórias é uma forma de valorizar nossa trajetória e compreender melhor quem somos.

Este texto de memórias pretende resgatar as recordações da minha relação com a leitura e a escrita, desde a infância até os dias atuais. Por meio dessas lembranças, espero compartilhar a evolução da minha jornada literária e destacar as influências que foram fundamentais para o desenvolvimento do meu amor pelos livros e pela palavra escrita. Segundo a professora Sara Rojo, o progresso da linguagem escrita ou do processo de letramento infantil está relacionado ao nível de letramento das instituições sociais onde a criança se encontra, assim como as diversas formas de engajamento em práticas discursivas orais através de atividades cheias de significado.

Para iniciar este relato de memória, irei falar um pouco sobre a minha infância. Passei minha infância em um lugar chamado Serra da Bicha, que era afastado de tudo e de todos. A casa mais próxima ficava a cerca de 20 minutos de distância. Não havia estrada para carro; para fazer compras, meus pais iam a Capivari ou pegavam o burro e iam para São Gonçalo do Rio das Pedras. Dormiam na casa de parentes e, de manhã, pegavam o ônibus de Diamantina, faziam uma compra bem grande e voltavam para São Gonçalo do Rio das Pedras. Colocavam as compras no burro e voltavam para casa. Minha mãe e minha avó eram analfabetas, e meu pai mal sabia escrever o nome.

Antes dos meus sete anos, pelo que me lembro, minha infância não foi marcada por uma forte presença de textos escritos. Só tive contato com um livro de matemática, que tinha muitos desenhos e que era da minha avó, e mesmo assim ele desapareceu rapidamente. Não era comum ver livros, jornais ou revistas em minha casa. Antes de frequentar a escola, minha relação com a escrita era quase inexistente. Aprendi as primeiras letras na escola, aos sete anos de idade. A experiência foi desafiadora no início, pois não tinha muita familiaridade com o universo das letras e das palavras.

Quando comecei os estudos, fui morar com minha madrinha (mãe) na comunidade de Capivari. Nos primeiros anos escolares, comecei a desenvolver uma relação mais próxima com a escrita. As aulas de alfabetização eram momentos de descoberta, e lembro-me de escrever pequenas palavras e frases simples. Todos os dias, minha professora escrevia no quadro o nome da escola, o dia, o mês e o ano por extenso. Eu tinha muita dificuldade, mas fui aprendendo aos poucos. A escola desempenhou um papel fundamental em meus letramentos iniciais. Foi no ambiente escolar que tive o primeiro contato consistente com livros e outros materiais de leitura. As atividades escolares me ajudaram a melhorar minhas habilidades de leitura e escrita.

Minha relação com a matemática também começou na escola. Aprendi a contar e a reconhecer números com a ajuda dos professores. Não tenho lembranças claras de saber contar antes de ingressar na escola. Com o tempo, aprendi a somar e subtrair, e essas habilidades se consolidaram com a prática contínua ao longo dos anos escolares. Quando entrei na escola, não sabia fazer contas complexas. Os problemas matemáticos eram desafiadores, mas, com o apoio dos professores e a prática regular, comecei a entender melhor os conceitos matemáticos.

Durante minha vida escolar, não tive acesso a diferentes gêneros textuais. No ensino fundamental I, a escola era bem pequena, tinha somente duas salas, dois banheiros pequenos e uma cozinha. As professoras davam aula para duas turmas ao mesmo tempo. Não havia muitos livros; até os livros didáticos tínhamos que compartilhar com os colegas. Lembro-me de que, no quinto ano, minha professora, chamada Marina, nos obrigava a escolher um livro, ler e depois contar para os colegas. Porém, não havia livros para todos, e os que havia não eram de fácil entendimento.

No ensino fundamental II, perdi meu grande herói, meu pai. Fui morar com minha mãe em outra cidade e lá não tive professores que incentivavam a leitura. Também não era madura o suficiente para entender a importância da leitura e ler por conta própria. No ensino médio, comecei a trabalhar e tinha pouco tempo, pois trabalhava das sete às 17 horas, arrumava no serviço e ia direto para a escola. Chegava em casa por volta das 22h30, tinha apenas tempo para comer, tomar um banho e dormir. As escolas que frequentei tinham bibliotecas, mas eu não era muito motivada a frequentá-las. Minhas visitas à biblioteca eram geralmente para cumprir tarefas escolares específicas.

Comecei a ler depois de me formar no ensino médio. Nessa época, sentia-me sozinha, pois havia me mudado para Belo Horizonte para trabalhar. Depois do horário de trabalho, não tinha nada para fazer ou ver. Foi quando comecei a ler romances, que me permitiram imaginar vários cenários na minha cabeça. A leitura me transportou para outros mundos, proporcionando uma fuga e um conforto que não encontrava na minha nova rotina.

Segundo Brito (2010), ler é uma prática agradável e poderosa, pois estimula a capacidade criativa, amplia o conhecimento e oferece uma nova perspectiva sobre o mundo. O leitor estabelece uma conexão dinâmica entre a fantasia dos livros e a realidade de seu ambiente social. Nesse cenário fascinante, a criatividade, a imaginação e o raciocínio se destacam, abrindo um leque de possibilidades.

Na universidade, meus hábitos de leitura e escrita mudaram. Passei a ler mais textos acadêmicos e a escrever de forma mais crítica e analítica. Essas mudanças trouxeram aspectos positivos; minha capacidade de compreensão e análise textual melhorou significativamente. Atualmente, leio tanto autonomamente quanto os textos recomendados pelos professores e participo de grupos de leitura, o que enriquece ainda mais minha experiência literária.

No entanto, sinto que os professores do ensino fundamental e médio poderiam ter me preparado melhor. Se tivesse tido um contato mais profundo e constante com a leitura desde cedo, talvez minha transição para a leitura acadêmica e a escrita crítica tivesse sido mais natural. Mesmo assim, valorizo cada etapa da minha jornada, pois cada livro e cada texto lido contribuíram para o meu desenvolvimento pessoal e intelectual.

Como futura professora, pretendo cultivar uma relação constante e significativa com a leitura e a escrita. Quero inspirar meus alunos a descobrir o prazer da leitura, proporcionando-lhes as ferramentas necessárias para desenvolver essas habilidades de forma plena e enriquecedora. Pretendo criar um ambiente de aprendizado onde a curiosidade e a criatividade sejam incentivadas, permitindo que cada aluno encontre seu próprio caminho no mundo das palavras.

Cada etapa da minha vida contribuiu para o desenvolvimento das habilidades que valorizo e que continuarei a aprimorar no futuro. Minha experiência pessoal mostrou como a leitura pode ser uma fonte de conforto, conhecimento e crescimento. Desejo transmitir essa paixão aos meus alunos, ajudando-os a reconhecer o poder transformador da leitura e da escrita. Assim, espero não apenas educar, mas também inspirar uma nova geração de leitores e escritores apaixonados, preparados para enfrentar os desafios e aproveitar as oportunidades que surgirem em suas vidas.

Ao refletir sobre minha trajetória de leitura e escrita, percebo como cada etapa, desde minha infância até minha vida adulta, desempenhou um papel crucial no desenvolvimento das minhas habilidades literárias. As dificuldades e limitações que enfrentei, tanto em termos de acesso quanto de motivação, foram superadas pela descoberta do prazer da leitura e pelo impacto transformador que os livros tiveram em minha vida.

Minha experiência pessoal me ensinou que a leitura é uma janela para outros mundos e uma ferramenta poderosa para o crescimento intelectual e emocional. Essas memórias moldaram não apenas quem sou hoje, mas também meus objetivos futuros como educadora. Como futura professora, estou determinada a criar um ambiente de aprendizado que valorize e incentive a leitura e a escrita, proporcionando aos meus alunos as oportunidades que me faltaram no início.

Quero ser uma fonte de inspiração para meus alunos, ajudando-os a descobrir o prazer da leitura e a importância da escrita em suas vidas. Ao transmitir minha paixão pelos livros e pelo conhecimento, espero cultivar uma nova geração de leitores e escritores apaixonados, preparados para enfrentar os desafios e aproveitar as oportunidades que a vida lhes oferecer.

Assim, cada livro lido, cada texto escrito e cada memória revisitada não só enriqueceram minha vida, mas também me prepararam para inspirar e educar aqueles que cruzarem meu caminho. Continuarei a aprimorar minhas habilidades e a valorizar cada etapa da minha jornada literária, sempre buscando transmitir aos meus alunos o poder transformador da leitura e da escrita.



SOBRE A AUTORA:

Claudiana Silva Sincurá é acadêmica da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM), na Licenciatura em Educação do Campo. Produziu este relato na disciplina Gêneros Textuais/Discursivos, ofertada de julho a novembro de 2024.

 

 

 

Este trabalho foi orientado pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro e faz parte do livro Memórias de letramentos 5, que pode ser baixado gratuitamente. Clique na capa ao lado.

 

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Entre laços literários e desafios acadêmicos

Entre laços literários e desafios acadêmicos

Como diz Chimamanda Ngozi Adichie, “Todas essas histórias fazem de mim quem eu sou. Mas insistir somente nessas histórias negativas é superficializar minha experiência e negligenciar as muitas outras histórias que me formaram. A única história cria estereótipos. E o problema com estereótipos não é que eles sejam mentira, mas que eles sejam incompletos.” Não só Chimamanda, mas observando as tendências atuais na literatura, tenho percebido um incentivo crescente à valorização da diversidade. Isso se reflete, por exemplo, na representação da minha identidade como mulher negra e quilombola.

Um exemplo notável é a obra de Chimamanda Ngozi Adichie, que tem impactado profundamente a cena literária global, especialmente no contexto da cultura afro. Essa influência ressoa fortemente com minha posição na produção literária, alinhando-se com minha visão de mundo e com o letramento que adquiri até o momento.

Mas por que focar na literatura e entender minha posição na produção literária, quando talvez eu devesse apenas registrar uma simples memória de letramento? A resposta é simples: o letramento vai muito além da alfabetização (a habilidade de ler e escrever). No entanto, vou me concentrar nas minhas experiências pessoais e na minha evolução com a leitura e a escrita ao longo da minha vida, mostrando como essas experiências moldaram meu desenvolvimento educacional e pessoal de maneira profunda e significativa.

Lembranças de livros específicos que abriram minha mente para novos mundos, professores inspiradores que despertaram minha paixão pelo conhecimento e atividades escolares que transformaram minha visão do aprendizado estarão no centro desta narrativa. Cada uma dessas experiências está intimamente ligada ao letramento, que nos permite viver, sonhar e nos inspirar. Através dos diversos gêneros literários, especialmente aqueles que mais me emocionam ao recordá-los, quero compartilhar o impacto transformador da leitura e da escrita.

Uma das obras que considero marcantes na minha infância é “Menina Bonita do Laço de Fita”, de Ana Maria Machado. Essa história se destaca como uma das minhas favoritas, exercendo profunda influência na minha percepção da beleza negra. Pela primeira vez, vi uma personagem que refletia minha própria imagem, e isso teve um impacto significativo na minha autoestima. Eu e meus colegas de turma encenamos um teatro baseado na história, o que incentivou minha criatividade e meu amor pelas obras literárias. Essa experiência pessoal, juntamente com minha vivência na comunidade, reforça a importância do acesso à literatura desde cedo.

Um trecho da historinha que mais me marcou foi: “Por isso, um dia ele foi até a casa da menina e perguntou: – Menina bonita do laço de fita, qual é teu segredo para ser tão pretinha? A menina não sabia, mas inventou: – Ah deve ser porque eu caí na tinta preta quando era pequenina… O coelho saiu dali, procurou uma lata de tinta preta e tomou banho nela. Ficou bem negro, todo contente. Mas aí veio uma chuva e lavou todo aquele pretume, ele ficou branco outra vez”. Recriar essa cena, interpretando e narrando juntamente com meus colegas, abriu minha mente para novos horizontes.

Considerando que desde criança sempre fui incentivada a ler, durante o Ensino Fundamental 1 na escola XV de Novembro da minha comunidade local, a Comunidade Quilombola do Paiol, a professora Eliana, nossa querida professora daquela época e até hoje, sempre demonstrou grande dedicação à leitura e aos poemas. Ela costumava nos passar livrinhos literários e históricos, incentivando a criação de contos e recontos. Essa prática constante contribuiu para que eu desenvolvesse um profundo gosto pela literatura e pela leitura. Além disso, vivendo na nossa comunidade, ela contextualizava todas as aulas com nossa experiência de vida, o que significou um avanço significativo no nosso letramento.

Quando ingressei no Ensino Fundamental II, meu amor pela leitura continuou evidente. Adorava passar o tempo na biblioteca durante o recreio. No entanto, a proximidade com a literatura não era mais tão intensa quanto no Ensino Fundamental I. Tínhamos uma aula por semana chamada “Literatura”, onde estudávamos barroco, cordel, entre outros. Embora interessante, não era tão estimulante quanto às atividades criativas do Fundamental I. Mesmo assim, mantive o hábito de ler e comecei a apreciar também a ficção científica, que me proporciona visões do futuro. Quando se trata de ficção científica, pode parecer loucura, mas num mundo tão interconectado e dinâmico, desde pequenos somos rápidos em nos adaptar às tecnologias atuais; no entanto, é crucial sabermos utilizá-las para o bem maior. Além disso, eu amava mergulhar nos quadrinhos da “Turma da Mônica”, do autor Maurício de Sousa, especialmente pelos variados personagens como Chico Bento, Mônica, Magali, entre outros, porque eles me proporcionavam momentos de diversão e me permitiam mergulhar em histórias cativantes e cheias de aventuras.

Havia um aspecto que me desagradava em algumas histórias: o desfecho trágico. Muitas vezes, começavam felizes, mas terminavam de maneira dolorosa e triste. Na escola, participei de eventos onde conquistei títulos, como o primeiro lugar em uma gincana sobre “Reconto”, interpretação e produção de texto de poema, e o segundo lugar em outras competições. Com a chegada da pandemia, o acesso aos livros físicos ficou mais difícil, mas a internet proporcionava alternativas. No entanto, acabei me distanciando um pouco da leitura nesse período.

Ao ingressar na faculdade e explorar a Linguagem e Códigos, percebi que, mesmo antes, tinha contato constante com a literatura, mas minha visão sobre ela não era tão apurada como é hoje. O percurso acadêmico trouxe uma compreensão mais profunda e uma conexão ainda maior com o mundo literário, tornando-me letrada em várias etapas da minha vida. Durante esse período, um docente lançou um desafio: quem fizesse a melhor interpretação em áudio de um trecho do livro “Torto Arado”, de Itamar Vieira Junior, ganharia o livro “Do Amor e Outros Demônios”, de Gabriel García Márquez. Aceitei o desafio, fiz uma interpretação envolvente e ganhei o livro. Depois disso, ao decorrer dessa jornada universitária fui presenteada com vários outros livros: “Como Educar as Crianças no Mundo das Telas” de Igor Amin, “Linguagem e Autismo: Conversas Transdisciplinares,” organizado por Luiz Magnani e Gustavo Ruckert. “Os Vales que Educam,” de Lemes et al. Futuramente, pretendo criar uma pequena biblioteca dentro da minha casa, que é um sonho de infância. Os docentes me deixam feliz quando me presenteiam com um bom livro. Gratidão!

Para mim, a literatura desempenha um papel crucial em minha formação e no meu letramento. Através dela, é possível educar, desmantelar estereótipos, sonhar e imaginar, influenciando meus futuros docentes. Ela se torna um veículo essencial para o desenvolvimento pessoal, proporcionando um meio de expressão e compreensão do mundo que vai além das barreiras cotidianas.



SOBRE A AUTORA:

Caroline Rodrigues Ferreira é acadêmica da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM), na Licenciatura em Educação do Campo. Produziu este relato na disciplina Gêneros Textuais/Discursivos, ofertada de julho a novembro de 2024.

 

 

 

Este trabalho foi orientado pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro e faz parte do livro Memórias de letramentos 5, que pode ser baixado gratuitamente. Clique na capa ao lado.

 

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Memórias de meus letramentos

Memórias de meus letramentos

Resido na comunidade Quilombola Paiol, localizada no município de Cristália-MG. Sou filha de mãe analfabeta e pai alfabetizado. Acredito que meu primeiro contato com os letramentos foi quando ouvia minha mãe contar histórias e causos sobre a comunidade, que me lembro até hoje. Também recordo diversas brincadeiras que tinham a ver com gêneros escritos, como amarelinha e quebra-pedra, entre outras. Aos 6 anos, tive meus primeiros contatos com a Escola Municipal da cidade de Cristália, que fica a nove quilômetros de distância da comunidade.

Naquela época, enfrentei muitos desafios para estudar, inclusive para pegar o transporte escolar, pois tinha que caminhar meia hora a pé, já que o ônibus não chegava até a porta da minha casa. Embora houvesse uma escola dentro da comunidade, minha mãe optou por me matricular na cidade, pois a escola da zona rural funcionava apenas pela manhã. Assim, não havia como eu ir todos os dias a pé, sozinha, até a escola, que ficava a 5 quilômetros de casa. Como meus irmãos estudavam na cidade, facilitava meu deslocamento, já que eles cuidavam de mim e ajudavam a levar meus materiais até o ponto de ônibus.

No ensino fundamental, passei por algumas dificuldades para aprender a ler, embora já tivesse uma boa coordenação motora, desenvolvida nas brincadeiras de ‘escrever’ no chão de terra batida com pedaços de madeira. Na escola, viajantes vendiam livrinhos de histórias de princesas, e meu sonho era adquirir aqueles livros com lindas imagens. Mesmo sem saber ler perfeitamente, eu podia olhar as imagens e, com o CD que acompanhava o kit, ouvir as histórias. Apesar das dificuldades financeiras, meus pais sempre compravam esses kits para mim. Quando eu os adquiri, já tinha uma imaginação de contos de fadas, e minha vontade de ler todos os parágrafos das histórias e interpretá-los era muito grande. Isso foi um dos incentivos para aprender a ler.

Ao longo dos anos, meu desejo pelos estudos foi aumentando, mas sempre tive dificuldade em matemática; as contas eram algo que complicava minha cabeça. Nos anos iniciais, aprendi a contar os primeiros números e depois a fazer operações de soma e subtração. Sempre levava moedas para comprar meu lanche, mas não sabia o valor de muitos números e tinha que perguntar aos funcionários o que poderia comprar. Isso me causava muita vergonha, pois eu queria saber o valor de cada moeda.

Minha família sempre influenciou na escola e no papel dos letramentos, inclusive nos conteúdos voltados à área da matemática. Os principais incentivos partiram do berço familiar, antes mesmo de me alfabetizar, sendo de certa forma influenciada pelo meio social em que vivia. Aos poucos, fui aprendendo a reconhecer o dinheiro e as horas.

Na escola que frequentei durante os anos iniciais, não havia uma biblioteca. Assim, quando precisávamos de algum material ou livro didático-pedagógico, tínhamos que nos deslocar até a Secretaria de Educação, que ficava a cerca de um quilômetro de distância da escola. A locomoção e a distância entre os dois locais dificultavam o acesso contínuo aos livros didáticos. Nos anos finais do ensino fundamental, já não tive mais problemas em relação à biblioteca e às leituras, uma vez que fui estudar na Escola Estadual. Naquele período, os docentes sempre nos incentivavam a realizar atividades articuladas aos livros. No entanto, enfrentei grande dificuldade com leitura crítica e interpretação de texto, e acredito que isso foi um dos resultados da falta de diversidade de leitura no início da alfabetização.

Ao iniciar os estudos na universidade, tive bastante dificuldade com diversos gêneros textuais, com a escrita e com a leitura engajada, entre outros. No entanto, ao longo do tempo, fui praticando e, assim, melhorando tanto na forma de escrever quanto na forma de expressar minhas opiniões sobre diversos temas. Atualmente, me identifico com a linguagem e temas e consigo acompanhar os conteúdos das unidades curriculares, pois são bem contextualizados com a realidade dos educandos.

Vale ressaltar o quanto os estudos, práticas e pesquisas desenvolvidas até aqui têm fortalecido meu processo formativo como educadora do campo. Pretendo enriquecer ainda mais meu conhecimento acadêmico e, assim, no futuro, ter a capacidade de articular conteúdos diversos à realidade dos meus alunos, proporcionando desenvolvimento tanto no processo de aprender quanto de ensinar.



SOBRE A AUTORA:

Amanda Pereira dos Santos é acadêmica da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM), na Licenciatura em Educação do Campo. Produziu este relato na disciplina Gêneros Textuais/Discursivos, ofertada de julho a novembro de 2024.

 

 

 

Este trabalho foi orientado pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro e faz parte do livro Memórias de letramentos 5, que pode ser baixado gratuitamente. Clique na capa ao lado.

 

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Memórias de Letramentos 5 – Apresentação

Memórias de Letramentos 5 – Apresentação

Este é o quinto volume da coleção Memórias de Letramentos, iniciada em 2017 em parceria com meu compadre Luiz Henrique Magnani, também professor da nossa Universidade, a UFVJM. Outros colegas contribuíram em outras edições, como Rosana Baptista dos Santos e Mauricio Teixeira Mendes. Neste volume, sete anos depois, trago para os leitores 10 narrativas autobiográficas de sujeitos dos nossos Vales do Jequitinhonha e Mucuri. Já somos 148 vozes, cada uma com sua identidade, mas muitas similaridades em termos de formação e letramentos. Não necessariamente nesta ordem, o livro conta com dois textos oriundos da Comunidade Quilombola Paiol, situada em Cristália-MG, município que conta também com um terceiro texto. Quatro outras narrativas vêm da Comunidade Quilombola Capivari, situada no Serro-MG; e a Comunidade Quilombola do Peixe Bravo, situada em Riacho dos Machados-MG, é a origem do último dos textos quilombolas. Completam a edição um texto de Diamantina-MG e outro de Coronel Murta-MG.

Temos um livro cheio de emoção, com histórias e reflexões importantes, não apenas para os autores e autoras, estudantes da Licenciatura em Educação do Campo, mas também para pesquisadores e cidadãos comuns que se preocupam com reflexões sobre letramentos, diversidade e educação, ou gostam de textos autobiográficos. São novas vozes que se juntam a outras tantas eternizadas em nossa coleção, com questões antigas, como acesso à educação e certos bens culturais, mas também com experiências lindas de superação, generosidade e criatividade.

Refletir sobre como aprendemos, especialmente com as letras e seus contextos, nos torna cidadãos mais críticos e conectados com a realidade. Pensar sobre como aprendemos nos ajuda a melhorar nossas práticas de aprendizagem e ensino, a promover a autonomia e o diálogo. Em um mundo cheio de informações e armadilhas, altamente letrado em termos de presença da escrita, o professor precisa ser reflexivo e precisa saber lidar com essas mudanças. A ‘leitura de mundo’, defendida por Paulo Freire na Conferência de Abertura do 3° Congresso de Leitura do Brasil (COLE), em Campinas, 1981, vai além da palavra escrita e continua tão necessária quanto nos tempos difíceis que levaram o educador ao exílio. Refletir sobre a realidade de uma educação real, dos vales, que, como tantas existentes em nossos territórios, promove ‘leitura de mundo’.

A escrita dessas memórias fez parte das atividades da disciplina Gêneros Textuais/Discursivos, oferecida para estudantes da Licenciatura em Educação do Campo, habilitação Linguagens e Códigos, em julho de 2024, no período que denominamos Tempo Universidade, que, grosso modo, é um período em que os nossos estudantes do campo comparecem presencialmente à Universidade. Quando não estão na Universidade, aguardam as visitas dos professores em suas comunidades, tarefa que sempre me traz imenso prazer e muitas aprendizagens.

A disciplina incluiu reflexões teóricas e pesquisas práticas sobre letramentos e práticas nas áreas de formação dos alunos-autores e futuros professores. Promover o diálogo entre os estudantes e o público externo à universidade também foi um dos objetivos da disciplina. Para isso, este material foi produzido em etapas que incluíram oficina de escrita de narrativas, revisão, diagramação e edição final. Adicionalmente, cada texto é acompanhado de um podcast, que, em conjunto com estes dez textos que aqui apresento, serão publicados no site do Projeto de Extensão Aula Digital – auladigital.net.br – e divulgados nas redes sociais – instagram.com/auladigital.net.br.

O material também promove troca de saberes, trazendo para a universidade reflexões e ensinamentos sobre como nossa gente aprende, especialmente na adversidade. Assim, nós, os professores, aprendemos com eles em uma saudável inversão de papéis que nos auxilia a descobrirmos os caminhos do saber junto a eles, aprendendo a arte de ensinar e a melhor forma de guiar, transformando-nos em estudiosos e orientadores mediadores mais conectados com o mundo.

Nesse processo de troca e crescimento, vemos a urgência de não apenas abrir os portões das universidades, mas de possibilitar que o caminho seja virtuoso com políticas de permanência, além da necessidade de se manter sempre as janelas abertas para que não se percam o diálogo, as mudanças e a complexidade do mundo.

Para adquirir a obra gratuitamente em formato digital, ou impresso a preço de custo, clique na imagem com as capas dos livros acima, ou na capa do volume 5 abaixo, ou AQUI!

Carlos Henrique Silva de Castro

Outubro/2024

Licenciatura em Educação do Campo (LEC)

Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM)



SOBRE O AUTOR DO TEXTO E ORGANIZADOR DO LIVRO:

Carlos Henrique Silva de Castro é um professor e pesquisador brasileiro que atua no Ensino Superior pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) no curso Licenciatura em Educação no Campo, em cursos de licenciatura da Diretoria de Educação Aberta e a Distância (DEAD) e no Programa de Pós-Graduação em Ciências Humanas (PPG-CH), Linha de Pesquisa Práticas Educacionais, Culturais e Linguagens. Licenciado e bacharel em Letras pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG / 2000-2005), atua nas áreas Linguagem e Tecnologia e Ensino de Português. É doutor em Estudos Linguísticos / Linguística Aplicada pela UFMG (2011-2015), com período sanduíche na University of California, Santa Barbara (UCSB / 2013-2014). Fez estágio pós-doutoral na UFMG (2018-2019) com pesquisa acerca de letramentos digitais e educação. Atuou como consultor da Organização de Estados Ibero-Americanos para a Educação, Ciência e Cultura (OEI). Como professor visitante, fez estágio pós-doutoral na Universidad Complutense de Madrid em associação com a Universidade de Aveiro (2021-2022), com pesquisa de viés etnográfico sobre educação linguística, plurilíngue e multicultural. Mais detalhes sobre sua produção na seção DIVULGAÇÃO CIENTÍFICA e no currículo lattes: https://lattes.cnpq.br/8846976753165320.

 

 

 

Este trabalho foi orientado pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro e faz parte do livro Memórias de letramentos 5, que pode ser baixado gratuitamente. Clique na capa ao lado.

 

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Agroecologia contra o êxodo rural: o caso do Serro/MG

Agroecologia contra o êxodo rural: o caso do Serro/MG

Práticas agroecológicas estão sendo desenvolvidas por moradores da cidade de Serro e região, devido à lacuna percebida na aplicação de atividades econômicas sustentáveis no município. A agroecologia representa uma forma de resistência ao êxodo rural, especialmente nas comunidades quilombolas. O relacionamento entre o campo e a cidade sempre foi mal compreendido, embora sejam espaços interdependentes. No entanto, uma idealização promovida pelo setor econômico e capitalista retrata o homem do campo como alguém atrasado, sem acesso a tecnologias modernas e incapaz de se integrar aos espaços urbanos. Nesse contexto, cabe uma reflexão por parte dos moradores de Serro-MG, onde a agricultura familiar exerceu uma influência significativa na formação do município. No entanto, os moradores afirma

A principal razão para o êxodo rural na região de Serro é a falta de políticas públicas voltadas para o campo, a escassez de acesso à terra para os jovens e a ausência de apoio técnico para sua produção. Esta realidade automaticamente leva as pessoas a abandonarem o campo em busca de melhores condições nas cidades. Muitas vezes, elas escolhem migrar para grandes metrópoles, levando suas famílias consigo, resultando assim no êxodo rural. Em alguns casos, optam por migrar ilegalmente para os Estados Unidos. Segundo Fonseca (2015) [1], “O problema do êxodo rural é uma consequência da mecanização da agricultura, onde os pequenos agricultores não conseguem competir no mercado devido à falta de recursos”.

Consequentemente, os agricultores acabam abandonando suas terras e procurando novas oportunidades nas cidades. Isso enfraquece nossas identidades e contribui para a desterritorialização de espaços que foram conquistados por nossos antepassados, resultando também na perda de nossas culturas. Para tentar resolver parte desses problemas e dar protagonismo às pessoas que realmente vivem no território, a Agroecologia tem sido discutida como uma abordagem sustentável para lidar com a terra na região. Universidades, escolas e associações têm promovido discussões sobre o tema por meio de projetos de extensão, rodas de conversa, feiras agroecológicas e trocas de sementes, com a participação das comunidades.

A prática da agroecologia parte do pressuposto de que não basta apenas produzir para sobreviver bem, mas é essencial produzir com consciência e respeito à natureza e ao local, visando criar condições de sobrevivência. Essas práticas também são capazes de promover a soberania alimentar da população local. Conforme Jesus e Paes (2020) [2] esclarecem, “A comunidade de Capivari é tradicional e preserva suas práticas culturais de manejo ambiental, preparo da terra e conservação de sementes crioulas há várias gerações”. Um exemplo desse movimento dentro do município envolve a participação de jovens e mulheres nas práticas agroecológicas, como o coletivo de Mulheres da Comunidade Quilombola Ausente Feliz. Liderado por mulheres, o coletivo tem promovido diversas iniciativas para geração de renda na comunidade.

O coletivo tem compartilhado experiências e métodos tradicionais de trabalho na terra em eventos regionais e nacionais. Isso destaca a importância de nossas lutas em defesa do uso sustentável do solo em nossos territórios quilombolas, bem como a valiosa permanência dos jovens que se reconhecem e se identificam com o espaço rural. Dessa forma, por meio das técnicas agroecológicas, a comunidade começa a desafiar a ideia de que os grandes capitais, especialmente na nossa região, a partir da mineração, trazem desenvolvimento para a região. No entanto, é importante destacar que os únicos beneficiários dessa exploração são os proprietários das mineradoras, políticos e fazendeiros que concentram grandes riquezas em suas mãos. Não há espaço para mineração onde a agricultura é a base de sustento, ou onde existem comunidades quilombolas.

Portanto, é essencial conscientizar nossa população, especialmente os jovens, sobre os danos que o poder capitalista pode causar. Isso inclui exemplos de abandono de nossas culturas, famílias e áreas rurais. Para efetuar isso de maneira eficiente, devemos criar espaços em escolas, universidades e na própria comunidade, onde possamos discutir esses temas relacionados à Agroecologia e ao êxodo rural, além de destacar o potencial de nossa região para crescer de maneira sustentável na agricultura.

Referências

[1] FONSECA, Wéverson Lima; et al. Causas e consequências do êxodo rural no nordeste brasileiro. Revista Nucleus, v. 12, 2015. Disponível em: https://www.nucleus.feituverava.com.br/index.php/nucleus/article/view/1422/0.

[2] JESUS, Nanci Ribeiro; PAES, Silvia Regina. Horta Comunitária “Jovens de Capivari”. Cadernos de Agroecologia, v. 15, n. 3, 2020. Disponível em: https://cadernos.aba-agroecologia.org.br/cadernos/article/view/6378.



SOBRE O AUTOR

Valderes Quintino Silva é acadêmico da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziu este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre letivo de 2023 (janeiro a junho de 2024). Foi orientado pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

Educação sexual e prevenção da gravidez na adolescência

Educação sexual e prevenção da gravidez na adolescência

A taxa alarmante de gravidez na adolescência no Brasil continua a ser um desafio persistente para as políticas de saúde pública e educação. Segundo dados do governo brasileiro (2023), uma em cada sete mães de recém-nascidos é adolescente, totalizando 1.043 adolescentes se tornando mães todos os dias [1]. Essas estatísticas não apenas representam números impressionantes, mas também revelam uma realidade preocupante: a falta de acesso a informações e educação sexual adequada entre os adolescentes.

O Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos (SINASC), ferramenta do Sistema Único de Saúde (SUS), fornece uma visão sombria da situação, destacando não apenas a prevalência de gravidez na adolescência, mas também a faixa etária preocupante das mães adolescentes. De acordo com os dados, duas das 44 mães adolescentes que dão à luz a cada hora têm entre 10 e 14 anos de idade [1]. Esses números não são apenas estatísticas frias, mas representam vidas jovens afetadas por consequências profundas e duradouras (SUS, 2023).

Por trás desses números estão histórias reais de jovens, como Viviane, do município de Cristália-MG, que aos 15 anos de idade se viu enfrentando uma gravidez não planejada. Viviane compartilhou sua história, revelando uma lacuna preocupante na educação sexual dentro de sua família e escola. Sua mãe não abordou o assunto em casa; na escola, os professores não ofereceram orientação adequada sobre prevenção da gravidez e saúde sexual. Em suas próprias palavras, Viviane não temia a gravidez; o tema era tratado com piadas entre colegas e a falta de informação e apoio a levaram a abandonar os estudos. A história de Viviane não é única. Muitas adolescentes enfrentam desafios semelhantes devido à falta de educação sexual adequada. E isso não é apenas uma questão de evitar a gravidez na adolescência, mas também de promover relacionamentos saudáveis, prevenir doenças e infecções sexualmente transmissíveis e capacitar os jovens para tomarem decisões informadas sobre sua saúde e bem-estar.

Diante desse cenário, é crucial reconhecer o papel fundamental das escolas na educação sexual dos adolescentes. As escolas não apenas têm a responsabilidade de fornecer informações precisas e abrangentes sobre saúde sexual e reprodutiva, mas também de criar um ambiente seguro e acolhedor onde os alunos se sintam à vontade para discutir esses assuntos sem vergonha ou estigma. A inclusão da educação sexual no currículo escolar não é apenas uma questão de fornecer informações sobre anatomia e contracepção; trata-se também de promover valores como respeito, consentimento e igualdade de gênero. Os adolescentes precisam entender não apenas como evitar uma gravidez não planejada, mas também como construir relacionamentos saudáveis e tomar decisões responsáveis em relação à sua vida sexual.

Apesar da alta taxa de gravidez na adolescência e de todas as dificuldades enfrentadas por essas mães adolescentes, esse assunto ainda gera opiniões divididas, especialmente quanto à abordagem nas escolas. Algumas pessoas acreditam que a educação sexual nas escolas não irá ajudar os adolescentes, considerando que pode ser cedo demais para eles serem expostos a certos temas, ou que isso contradiz tradições culturais, religiosas, entre outros aspectos, além de receios sobre incentivar a prática sexual. Segundo a pesquisadora Fabiana Maranhão (2019) [2], o próprio ex-presidente Jair Bolsonaro expressou sua opinião sobre esse assunto, chegando a afirmar que “quem ensina sexo para a criança são o papai e a mamãe”. Outros líderes que são contra a educação sexual nas escolas, além das lideranças políticas, são os religiosos, que argumentam que essa educação pode acarretar “sexualização precoce” ou até mesmo “estimular a troca de sexo”.

Contudo, é de suma importância abordar esse assunto nas escolas, mesmo que gere polêmica. Acreditamos que, quando tratado de forma leve, responsável e inclusiva, pode trazer inúmeros benefícios para crianças e adolescentes. Através dessa educação, eles podem aprender sobre si mesmos, suas emoções e desenvolver o respeito mútuo, além de receber informações essenciais sobre prevenção da gravidez precoce e outros temas relevantes. É crucial que tenham acesso a informações corretas e respeitosas para tomar decisões conscientes sobre suas vidas. A abordagem aberta também ajuda a combater tabus e preconceitos, promovendo uma cultura de respeito e compreensão. Além disso, a participação dos pais e líderes é fundamental para apoiar e complementar essa educação, garantindo que haja um ambiente de apoio e diálogo em casa e na comunidade. Em última análise, a educação sexual nas escolas pode contribuir para a formação de indivíduos conscientes, responsáveis e respeitosos em nossa sociedade.

 

Referências

[1] Ministério da Educação do Brasil. (2023). Por hora, nascem 44 bebês de mães adolescentes no Brasil, segundo dados do SUS. Recuperado de <https://www.gov.br/ebserh/pt-br/comunicacao/noticias/por-hora-nascem-44-bebes-de-maes-adolescentes-no-brasil-segundo-dados-do-sus> Acessado em: 12/02/2024.

[2] Maranhão, Fabiana. (2019). Educação sexual nas escolas é menor do que imaginamos. Recuperado de <https://novaescola.org.br/conteudo/15749/educacao-sexual-nas-escolas-e-menor-do-que-imaginamos> Acessado em: 20/02/2024.



SOBRE AS AUTORAS

Thalyta Cristina Gomes Martins e Vívian Emanuelly Rodrigues Borges são acadêmicas da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziram este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre letivo de 2023 (janeiro a junho de 2024). Foram orientadas pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

O feminicídio e os gritos silenciados

O feminicídio e os gritos silenciados

De acordo com os últimos dados estatísticos do site do G1 (2024) [1], os registros de feminicídio em 2023 aumentaram de forma preocupante no Brasil, com uma média de um caso a cada seis horas. Esta forma de violência desrespeita os direitos humanos e constitui um crime direcionado contra a vida das mulheres unicamente por sua condição de gênero, sendo um grito silenciado das vítimas que pede por justiça e chama a atenção daqueles que não aceitam a normalização do feminicídio.

A violência baseada exclusivamente na condição de gênero reflete uma falha na garantia da igualdade. Esta realidade permite que o medo e a opressão silenciem as vozes das mulheres e neguem seu direito à vida. Segundo a matéria de D. Piccirillo e G. Silvestre no G1 (2023) [2], foi registrado um aumento de 5,5% nos casos de feminicídio no país entre 2021 e 2022, resultando em 1,4 mil mulheres mortas exclusivamente por sua condição de gênero. O feminicídio não é apenas um problema doméstico, mas sim um problema global que deve ser reconhecido e tratado com a devida importância.

As leis, como a Lei Maria da Penha e a Lei do Feminicídio, apesar de representarem avanços na proteção das mulheres contra a violência de gênero, não são suficientes para garantir a prevenção e o combate a essa realidade cruel. No pleno século XXI, é incontestável que o feminicídio se revela como algo preocupante em nossas estruturas sociais e culturais, sendo resultado de um passado permeado por opressões e influências de ideais patriarcais, que contribuem para a continuidade desta situação alarmante, na qual as mulheres são vítimas diárias de violência em diversos contextos, seja nas ruas, em casa ou até mesmo nos ambientes de trabalho.

É importante lembrar que o crime de feminicídio não se restringe a um único perfil de mulher; todas as mulheres estão sujeitas a essa violência. No entanto, segundo Almeida (2023) [3], o Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2023 revelou que, em 2022, 1,9% dos casos de feminicídio no Brasil ocorreram na área rural. A baixa densidade populacional e a distância dessas regiões colaboram para o silenciamento dos casos de feminicídio, mantendo-os longe da atenção pública e das autoridades. Esta realidade é muito comum entre mulheres em situações de vulnerabilidade socioeconômica. Além disso, muitas mulheres criadas em áreas rurais possuem uma concepção de vida ligada à crença de que o homem detém o poder dentro do lar, o que dificulta o reconhecimento e a denúncia, tornando-as mais propensas a permanecer nesse ciclo de violência.

Diariamente, acompanhamos nos jornais casos em que mulheres são assassinadas brutalmente, principalmente por seus companheiros ou ex-companheiros. A impunidade dos agressores é um reflexo da falta de políticas eficientes para a prevenção do feminicídio. Tajra (2023) [4] relatou um aumento de cerca de 40% no número de novos casos de feminicídio e violência doméstica contra a mulher nos tribunais estaduais em 2022. Em relação aos casos pendentes na Justiça, aqueles em andamento ou sem encerramento definitivo, houve um acréscimo de 15%. Inúmeros casos de feminicídio muitas vezes não chegam a ser levados a julgamento, e frequentemente aqueles que passam pelo processo judicial resultam em penas brandas ou absolvições, resultado das lacunas na legislação que contribuem para o aumento deste crime. Isso destaca a importância de questionar os fundamentos jurídicos que podem perpetuar a violência contra as mulheres.

Em contrapartida, há quem diga que o feminicídio é um problema isolado, quando na verdade trata-se de um reflexo alarmante da violência de gênero e da desigualdade estrutural em nossa sociedade, que atenta contra o direito fundamental à vida e à segurança das mulheres. Embora a violência de gênero tenha raízes culturais profundas, políticas governamentais eficazes como a Lei Maria da Penha e a Lei do Feminicídio, que visam acabar com a violência contra a mulher, e outras iniciativas governamentais para o atendimento às vítimas, podem contribuir significativamente para a prevenção deste crime, que frequentemente resulta em altos índices de impunidade.

Por fim, é necessário refletir: como chegamos a um momento em que aceitamos silenciosamente a violência do feminicídio? Esta reflexão aponta uma direção clara; é hora de romper o silêncio e reconhecer a interligação entre diversidade, educação e direitos humanos. Introduzir práticas educativas nos currículos escolares, como palestras que abordem temas como igualdade, violência de gênero e feminicídio, além de promover a conscientização nas escolas e comunidades, contribuiria para a construção de uma cultura de tolerância por meio da educação. Além disso, é fundamental a criação de políticas de justiça social e educacional que sensibilizem sobre questões de gênero. Somente assim será possível promover a diversidade e a educação, rompendo o silêncio que mata e dando voz a esse grito silenciado para garantir os direitos das mulheres.

Referências:

[1] https://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2024/03/07/brasil-registra-em-media-um-feminicidio-a-cada-seis-horas-em-2023.ghtml

[2] https://g1.globo.com/monitor-da-violencia/noticia/2023/03/08/numeros-de-uma-tragedia-anunciada-10-mulheres-assassinadas-todos-os-dias-no-brasil.ghtml

[3] ALMEIDA, Daniella. Margaridas debatem impactos da violência contra mulheres rurais. 2023. Agência Brasil, Brasília. Disponível em: https://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2023-08/margaridas-debatem-impactos-da-violencia-contra-mulheres.

[4] TAJRA, Alex. Registros de feminicídio e violência doméstica contra mulher cresceram 40%. Consultor Jurídico, 2023. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2023-ago-16/casos-feminicidio-violencia-mulher-crescem-40-justica




SOBRE A AUTORA

Taciane Viviane Cunha Nascimento é acadêmica da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziu este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre letivo de 2023 (janeiro a junho de 2024). Foi orientada pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

Complexidades da gravidez precoce: impactos individuais e coletivos

Complexidades da gravidez precoce: impactos individuais e coletivos

A gravidez na adolescência acomete jovens do campo e de vulnerabilidade socioeconômica, sendo consequência da falta de acesso à educação e ao conhecimento. O Brasil lidera em índices de gravidez na adolescência, prevalente sobretudo em zonas rurais e áreas com vulnerabilidade socioeconômica, em comparação com regiões metropolitanas (CRUZ, CARVALHO, IRFFI, 2016) [1]. Segundo a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares [2], ‘um a cada sete bebês brasileiros é filho de mãe adolescente. Por dia, 1.043 adolescentes tornam-se mães no Brasil. A cada hora, nascem 44 bebês de mães adolescentes, das quais duas têm entre 10 e 14 anos de idade’. Esta disparidade é atribuída à falta de acesso à educação e à falta de orientação sexual por parte das famílias e da sociedade, resultando em impactos psicológicos, sociais e econômicos significativos na vida das adolescentes. Em famílias com pouca orientação sexual, as adolescentes enfrentam maior risco de gravidez na adolescência.

Assim, a família desempenha um papel crucial para reduzir esses índices, especialmente porque afetam mais jovens. Também é uma consequência do ‘tabu’ em discutir sexualidade com meninas, devido ao papel social tradicional atribuído à mulher desde tempos antigos, onde há uma pressão para que se casem jovens e formem família, de acordo com normas sociais. Ainda hoje, há casamentos na adolescência, aumentando as taxas de gravidez e suas consequências biopsicossociais às adolescentes. Quando se trata de sexualidade, muitas questões estão envolvidas, como vergonha, cultura e preconceito, o que muitas vezes impede os pais de dialogar diretamente com os filhos, resultando em conversas indiretas e falta de compreensão dos filhos sobre o tema (Silva, 2011) [3].

A falta de orientação sexual por parte dos pais é uma das consequências da gravidez na adolescência. Falar sobre sexualidade com os filhos é crucial, especialmente com as adolescentes, que são as mais afetadas por uma gravidez indesejada. Para uma educação sexual eficaz, é necessário o diálogo, que deve começar na família. A escola também desempenha um papel importante na construção de conhecimento, mas enfrenta resistência por parte dos professores ao abordar sexualidade, devido ao ‘tabu’ e ao preconceito que persistem nas escolas. Muitos profissionais se sentem desconfortáveis em discutir sexualidade devido à falta de educação sexual recebida dos pais, perpetuando a visão de que o assunto deve ser tratado exclusivamente em casa. Com a falta de informação, os jovens não têm conhecimento sobre métodos contraceptivos para evitar gravidezes indesejadas ou infecções sexualmente transmissíveis. Segundo Taborda (2014, p. 20 [4]):

Com relação à prevenção, três fatores são comumente associados. O primeiro é a ideia de que a gravidez na adolescência resulta da falta de informação sobre métodos contraceptivos; o segundo é a relação entre contracepção e iniciação sexual, onde quanto mais precoce a iniciação sexual, menores são as chances de uso de métodos contraceptivos; e o terceiro é a correlação entre escolaridade e contracepção, onde maior escolaridade aumenta as chances de uso de métodos contraceptivos na primeira relação sexual e subsequentes.

 

Estes fatores destacam a importância da educação sexual para adolescentes, ensinando sobre métodos contraceptivos como camisinhas e pílulas anticoncepcionais, os mais utilizados. Além disso, enfatiza a importância de que a família converse abertamente com os adolescentes sobre sexualidade, pois o diálogo tardio aumenta as chances de gravidez. Finalmente, mostra a influência positiva da escolaridade na utilização de métodos contraceptivos, reduzindo as chances de gravidez precoce e indesejada.

A gravidez na adolescência pode interromper a educação e limitar as oportunidades profissionais, levando a dificuldades econômicas e menor estabilidade financeira. Esta condição precoce também pode afetar o desenvolvimento pessoal e social, restrito a participação em atividades e crescimento individual, podendo alterar os relacionamentos familiares e sociais, representando barreiras para jovens alcançarem metas pessoais e profissionais. Segundo Borges (2016, p.15) [5]:

Há uma preocupação significativa com as consequências da maternidade precoce para a saúde, educação e desenvolvimento econômico e social, devido à dificuldade de desenvolvimento educacional e social da adolescente, bem como sua capacidade de utilizar todo o seu potencial individual. Como resultado, observa-se maior taxa de abandono escolar, desajustes familiares e dificuldade de inserção no mercado de trabalho.

 

Explorar as complexidades e impactos da gravidez precoce na adolescência é essencial para compreender suas ramificações sociais e individuais. A evasão escolar é uma questão delicada que pode ser exacerbada pela gravidez precoce. Para adolescentes mães, conciliar responsabilidades familiares com estudos é desafiador, com cuidados infantis interferindo na frequência escolar e no foco acadêmico, levando muitas adolescentes a abandonarem a escola, aumentando as taxas de evasão e limitando futuras oportunidades educacionais e de emprego, perpetuando o ciclo de pobreza e desigualdade social. Abordar essas questões é fundamental para a urgente necessidade de educação sexual e apoio familiar para jovens adolescentes em vulnerabilidade socioeconômica que se tornam mães precocemente.

Um contra-argumento identificado é que, ao engravidarem, as jovens frequentemente abandonam seus estudos para cuidar dos filhos. No entanto, há estudos, como o de Taborda e colaboradores (2014) [4] em Belém do Pará, que mostram o contrário: a gravidez na adolescência fortalece a permanência das jovens na escola. Os pesquisadores atribuem isso ao desejo das jovens de usar a escola como um meio de mobilidade social e para realizar seus projetos de vida e oferecer uma vida melhor para seus filhos e para si mesmas.

Uma intervenção viável nas escolas para transformar essa realidade seria a realização de palestras sobre sexualidade e estratégias para manter as adolescentes no ambiente escolar. Políticas públicas direcionadas às populações vulneráveis socioeconômicas podem ampliar o acesso ao conhecimento, desconstruindo o papel social tradicional das mulheres e promovendo maior independência financeira e emocional para os jovens, especialmente as adolescentes.

 

REFERÊNCIAS

[1] CRUZ, Mércia Santos; CARVALHO, Fabrícia Jóisse Vitorio; IRFFI Guilherme. Perfil socioeconômico, demográfico, cultural, regional e comportamental da gravidez na adolescência no Brasil. Planejamento e Políticas Públicas – PPP, n.46, p. 243- 266, 2016.

[2] Gov.br: Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares. Por hora, nascem 44 bebês de mães adolescentes no Brasil, segundo dados do SUS. São Luís, 13 fev. 2023. Disponível em: https://www.gov.br/ebserh/pt-br/comunicacao/noticias/por-hora-nascem-44-bebes-de-maes-adolescentes-no-brasil-segundo-dados-do-sus. Acesso em 25/03/2024

[3] SILVA, Marli de Fátima. Sexualidade e gravidez na adolescência. Trabalho de conclusão de curso apresentado ao curso de especialização em atenção básica em saúde da família da Universidade Federal de Minas Gerais como parte das exigências para obtenção de título de especialista. UFMG, Campos Gerais – MG, 2011.

[4] TABORDA, Joseane Adriana et al.. Consequências da gravidez na adolescência para as meninas considerando-se as diferenças socioeconômicas entre elas. Cad. Saúde Colet. Rio de Janeiro, n. 22, p. 16-24, 2014.

[5] BORGES, Daniela Monise de Souza. Amamentar, ato de amor e perseverança: o que as mães adolescentes pensam sobre isso? Monografia – (Bacharelado em Enfermagem) – Universidade Federal do Piauí, Pícos, 2016.




SOBRE AS AUTORAS

Silmara da Silva Pereira e Taliele Santana Higino são acadêmicas da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziram este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre letivo de 2023 (janeiro a junho de 2024). Foram orientadas pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

Agroecologia nas escolas

Agroecologia nas escolas

O Vale do Jequitinhonha é uma região de Minas Gerais que há muito tempo convive com o êxodo rural. Muitas pessoas deixaram e continuam deixando o Vale em busca de oportunidades no corte de cana-de-açúcar, na colheita de café, entre outras atividades. Nesse sentido, o ensino de agroecologia nas escolas pode contribuir para a valorização territorial e, consequentemente, evitar o êxodo rural no Vale do Jequitinhonha.

O êxodo rural é um fenômeno de migração da população rural para as áreas urbanas, um problema preocupante em todo o Brasil. O jornal Brasil de Fato mostra que: “De acordo com dados do Banco Mundial, o percentual de habitantes do país que vivem no campo caiu 33,8% de 2000 a 2022. No mundo, a redução foi de 19,2%.” (Konchinski, 2024) [1]. Ou seja, o êxodo rural no Brasil está muito acima da média global. Isso também se reflete no Vale do Jequitinhonha, como revela uma matéria do jornal Estado de Minas, que evidencia os impactos do êxodo rural com o surgimento de cidades fantasmas, onde a maioria dos moradores migrou em busca de oportunidades de emprego. Segundo a matéria, essa migração intensificou-se nos últimos anos e tem resultado no aumento das casas abandonadas. (Ribeiro, 2018) [2].

A introdução da agroecologia nas escolas é um fator determinante para mudar essa realidade, pois não apenas promove a valorização territorial, mas também forma indivíduos críticos capazes de compreender sua própria realidade e engajar-se na luta por melhorias. Além disso, a agroecologia confronta o modelo hegemônico de agricultura capitalista, representando tanto a ciência quanto o saber dos sujeitos do campo que buscam uma agricultura que respeite e valorize tanto a natureza quanto o ser humano. Altieri (2012) [3] argumenta que a agroecologia mescla ciência e prática. Partindo desse pressuposto, Caldart (2016) [4] enumera cinco razões fundamentais para integrar a agroecologia nas escolas. Dentre elas, destacamos a quinta, de natureza epistemológica e pedagógica:

Se nossos objetivos formativos são de longo prazo e visam à construção de novas relações sociais, é necessário trabalhar com uma concepção de conhecimento que ajude na compreensão de como os fenômenos naturais e as relações sociais são produzidos, como a realidade se movimenta e transforma.’ (Caldart, 2016, p. 7)

 

Portanto, a agroecologia é crucial no processo educativo, permitindo a discussão sobre as diversas relações sociais e as complexidades da sociedade contemporânea, incluindo fenômenos como o êxodo rural. A agroecologia, por ser um conjunto de conhecimentos diversos, facilita o debate sobre realidades locais e globais frequentemente moldadas por um projeto de sociedade capitalista.

Outro aspecto significativo da agroecologia nas escolas é a construção e consolidação da identidade camponesa. No Vale do Jequitinhonha, é fundamental fortalecer essa identidade diante do discurso frequentemente propagado de que o Vale é uma região de pobreza e miséria, o que estigmatiza a localidade. Assim, formar indivíduos críticos sobre sua realidade é um passo para reduzir o êxodo, à medida que os estudantes aprendem sobre as possíveis conexões com a produção sustentável e uma sociedade mais justa e igualitária para todos, um princípio fundamental da agroecologia contra-hegemônica. Weisheimer (2005) [5] defende que a escola é crucial na formação da identidade da juventude rural, embora haja um descompasso entre o modelo escolar atual, derivado das sociedades industriais urbanas, e as especificidades das comunidades rurais, contribuindo assim para o êxodo rural, ao invés de mitigá-lo.

Por outro lado, muitas pessoas consideram que ensinar agroecologia nas escolas é irrelevante, argumentando que é apenas mais um método de produção ou que não é suficiente para resolver a complexidade do êxodo rural. No entanto, a agroecologia vai além disso, sendo um modo de vida que abraça a diversidade, não apenas um projeto agrícola, mas um projeto de sociedade que valoriza diferenças de conhecimento e forma indivíduos críticos capazes de questionar sua própria realidade rural e o fenômeno do êxodo, mobilizando-se para a mudança.

Portanto, é crucial debater a agroecologia nas escolas, considerando toda a sua complexidade. Tais debates podem resultar em projetos interdisciplinares, já que a agroecologia é por si só uma ciência interdisciplinar. Apesar dos desafios de fragmentação no ensino, a inclusão da agroecologia pode ser extremamente benéfica, inclusive para reduzir o êxodo rural. Cada disciplina pode contribuir para reflexões sobre agroecologia: disciplinas de linguagens e códigos podem explorar a relação entre linguagem e agroecologia, análise do discurso capitalista com os estudantes e a produção de diversos tipos de textos. Nas disciplinas de ciências da natureza, pode-se abordar questões práticas da agroecologia, ecossistemas, agroecossistemas e tudo o que envolve a natureza. Já nas matérias de ciências humanas, pode-se destacar os processos sociais envolvendo o surgimento da agroecologia, as lutas dos movimentos sociais e outras questões políticas e sociais relevantes para o estudo da agroecologia. Dessa forma, é possível implementar na escola projetos agroecológicos que combinem contribuições práticas e teóricas de todas as disciplinas.

 

Referências

[1] KONCHINSKI, V. Êxodo rural no Brasil é quase o dobro da média mundial e desafia sustentabilidade do campo e cidade. Brasil de Fato. Curitiba, 18 fev. 2024. Disponível em: <https://www.brasildefato.com.br/2024/02/18/exodo-rural-no-brasil-e-quase-o-dobro-da-media-mundial-e-desafia-sustentabilidade-do-campo-e-cidade>. Acesso em 19/03/2024.

[2] RIBEIRO, L. Êxodo rural deixa cidades fantasmas no Vale do Jequitinhonha. Estado de Minas, abr. 2018. Disponível em: <https://www.em.com.br/app/noticia/economia/2018/04/17/internas_economia,952184/exodo-rural-deixa-cidades-fantasmas-no-vale-do-jequitinhonha.shtml>. Acesso em 19/03/2024

[3] ALTIERI, M. Agroecologia: bases científicas para uma agricultura sustentável. 3ª ed. (revista e ampliada), São Paulo/Rio de Janeiro: Expressão Popular/AS-PTA, 2012.

[4] CALDART, R. S. Escolas do Campo e Agroecologia: uma agenda de trabalho com a vida e pela vida. Porto Alegre, 2016.

[5] WEISHEIMER, N. Juventudes rurais: mapa de estudos recentes. Brasília: MDA/NEAD, 2005.

 



SOBRE OS AUTORES

Rozilene Pereira da Silva e Denilson da Silva Pereira são acadêmicos da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziram este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre letivo de 2023 (janeiro a junho de 2024). Foram orientados pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

Famílias LGBTs e o bom desempenho escolar dos filhos

Famílias LGBTs e o bom desempenho escolar dos filhos

O debate em torno da diversidade familiar tem ganhado cada vez mais destaque, especialmente no que diz respeito ao impacto das novas dinâmicas socialmente aceitas na educação de crianças e adolescentes. Nesse contexto, as famílias LGBTQIAPN+ têm sido objeto de análise devido à sua crescente visibilidade e representatividade na sociedade contemporânea. Aqui defende-se a tese de que filhos de pais LGBTQIAPN+ tendem a ter um desempenho educacional positivo, e que ambientes familiares inclusivos, que celebram a diversidade, contribuem para o desenvolvimento educacional das crianças. Diante desse cenário, é crucial compreender e reconhecer a importância do apoio familiar para o desenvolvimento educacional das crianças criadas por pais LGBTQIAPN+.

Conforme Gonçalves (2018) [1], um dos pilares essenciais a ser destacado é o papel que o apoio familiar desempenha no desenvolvimento acadêmico e socioemocional das crianças. Pais LGBTQIAPN+ frequentemente proporcionam um ambiente familiar marcado pela comunicação aberta, apoio emocional, participação ativa na vida dos filhos e valorização da educação. Esses elementos são fundamentais para estabelecer um contexto propício ao aprendizado e ao crescimento das crianças, independentemente da orientação sexual ou identidade de gênero dos pais.

Segundo Faria (2020) [2], a comunicação franca e aberta entre pais e filhos promove um ambiente de confiança e compreensão, permitindo que as crianças expressem livremente seus pensamentos, sentimentos e preocupações. O apoio emocional oferecido pelos pais LGBTQIAPN+ ajuda a fortalecer o bem-estar mental das crianças, proporcionando-lhes o suporte necessário para enfrentar os desafios da vida cotidiana. De acordo com Oliveira (2018) [3], o envolvimento parental ativo demonstrado por pais LGBTQIAPN+ também cria um senso de segurança e pertencimento nas crianças, mostrando-lhes que são amadas e valorizadas em seu ambiente familiar. Essa valorização da educação, por sua vez, estimula o interesse pela aprendizagem e pelo desenvolvimento pessoal, incentivando as crianças a explorarem seu potencial máximo.

Além disso, a desconstrução de estigmas e preconceitos desempenha um papel crucial na promoção de um ambiente educacional inclusivo e acolhedor. Conforme Faria (2020) [2], ao desafiar estereótipos de gênero e sexualidade e ao promover uma cultura de aceitação e respeito mútuo, essas famílias criam um contexto favorável para o aprendizado das crianças. Esse ambiente é fundamental para o desenvolvimento de habilidades socioemocionais, como empatia, resiliência e pensamento crítico, que desempenham um papel fundamental no sucesso acadêmico e pessoal das crianças. Segundo Gonçalves (2018) [1], ao oferecer um espaço onde a diversidade é celebrada e as diferenças são respeitadas, as famílias LGBTQIAPN+ contribuem significativamente para a formação de indivíduos mais tolerantes, abertos e preparados para enfrentar os desafios da vida e contribuir para uma sociedade mais inclusiva.

Por outro lado, é importante reconhecer que ainda existem desafios a serem superados. Ribeiro (2023) [4] aborda que, apesar do progresso alcançado, as famílias LGBTQIAPN+ continuam a enfrentar discriminação e estigma em muitos contextos sociais. Portanto, é crucial implementar políticas e práticas educacionais inclusivas que garantam um ambiente seguro e acolhedor para todos os alunos, independentemente da composição de suas famílias.

Nesse sentido, conforme apontado por Silva (2023) [5], intervenções no contexto escolar, como a implementação de políticas antidiscriminatórias, a inclusão de conteúdos curriculares que abordem a diversidade familiar, questões de gênero, sexualidade e a criação de espaços seguros para estudantes LGBTQIAPN+, são fundamentais para promover uma cultura de respeito e inclusão. Além disso, a colaboração com pais e responsáveis é essencial para garantir o sucesso dessas iniciativas e promover uma cultura de apoio e compreensão mútua.

Diante do exposto, destacamos a importância de reconhecer e valorizar a diversidade familiar, especialmente no contexto das famílias LGBTQIAPN+, e seu impacto positivo no desenvolvimento educacional de crianças e adolescentes. É fundamental reconhecer que as famílias LGBTQIAPN+ enfrentam desafios únicos, como estigma, discriminação e falta de reconhecimento legal, que podem impactar o ambiente familiar e, consequentemente, o desenvolvimento educacional das crianças. No entanto, também é evidente que essas famílias podem oferecer um apoio emocional sólido, além de promoverem a diversidade e a desconstrução de estereótipos, iniciativas propícias ao aprendizado e ao desenvolvimento pessoal.

Assim, reconhecer e valorizar a diversidade familiar, especialmente no contexto das famílias LGBTQIAPN+, é fundamental para promover uma sociedade mais inclusiva e justa. Ao promover políticas e práticas educacionais inclusivas, podemos garantir que todas as crianças tenham acesso a uma educação de qualidade e se sintam valorizadas em seu processo de aprendizagem. Portanto, é imperativo que continuemos a apoiar e valorizar as famílias LGBTQIAPN+, reconhecendo o papel crucial que desempenham no desenvolvimento educacional de crianças e adolescentes.

 

Referências

[1] GONÇALVES, Sara Sofia Basílio. Envolvimento do Aluno Na Escola, Percepção de Apoio Familiar e Desempenho Escolar. Dissertação de Mestrado. Universidade da Madeira (Portugal) ProQuest Dissertations Publishing, 2018. 

[2] FARIA, Margareth Regina Gomes Veríssimo de. Apoio Social Como Fator de Proteção para Vitimizações e Desempenho Escolar. Avaliação em Psicologia, v. 19, 2020.

[3] OLIVEIRA, Gualber Pereira Silva de. A inclusão de filhos(as) de casais homoparentais em escolas da zona sul de Natal (RN). Dissertação (Mestrado em Educação). Programa de PósGraduação em Educação, da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte, 2018, 120p.

[4] RIBEIRO, A. B. O.. Descoberta e aceitação: relatos de experiência de um grupo de lésbicas e de gays. Palimpsesto, v. 22, 2023. Disponível em: https://doi.org/10.12957/palimpsesto.2023.70350. Acesso em 30/05/2024.

[5] SILVA, Viviane Flores da. Gênero, sexualidade e prática docente: desafios e perspectivas na educação. Trabalho de conclusão de curso. Pedagogia Plena. Universidade Federal de Santa Maria. Santa Maria, RS, Brasil. 2023.




SOBRE AS AUTORAS

Maria Amélia Martins Sousa e Maria Rosa Marques de Matos são acadêmicas da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziram este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre letivo de 2023 (janeiro a junho de 2024). Foram orientadas pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

Agroecologia, sexualidade, gênero e êxodo rural

Agroecologia, sexualidade, gênero e êxodo rural

A agroecologia nos últimos tempos tem sido tema de muitos debates no Brasil, pois além de ser o principal meio de sustentabilidade econômica, que preza pelo cuidado com as pautas da sexualidade, afirmações de gênero e na redução do êxodo rural, é o futuro para as comunidades do campo. Nas atividades campesinas, o diálogo sobre a sexualidade faz parte de uma educação muito mais ampla e complexa. Nessa perspectiva educacional, o êxodo rural é um dos principais pontos de discussão, visto que evitar a saída das pessoas de suas próprias comunidades, através de formações na área da agroecologia, pode fortalecer seus conhecimentos e enriquecer seus aprendizados sobre a vida e sobre si mesmas.

Para discutir a agroecologia como fundamental para as afirmações e relações de gênero e sexualidade em comunidades do campo, citamos o artigo “Convergências e divergências entre feminismo e agroecologia”, publicado na revista Ciência e Cultura por Ferreira e Mattos (2017). Esses pesquisadores consideram fundamental o feminismo na agroecologia, pois beneficia questões tecnológicas, produtivas e ambientais. Além disso, a agroecologia promove a justiça e equidade nas relações de gênero e afirmações de sexualidades. Como sabemos, a agricultura familiar, com técnicas agroecológicas tradicionais, sempre foi a base da sustentabilidade econômica do país. No entanto, o Estado precisa dar mais visibilidade a esse meio de subsistência e às relações das pessoas, uma vez que são as plantações das pessoas do campo que fornecem alimentos saudáveis e livres de produtos químicos para as cidades, possibilitando assim a soberania alimentar.

A coautora deste trabalho, Marciléia Silva, é coordenadora do Coletivo de Agroecologia Quilombo Ausente Feliz; é uma mulher preta, quilombola, mãe, graduanda em Educação do Campo e agricultora de 34 anos. Em diálogo com as vivências da coordenadora Marciléia, afirmamos que a agroecologia colabora com: (i) autonomia, inclusão e diversidade nas práticas agroecológicas; (ii) geração de renda e afirmação de identidades e territorialidades em combate ao êxodo rural; e (iii) fortalecimento de bases e empoderamento em várias dimensões sociais, como, por exemplo, no âmbito político. A partir de conversa informal com a coordenadora Marciléia, outras considerações são importantes. Sobre a permanência dos jovens nas atividades do campo e sobre a sexualidade dentro das práticas agroecológicas, a coordenadora disse que o coletivo é formado por 20 integrantes, dos quais 19 se identificam como mulheres (incluindo uma mulher lésbica) e 1 homem, cuja sexualidade não é revelada publicamente. Além disso, 2 pessoas são jovens e as demais são adultas com mais de 30 anos de idade.

Segundo Marciléia, em qualquer outro ambiente, uma pessoa mais velha tem dificuldade para conversar com um filho sobre várias questões que envolvem o desenvolvimento do corpo. Já em processos de formação orientados pela agroecologia, essa pessoa aprende a deixar o receio de lado e é auxiliada a perceber os momentos de diálogo sobre questões que envolvem sexualidade e identidade de gênero, proporcionando a liberdade de conversar com seus filhos(as) e assim compreendê-los. Isso ajuda a evitar que eles queiram sair da comunidade por causa da falta de aceitação da família e da sociedade.

A coordenadora afirma que “a agroecologia é muito significativa para o coletivo, porque, com o cuidado que o grupo tem com a terra e ao usar apenas insumos naturais, evitam agredir o meio ambiente.” No entanto, destacam-se as relações sociais e culturais dentro da agroecologia que abrem espaço para questões de gênero e a pauta da sexualidade, fortalecendo o diálogo no grupo e nos núcleos familiares. Sobre isso, complementa que “a partir dessas discussões, uma grande conquista hoje é a distribuição das tarefas domésticas entre os membros da família, que não ficam mais apenas sob responsabilidade das matriarcas.” Além disso, essas mulheres hoje já participam abertamente e publicamente de eventos e palestras com temas diversos.

Durante o IV Encontro Nacional de Agroecologia (ENA), em um debate da Plenária das Juventudes, foram registradas manifestações dos participantes. Segundo o Website Jornalistas Livres (2018), a agroecologia compreende as mulheres, os LGBTs, os negros e outros seres humanos que compõem todo esse universo da diversidade. A matéria também afirma que a não aceitação da diversidade e a invisibilidade, principalmente do sujeito LGBT, na construção da agroecologia, é um dos principais motivos da migração das pessoas para a cidade, onde buscam maior aceitação no mercado de trabalho.

Os grupos LGBT tendem a sofrer muitos preconceitos no campo, com a estrutura tradicional de família e a falta de acesso a variedades de formações que possam compreender a necessidade de aceitação das outras pessoas com orientações sexuais diferentes das padronizadas pela comunidade. Nesse ínterim, cabe destacar a importância de valorizar a discussão sobre a permanência nas atividades do campo, desmistificando argumentos como a falta de identificação com o cotidiano rural, a remuneração reduzida, as dificuldades na obtenção de crédito, a falta de acesso à cultura e ao lazer, entre outras justificativas falsas que os jovens acreditam quando se sentem desmotivados a se empoderarem e a buscar por seus direitos e autonomias dentro da agroecologia, optando por migrar para as cidades. Eles precisam entender que a falta de conhecimento e de políticas públicas pode ser resolvida com uma organização social consciente e disposta a acessar seus direitos. Além disso, precisam aprender a precificar seus produtos, a participar de feiras municipais e regionais e a pesquisar sobre os créditos disponíveis para agricultores, como o Pronaf e outras linhas de crédito oferecidas por instituições bancárias, melhorando assim sua remuneração.

Apesar de muitos argumentos defenderem a migração para a cidade, o senso de pertencimento, o empoderamento e as relações territoriais sólidas são bases para a construção política dos sujeitos do campo que lutam por seus direitos e por políticas públicas. Embora algumas já existam, elas são inacessíveis devido às segregações do sistema social e capitalista. Baseado nas justificativas do êxodo rural, o autor Florêncio et al. (2023) [2], em seu artigo “A juventude rural e as questões do êxodo rural: Uma breve revisão”, afirma que a falta de estímulo na sucessão familiar dos serviços rurais impulsiona os jovens a procurarem outras profissões, sendo essa sua principal razão para abandonar as atividades rurais. Em contrapartida, a luta começa com a reconstrução dessa argumentação, com o objetivo de mostrar que a agroecologia também é uma ótima opção para a autonomia financeira nas comunidades camponesas e uma profissão digna de ser vivida.

O autor Florêncio et al. (2023) [2] defende que o contexto no qual o jovem do campo está inserido possibilita a tomada de decisão de permanecer no ambiente agrícola. Com base nisso e na função dos pais e da comunidade em inserir os jovens nesse ambiente, a agroecologia é também um método de mitigar o êxodo, a partir da autonomia de cada sujeito, com o objetivo de reconhecer que a agroecologia “propõe relações justas, equitativas e equilibradas entre as pessoas e o ambiente” (Pinto, Calbino, 2020) [3]. Nesse sentido, pode fornecer renda e contribuir para a melhoria da qualidade de vida, baseada na soberania alimentar e na sustentabilidade.

À medida que as pessoas do campo vão tendo os seus trabalhos reconhecidos, elas se tornam mais empoderadas no seu próprio território; e isso, gera o desejo de continuar em seu lugarejo e, consequentemente, a diminuição do êxodo rural e das superlotações das periferias das grandes cidades. Um caminho a percorrer é reforçar o diálogo aberto nas comunidades fortalecendo as relações sociais e culturais. Esse fortalecimento pode vir por meio de projetos educacionais interdisciplinares nas escolas, que explorem a agroecologia como tema central, incentivando os estudantes a compreenderem a importância da prática para a sustentabilidade econômica, inclusão social com base no diálogo sobre gêneros e sexualidade e a redução do êxodo rural.

Isso pode incluir atividades práticas, como a criação de pequenas hortas agroecológicas na escola, palestras sobre sustentabilidade, diversidade e inclusão nas atividades agroecológicas, e debates sobre a importância da agroecologia na preservação do ambiente e no combate ao êxodo rural. Além disso, poderia incluir também, visitas a comunidades que desempenham atividades ligadas a agroecologia, palestras com especialistas e a realização de outras atividades dinâmicas relacionadas à agroecologia. Essa iniciativa visa não apenas a educar, mas também a incentivar a reflexão sobre a contribuição de cada indivíduo para a construção de comunidades mais sustentáveis e inclusivas.

Referências

[1] FERREIRA, Ana Paula Lopes; MATTOS, Luís Cláudio. Convergências e divergências entre feminismo e agroecologia. Ciência e Cultura. v. 69, São Paulo, 2017.

[2] FLORÊNCIO, T. S.; VASCONCELOS, O.; QUIRINO, J. M.; SANTOS, I. J. O. A juventude rural e as questões do êxodo rural: Uma breve revisão. Ciências Rurais em Foco, v. 9, 2023.

[3] PINTO, Luiz Henrique Rocha; CALBINO, Daniel. Sem diversidade (sexual) há Agroecologia? Proposta de uma agenda política. Cadernos de Agroecologia – Anais do XI Congresso Brasileiro de Agroecologia, São Cristóvão, Sergipe, v. 15, 2020.




SOBRE OS AUTORES

Marciléia S. Silva e Matheus H. Rocha são acadêmicos da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziram este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre letivo de 2023 (janeiro a junho de 2024). Foram orientados pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

Acesso à educação e a realidade da cultura do estupro

Acesso à educação e a realidade da cultura do estupro

A violência contra a mulher é um tema debatido em diversos espaços sociais, especialmente os casos de estupro, que, segundo uma pesquisa do IPEA [1], chegam a 822 mil por ano no Brasil. O número é alarmante e preocupante, pois muitas dessas vítimas são adolescentes e, frequentemente, os agressores são pessoas próximas das vítimas. Além disso, há um sério impacto na saúde física e mental dessas mulheres. De acordo com a BBC Brasil, a maioria das vítimas são mulheres com baixa escolaridade, especialmente adolescentes, conforme dados do IPEA, Sinan, Datafolha e outros divulgados pelo gov.br.

A educação é fundamental para mudar essa realidade; a educação sexual, especificamente, pode transformar a sociedade. Se as escolas educassem meninos e meninas sobre o respeito ao corpo do outro, certamente esses números seriam diferentes. A escola deveria ensinar às crianças e adolescentes que os homens não têm o direito de exercer poder sobre o corpo das mulheres, especialmente em uma sociedade estruturalmente machista onde as famílias frequentemente falham nesse papel. Tavares (2019) [2] afirma:

A escola tem o papel de oferecer aos educandos condições para um desenvolvimento pleno, tanto escolar quanto psicológico, sexual e social. Dessa forma, ela desempenha um papel crucial no apoio às vítimas de violência infantil, estabelecendo laços de afetividade e confiança no convívio diário entre professores e alunos, o que permite ao educador identificar alterações no corpo, comportamento, humor e capacidade de aprendizado dos educandos. (Tavares, 2019, p. 15)

 

A falta de informação e de educação, bem como as questões socioeconômicas, são fatores que contribuem para essa realidade. Quando a mulher conhece seus direitos, ela se torna empoderada e deixa de ser um alvo fácil para os estupradores. Uma lei foi criada para combater casos de assédio e estupro em locais públicos: a lei ‘Não é Não’, de acordo com Sofia Cerqueira da Veja [3]. Esta lei obriga os estabelecimentos a proteger e apoiar imediatamente as vítimas, mas é falha ao não abranger espaços como igrejas/cultos, onde também ocorrem casos, principalmente de assédio. Em 2022, um pastor foi denunciado por assediar uma jovem da igreja através de mensagens. Segundo informações do site G1.com [4], o pastor assediou a vítima por dois anos. Apesar das leis e campanhas de combate a esse tipo de crime, vemos autoridades políticas incentivando o crime. Em 2016, o então deputado federal Jair Bolsonaro tornou-se réu por afirmar que Maria do Rosário, também deputada, não merecia ser estuprada por ser feia. A declaração do deputado pode ser conferida no G1.com [5]:

Ela não merece, porque é muito ruim, é muito feia, não faz meu gênero, jamais a estupraria. Eu não sou estuprador, mas, se fosse, não iria estuprar porque ela não merece.

Além do crime hediondo que é o estupro, há outra atrocidade envolvida: grande parte da sociedade culpa a vítima pelo crime, argumentando que ela provocou o ato, seja por sua vestimenta, comportamento ou pelo local que frequenta. Segundo dados do site Desconstrucaodiaria.com [6], a partir de uma pesquisa do IPEA em 2013, 26% dos entrevistados concordam totalmente ou parcialmente com a afirmação de que ‘mulheres que usam roupas que mostram o corpo merecem ser atacadas’, e 58,5% concordam totalmente ou parcialmente com a afirmação de que ‘se as mulheres soubessem se comportar, haveria menos estupros’.

A falta de acesso à informação, a negligência das autoridades, o medo e o machismo da sociedade favorecem e perpetuam a ideia de que a vítima é responsável pelo estupro. Isso leva muitas mulheres a não denunciarem seus agressores. Essa visão machista e violenta é sustentada pelo patriarcado e por sistemas racistas e escravistas que objetificam e sexualizam a mulher. Além disso, o papel de algumas instituições, incluindo igrejas, na perpetuação dessas ideias é significativo. Explorar como esses sistemas sustentam e perpetuam a cultura do estupro pode ser fundamental para destacar a importância da educação sexual e da mudança dessas estruturas.

A educação sexual ainda é a melhor maneira de combater o estupro. Ao educar os jovens sobre respeito mútuo, consentimento e igualdade de gênero, podemos transformar a sociedade e reduzir os casos de estupro e violência contra a mulher. É fundamental desafiar os estereótipos de gênero prejudiciais e promover a igualdade em todos os níveis da sociedade. Investir na educação, promover a igualdade de gênero e apoiar as vítimas são passos essenciais para combater a cultura do estupro e criar uma sociedade mais segura e justa para todos.

Existem várias ações coletivas que os órgãos governamentais podem adotar para prevenir o estupro e promover um ambiente mais seguro e respeitoso, especialmente para as mulheres. Garantir que as vítimas de estupro tenham acesso ao apoio, assistência jurídica e serviços de saúde mental adequados, responsabilizar os agressores por seus atos e promover uma cultura de responsabilidade pessoal em relação ao consentimento, além de envolver a comunidade em discussões sobre prevenção ao estupro, são medidas essenciais para combatê-lo. Essas ações coletivas são fundamentais porque abordam o problema do estupro de forma abrangente, atuando em várias frentes para criar um ambiente mais solidário e seguro para as vítimas. Promover programas abrangentes de educação sexual nas escolas e comunidades, e discutir questões de gênero e sexualidade de maneira saudável, são medidas eficazes no combate ao estupro. Incluir a educação sexual no currículo escolar pode transformar a sociedade e mudar essa cultura de machismo e objetivação das mulheres.

 

Referências

[1] https://www.ipea.gov.br/portal/categorias/45-todas-as-noticias/noticias/13541-brasil-tem-cerca-de-822-mil-casos-de-estupro-a-cada-ano-dois-por-minuto.

[2] TAVARES, F. M. S. Representação social do abuso sexual infantil e as práticas escolares em professores do ensino fundamental. 2019. 89 f. Dissertação (Mestrado) – Pontifícia Universidade Católica de Goiás, Escola de Ciências Sociais e da Saúde, Goiânia, 2019. Disponível em: https://tede2.pucgoias.edu.br/bitstream/tede/4337/2/Fernanda%20Maria%20Siqueira%20Tavares.pdf. Acesso em: 07 jul. 2023.

[3] https://veja.abril.com.br/brasil/nao-e-nao-lula-sanciona-lei-que-protege-mulheres-em-bares-e-shows/mobile.

[4] https://g1.globo.com/sp/bauru-marilia/noticia/2022/10/03/mulher-denuncia-pastor-de-igreja-no-interior-de-sp-por-assedio-sexual-em-mensagens.ghtml.

[5] https://g1.globo.com/politica/noticia/2016/06/bolsonaro-vira-reu-por-falar-que-maria-do-rosario-nao-merece-ser-estuprada.amp.

[6] https://desconstrucaodiaria.com/2016/10/10/sobre-a-romantizacao-do-estupro/.

 

 




SOBRE AS AUTORAS

Márcia Martins e Maria Madalena Ribeiro são acadêmicas da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziram este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre de 2023 (janeiro a junho de 2024). Foram orientadas pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

Os direitos de famílias LGBTQIAPN+

Os direitos de famílias LGBTQIAPN+

É importante abordar que em 1950, ser homossexual era crime. Isso mostra a opressão e a injustiça que essas pessoas enfrentaram. Desde 1978, o movimento LGBTQIAPN+ tem conquistado diversos direitos [1]. Apesar das vitórias, ainda há muito a ser feito. O dia 28 de junho é um dia que deve ser celebrado e essa luta deve continuar, pois todos devem ser livres para viver suas vidas com direitos iguais e livres de discriminações.

As pessoas LGBTQIAPN+ têm o direito à formação e à construção de famílias, direito que não se resume apenas a um aspecto casual. Pelo contrário, existem leis que as protegem e amparam, como o reconhecimento da união estável, o casamento com direito a divórcio com separação de bens e o direito à adoção. Ainda é comum vermos preconceitos relacionados a essa formação familiar, preconceitos e discriminações que são passados de geração para geração, muitas vezes enraizados por diferentes causas, incluindo a influência da religião.

No entanto, os grupos católicos LGBTQIAPN+ têm sido importantes motores de mudança dentro da igreja, defendendo a inclusão e o respeito às pessoas LGBTQIAPN+ e promovendo um diálogo construtivo sobre as questões que envolvem essa comunidade. Segundo uma publicação da CNN em 2023 [2], o Papa Francisco afirmou que a igreja “está aberta” à população LGBTQIAPN+ e que a instituição deve guiar o caminho espiritual, mas enfatizou que “existem regras que regulam a vida católica”. Essas declarações foram feitas durante um pronunciamento a jornalistas em um avião.

As famílias LGBTQIAPN+ estão sendo cada vez mais aceitas pela sociedade ao longo dos anos, além de se mostrarem modelos que fazem parte da nova definição de família. Segundo Quirino Rangel, em 2019 [3], o pesquisador Éric Feugé observou 46 famílias com crianças entre um e nove anos e concluiu que elas foram capazes de redefinir e propor novos modelos culturais de paternidade e masculinidade, conforme analisado pelo Montreal Gazette. De maneira geral, os filhos de casais LGBTs ainda não se tornaram adultos, mas já se mostram crianças e adolescentes sensíveis às realidades, às diversidades, culturalmente menos reacionários e preconceituosos que a média da população

Afirmar que pais LGBTQIAPN+ ao adotarem crianças torna estas crianças gays é um grande mito, uma afirmação sem fundamentos. A orientação sexual não influencia o ambiente familiar, como já comprovado por cientistas. Com a implementação e a aplicação dessas leis na sociedade, podemos iniciar um processo de reeducação, transformação e respeito pelas escolhas e sexualidades individuais, independentemente de quais sejam elas. Ao desconstruirmos o estereótipo da família tradicional, um modelo que ignora toda a riqueza da diversidade e perpetua preconceitos sob a forma de discriminações, percebemos que devemos construir uma sociedade mais justa e igualitária, independentemente de sua forma, pois todas as famílias são válidas e merecem todo respeito.

 

REFERÊNCIAS

[1] https://dorconsultoria.com.br/2022/05/20/conquistas-do-movimento-lgbt-no-brasil

[2] https://www.cnnbrasil.com.br/internacional/papa-francisco-igreja-esta-aberta-a-populacao-lgbtqia-mas-ha-regras/

[3] RANGEL, Quirino. Pesquisas revela que pais gays costumam ser ótimos na criação de filhos. https://observatoriog.bol.uol.com.br/noticias/2019/02/pesquisa-pais-gays-otimos-criacao-filhos.




SOBRE AS AUTORAS

Macielle Rodrigues Silva e Naiane Isabela Silva são acadêmicos da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziram este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre letivo de 2023 (janeiro a junho de 2024). Foram orientados pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

A intolerância religiosa no âmbito escolar

A intolerância religiosa no âmbito escolar

No atual sistema de ensino, a religião faz parte do contexto escolar em matérias facultativas como o ensino religioso, ou em matérias obrigatórias como filosofia, história e sociologia. Porém, quando damos ênfase à disciplina de religião, é visível o favoritismo nas escolas por religiões socialmente mais aceitas pela maioria, como, por exemplo, o cristianismo, que possui 22,2% de fiéis, e o catolicismo, com 64,6%, segundo o censo de 2010 [1]. Isso acaba deixando outras religiões em segundo plano, sendo pouco citadas, e quando mencionadas, na maioria das vezes é em algum evento ou projeto escolar.

Com isso em mente, podemos observar que mesmo nas escolas que não adotam a disciplina de ensino religioso, o proselitismo é encontrado e reproduzido. Segundo uma matéria publicada no G1 por Moreno em 2017, ‘Uma quantidade muito grande de professores começa as aulas com oração, uma Ave Maria ou um Pai Nosso’ [2]. Devido a esse fato ocorrer em sala de aula, muitos alunos se sentem obrigados a realizar essas orações. O proselitismo religioso é aplicado repetidamente, visto que algumas escolas adotam feriados religiosos católicos, como a Páscoa e festas juninas.

No que diz respeito às aulas de ensino religioso, estas geralmente têm foco em ensinar sobre o cristianismo, ignorando outras religiões, como as de matrizes africanas. Segundo uma publicação de Guimarães e Xarão em 2021. na revista científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento, o STF apoia essa prática, pois ‘em 27 de setembro de 2017, ao rejeitar a ADI 4.439/2010 e reconhecer a constitucionalidade do Decreto nº 7.107, de 11 de fevereiro de 2010, que instituiu o ensino religioso confessional’ [3]. Este destaca em lei que a disciplina de ensino religioso pode ser baseada apenas em uma religião, o que desrespeita e ataca a liberdade de pensamento e de crença dos alunos.

Outro fato que evidencia o favoritismo religioso em relação às religiões baseadas no cristianismo é o fato de as religiões de matrizes africanas serem alvo frequente de intolerância religiosa no Brasil, já que não recebem ênfase ou espaço nas escolas, sendo lembradas apenas em comemorações específicas durante o ano, como o Dia da Consciência Negra. Outras religiões presentes no Brasil, como as indígenas, raramente são mencionadas nas salas de aula.

Este cenário contribui para a desinformação, perpetuando a intolerância religiosa no Brasil. Segundo Bernardo (2023), em matéria da BBC News, ‘O número de denúncias de intolerância religiosa no Brasil aumentou 106% em apenas um ano, passando de 583 em 2021 para 1.200 em 2022, uma média de três por dia. (…) A maioria das denúncias foi feita por praticantes de religiões de matriz africana, como umbanda e candomblé’ [4]. Esses números são resultado do preconceito, que também é silenciosamente demonstrado na escola, apesar de afirmar não ter preferências ou partidos religiosos. A escola deve ser laica e não ter preconceitos, no entanto, quando os jovens expressam suas religiões, principalmente de matriz africana, são reprimidos. Por isso, muitos alunos têm medo de seus colegas e até mesmo dos profissionais, pois alguns ainda se preocupam se o ‘destino’ do aluno será ‘o inferno’.

Há relatos, em matéria do G1 [5], de que uma estudante seguidora do candomblé, após passar mal na escola, foi acusada por colegas, funcionários e até mesmo pela diretora da escola de estar possuída pelo demônio. Após mais intolerâncias, disfarçadas de conselhos como ‘Procure uma igreja para aceitar Jesus’ ou ‘Quando vai começar a macumba?’, ela registrou uma denúncia na Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância. Outro episódio foi relatado em uma matéria de 2023 da revista Correio Braziliense [6], que descreve uma mãe vestida com roupas religiosas de matriz africana tendo a matrícula de sua filha negada em uma escola, aparentemente devido às suas vestimentas.

Segundo a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB N°9.475, de 22 de julho de 1997, no Art. 33, ‘O ensino religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante da formação básica do cidadão e constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo’ [7]. No entanto, em 2017, o STF votou a favor do Decreto nº 7.107/2010, que instituiu o ensino religioso confessional. De acordo com uma pesquisa do G1 de 2017, ‘De acordo com os dados mais recentes, um terço das escolas oferece o ensino religioso, mas os alunos são obrigados a participar'[2].

Diante disso, vemos que a escola atual não segue a LDB no art. 33, o que leva os educandos a terem uma visão limitada das religiões, excluindo-os da diversidade religiosa brasileira. Essa diversidade só seria possível se o Estado adotasse uma postura laica em todos os contextos, uma vez que o sistema atual favorece a perpetuação da intolerância religiosa. Concluímos com uma frase retirada de uma matéria da Agência Gov, de Pai Aurélio de Odé: ‘A separação entre Estado e religião é um desafio em muitos lugares. Promover a laicidade é crucial para garantir a liberdade religiosa e a igualdade para todos os cidadãos'[8] (Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania).”

 

Referências

[1] Censo 2010: número de católicos cai e aumenta o de evangélicos, espíritas e sem religião. agência IBGE notícias, 2023. Disponível em: https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-sala-de-imprensa/2013-agencia-de-noticias/releases/14244-asi-censo-2010-numero-de-catolicos-cai-e-aumenta-o-de-evangelicos-espiritas-e-sem-religiao. Acesso em 25/03/2024.

[2] MORENO, Ana Carolina. Proselitismo existe mesmo em escolas que proíbem o ensino religioso confessional, diz especialista. G1, 2017. Disponível em: https://g1.globo.com/educacao/noticia/proselitismo-existe-mesmo-em-escolas-que-p roibem-o-ensino-religioso-confessional-diz-especialista.ghtml. Acesso em 25/03/2024.

[3] GUIMARÃES, Marilia; XARÃO, José Francisco Lopes. Ensino religioso confessional: A decisão do STF e o enfraquecimento do estado laico no Brasil. G1, 2021. Disponível em: https://www.nucleodoconhecimento.com.br/educacao/decisao-do-stf#:~:text=Esta%20foi%20a%20decis%C3%A3o%20do,instituiu%20o%20ensino%20religioso%20confessiona. Acesso em 25/03/2024.

[4] BERNARDO, André. Liberdade religiosa ainda não é realidade: os duros relatos de ataques por intolerância no Brasil. BBC NEWS Brasil, 2023. Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/brasil-64393722#:~:text=O%20n%C3%BAmero%20de%20den%C3%BAncias%20de,Grande%20do%20Sul%20(51). Acesso em 25/03/2024.

[5] PRADO, Anita; LANNOY, Carlos De. Adolescente denuncia ter sofrido intolerância religiosa por funcionários do colégio que estuda em Nova Iguaçu. G1, 2023. Disponível em: https://g1.globo.com/rj/rio-de-janeiro/noticia/2023/10/06/adolescente-denuncia-ter-sofrido-intelorancia-religiosa-por-funcionarios-do-colegio-que-estuda-em-nova-iguacu.ghtml. Acesso em 25/03/2024.

[6] BRASIL, Agência. Com traje candomblecista, mãe tem matrícula da filha negada. Correio Braziliense, 2023. Disponível em: https://www.correiobraziliense.com.br/brasil/2023/02/5073011-com-trajes-candomble cista-mae-tem-matricula-da-filha-negada.html. Acesso em 25/03/2024.

[7] BRASIL. Ministério de Educação e Cultura. LDB- N°9.475, de 22 de julho de 1997 Art 33. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9475.htm#:~:text=%22Art.,vedadas%20quaisquer%20formas%20de%20proselitismo. Acesso em 25/03/2024.

[8] AQUINO, Yara. Debate sobre liberdade religiosa aponta perspectivas de tolerância a diferentes crenças. Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC), 2024. Disponível em: https://agenciagov.ebc.com.br/noticias/202401/mesa-redonda-sobre-liberdade-religiosa-promovida-pelo-mdhc-aponta-perspectivas-de-respeito-e-tolerancia-a-diferentescrencas. Acesso em 25/03/2024.




SOBRE OS AUTORES

Lorrane Borges Lima e Walison Moreira dos Santos Paranhos são acadêmicos da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziram este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre letivo de 2023 (janeiro a junho de 2024). Foram orientados pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

O combate à cultura do estupro e os direitos de crianças e adolescentes

O combate à cultura do estupro e os direitos de crianças e adolescentes

Dos 159 mil registros feitos pelo Disque Direitos Humanos ao longo de 2019, 86,8 mil são de violações de direitos de crianças ou adolescentes, um aumento de quase 14% em relação a 2018. A violência sexual figura em 11% das denúncias que se referem a este grupo específico, correspondendo a 17 mil ocorrências. Em comparação com 2018, o número manteve-se praticamente estável, apresentando uma queda de apenas 0,3%. [1]

A cultura do estupro é um fenômeno que permeia a sociedade de diversas formas e está relacionado a uma série de questões estruturais e culturais que perpetuam a violência contra as mulheres. Em algumas localidades, vemos que o estupro se tornou até mesmo uma espécie de cultura, onde esse termo refere-se a um conjunto de crenças, comportamentos e práticas que normalizam e justificam a violência sexual contra mulheres, homens e até mesmo crianças, tornando-se um problema social generalizado e endêmico. A cultura do estupro faz vítimas no ambiente doméstico e até em espaços públicos, de diferentes formas. No machismo, encontra apoio com a culpabilização da vítima, a minimização do agressor, a objetificação das mulheres, a banalização da violência sexual e a aceitação.

Em meio a uma sociedade marcada pela cultura do estupro, as crianças são alvo fácil de abusadores, sejam familiares, conhecidos ou estranhos. Elas podem a qualquer momento sofrer impactos que mudam totalmente suas vidas, e o trauma vivido na infância leva a efeitos devastadores na saúde física e emocional dessas crianças, moldando sua visão sobre relacionamentos, intimidade e confiança. O impacto dessas experiências pode persistir por toda a vida, afetando negativamente suas escolhas, relacionamentos futuros e sua capacidade de se sentirem seguras e confiantes em sua própria sexualidade.

Para combater a cultura do estupro, é fundamental que a sociedade como um todo se engaje na reflexão sobre suas próprias atitudes e valores em relação à violência sexual, que se sensibilize para as consequências devastadoras desse tipo de crime e que assuma a responsabilidade de promover a igualdade de gênero e a dignidade das mulheres. Isso requer um esforço coletivo para desconstruir mitos, estereótipos e preconceitos que legitimam a violência e para construir novos modelos de masculinidade e feminilidade baseados no respeito mútuo, na empatia e na igualdade de direitos.

Em suma, a cultura do estupro é um problema social complexo e enraizado que requer uma abordagem sistêmica para ser superado. É preciso que toda a sociedade se mobilize para desafiar as normas e valores que sustentam a violência sexual, para promover a educação e a conscientização sobre a importância do consentimento e para criar um ambiente mais seguro e acolhedor para todas as pessoas, independentemente de seu gênero. A mudança é possível, mas exige o comprometimento de todos os indivíduos e instituições para construir uma cultura de respeito e dignidade para todas as pessoas.

A violência estrutural que acarreta estupro precisa ser mais trabalhada nas comunidades em geral, principalmente nas instituições escolares, uma vez que podemos ver que nos ambientes escolares, as crianças e adolescentes têm mais liberdade para dizer e se expressar sobre o que está acontecendo com eles, pois o acolhimento e a percepção de quem convive com as crianças são muito grandes, podendo identificar suas diferentes reações e comportamentos, e assim saber quando eles estão bem ou precisando de ajuda. Torna-se imprescindível que medidas efetivas sejam tomadas para combater a cultura do estupro e proteger as crianças de violências sexuais. Ações de prevenção e conscientização, tanto em nível individual quanto institucional, são fundamentais para promover a segurança e o bem-estar infantil. Investimentos em capacitação de profissionais da área de educação, saúde e assistência social são essenciais para a identificação precoce de casos de violência sexual e o encaminhamento adequado das vítimas para receberem o apoio necessário. Portanto, é fundamental reconhecer o impacto negativo que a cultura do estupro tem sobre o desenvolvimento das crianças, assegurando que elas tenham seus direitos protegidos e promovendo uma sociedade mais segura e igualitária para todos.

A cultura do estupro e a violência contra crianças são problemas graves que afetam as comunidades do campo. As disparidades econômicas, sociais e educacionais nessas regiões muitas vezes tornam as crianças mais vulneráveis a abusos e agressões. A falta de acesso a serviços de proteção e apoio, a normalização da violência e a perpetuação de estereótipos de gênero contribuem para a prevalência desses casos. Além disso, a falta de denúncia e a impunidade dos agressores também são fatores que perpetuam esses crimes. É fundamental que as comunidades do campo se mobilizem para enfrentar esses problemas, promovendo a educação sobre direitos e prevenção de abusos, incentivando a denúncia de casos e apoiando as vítimas. As autoridades locais e a sociedade civil também devem se envolver ativamente na proteção das crianças e na punição dos agressores. A conscientização e a ação coletiva são essenciais para erradicar a cultura do estupro e a violência contra crianças nas comunidades do campo, garantindo um ambiente seguro e saudável para o desenvolvimento de todos os indivíduos.

 

Referência

[1] Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania. Ministério divulga dados de violência sexual contra crianças e adolescentes. Disponível em: https://www.gov.br/mdh/pt-br/assuntos/noticias/2020-2/maio/ministerio-divulga-dados-de-violencia-sexual-contra-criancas-e-adolescentes. Acesso em 18/06/2024.




SOBRE AS AUTORAS

Katiane da Cunha Ribeiro e Larissa Emanuelly Santos Gomes são acadêmicas da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziram este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre letivo de 2023 (janeiro a junho de 2024). Foram orientadas pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

A terra é mãe, a terra é mulher: agroecologia e feminismo

A terra é mãe, a terra é mulher: agroecologia e feminismo

“Sem o feminismo, não há agroecologia”, frase encontrada em diversos movimentos e redes sociais. A agroecologia é uma ferramenta de empoderamento, o cuidado com a terra, o solo, uma forma harmoniosa de viver. Agricultoras e camponesas que lutam pela conscientização dos direitos das mulheres são protagonistas de suas próprias histórias à medida que batalham por políticas sociais, ambientais e econômicas. A agroecologia acolhe essa diversidade, com afeto e sabedoria ancestral, garantindo segurança alimentar e nutricional.

Segundo Oliveira (2005) [1], perceber o corpo por essa perspectiva leva à compreensão da diversidade corporal, tanto do ponto de vista biológico quanto dos múltiplos significados culturais, integrando-se ao seu ambiente ancestral. A mulher traz essa integração do corpo, vida, terra, natureza, maternidade, ação e luta. Como Oliveira nos mostra, em diversas experiências de movimentos sociais e vivências comunitárias, as mulheres protagonizam a luta agroecológica! Sendo maioria nos territórios, elas se articulam nas comunidades para debater questões de gênero, não apenas no campo, mas também na cidade. Como mulheres do campo, são lutadoras e feministas, protagonistas de suas próprias histórias.

Elas levantam a bandeira do cuidado com a Mãe Terra, nossas sementes, nossa água. Têm a característica de sempre motivar outras mulheres contra a violência de gênero. O feminismo traz uma contribuição valiosa para a análise do conceito de patriarcado, revelando suas raízes históricas. Akotirene (2021) [2] destaca o quanto a luta das mulheres ainda enfrenta desafios significativos em relação à classe social, raça, periferia e negritude. Para as mulheres, o corpo também é um ponto de intersecção de várias categorias da dinâmica social, formando uma rede complexa de desigualdades e experienciando múltiplas colisões dos eixos estruturais de opressão da nossa sociedade, especialmente de gênero, raça e classe social. O papel subordinado da mulher e as diversas formas de opressão social que ainda enfrenta, de natureza patriarcal, perpetuam estereótipos paternalistas. Se não reconhecermos o papel e o trabalho das mulheres, não haverá agroecologia. Portanto, o desrespeito aos direitos das mulheres ainda é uma prática cotidiana.

Como educadores do campo, membros de movimentos sociais e sonhadores utópicos, precisamos trazer o feminismo e a agroecologia para as discussões nas escolas. É essencial fortalecer as práticas agroecológicas, fortalecendo espaços sociais e políticos, escapando dos espaços de opressão e melhorando a qualidade de vida das mulheres. Devemos inserir mais mulheres nos espaços políticos e de representatividade, não apenas na ação, mas também no papel.

O reconhecimento das lutas das mulheres e do feminismo na agroecologia se expandirá à medida que se tornarem pauta nas discussões dos espaços que ocupamos. Isso depende de um esforço da sociedade, especialmente dos homens, para compreender e contribuir para a redução da histórica desigualdade enfrentada pelas mulheres. Exige esforço das mulheres para desmistificar a desvalorização de seus trabalhos, historicamente menos valorizados em uma sociedade machista e patriarcal.

 

Referências

[1] OLIVEIRA, Eduardo David de. Filosofia da ancestralidade: corpo e mito na filosofia da Educação Brasileira. UFC. 2005. 353f. – Tese (Doutorado) – Universidade Federal do Ceará, Programa de Pós-graduação em Educação Brasileira, Fortaleza (CE), 2005.

[2] AKOTIRENE, Karla. Interseccionalidade. São Paulo: Pólen, 2019.




SOBRE A AUTORA

Karina Mendes é acadêmica da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziu este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre letivo de 2023 (janeiro a junho de 2024). Foi orientada pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

Agroecologia e os povos originários

Agroecologia e os povos originários

Os portugueses, por volta do ano 1500, ao afirmarem ter descoberto novas terras habitadas por nossos antepassados indígenas, acreditaram que conheciam a melhor forma de trabalhar a terra. Este modelo diferia radicalmente do praticado pelos povos originários, como registrado por Caminha (1500) [1], que escreveu:

Eles não lavram nem criam, nem há aqui boi, nem vaca, nem cabra, nem ovelha, nem galinha; nem nenhuma outra alimária que costumada seja ao viver dos homens; nem comem senão desse inhame que aqui há muito; e dessas sementes e frutos que a terra e as árvores de si lançam.

Foi implementado um novo modelo de plantação conhecido como monocultura, que evoluiu para a agricultura convencional que conhecemos hoje, eliminando vastas áreas da vegetação original para dar lugar a culturas isoladas como milho, feijão, soja, arroz, entre outras. Entretanto, ao longo dos anos, especialmente no século XXI, está se descobrindo que os portugueses estavam completamente equivocados, pois eram os povos originários que possuíam o conhecimento verdadeiro sobre o manejo da terra. Nas palavras dos invasores, implantaram um modelo de produção que visava ‘desenvolver’ as regiões do país. O modelo de exploração monocultural tornou-se um grande problema com o avanço das novas tecnologias, culminando na chamada revolução verde, um nome pomposo que escondia uma lógica de produção em larga escala, resultando em um aumento exponencial do desmatamento e das queimadas.

Com o tempo, começaram a surgir críticas ao modelo descrito acima, levando ao surgimento da agroecologia, um campo da ciência que busca estudar sistemas agrícolas sustentáveis. Na década de 60, o ritmo acelerado de crescimento da produção e do consumo estava prevendo catástrofes naturais e sociais que inevitavelmente levariam a uma série de desastres, conforme destacado no relatório Meadows de 1972, elaborado pelo Clube de Roma. A partir desse ponto, a questão ambiental passou a ser discutida em escala global, resultando no surgimento de diversos movimentos ecoambientalistas (Neto e Canavesi, 2002, p. 204) [2]. Como resultado, diversos modelos de produção começaram a ser desenvolvidos e modelados, incluindo a agricultura ecológica, sistemas agroflorestais, silvipastoris, agrossilvipastoris, permacultura, entre outros.

A problemática originada pelo modelo agroquímico de produção, que surgiu no final do século XIX, motivou a criação de movimentos contrários à devastação dos recursos naturais, centrados na busca por modelos alternativos de produção agrícola sustentável, como a agricultura biodinâmica, orgânica, biológica, natural, permacultura e, mais recentemente, a organo-mineral ou SAT (produção sem utilização de agrotóxicos). Tais modelos, embora variem em práticas e princípios orientadores, compartilham o ideal de sustentabilidade dos agroecossistemas (Lopes & Lopes, 2011, p.1) [3]. Atualmente, o sistema agroflorestal se destaca, pois visa produzir alimentos de forma harmoniosa com a natureza, adaptando-se ao ambiente sem destruir a vegetação local.

[…] o uso das florestas, ao longo da história, não pressupõe necessariamente a transformação delas em uma paisagem de monocultura, mas resultando em mosaicos de florestas manejadas e sistemas agroflorestais. (Neves, 2014, p.409) [4].

Os povos originários já desenvolviam modelos de produção agroecológicos, muito similares aos defendidos pela agroecologia hoje em dia. Há relatos de que cultivavam em meio à mata sem destruir a floresta local, sempre buscando manter a diversidade e a sustentabilidade ambiental. Portanto, acreditamos que os portugueses estavam equivocados ao afirmar que os índios “[…] não lavram […]” (Caminha, 1500) [1]. Pelo contrário, eles praticavam a agricultura de forma sustentável, um modelo que só recentemente foi reconhecido como o mais correto. Alves (2001, p. 15) [5] destaca a importância dos indígenas nesse contexto:

Os indígenas foram os pioneiros na implantação de sistemas agroflorestais na Amazônia, sendo reconhecidos por promover o adensamento de espécies como castanha-do-pará, cacaueiro e diversas palmeiras em diferentes locais da região.

É importante mencionar que se os seres humanos tivessem adotado modelos de produção sustentáveis desde tempos antigos, o planeta provavelmente não estaria enfrentando o atual aquecimento global tão acentuado. Ações humanas como desmatamento, queimadas e queima de combustíveis fósseis têm contribuído significativamente para altas emissões de gases como dióxido de carbono (CO2), metano (CH4) e óxido nitroso (N2O). Esses gases são responsáveis pelo efeito estufa, que por sua vez causa o aquecimento global e as mudanças climáticas.

Grande parte da comunidade científica acredita que o aumento da concentração de poluentes antropogênicos na atmosfera é a causa principal do efeito estufa, consequentemente do aquecimento global. (Silva; Paula, 2009, p.47) [6].

As mudanças climáticas afetam globalmente a vida de todos os seres vivos, alterando padrões climáticos como temperatura, umidade do ar e padrões de precipitação. Isso resulta em consequências como desertificação, extinção de espécies e desastres naturais significativos em várias partes do mundo. Segundo o Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas (2014, p. 25) [7],

Os cenários climáticos futuros indicam um aumento de eventos extremos de seca e estiagem prolongada, especialmente nos biomas da Amazônia, Cerrado e Caatinga, com acentuação a partir da metade e final do século XXI.

Os defensores do modelo agrícola convencional/monocultura geralmente são contrários aos modelos agroecológicos, devido aos altos lucros obtidos pela produção monocultural. Esses lucros beneficiam apenas pequenos grupos dominantes, enquanto a natureza e a maioria da população pagam o preço, mantendo esses grupos no poder continuamente. O capitalismo, um sistema baseado na propriedade privada e na busca incessante pelo lucro e acumulação de capital em forma de bens e dinheiro, influencia não apenas a economia, mas também aspectos políticos, sociais, culturais e éticos (Pena, 2024). [8]

Devido a isso, há poucos incentivos por parte das grandes potências para a implementação de modelos agroecológicos. Um dos poucos incentivos é o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA). Para evitar a perda de lucratividade e acesso a grandes extensões de terras, são feitas propagandas promovendo o agronegócio como solução para o ‘desenvolvimento’ do país, dificultando assim a difusão e a implementação de modelos agroecológicos. No entanto, esse modelo não é mais sustentável, pois a natureza tem mostrado sua resistência através das mudanças climáticas.

Existem inúmeros argumentos contra os defensores do agronegócio e a favor da agroecologia. Um deles é a afirmação de que os modelos agroecológicos demandam muito trabalho. De fato, muitos desses modelos são intensivos em trabalho, enfrentando desafios como a escassez de mão de obra atualmente disponível. No entanto, é crucial entender que o foco não deve ser o trabalho envolvido, mas a urgência da necessidade de adoção de modelos que minimizem os impactos das mudanças climáticas.

Outro argumento é que os modelos agroecológicos necessitam de recursos financeiros significativos. Embora seja verdade que há uma necessidade de financiamento substancial, é importante ressaltar que essa necessidade é exacerbada pelo próprio capital. Certamente vale a pena investir em agroecologia, pois ela não apenas promove práticas sustentáveis ​​e respeitosas ao meio ambiente, mas também preserva a saúde dos ecossistemas e das comunidades humanas que deles dependem.

 

Referências

[1] CAMINHA, Pero Vaz de. Carta de Pero Vaz de Caminha. 1500. Disponível em: https://www.cervantesvirtual.com/obra-visor/a-carta-de-pero-vaz-de-caminha–0/html/ffce9a90-82b1-11df-acc7-002185ce6064_2.html. Acesso em 18/06/2024.

[2] NETO, Canrobert Costa; CANAVESI, Flaviane. Sustentabilidade em assentamentos rurais: o MST rumo à reforma agrária agroecológica no Brasil. H. Alimonda (Comp.), Ecología Política. Naturaleza, sociedad y utopía, p. 203-215, 2002.

[3] LOPES, Paulo Rogério; LOPES, Keila Cássia Santos Araújo. Sistemas de produção de base ecológica–a busca por um desenvolvimento rural sustentável. REDD–Revista Espaço de Diálogo e Desconexão, v. 4, n. 1, 2011.

[4] NEVES, Pedro Dias Mangolini. Sistemas agroflorestais como fomento para a segurança alimentar e nutricional. Boletim Gaúcho de Geografia, v. 41, n. 2, 2014.

[5] ALVES, Raimundo Nonato Brabo. Características da agricultura indígena e sua influência na produção familiar da Amazônia. 2001.

[6] SILVA, Robson Willians da Costa; PAULA, Beatriz Lima de. Causa do aquecimento global: antropogênica versus natural. Terræ Didatica, v. 5, n. 1, p. 42-49, 2009.

[7] PBMC-Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas. Base científica das mudanças climáticas. Contribuição do Grupo de Trabalho, v. 1, 2014.

[8] PENA, Rodolfo F. Alves. “O que é capitalismo?”; Brasil Escola. Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/o-que-e/geografia/o-que-e-capitalismo.htm. Acesso em 08 de maio de 2024.

 



* João Edson Gomes e Edilson Pereira Ferreira Sena são acadêmicos da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziram este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre letivo de 2023 (janeiro a junho de 2024). Foram orientadados pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

Desigualdade salarial entre homens e mulheres

Desigualdade salarial entre homens e mulheres

Vivemos em uma sociedade onde as mulheres, além de trabalharem em seus empregos, também lidam com as tarefas domésticas. No entanto, um dos maiores desafios que enfrentam é a diferença salarial entre gêneros, pois os homens recebem significativamente mais, mesmo desempenhando a mesma função. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, no mês de julho de 2023, sancionou a lei nº 1.085 que garante a igualdade salarial entre os gêneros [1]. Esta lei é um direito que está previsto na Declaração Universal dos Direitos Humanos, no artigo 23, §2º, onde afirma que todo ser humano, sem qualquer distinção, tem direito a igual remuneração por igual trabalho. Infelizmente, não se observa o cumprimento desse direito na sociedade, como destacado em uma notícia publicada pelo G1 em 2022, que reportou uma diferença salarial superior a 20% [2].

Essa realidade, onde a mulher é menosprezada, é uma questão enraizada na história da sociedade há muito tempo, na qual a mulher é vista como um ser frágil, destinado apenas à procriação e à gestão doméstica. Infelizmente, essa percepção persiste nos tempos atuais, refletindo-se em uma diferença salarial cada vez mais presente e marcante.

No mesmo sentido, o site CONJUR (Consultor Jurídico), em 6 de dezembro de 2023, publicou que, de acordo com dados do IBGE, “as mulheres recebem salário 22% menor em comparação com os homens”. A disparidade salarial aumenta à medida que os cargos são mais altos – mulheres em posições de liderança chegam a receber cerca de 34% a menos do que os homens ocupantes do mesmo cargo [3] Se o direito das mulheres à igualdade salarial, quando estão na mesma profissão e função que os homens, não for respeitado, essa diferença só tenderá a aumentar. Dessa forma, o pensamento machista continuará prevalecendo, contribuindo para a desvalorização contínua da mulher.

Diariamente, as mulheres ouvem que não são capazes de realizar o que os homens fazem, sendo suas características físicas consideradas inadequadas para certas atividades. Essa visão masculina da mulher como um corpo delicado e frágil perpetua a desigualdade, mesmo quando elas possuem a mesma formação, idade e experiência necessárias para o trabalho. Infelizmente, esse pensamento machista persiste em muitas mentes, o que leva as mulheres a se sentirem oprimidas e desvalorizadas ao executar suas funções, sendo menos reconhecidas do que os homens que ocupam as mesmas posições.

Contudo, enquanto as mulheres continuarem expostas a essas situações, sem ver o reconhecimento de seu desempenho no trabalho, apesar de seus esforços diários, isso reforçará o mesmo pensamento machista de que não são capazes de competir em igualdade com os homens na mesma profissão. Esse é um pensamento enraizado por anos em uma sociedade machista, ao qual as mulheres estão submetidas diariamente.

Diante dos aspectos relacionados à desigualdade salarial entre mulheres e homens, é essencial promover atividades de conscientização nas escolas para que as crianças não cresçam com visões machistas. Educando futuros cidadãos para quebrarem esses paradigmas presentes na sociedade, tornamo-los capazes de compreender a desigualdade salarial e de se posicionarem contra os diversos pensamentos machistas que afetam até mesmo as escolhas profissionais das mulheres.

 

Referências

[1] https://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2023/07/03/lula-sanciona-lei-que-obriga-o-pagamento-de-salarios-iguais-para-homens-e-mulheres-na-mesma-funcao.ghtml

[2] https://g1.globo.com/trabalho-e-carreira/noticia/2022/04/20/pesquisa-mostra-os-cargos-com-maior-diferenca-salarial-entre-homens-e-mulheres.ghtml

[3] https://www.conjur.com.br/2023-dez-06/novas-medidas-de-igualdade-salarial-entre-homens-e-mulheres




SOBRE AS AUTORAS

Indiamara Cunha e Kátia Jesus são acadêmicas da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziram este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre de 2023 (janeiro a junho de 2024). Foram orientadas pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

Vulnerabilidade e gravidez precoce

Vulnerabilidade e gravidez precoce

Neste artigo queremos discutir a gravidez precoce [1] como uma das consequências da violência estrutural e institucional contra a mulher. A violência contra as mulheres é estrutural, pois se manifesta em todas as esferas sociais: na câmara dos deputados, nas delegacias policiais, nos espaços de trabalho público e privado e, principalmente, dentro do ambiente doméstico.

A violência contra a mulher também é institucional, pois quando imagens de policiais militares batendo em mulheres são divulgadas pela internet sem nenhuma consequência de punição, o Estado brasileiro normaliza este tratamento. O recado passado à sociedade é: “está autorizada a violência ao corpo feminino”. Nesse contexto, nota-se que a gravidez precoce é uma das faces da violência que a mulher sofre.

A violência contra o corpo feminino se manifesta de diferentes maneiras, resultando sempre na desvalorização da mulher socialmente e promovendo a precarização do seu corpo. Por exemplo, o salário feminino é inferior ao salário do homem na mesma atividade e na mesma empresa, uma violência que se manifesta de forma silenciosa e contínua. Todo mês, nos holerites, a mulher se sente diminuída.

Um dos dados que evidenciam isso é a diferença salarial: o rendimento das mulheres representa, em média, 77,7% do rendimento dos homens (R$ 1.985 frente a R$ 2.555), conforme a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad) de 2019 (CSJT, 2023) [2]. Não apenas as mulheres ganham menos nas estruturas sociais, mas também têm menores chances de ocuparem cargos de chefia. Os dados apontam para uma disparidade de gênero nas posições mais importantes dessas empresas. Apenas 17,4% das pessoas do sexo feminino possuem posição de destaque, como CFO (equivalente à diretora financeira) em bancos de investimento (Félix, 2024) [3].

Apesar de as mulheres serem maioria da população, a representação política feminina ainda é um desafio que parece estar longe de ser resolvido. Em João Pessoa, capital da Paraíba, a câmara municipal tem apenas uma vereadora. Podemos traduzir esta realidade na seguinte visão: quem toma conta do Brasil são os homens. Dentro do contexto da nossa discussão, fica a dúvida: para o homem, a gravidez precoce é um problema ou uma solução? Em 2018, foram eleitas 77 deputadas federais, 15% do total, o que, mesmo longe da paridade, representou um aumento expressivo em relação às eleições anteriores. Neste domingo (2), foram eleitas 92 mulheres para a Câmara e quatro para o Senado, totalizando 18% e 7%, respectivamente (Abreu, Mori, 2022) [4].

Dentro desta realidade, a sociedade tenta se contrapor, criando mecanismos legais que possam, de alguma forma, proteger as mulheres. Mas proteger de quem? Justamente dos homens. Alguns maiores exemplos são as delegacias especializadas e algumas leis. As Delegacias da Mulher são um espaço institucional especializado para socorrer mulheres que sofreram, ou ainda sofrem, violência por parte de homens (geralmente companheiros ou parentes). A Lei Maria da Penha define e criminaliza o feminicídio. Principalmente tirando da vítima a culpa do crime. A Lei Não é Não, por sua vez, busca proteger o corpo feminino da importunação e abuso em ambientes públicos.

Esta situação de vulnerabilidade autoriza, veladamente, o uso e abuso do corpo feminino. A menina adolescente se sente fragilizada diante do corpo masculino, sem condições de impor seus desejos e seus limites. A gravidez precoce não é apenas um trauma familiar nem uma ruptura de vida; é um caminho trilhado por muitas jovens. Neste contexto, a gravidez precoce faz parte de uma engrenagem social que normaliza esta situação. Talvez cumpra um papel importante na geração de mão de obra barata.

Referências

[1] https://ufmg.br/comunicacao/noticias/gravidez-na-adolescencia-uma-questao-de-saude-publica#:~:text=Segundo%20a%20Organiza%C3%A7%C3%A3o%20Mundial%20de,das%20mais%20altas%20do%20mundo.

[2]  CSJT. Desigualdade salarial entre homens e mulheres evidencia discriminação de gênero no mercado de trabalho. https://www.csjt.jus.br/web/csjt/-/desigualdade-salarial-entre-homens-e-mulheres-evidencia-discrimina%C3%A7%C3%A3o-de-g%C3%AAnero-no-mercado-de-trabalho. 2023.

[3] Félix, Thiago. Mulheres ocupam apenas 17% dos cargos de alto escalão em bancos de investimento, CNN, São Paulo, 2024.

[4] Abreu, Masra; Mori, Natalia. Como fica a representação feminina no Congresso Nacional a partir de 2023? Brasil de Fato, 2022.




SOBRE OS AUTORES

Graziella Rocha Baldaia e Clayton Fernandes são acadêmicos da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziram este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre de 2023 (janeiro a junho de 2024). Foram orientados pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

A polêmica da (des)criminalização do aborto

A polêmica da (des)criminalização do aborto

Os debates inerentes ao aborto são polêmicos, complexos e delicados, perpassando questões de cunho social, econômico, cultural, bioético, moral, religioso, ideológico, político e de saúde pública. Segundo Rocha (2015) [1], é comum o uso da palavra “aborto” para indicar a interrupção da gravidez. Contudo, do ponto de vista técnico, existe uma diferença entre aborto e abortamento. Conceitualmente, a Organização Mundial de Saúde (OMS) define o abortamento como a interrupção da gravidez até a 22ª semana, com produto da concepção pesando menos que 500g (BRASIL, 2012) [2]. Já o aborto é compreendido como o produto da concepção eliminado no abortamento. Pode ser classificado como espontâneo e provocado; o primeiro é interpretado como “natural” e é decorrente de inúmeras causas, enquanto o segundo é feito pela decisão da mulher (PEREIRA, 2018) [3].

No Brasil, a prática de interrupção provocada da gravidez é criminalizada, exceto nas hipóteses de gravidez decorrente de estupro, risco à vida da mulher e anencefalia do feto, previstas no Código Penal Brasileiro. Contudo, é de conhecimento geral que, mesmo com a proibição da prática, a interrupção da gravidez, para além das hipóteses previstas em lei, existe e é um fato social de ampla dimensão, sendo realizada, na maioria dos casos, em péssimas condições, colocando em risco a vida das mulheres (SANTOS, 2013) [4].

Grupos conservadores defendem a criminalização do aborto sob a pauta da moralidade religiosa e preceitos ideológicos, advogando em favor da proibição do aborto provocado, justificado pelo princípio da sacralidade da vida, cujo início ocorreria a partir da concepção. Portanto, quem aborta estaria tirando uma vida. Os argumentos sustentados pelos ativistas em favor da criminalização do aborto versam sobre a proteção ao feto/bebê considerado o mais vulnerável, além da promoção de medidas de auxílio às mães que não querem ter filhos, partindo do ponto de vista de que, ao invés de descriminalizar o aborto, deveriam ser criadas oportunidades para que as mulheres que pensam em realizar o abortamento possam ter as crianças com o amparo adequado, através de políticas de auxílio que proporcionarão condições dignas para a manutenção da gestação e para a saúde da mulher e do bebê.

Em contrapartida, grupos feministas e defensores da descriminalização do aborto, promotores de ações relacionadas à saúde da mulher, apontam a questão como um caso de saúde pública, argumentando que a prática é a razão para o elevado índice de mortalidade materna. O debate se articula no âmbito de diversas posições morais e conflitos legais, que se desdobram na perspectiva sociocultural e econômica. Ademais, os defensores da legalização do aborto argumentam que a previsão legal de proibição do aborto no Código Penal fere preceitos fundamentais da Constituição Federal, como o direito das mulheres à vida, à dignidade, à cidadania, à não discriminação, à liberdade, à igualdade, à saúde e ao planejamento familiar, entre outros. Ressaltam ainda que deveria ser garantido às mulheres o direito de decidir sobre o próprio corpo.

De acordo com um levantamento de dados feito pelo G1 na base de dados do DataSUS [5], no ano de 2020, o número de mulheres atendidas pelo Sistema Único de Saúde (SUS) em razão de abortos malsucedidos foi 79 vezes maior que o de interrupções de gravidez previstas pela lei. Segundo o levantamento, no período de janeiro a junho do mesmo ano, o SUS realizou 1.024 abortos legais em todo o Brasil e, no mesmo período, foram realizados 80.948 procedimentos de curetagens e aspirações, processos necessários para a limpeza do útero após um aborto incompleto, que são mais frequentes nos casos em que a interrupção da gravidez é provocada, ou seja, a necessidade é menor no caso de abortos espontâneos.

Fato é que existem muitas questões atreladas à legalização do aborto, e estas vão muito além da relação com o avanço científico e tecnológico. Esse embate se conecta a um sistema complexo que envolve posicionamentos sociais, políticos e religiosos. Ademais, a ideia de ser “contra” ou “a favor” do aborto é puramente individual e pautada nos ideais, valores e crenças de cada sujeito. Portanto, o tema será sempre rodeado de polêmicas em função da divergência de posicionamentos. Compreender e respeitar a diversidade de opiniões que permeiam o assunto é fundamental para a formação de um diálogo que considere os prós e contras apresentados por cada grupo, visando chegar a um consenso. Neste sentido, é fundamental considerar a realidade e as consequências da prática do aborto, principalmente no que tange à saúde da mulher.

Por fim, a legalização da prática abortiva no Brasil não será a solução para amenizar o número dos procedimentos que colocam em risco a integridade física e emocional da mulher. O ideal seria o investimento em políticas públicas de conscientização, promoção da educação sexual e do planejamento familiar, e acolhimento de mulheres em situação de vulnerabilidade, além de políticas de enfrentamento da desigualdade social. A prevenção do aborto inseguro depende de esforços de setores políticos, econômicos e sociais para garantir a ampliação do debate sobre o tema, pautado na conscientização e promoção da dignidade das mulheres.

Referências

[1] ROCHA, Wesley Braga et al. Percepção de profissionais da saúde sobre abortamento legal. Revista Bioética, v. 23, 2015. Disponível in: https://doi.org/10.1590/1983-80422015232077. Acesso em 20/03/2024.
[2] BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Prevenção e tratamento dos agravos resultantes da violência sexual contra mulheres e adolescentes: norma técnica / Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. – 3. ed. atual. Brasília: Ministério da Saúde, 2012. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/prevencao_agravo_violencia_sexual_mulheres_3ed.pd. Acesso em 20/03/2024.
[3] PEREIRA, Adriana de Jesus. O Papel do Profissional Enfermeiro Frente ao Aborto em seus Aspectos Jurídicos, Físico e Emocionais. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento, v. 07, 2018. Disponível em: https://www.nucleodoconhecimento.com.br/saude/profissional-enfermeiro. Acesso em 20/03/2024.
[4] SANTOS, Vanessa Cruz. et al. Criminalização do aborto no Brasil e implicações à saúde pública. Revista Bioética, v. 21, 2013. Disponível em https://www.scielo.br/j/bioet/a/3ZMrQd69ZnwWCGNXTsZzh7t/?lang=pt. Acesso em 05/05/2024.
[5] ACAYABA, Cíntia; FIGUEIREDO, Patrícia. SUS fez 80,9 mil procedimentos após abortos malsucedidos e 1.024 interrupções de gravidez previstas em lei no 1º semestre de 2020. G1. São Paulo. 2020. Disponível em https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/2020/08/20/sus-fez-809-mil-procedimentos-apos-abortos-malsucedidos-e-1024-interrupcoes-de-gravidez-previstas-em-lei-no-1o-semestre-de-2020.ghtml. Acesso em 05/05/2024.




SOBRE OS AUTORES

Gilvan Barrozo Dos Santos e Orlandina Aparecida Da Silva Rodrigues são acadêmicos da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziram este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre de 2023 (janeiro a junho de 2024). Foram orientados pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

A agroecologia e a voz das mulheres do campo

A agroecologia e a voz das mulheres do campo

No Brasil, a agroecologia é um instrumento de resistência na jornada de mulheres pretas e agricultoras. Observamos o quanto as mulheres sofrem com a desvalorização de seu ser e de seu trabalho, principalmente as mulheres do campo que são pretas e agricultoras, as quais passam o tempo todo cuidando dos filhos, arrumando a casa, trabalhando na roça e no quintal, cultivando. Mesmo com essa carga horária altíssima, cheia de tarefas, as mulheres têm seu trabalho desvalorizado e não reconhecido pela sociedade. Nesse cenário, a agroecologia se configura como um instrumento essencial, promovendo autonomias na trajetória das mulheres pretas agricultoras e importante e poderosa aliada na resistência e no empoderamento delas.

Ao longo da história, os homens são vistos como fortes e livres, enquanto as mulheres têm sido colocadas em uma posição de inferioridade, rotuladas como o sexo frágil e tendo seus trabalhos invisibilizados. Diante desse cenário, devemos considerar que o trabalho das mulheres do campo é de extrema importância para a contribuição da renda familiar, visto que, enquanto estão produzindo grãos, legumes, verduras, entre outros produtos, deixam de comprá-los. Dessa forma, a agroecologia surge como um instrumento crucial para as mulheres do campo conquistarem autonomia, permitindo-lhes romper com esse tratamento desigual. Através da agroecologia, elas podem evidenciar como seus trabalhos são fundamentais para a subsistência de suas famílias e das comunidades, ao mesmo tempo em que demonstram respeito pela natureza, lutam por justiça social, enfrentam o racismo, reivindicam seus espaços e direitos. A essência de seus trabalhos gera alimentos produzidos de forma orgânica e sustentável, o que contribui para a segurança alimentar da região.

O trabalho sobre agroecologia produzido como conclusão de curso, intitulado “Mulheres Rurais e Seus Quintais Produtivos: Empoderamento Feminino, Sustentabilidade e Segurança Alimentar”, de Carolina Azevedo de Brito (2020) [1], apresenta que a segurança alimentar torna acessível a todos a obtenção de alimentos, visando garantir uma vida saudável à sociedade, permitindo o acesso a uma alimentação adequada por meio de recursos locais de forma constante e sustentável. Como exemplo de um trabalho sustentável que gera segurança alimentar, podemos citar o trabalho realizado pelo Coletivo de Agroecologia Quilombo Ausente Feliz, da comunidade Quilombola de Ausente/Serro-MG, em que as mulheres produzem alimentos saudáveis e agroecológicos para o sustento da família e para vendas no entorno da comunidade. Nesse processo, elas se empoderam, tornando-se referências na luta por reconhecer o contexto em que estão inseridas e demonstrando que esse trabalho também é uma forma de resistência contra o racismo estrutural, reafirmando suas raízes e identidade, além de promover uma boa alimentação. Vale ressaltar que, além da produção para a venda e consumo próprio, em muitas comunidades do campo há também relações de doações e trocas de alimentos.

O texto “Cadernetas agroecológicas e as Mulheres do Semiárido: de mãos dadas fortalecendo a agroecologia” do Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola (FIDA, 2020) [2] aborda a informação, com base no censo de 2010, de que o quantitativo de mulheres que se encontram chefiando os lares e desempenhando outros trabalhos não trouxe visibilidade para elas. Portanto, conclui-se que, na maioria das vezes, não há políticas públicas exclusivamente destinadas às mulheres agricultoras para que as auxiliem na busca por melhores condições de trabalho e segurança. Percebe-se isso porque essas mulheres há muito tempo vivem rodeadas de violência doméstica, resultante do machismo, entre outras questões.

Em outra realidade, como em comunidades rurais do município de Serro-MG, por exemplo, dentre todos os programas governamentais e não governamentais, são as mulheres que participam ativamente. Com isso, observamos que a agroecologia/agricultura familiar tem sido uma forma de quebrar esse modelo, pois atualmente, por meio de movimentos sociais e projetos, elas têm acesso a formações políticas, sociais e econômicas, que contribuem para sua autonomia e independência. Tudo isso fortalece o reconhecimento de suas identidades enquanto mulheres tradicionais, quilombolas, campesinas que enfrentam diariamente conflitos com grandes empreendimentos minerários que estão chegando na região.

A agroecologia tem sido uma ferramenta muito utilizada pelas mulheres no enfrentamento do racismo estrutural. O texto “Agrofloresta, feminismo e agroecologia: entrelaçando saberes e fazeres das mulheres” de Lobo e Curado (2022) [3] aponta que a agroecologia é vista como um caminho em oposição à conjuntura racista e capitalista que vivenciamos na sociedade, por meio de diversas frentes de luta como: manifestações públicas, compartilhando e dando visibilidade aos saberes das comunidades e das mulheres, produzindo alimentos saudáveis, entre outras coisas. Dessa forma, com muita luta e resistência, as mulheres têm conquistado cada vez mais seu lugar de fala, mostrando o quanto seu trabalho tem importância para o mundo. Além disso, as mulheres do campo têm soltado cada vez mais sua voz através da participação em movimentos sociais, comunitários e projetos de vendas coletivas formados por mulheres.

No site da revista UOL, no texto intitulado “Bolsonaro defende agronegócio e consumo de carne ‘de segunda a domingo’” por Ricardo Brito (2022) [4], há uma fala do ex-presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, que diz, “investir no agronegócio é um bom negócio e, para mim, carne fica de segunda a domingo, desde que tenha à disposição para a gente comprar, obviamente, e recurso para tal”. Essa fala do ex-presidente defende o capital pelo fato de ser um setor que gera dinheiro rápido, uma vez que envolve projetos de grande porte e grandes empresários, os quais visam somente o lucro. Investir no agronegócio concentra recursos e poder nas mãos de poucos, gerando, assim, desigualdade social e econômica. O agronegócio, com suas produções intensivas, provoca grandes impactos no meio ambiente, como desmatamento e poluição decorrente do uso excessivo de substâncias químicas. Isso compromete a saúde pública, uma vez que o consumo de alimentos ultraprocessados e com agrotóxicos aumenta. E afeta também o bem-estar dos animais devido às condições precárias em que são mantidos, e a qualidade das plantações. Assim, percebe-se que o agronegócio não se mostra como uma produção sustentável, tampouco de boa qualidade. Ao contrário, a agroecologia é baseada na sustentabilidade, prezando pela qualidade dos alimentos e pelo bem-estar social, comunitário e coletivo. E a mulher do campo agricultora tem um papel fundamental nessa forma de produção agroecológica.

Enfim, é de suma importância trabalhar essas questões da resistência da mulher por meio da agroecologia, tanto no ambiente escolar quanto com os jovens das comunidades rurais. Promover momentos de debates sobre o tema, desenvolver atividades com os alunos e jovens das comunidades e realizar intercâmbios entre escola e territórios, de forma a explicar aos alunos e jovens que o trabalho das mulheres, assim como o trabalho dos homens, tem importância e deve ser reconhecido e valorizado.

Referências

[1] BRITO, Carolina Azevedo de. Mulheres Rurais e Seus Quintais Produtivos: empoderamento feminino, sustentabilidade e segurança alimentar. 2020, 21f. Trabalho de Conclusão de Curso (Especialização em Gestão Ambiental de Municípios) – Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia da Paraíba, Princesa Isabel-PB. Disponível em: https://repositorio.ifpb.edu.br/jspui/bitstream/177683/1607/1/CarolinaBrito_MULHERES%20RURAIS%20E%20SEUS%20QUINTAIS%20PRODUTIVOS.pdf. Acesso em: 23 de Março de 2024.
[2] FUNDO INTERNACIONAL DE DESENVOLVIMENTO AGRÍCOLA (FIDA). Cadernetas agroecológicas e as mulheres do semiárido de mãos dadas fortalecendo a agroecologia: resultados do uso das cadernetas nos projetos apoiados pelo FIDA no Brasil de agosto de 2019 a fevereiro de 2020. Salvador, Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola (FIDA), 2020, 232 p.
[3] LOBO, Natália; CURADO, Isabela. Agrofloresta, feminismo e agroecologia: entrelaçando saberes e fazeres das mulheres. Capire, 2022. Disponível em: https://capiremov.org/experiencias/agrofloresta-feminismo-e-agroecologia-entrelacando-saberes-e-fazeres-das-mulheres/ . Acesso em 23 de março de 2024.
[4] BRITO, Ricardo. Bolsonaro defende agronegócio e consumo de carne ‘de segunda a domingo’. UOL, 2022. Disponível em: https://economia.uol.com.br/noticias/reuters/2022/01/06/bolsonaro-defende-agronegocio-e-consumo-de-carne-de-segunda-a-domingo.htm . Acesso em: 24 de Março de 2024.




SOBRE AS AUTORAS

Elizete Pires de Sena e Luciene A. C. Viríssimo Brandão são acadêmicas da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziram este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre de 2023 (janeiro a junho de 2024). Foram orientadas pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

Feminicídio e violação dos direitos das mulheres

Feminicídio e violação dos direitos das mulheres

No Brasil e em muitas partes do mundo, as mulheres enfrentam diariamente uma ameaça que não deveria existir no século XXI: o feminicídio. Esse termo, criado para descrever o assassinato de mulheres por razões de gênero, reflete uma realidade brutal que permeia nossa sociedade. É uma violação flagrante dos direitos humanos e uma triste evidência da persistência do machismo e da misoginia em nossa cultura.

A Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006) e a Lei do Feminicídio (Lei nº 13.104/2015) tipificam esse crime como homicídio qualificado quando a vítima é morta em razão de seu gênero. Ao violar direitos fundamentais, como o direito à vida, à integridade física e à igualdade de gênero, o feminicídio contraria diversos artigos da Declaração Universal dos Direitos Humanos, incluindo os artigos 3º, 5º e 7º. Conforme Pires e Perregil [1] (2021) é essencial compreender esse crime como uma clara violação ao direito à vida, à segurança e à igualdade, princípios fundamentais que são sistematicamente desrespeitados quando uma mulher é vítima desse crime brutal. Nesse sentido, assumir uma posição contrária ao feminicídio é uma questão de coerência com os valores democráticos e humanistas que regem nossa sociedade.

O feminicídio é uma dura realidade em nossa sociedade contemporânea, representando uma das mais cruéis violações dos direitos humanos das mulheres. Não se trata apenas de um crime comum, mas de uma manifestação clara da desigualdade de gênero e da violência contra as mulheres. Refere-se a uma forma específica de violência de gênero, motivada pelo machismo e pela misoginia arraigados em nossa sociedade. Portanto, exige medidas específicas e uma abordagem diferenciada por parte das autoridades e da sociedade como um todo. Essa triste realidade demanda ação urgente e decidida para ser erradicada.

Os números crescentes de feminicídios no Brasil não podem ser ignorados. De acordo com o G1 (2022) [2], a cada seis horas, uma mulher perde sua vida vítima desse crime brutal, deixando um rastro de dor e sofrimento para trás. Diante desse contexto, Nascimento (2023) [3] afirma que não podemos deixar de considerar o impacto devastador desse crime não apenas nas vítimas, mas também em suas famílias e na sociedade como um todo. Além do trauma emocional profundo que afeta as famílias das vítimas, o feminicídio também contribui para a perpetuação do medo e da insegurança entre as mulheres.

Diante dessa alarmante realidade, é necessário adotar uma postura firme e comprometida na luta contra essa forma extrema de violência de gênero. O reconhecimento inequívoco de que tal crime é uma violação dos direitos humanos das mulheres e uma manifestação clara da desigualdade e opressão de gênero é imprescindível. Não podemos mais aceitar passivamente sua ocorrência ou tratá-lo como apenas mais um crime. É imperativo que nos posicionemos de forma clara e inequívoca contra ele, defendendo a igualdade, o respeito e a dignidade das mulheres em todas as esferas da vida. Não se pode negar que o feminicídio é uma manifestação direta da desigualdade de gênero e do machismo estrutural que permeia nossa cultura. Ele reflete a ideia profundamente arraigada de que as mulheres são vistas como seres inferiores, cujas vidas têm menos valor do que as dos homens. Portanto, combatê-lo significa desafiar e transformar essas estruturas de poder desiguais que perpetuam a violência de gênero.

Defender a justiça e a responsabilização dos agressores é fundamental. Garantir que aqueles que cometem feminicídio sejam devidamente punidos é crucial para enviar uma mensagem clara de que esse tipo de violência não será tolerado em nossa sociedade. Isso envolve não apenas a aplicação rigorosa da lei, mas também a promoção de uma cultura de respeito pelos direitos das mulheres e de rejeição à violência de gênero em todas as suas formas. Para lidar com isso, é importante investir em medidas preventivas e educacionais para combater o feminicídio. Isso inclui programas educacionais que promovam a igualdade de gênero, o respeito mútuo e a não violência desde cedo, bem como políticas públicas que garantam o acesso das mulheres à justiça e aos serviços de proteção. Somente através de uma abordagem abrangente e multidisciplinar poderemos efetivamente enfrentar o feminicídio e construir uma sociedade mais justa, igualitária e segura para todas as mulheres.

Infelizmente, ainda existem vozes que minimizam sua gravidade e desconsideram suas motivações. A exemplo do ex-presidente Bolsonaro, que, de acordo com o Carta Capital (2018) [4], tratou esses crimes como algo corriqueiro, evidenciando a falta de empatia e compromisso político que pode perpetuar essa violência. No entanto, não podemos nos deixar abater por discursos que tentam normalizar o feminicídio. Devemos nos unir em torno desse objetivo comum e trabalhar incansavelmente para erradicar essa forma de violência de gênero. Isso requer uma ação conjunta e coordenada entre o Estado, as organizações da sociedade civil e a população em geral.

Para avançarmos nessa luta, é fundamental promover o diálogo e a colaboração entre os diversos setores da sociedade. Somente assim poderemos efetivamente enfrentar o feminicídio e construir uma sociedade mais justa e igualitária, onde todas as mulheres possam viver livres do medo e da opressão. Resta claro que o combate ao feminicídio é uma questão de direitos humanos e de justiça social. Devemos nos manter firmes em nossa determinação de erradicar essa epidemia de violência de gênero e garantir que todas as mulheres possam viver com dignidade e segurança. Juntos, podemos e devemos fazer a diferença.

Referências

[1] https://innocenti.com.br/a-importancia-da-luta-em-defesa-e-garantia-dos-direitos-humanos-das-mulheres/#top

[2] https://g1.globo.com/monitor-da-violencia/noticia/2023/03/08/brasil-bate-recorde-de-feminicidios-em-2022-com-uma-mulher-morta-a-cada-6-horas.ghtml

[3] https://sites.uel.br/lesfem/nada-e-como-a-mae-a-vida-de-criancas-e-adolescentes-orfaos-do-feminicidio/

[4] https://www.cartacapital.com.br/blogs/brasil-debate/o-discurso-que-legitima-o-feminicidio/




SOBRE AS AUTORAS

Elidiana Martins da Silva e Márcia Vicente de Sales são acadêmicas da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziram este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre de 2023 (janeiro a junho de 2024). Foram orientadas pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

Educação sexual e responsabilidade

Educação sexual e responsabilidade

Desde a década de 1970, segundo Juliane Pariz, Celito Francisco Mengarda e Giana Bitencourt Frizzo (2012) [1], a maternidade na adolescência vem sendo identificada como um problema de saúde pública. Complicações obstétricas com repercussões para a mãe e o recém-nascido, bem como problemas psicológicos, sociais e econômicos, têm fundamentado essa afirmação, evidenciando a gravidez na adolescência como um fenômeno complexo e preocupante, pois esta é uma fase de descobertas e mudanças, tanto físicas quanto emocionais. Nesse contexto, os adolescentes muitas vezes estão expostos a situações de risco, incluindo relações sexuais sem proteção, ocasionando um desafio tanto para os adolescentes quanto para a sociedade em geral. As ações voltadas para lidar com essa temática têm se apoiado em resoluções fundamentadas em políticas educacionais de educação sexual.

É imprescindível que haja Educação Sexual nas escolas para que os adolescentes tenham acesso a informações sobre métodos contraceptivos e todas as consequências de uma relação desprotegida, como DSTs e gravidez indesejada. Assim, esses jovens podem desenvolver uma sexualidade responsável, na qual tenham autonomia e garantia de seu bem-estar. Fornecendo informações precisas e abrangentes sobre educação sexual aos adolescentes, reduziremos os índices alarmantes de gravidez na adolescência.

De acordo com as informações disponíveis no site do Gov.br [2], diariamente, 1.043 adolescentes no Brasil se tornam mães. A cada hora, ocorrem 44 nascimentos de bebês cujas mães são adolescentes, com duas dessas jovens tendo entre 10 e 14 anos de idade. Esses dados foram obtidos por meio do Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos (Sinasc), uma ferramenta do Sistema Único de Saúde (SUS). Esses fatos apontam um grande problema, pois, segundo Marta Edna Holanda Diógenes Yazlle (2006), [3] a gravidez neste grupo populacional vem sendo considerada, em alguns países, um problema de saúde pública, uma vez que pode acarretar complicações obstétricas, com repercussões para a mãe e o recém-nascido, bem como problemas psicossociais e econômicos.

Nesse contexto, a educação desempenha um papel crucial, fornecendo informações precisas sobre saúde sexual e capacitando os jovens a possuírem habilidades de tomada de decisão e autoconhecimento, fundamentais para promover escolhas saudáveis e responsáveis, auxiliando na prevenção de gravidezes não planejadas. Portanto, investir em programas educacionais abrangentes que abordem questões ligadas à sexualidade é de suma importância para enfrentar esse desafio e garantir um futuro mais promissor para os jovens brasileiros.

Em revisão crítica da literatura, Ana Cristina Garcia Dias e Marco Antônio Pereira Teixeira (2010) [4], constataram que a gravidez precoce acarreta aumentos significativos nos riscos de mortalidade, tanto para a mãe quanto para o bebê, além de elevar as chances de parto prematuro, anemia, aborto espontâneo, eclâmpsia e depressão pós-parto. Adicionalmente, segundo Ana Cristina Garcia Dias (2010), há impactos sociais consideráveis, como o abandono dos estudos, desorganização familiar, afastamento do convívio escolar, isolamento social e dificuldade de inserção no mercado de trabalho. O contexto individual e familiar também é profundamente afetado, gerando um abalo emocional.

No entendimento de Leila Maria Vieira, Sandra de Oliveira Sales, Adriana Aparecida Bini Dória e Tamara Beres Lederer Goldberg (2006), [5] métodos de prevenção da gravidez e dos perigos associados ao sexo sem proteção são essenciais para que os jovens experimentem uma sexualidade saudável e responsável. Isso garante a prevenção tanto da gravidez não planejada quanto das doenças sexualmente transmissíveis e promove o direito humano à expressão sexual separada da reprodução, permitindo uma maior liberdade nesse aspecto da vida. As instituições de ensino, sendo grandes parceiras dos alunos e o lugar onde passam boa parte do tempo, podem atuar como mecanismos de inserção do assunto, trazendo palestras educativas que já são realizadas pelas entidades públicas, além de uma preparação estrutural do corpo docente, valorizando, dessa forma, o corpo do adolescente e o desenvolvimento do pensamento crítico.

Segundo César Aparecido Nunes (1987) [6], a temática da sexualidade é constantemente controversa, pois abarca uma variedade de questões, desde aspectos religiosos até considerações éticas, abrangendo diversas perspectivas. Ao abordar esse assunto, muitas pessoas tendem a associá-lo exclusivamente ao ato sexual. Entretanto, o conceito de sexualidade é muito mais amplo e não se limita apenas a isso, podendo também englobar aspectos relacionados à saúde. De acordo com Gabriela Cabral da Silva Dantas (2024) [7], isso implica na responsabilidade individual de cuidar do próprio corpo, a fim de evitar situações indesejadas no futuro, como a contração de doenças ou uma gravidez precoce e indesejada. Portanto, ao integrar a educação sexual no currículo escolar de forma abrangente, as instituições de ensino não apenas contribuem para o desenvolvimento integral dos estudantes, mas também desempenham um papel crucial na redução dos índices de gravidez na adolescência e na promoção da saúde sexual e reprodutiva.

Para mudar esse contexto, a escola deve trabalhar a educação sexual respeitando a faixa etária das crianças e adolescentes, abordando o respeito ao próprio corpo, ao corpo do outro e à sexualidade de modo pedagógico, envolvendo aspectos da vida como questões emocionais, sensações corpóreas, afeto, razão, amizade e gênero. Cabe aos profissionais a maneira de introduzir e abordar o tema de forma inteligente e aberta, quebrando tabus e preconceitos entre os jovens. Na maioria dos casos, os pais e responsáveis não têm informação suficiente para assumirem essa demanda. Por meio das Secretarias de Educação dos Estados e do Distrito Federal, o Ministério da Educação (MEC), em parceria com o Ministério da Saúde, deve oferecer programas de formação continuada para os professores, capacitando-os para abordar os temas de forma sensível, inclusiva e baseada em evidências científicas. As Secretarias de Educação dos Estados devem estabelecer parcerias com profissionais de saúde, como enfermeiros e psicólogos, para oferecer orientações e informações especializadas aos alunos, bem como realizar campanhas de prevenção e conscientização. Dessa forma, o MEC deve avaliar regularmente a eficácia das iniciativas implementadas por meio de pesquisas, questionários de satisfação e análise de indicadores de saúde e bem-estar dos alunos, ajustando as estratégias conforme necessário.

A educação sexual será o melhor método contraceptivo, pois os métodos tradicionais não são usados pelos adolescentes, contribuindo para a redução da gravidez precoce. É importante que todas as ações sejam desenvolvidas de forma colaborativa, envolvendo não apenas os professores e a equipe escolar, mas também os alunos, os pais/responsáveis e outros membros da comunidade, para garantir uma abordagem abrangente e sustentável da educação sexual na escola.

Referências

[1] PARIZ, J.; MENGARDA, C. F.; FRIZZO, G. B. A Atenção e o Cuidado à Gravidez na Adolescência nos Âmbitos Familiar, Político e na Sociedade: uma revisão da literatura. Saúde e sociedade, São Paulo, 2012.

[2] HOSPITAL UNIVERSITÁRIO DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO MARANHÃO (HU-UFMA). Por hora, nascem 44 bebês de mães adolescentes no Brasil, segundo dados do SUS. Gov.br, 2023. Disponível em: <https://www.gov.br/ebserh/pt-br/comunicacao/noticias/por-hora-nascem-44-bebes-de-maes-adolescentes-no-brasil-segundo-dados-do-sus>. Acesso em: 19 de fevereiro 2024.

[3] YAZLLE, Marta Edna Holanda Diógenes. Gravidez na adolescência. Revista Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia, v. 28, 2006.

[4] DIAS, Ana Cristina Garcia; TEIXEIRA, Marco Antônio Pereira. Gravidez na adolescência: um olhar sobre um fenômeno complexo. Ribeirão Preto: Paidéia, v. 20, 2010.

[5] VIEIRA, Leila Maria et al. Reflexões sobre a anticoncepção na adolescência no Brasil. Revista Brasileira de Saúde Materno Infantil, v. 6, 2006.

[6] NUNES, César Aparecido. Desvendando a sexualidade. Campinas: Papirus, 1987.

[7] DANTAS, Gabriela Cabral da Silva. Educação Sexual – Brasil Escola. Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/sexualidade/educacao-sexual.htm. Acesso em 29 de fevereiro de 2024.




SOBRE OS AUTORES

Claudiana Silva Sincurá e Edmilson Oliveira Silva são acadêmicos da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziram este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre de 2023 (janeiro a junho de 2024). Foram orientados pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

Estratégias de prevenção do êxodo rural

Estratégias de prevenção do êxodo rural

O êxodo rural [1] acontece principalmente pela busca por melhores oportunidades e tem transformado o Brasil, levando ao crescimento desordenado das cidades e à formação de favelas, comunidades de pessoas de baixa renda. Além disso, é importante destacar alguns problemas que persistem na maioria das favelas, como a falta de saneamento básico, violência e insegurança dos moradores, desigualdade social e falta de renda, entre outros. Segundo o IBGE, essa migração intensa ocorreu principalmente entre 1950 e 1980, reduzindo a população rural de 65% para cerca de 25%. Apesar da desaceleração recente, o êxodo rural ainda persiste [2].

A agroecologia pode evitar o êxodo rural. Uma abordagem mais sustentável pode impedir a migração da população e o deslocamento dos trabalhadores para os centros urbanos, em busca de fontes de renda ou de uma vida melhor. Uma consequência disso é o grande aumento populacional nas cidades, resultando na criação de favelas, especialmente em grandes cidades. Esse fator se dá por conta das construções de grandes indústrias, que muitas vezes têm uma taxa de empregados muito baixa, aumentando a taxa de subemprego (bico), que inclui diaristas, camelôs e empregadas domésticas, entre outros.

A preservação ambiental é um fator que pode contribuir para a diminuição do êxodo rural. No entanto, atualmente muitas áreas estão sendo desmatadas para a criação de indústrias e para o agronegócio, o que tem levado muitas pessoas do campo a migrarem para a zona urbana, uma vez que acabam sendo expulsas de suas terras para que sejam feitos plantios em larga escala como soja e milho. Atualmente, existem leis que protegem os trabalhadores do campo para que não venham a perder suas terras e que favorecem a preservação do meio ambiente, como programas de proteção a nascentes, rios e lagos. Na maioria das comunidades, pode-se observar que um dos problemas é a grande escassez de água. Uma solução é captar água do rio até que ele seque e, com a água disponível, possibilitar que alguns moradores façam pequenos plantios, conseguindo vendê-los para obter renda e ajudar na alimentação da família. Após isso, é importante conscientizar os moradores que consomem a água, para que não haja desperdício, e observar que aqueles com uma condição financeira mais alta furam poços artesianos em lençóis freáticos ou veias d’água.

Um dos desafios enfrentados pelas famílias é a obtenção de renda, que pode se tornar complicada em várias circunstâncias, como durante períodos de seca. Por exemplo, aqueles que dependem de pequenas plantações podem encontrar dificuldades devido à escassez de água. No entanto, existem algumas medidas de apoio disponíveis para essas famílias, como o programa Garantia Safra, que é um benefício social disponibilizado aos pequenos produtores rurais com baixa renda, que geralmente são sujeitos a perdas de safra devido a fenômenos naturais, como secas de geralmente 8 a 9 meses. Além deste programa, temos o Bolsa Família, que também é um auxílio que permite que alguns produtores comprem sementes para o plantio de hortaliças. Existem também leis específicas, como o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) [3], que oferece benefícios financeiros aos produtores rurais que entregam os alimentos produzidos em suas propriedades para escolas da cidade.

Uma questão problemática que pode ser observada são os agrotóxicos. No Brasil, os agrotóxicos são comprados em larga escala e geralmente são prejudiciais à terra e à saúde, mesmo que os produtos pareçam perfeitos e bonitos. Os agrotóxicos podem causar doenças cardiovasculares e até câncer. Observando as vendas atualmente, podemos notar que algumas frutas têm um prazo de validade muito alto, o que é indício de uso de agrotóxicos. No Brasil, temos a riqueza de poder usufruir dos frutos da nossa própria cultura alimentar e ambiental. Isso ainda acontece graças a produtores que plantam vegetais e frutas utilizando, na maioria das vezes, adubos orgânicos produzidos pelos próprios animais da fazenda.

Embora os agrotóxicos possam aumentar a produção agrícola, eles também são prejudiciais ao meio ambiente e à saúde humana, criando uma situação contraditória onde a busca por maior produtividade pode resultar em danos significativos. Existem modelos de plantios usando a agroecologia que são muito utilizados. Exemplos incluem a aquaponia, que é uma fonte de produção sustentável combinada com a aquicultura (criação de peixes) e hidroponia (cultivo de plantas em água), onde são plantadas hortaliças. Experiências bem-sucedidas comprovam que esse método é muito utilizado, principalmente por agricultores, sendo viável pelo grande retorno financeiro. Além disso, as plantações com agrotóxicos estão fazendo com que alguns tipos de plantas, como os milhos crioulos, percam sua raça de origem, levando a cultura à extinção. Para aprender sobre alguns tipos de produtos, são disponibilizados cursos do SENAI (Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial), oferecidos pela prefeitura. Além de serem totalmente livres de qualquer tipo de agrotóxico ou produto prejudicial à saúde.

Contudo, com as parcerias locais, como a prefeitura, que geralmente adota leis municipais como as ‘feirinhas’, disponibilizadas na cidade semanalmente para os trabalhadores rurais, é possível que, após suas colheitas, eles comercializem seus produtos e obtenham uma fonte de renda para suas casas. Deve-se incentivar as práticas agrícolas, como a doação de sementes e o auxílio aos produtores, possibilitando a continuidade e melhora das atividades.

Referências

[1] Êxodo rural no Brasil. O êxodo rural no Brasil e seus efeitos. Disponível em: <https://mundoeducacao.uol.com.br/geografia/Exodo-rural-no-brasil.htm>. Acessado em 09/05/2024.

[2] FERNANDA. Êxodo rural no Brasil é quase o dobro da média mundial e desafia sustentabilidade do campo e cidade. Disponível em: <https://mst.org.br/2024/02/20/exodo-rural-no-brasil-e-quase-o-dobro-da-media-mundial-e-desafia-sustentabilidade-do-campo-e-cidade/>. Acessado em 09/05/2024.

[3] Programa de Aquisição de Alimentos (PAA). Disponível em: < https://www.gov.br/mds/pt-br/acoes-e-programas/inclusao-produtiva-rural/paa >. Acessado em 09/05/2024.




  • SOBRE OS AUTORES

  • Caroline Rodrigues Ferreira e Maurício Máximo Ferreira são acadêmicos da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziram este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre de 2022 (janeiro a junho de 2023). Foram orientados pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

Adaptação do mundo para as pessoas com deficiência

Adaptação do mundo para as pessoas com deficiência

A análise e as reflexões presentes neste texto foram delineadas com base em nossas experiências durante os estágios, onde observamos a estrutura das instituições escolares em relação às Pessoas com Deficiência (PcD). Fica evidente que muitas escolas e espaços públicos carecem de uma estrutura adequada para a realidade desses indivíduos. É crucial reconhecer que todos os membros da sociedade têm o direito inalienável à participação plena e igualitária. Isso abrange as pessoas com deficiência, frequentemente confrontadas com barreiras físicas, sociais e políticas que obstruem sua integração completa. Ao não adaptar o mundo para atender às suas necessidades, estamos restringindo seu acesso a oportunidades básicas e violando diretamente seus direitos humanos.

A inclusão social transcende a mera garantia de acesso físico a espaços e recursos. Ela requer a criação de ambientes acolhedores, acessíveis e promotores da participação ativa de todos, independentemente de suas capacidades físicas ou mentais. A ausência de adaptações pode levar à exclusão e ao isolamento, privando os indivíduos com deficiência de contribuir plenamente para a sociedade. O Relatório Mundial Sobre Deficiência [1] traz relatos que ilustram isso de maneira vívida, como o de Samantha:

Minha vida gira em torno dos meus dois lindos filhos. Eles me veem como a ‘Mamãe’, e não como uma pessoa em cadeira de rodas, e não julgam a mim ou a vida que levamos. Agora isso está mudando, pois meus esforços para fazer parte das suas vidas são limitados pela dificuldade de acesso em escolas, parques e lojas, as atitudes dos outros pais, e a realidade de precisar de 8 horas de ajuda diária de um cuidador… Não posso entrar nas casas dos amigos dos meus filhos, é preciso esperar do lado de fora até terminarem de brincar. Não posso entrar em todas as salas de aula da escola, e por isso ainda não conheço muitos dos outros pais. Não consigo me aproximar do playground no meio do parque ou ajudar nos eventos esportivos dos quais meus filhos desejam participar. Os outros pais me veem como alguém diferente, e já vi uma mãe impedir meu filho de brincar com o seu porque eu não poderia ajudar a supervisionar as crianças na sua casa, inacessível para mim.” (ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE, 2011, p.3)

Indivíduos com realidades semelhantes à de Samantha enfrentam diariamente desigualdades e inadequações como estas, destacando a urgência da conscientização e da adaptação do mundo para garantir, ao menos, os direitos básicos dessas pessoas. Contudo, para que haja uma transformação no mundo, é essencial promover uma mudança na mentalidade das pessoas. A adaptação do mundo para pessoas com deficiência não é apenas um imperativo moral, mas também traz benefícios tangíveis para toda a sociedade. Ambientes e serviços adaptados beneficiam não só aqueles com deficiência, mas também idosos, pais com carrinhos de bebê, pessoas temporariamente feridas, entre outros. Uma sociedade inclusiva é mais eficiente e compassiva para todos.

Apesar de haver argumentos contrários, muitos são baseados em equívocos sobre a importância da inclusão. Alguns desses argumentos incluem dificuldade na implementação de estrutura adequados para todos, pessoas sem e com deficiências. Alega-se que isso poderia causar perturbações ou exigir grandes reformas que não são viáveis. No entanto, com planejamento e comprometimento, adaptações podem ser feitas de maneira eficaz ao longo do tempo. Alguns podem questionar, ainda, se as adaptações seriam úteis para o restante da população. Contudo, muitas adaptações, como rampas de acesso, legendas em vídeos e espaços mais amplos, são benéficas para uma ampla gama de pessoas. Abordar esses argumentos geralmente envolve demonstrar os benefícios de longo prazo, tanto sociais quanto econômicos, da inclusão. Exemplos de adaptações bem-sucedidas e como a adaptação beneficia não apenas as pessoas com deficiência, mas toda a sociedade, são essenciais.

O governo implementa estratégias para a inclusão de pessoas com deficiência (PCDs) através de leis, projetos e decretos. No entanto, há limitações nesses esforços. Por exemplo, o artigo 93 da Lei da Previdência Social nº 8.213/91 [2] estabelece que empresas com mais de 100 funcionários devem reservar de 2% a 5% de seus cargos para PCDs. No entanto, essa lei não aborda a especialização necessária para esses profissionais, nem especifica o tipo de deficiência. Isso levanta questões sobre como as empresas podem proporcionar treinamento adequado e onde esses funcionários seriam inseridos e que funções desempenhariam. A lei, entretanto, muitas vezes não é cumprida, resultando na exclusão contínua das pessoas com deficiência. Falta uma verdadeira intenção de adaptar o mundo para incluí-las, deixando muitos programas apenas no papel e não na prática.

Para melhorar a inclusão de PCDs na sociedade, é essencial instalar rampas, corrimãos e banheiros adaptados, além de usar tecnologias assistivas como softwares de leitura de tela. O ensino de linguagem de sinais nas escolas e o treinamento dos professores também são cruciais para uma abordagem inclusiva em sala de aula e para promover conscientização sobre as PCDs, evitando estigmas e promovendo a compreensão.

Referências:

[1] ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE. Relatório mundial sobre deficiência 2011. Genebra: Organização Mundial da Saúde, 2011.

[2] PREVIDÊNCIA SOCIAL. Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991. Dispõe sobre os planos de benefícios da Previdência Social. Brasília, DF: Planalto, 1991. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8213cons.htm> Acesso em: 06 mai. 2014.




* As autoras são acadêmicas da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziram este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre de 2023 (janeiro a junho de 2024). Foram orientadas pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

Educação Sexual e as Escolas do Campo

Educação Sexual e as Escolas do Campo

De fato, trazer problemáticas relacionadas à educação sexual para dentro das práticas pedagógicas, no contexto das escolas do campo, pode contribuir para a queda no índice de gravidez precoce nessas realidades. “Uma vez que a Educação sobre sexualidade pode ajudar a população jovem a identificar o assédio desde cedo, por exemplo, e também no processo de decisão” (UOL, 2020).” [1]

O diálogo sobre a educação sexual e o trabalho de orientação sexual nas escolas contribui inclusive para “Prevenção de problemas graves, Gravidez indesejada, conhecimento sobre os métodos anticoncepcionais, sua disponibilidade e a reflexão sobre a própria sexualidade. Além de favorecer a apropriação do corpo, promovendo a consciência de que seu corpo lhes pertence e só deve ser tocado por outro com seu consentimento ou por razões de saúde e higiene (Parâmetros Curriculares Nacionais, p. 293)”. [2]

Esses são aspectos essenciais a serem abordados na educação sexual dos jovens. É evidente que trazer diálogos sobre tais temáticas é fundamental para garantir a saúde e o bem-estar dos adolescentes. Além disso, é importante promover debates sobre a importância da contracepção, dos métodos anticoncepcionais disponíveis e da responsabilidade na prática da sexualidade. Nesse sentido, é necessário que a educação sexual nas escolas enfatize tais questões que são socialmente relevantes, uma vez que estimula uma formação mais completa e responsável dos jovens/adolescentes. Esses impasses preparam-nos para trilhar um caminho de decisões conscientes, responsáveis e, sobretudo, saudáveis.

Fortalecer o diálogo acerca da educação sexual nas escolas do campo contribuirá não apenas para a diminuição da gravidez precoce, mas também estimulará a queda da evasão escolar e do círculo vicioso de pobreza. Em suma, estudos mostram que quando a educação se distancia da realidade socioeconômica e sociocultural dos grupos minoritários, o índice de pobreza e evasão escolar tende a crescer. Uma matéria publicada pelo UOL (2020) confirma: “A cada dez jovens de 15 a 19 anos grávidas, sete são negras e seis não estudam nem trabalham, neste sentido, a gravidez nessa etapa da vida reforça o círculo vicioso de pobreza, uma vez que diminui as chances de conclusão dos estudos e, consequentemente, resulta em menos qualificação professional (UOL.2020).” [1]

Existe o senso comum que é contra a inserção de temáticas voltadas à educação sexual nos currículos das escolas do campo. Esta minoria entende, supostamente, que trabalhar a educação sexual na escola é influenciar a relação sexual de adolescentes. Esse tipo de ideologia foi evidenciado claramente no governo do ex-presidente Bolsonaro, quando foram retiradas temáticas voltadas à educação sexual. “Nos últimos anos, especialmente na gestão de Jair Bolsonaro, os temas de sexualidade foram retirados das dinâmicas, restando somente conteúdos de alimentação saudável e incentivo a atividades físicas (G1,2023)”. [3]

Enquanto futuros/as educadores/as da educação básica, temos o dever de organizar, planejar e incluir temáticas voltadas à educação e orientação sexual nas práticas docentes nas diversas escolas. O diálogo sobre tais temáticas é a base para orientar os jovens acerca de doenças transmissíveis, gravidez precoce, pobreza e evasão escolar. A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) destaca “a importância de promover a compreensão sobre a sexualidade, suas orientações e identidades, bem como a prevenção de doenças sexualmente transmissíveis, incluindo a conscientização sobre métodos de prevenção e formas de diagnósticos e tratamentos” (BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular, 2018). [4]

A própria BNCC contempla a ideia de que a temática da sexualidade deve ser trabalhada com ênfase na reprodução e nas doenças sexualmente transmissíveis. A falta de práticas que articulem a educação sexual nos currículos tem fortalecido o processo de opressão, preconceito e racismo dentro do contexto educacional. Esse crescimento, relacionado ao preconceito e ao racismo, vem sendo influenciado por diversos grupos sociais, inclusive pelas classes dominantes. Com o intuito de promover a inserção de várias temáticas voltadas à educação sexual nas escolas do campo, poderíamos discutir e refletir sobre as problemáticas relacionadas à gravidez precoce, preconceito e racismo estrutural com maior frequência. Trazer o diálogo, a interação e o senso crítico para o contexto escolar é essencial. Nesse sentido, poderíamos utilizar o projeto “Semana para a Vida”, desenvolvido nas escolas, para promover ações de conscientização e orientação, dando visibilidade a várias temáticas.

Referências

[1] https://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/deutschewelle/2020/01/10/a-educacao-sexual-como-chave-contra-gravidez-na-adolescencia.htm

[2] http://basenacionalcomum.mec.gov.br/images/pcn/orientacao.pdf

[3] https://g1.globo.com/educacao/noticia/2023/09/15/educacao-sexual-na-escola-pode-evitar-casos-de-abuso-saiba-o-que-as-criancas-devem-aprender.ghtml

[4] https://www.gov.br/mec/pt-br/escola-em-tempo-integral/BNCC_EI_EF_110518_versaofinal.pdf




* As autoras são acadêmicas da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziram este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre de 2023 (janeiro a junho de 2024). Foram orientadas pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

Cultura do Estupro, Prevenção à Violência e Promoção da Igualdade de Gênero

Cultura do Estupro, Prevenção à Violência e Promoção da Igualdade de Gênero

Segundo a tese de 2020 de Joana Rodrigues Moreira Leite [1], a expressão “Cultura do Estupro” originou-se na língua inglesa como “Rape Culture” e surgiu na década de 1970, difundida por ativistas feministas, as quais denunciaram que o estupro era uma violência frequente, mas silenciada. Naquela época, as mulheres que trouxeram o assunto a público divulgaram informações e conscientizaram a sociedade sobre a problemática do estupro que, até então, era tratado como uma doença do estuprador ou necessidade masculina, tendo em vista que o agressor estava agindo de acordo com seus instintos. Isso foi confirmado, por exemplo, quando mulheres indígenas e escravas foram forçadas a ter relações sexuais com “homens brancos”. Ou seja, essa cultura foi normalizada após a conquista europeia do Brasil, e a sociedade atual culpa as vítimas.

A cultura do estupro é um conjunto de comportamentos, atitudes e crenças que minimizam, toleram e até incentivam a violência sexual. Por meio de educação e sensibilização adequadas, é possível combater essa cultura e promover a igualdade de gênero, o respeito e a empatia. É fundamental que a sociedade assuma a responsabilidade de desconstruir essa cultura e criar um ambiente seguro e acolhedor para todos.

A cultura do estupro atravessa diversas esferas da sociedade, perpetuando atitudes e comportamentos que normalizam a violência sexual e sempre culpam as vítimas. A discussão aqui colocada busca explorar estratégias eficazes para desconstruir essa cultura, promover a conscientização e prevenir a violência de gênero.

Segundo Patrícia Galvão [2], em 26 de julho de 2016, no Brasil, a cada 11 minutos uma mulher é estuprada, segundo dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Além disso, de acordo com levantamento divulgado pelo IPEA em 2014, apenas 10% dos casos desse tipo de violência chegam ao conhecimento da polícia, 89% das vítimas são do sexo feminino e 70% dos crimes são cometidos por parentes, namorados ou amigos/conhecidos. A maioria dos estupros é praticada por indivíduos do sexo masculino. A cultura do estupro é um problema sistêmico que precisa ser confrontado de forma direta. Isso requer educação e conscientização sobre consentimento, respeito mútuo e igualdade de gênero. Além disso, é fundamental que haja consequências reais para os agressores e um sistema de apoio sólido para as vítimas.

É necessário que os homens que cometem o estupro sejam presos e penalizados, para que eles não continuem a propagar essa cultura. Ao responsabilizar os agressores, a sociedade envia uma mensagem clara de que o estupro não será tolerado e que as vítimas serão apoiadas em busca de justiça. Além disso, a punição legal serve como um meio de dissuasão para outros potenciais agressores, contribuindo para a prevenção desse tipo de crime.

De acordo com a Lei do Minuto Seguinte (Lei 12.845/2013), as vítimas de violência sexual têm direito a atendimento imediato pelo SUS, amparo médico, psicológico e social, exames preventivos e informações sobre seus direitos. Podemos perceber que há leis que garantem o apoio às vítimas de estupro. No entanto, muitas vezes, essas leis não são tão divulgadas e, por isso, muitas mulheres não sabem de sua existência, o que faz com que muitas vítimas fiquem em silêncio.

Infelizmente, em muitos casos, as vítimas de estupro são culpadas ou responsabilizadas por terem sido agredidas sexualmente. Alguns argumentam que a vestimenta, o comportamento ou as ações da vítima contribuíram para o ocorrido, desviando a responsabilidade do agressor. Usar o termo “cultura” nesse contexto reforça a noção de que podemos e devemos trabalhar para mudar os padrões sociais e estruturas que perpetuam a violência sexual e a culpabilização das vítimas [3]. Portanto, é necessário quebrar os rótulos criados pela sociedade e as normas culturais que perpetuam a cultura do estupro. É importante educar as crianças desde cedo sobre o respeito ao próprio corpo, o respeito mútuo e, o mais importante, respeitar um “NÃO” quando ouvi-lo. Além disso, é fundamental saber ouvir e respeitar as vítimas de estupro, orientando-as para que possam procurar seus direitos. Afinal, a responsabilidade de combater essa cultura tão cruel é de todos nós.

 

Referências

[1] LEITE, Joana Rodrigues Moreira. Pode a mulher falar? Discursos de mulheres vítimas de abusos sexuais/estupro. 2020. 245 f. Tese (Doutorado em Estudos de Linguagem) – Universidade Federal de Mato Grosso, Instituto de Linguagens, Cuiabá, 2020 disponível em: <http://ri.ufmt.br/handle/1/3493>

[2] Agência Patrícia Galvão. Cultura do estupro: como ela é muito mais presente no Brasil do que você imagina. Disponível em: <https://agenciapatriciagalvao.org.br/violencia/noticias-violencia/cultura-do-estupro>

[3] MEDEIROS, L. Como assim, cultura do estupro? | Politize! Disponível em: <https://www.politize.com.br/cultura-do-estupro-como-assim/>.




* As autoras são acadêmicas da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziram este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre de 2023 (janeiro a junho de 2024). Foram orientadas pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

Gravidez na adolescência e educação sexual

Gravidez na adolescência e educação sexual

A gravidez na adolescência é um fenômeno complexo e preocupante que traz consigo uma série de desafios e consequências tanto para as mães quanto para os familiares e para a sociedade em geral. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) [1], a gravidez na adolescência é um grande desafio para a saúde pública no Brasil e, em 2020, a gravidez precoce totalizou 380.778 casos. A Organização Mundial da Saúde (OMS) [1] destaca que a gestação nesta fase é uma condição que eleva a prevalência de complicações para a mãe, para o feto e para o recém-nascido, além da possibilidade de agravamento de problemas socioeconômicos já existentes. Isso ressalta a magnitude desse problema não apenas no Brasil, mas também globalmente, onde milhões de adolescentes enfrentam a gravidez precoce.

A falta de educação e orientação sexual adequadas tem sido apontada como uma das principais causas desse fator. Muitos adolescentes desconhecem os meios e métodos contraceptivos, e os riscos associados à atividade sexual desprotegida crescem cada vez mais. De acordo Cabral e Brandão (2020), em estudo publicado na revista Cadernos de Saúde Pública [2], a falta de uma educação sexual eficaz e abrangente é um fator que contribui para as altas taxas de gravidez na adolescência no Brasil.

A educação sexual é fundamental para fornecer aos adolescentes informações precisas e relevantes sobre contracepção, prevenção de doenças sexualmente transmissíveis e desenvolvimento saudável das relações. Além disso, a educação sexual também desempenha um papel importante na promoção do respeito mútuo, da autoestima e do consentimento, ajudando assim a prevenir a gravidez não planejada e as consequências negativas associadas. Estudos na área de ciências sociais e saúde poderiam explorar o impacto da educação sexual na redução das taxas de gravidez na adolescência, bem como a eficácia dos programas de educação sexual nas escolas e comunidades. Além disso, poderiam investigar a influência de fatores socioeconômicos, culturais e familiares na tomada de decisões dos adolescentes em relação à atividade sexual e à contracepção.

Uma gravidez na adolescência tem consequências em diversos âmbitos para a sociedade, como na saúde mental e física das adolescentes, na vida profissional e na autonomia na fase adulta. Por isso, é tão importante que o tema seja encarado com sensibilidade e empatia pela sociedade como um problema sério, até porque a gravidez na adolescência é considerada de alto risco para as jovens mães, podendo acarretar diversos problemas de saúde, como aumento do risco de morte materna, hipertensão, anemia, aborto espontâneo, depressão pós-parto, entre outros.

É importante considerar que, nessa fase da vida, as jovens mães ainda não têm total maturidade para assumir uma responsabilidade tão importante quanto o papel de ser mãe. A gravidez na adolescência pode acarretar uma série de desafios físicos, emocionais e financeiros para toda a família. Os custos associados à gravidez precoce e ao parto, assim como os gastos com o sustento da criança, podem ser significativos e variar de acordo com o contexto em que a jovem está inserida. Dados do IBGE mostram que seis em cada dez adolescentes grávidas não estão envolvidas em atividades de estudo ou trabalho. Essa situação impacta direta e indiretamente a qualidade de vida das jovens mães e de suas famílias. Entre as adolescentes mães que estudam, muitas tendem a abandonar os estudos para criar os filhos, por não terem condições de pagar alguém para cuidar de seus filhos, e por isso acabam desistindo da escola.

Referências

[1] www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/noticias/2023/fevereiro/gravidez-na-adolescencia-saiba-os-riscos-para-maes-e-bebes-e-os-metodos-contraceptivos-disponiveis-no-sus

[2] Cabral, C. S.; Brandão, E. R.. Gravidez na adolescência, iniciação sexual e gênero: perspectivas em disputa. Cad. Saúde Pública, 36(8), 2020.




* As autoras são acadêmicas da Licenciatura em Educação do Campo (LEC), curso ofertado pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziram este artigo de opinião na disciplina Diversidade e Educação, ofertada no segundo semestre de 2023 (janeiro a junho de 2024). Foram orientadas pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

Refletindo sobre minha jornada de aprendizados

Refletindo sobre minha jornada de aprendizados

 

 

Desde pequena, o acesso a textos escritos era algo comum na minha casa e na comunidade em que vivia. Lembro-me claramente de ver meu tio lendo gibis, principalmente nos finais de semana. Era como um ritual para ele: pegava sua coleção de gibis, se acomodava no sofá e mergulhava nas histórias em quadrinhos. Eu achava aquilo fascinante, como ele parecia tão concentrado e entretido.

Além disso, meu tio-avô é escritor. Ele passava horas escrevendo ou editando algum texto. Às vezes, eu o via em sua escrivaninha, cercado de papéis e livros, com uma expressão séria enquanto digitava no computador ou fazia anotações. Ele sempre foi uma figura inspiradora para mim, mostrando o quanto a escrita e a leitura podem ser prazerosas. Crescer nesse ambiente me fez valorizar muito o mundo dos textos escritos, fosse lendo, escrevendo ou apenas observando os outros fazerem isso.

Antes de começar a frequentar a escola, eu já brincava de escrever letras de músicas. Eu devia ter uns cinco anos quando comecei a fazer isso. Não sabia escrever direito ainda, mas adorava imitar as letras das músicas que ouvia. Eu rabiscava no papel, fingindo que estava criando minhas próprias canções. Foi uma experiência divertida e, de certa forma, meu primeiro contato com a escrita.

Nos primeiros anos da escola, minha relação com a escrita foi muito positiva. Eu era motivada a escrever e adorava as atividades de redação. Lembro-me de escrever pequenas histórias, poemas e, claro, continuar com minha brincadeira de criar letras de músicas, mas agora de uma forma mais estruturada. A escola sempre incentivava a criatividade, e isso me fez gostar ainda mais de escrever.

Avalio o papel da escola nos meus letramentos iniciais como essencial. Foi na escola que aprendi as bases da leitura e da escrita, o que me permitiu explorar essas habilidades de formas mais complexas com o tempo. O ambiente escolar oferecia muitos estímulos e oportunidades para praticar e melhorar a escrita, e os professores sempre foram muito encorajadores.

A escrita teve um papel fundamental na minha decisão de fazer licenciatura em matemática. Embora pareça algo mais voltado para os números, a habilidade de se comunicar claramente através da escrita é muito importante. Além disso, a disciplina e a lógica que adquiri ao praticar a escrita ajudaram bastante nos meus estudos e na compreensão dos conceitos matemáticos.

Eu me recordo bem dos textos que lia e produzia na escola. Passei boa parte do meu tempo na biblioteca da escola, sempre em busca de novos livros e histórias. No Fundamental I, eu gostava de ler contos de fadas, fábulas e livros ilustrados. Produzia textos simples, como pequenas histórias sobre animais e amigos imaginários. No Fundamental II, meus interesses começaram a se diversificar. Eu lia muitas aventuras, mistérios e, claro, continuava apaixonada por gibis. Escrevia redações mais elaboradas, pequenos poemas e crônicas sobre o cotidiano escolar.

No Ensino Médio, comecei a me interessar por literatura clássica e textos mais complexos. Lia romances, poesias e livros de filosofia. Nessa época, me apaixonei por “A Moreninha”, de Joaquim Manuel de Macedo. Minhas produções textuais incluíam análises literárias, ensaios e reflexões sobre temas diversos. Minhas escolas sempre tinham biblioteca, e eu era muito motivada a frequentá-las. Os professores incentivavam o uso da biblioteca, e muitas atividades escolares envolviam pesquisas e leituras que eu adorava fazer.

Avaliando toda a minha vida escolar, noto várias mudanças nas minhas relações com a leitura e a escrita. No início, a leitura era mais recreativa e a escrita, uma forma de expressão simples. Com o tempo, ambas se tornaram mais profundas e críticas, passando a incluir análises e reflexões mais complexas. Notei que algumas mudanças na minha relação com a leitura e a escrita não foram motivadas diretamente pela escola. Por exemplo, o hábito de ler para relaxar e a prática de escrever diários e poesias surgiram por influência de familiares e amigos, e não necessariamente de atividades escolares.

Quanto às práticas com os números, elas sempre fizeram muito sentido para mim. Desde cedo, eu amava matemática. Encontrava prazer em resolver problemas e adorava quando percebia como os conceitos matemáticos se aplicavam a questões da vida real, como orçamento familiar, medições em projetos de arte ou até mesmo em jogos e estratégias.



SOBRE A AUTORA:

Rhanna Carolliny Santos Costa é graduanda da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziu este relato na disciplina Prática de Leitura e Produção de Textos, ofertada no primeiro semestre de 2024. A organização e edição do material foi feita pelo Projeto de Extensão Aula Digital.

Este trabalho foi orientado pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

Dos quadrinhos à universidade

Dos quadrinhos à universidade

Antes de frequentar a escola, os textos aos quais eu tinha acesso eram a Bíblia, jornais e revistas. Em minha casa, eu sempre via meus pais lendo a Bíblia ou revistas, e meu irmão lendo livros didáticos. Eu amava tiras de quadrinhos, especialmente as da Mafalda. Como ainda não sabia ler, sempre pedia ao meu irmão para ler para mim, mas já entendia algumas coisas pelas figuras. Os primeiros livros que ganhei eram de uma coletânea de livros bíblicos, que vinha com um CD contendo histórias em áudio e algumas músicas para complementar.

Eu aprendi a contar com meu irmão e meus primos, brincando de esconde-esconde. Antes de ir para a escola, eu já reconhecia o dinheiro porque meus avós e minha bisavó sempre me davam moedas por executar determinadas tarefas, e eu sempre comprava guloseimas com essas moedas. Entrei na escola sem saber somar ou subtrair, mas tive muita facilidade para aprender e sempre me destaquei na matemática. A escola e a família desempenharam papéis importantes e diferentes quanto ao meu letramento matemático, mas avalio que a escola foi mais importante.

Eu aprendi minhas primeiras letras com uma amiga mais velha. Brincávamos de escolinha, e ela me ensinou a escrever meu segundo nome, Camila, e palavras simples quando eu tinha 5 anos. Entrei na escola aos 6 anos, e minha professora me pediu para escrever meu nome, mas eu não sabia escrever o primeiro nome, Elida. Assim, meus primeiros dias foram traumáticos. Nos meus primeiros anos de escola, sempre fui motivada a escrever pelas professoras. Cheguei a ganhar um prêmio de melhor redação da turma, recebendo um chaveiro, o que foi o máximo para mim. Sempre gostei mais de ler do que escrever. Acho que sou uma ótima leitora, mas não tão boa escritora.

A escola foi crucial para meu letramento inicial. No ensino fundamental I, eu sempre lia histórias infantis, mas foi no fundamental II que comecei a ler diversas obras literárias e me apaixonei pela leitura. No 6° ano, conheci a Turma da Mônica, e foi amor à primeira vista. No ensino médio, tive acesso na biblioteca da escola a grandes obras literárias, como Orgulho e Preconceito e O Morro dos Ventos Uivantes. Nessa época, a leitura para mim já era quase como um vício.

Agora, na universidade, leio os textos orientados pelos professores, mas não gosto tanto de ler esses textos quanto gosto de ler livros literários. Acho que o ensino médio não nos prepara para os desafios econômicos e burocráticos da vida adulta. O que mais sinto que não aprendi na escola foi a língua portuguesa. Acho que, se consigo escrever bem, é porque li muito e ainda leio, mas a escola em si nunca me cobrou ser melhor. Acho que os alunos que se formaram comigo, que não tinham o hábito de ler autonomamente, enfrentaram muitas dificuldades após o término do ensino médio.



SOBRE A AUTORA:

Elida Camila de Souza Marques é graduanda da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziu este relato na disciplina Prática de Leitura e Produção de Textos, ofertada no primeiro semestre de 2024. A organização e edição do material foi feita pelo Projeto de Extensão Aula Digital.

Este trabalho foi orientado pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

Os livros e a leitura: portas abertas para o conhecimento

Os livros e a leitura: portas abertas para o conhecimento

 

 

 

 

Como a maioria das crianças da minha geração, fui alfabetizado em uma escola da zona urbana de uma pequena cidade do interior. Em 2004, no auge dos meus 6 anos, não era comum ter em casa computadores, smarTVs e muito menos celulares. Logo, toda a minha alfabetização ocorreu por meio de livros e cartilhas.

Antes mesmo de começar a primeira série, já sabia ler, fato esse que me enchia de orgulho. Saber ler me permitia participar das leituras nos cultos e missas aos domingos. Minha família me considerava extremamente inteligente por ter aprendido a ler tão cedo. Eu era o orgulho da vovó, que na época também estava aprendendo a ler e assim podia ajudá-la escrevendo cartas para o Divino Pai Eterno, pois ela tinha um sonho de receber uma carta do padre Robson.

Ler bem me fazia receber muita atenção dos meus familiares. Apesar dos poucos recursos, adorava ler o nome das capitais com meu pai e descobrir o nome dos países nos mapas. Meu pai sempre me dava livrinhos com historinhas, e minha mãe comprava aquelas revistas que vendedores levavam na escola. Tudo isso me incentivava a ler mais. Assim, a leitura se tornou uma paixão que me acompanha até hoje.

Na minha primeira série, minha primeira professora, a de Aparecida, além de suas aulas regulares, organizava grupos de estudos em sua casa pela manhã, onde ela avaliava a nossa leitura com o intuito de aprimorá-la. Eu adorava participar, pois sempre que lia corretamente, ganhava um doce. Nunca perdia um. A professora de Aparecida sempre dizia: “Quem lê mais, sabe mais.” Hoje, compreendo essa verdade e, trabalhando em uma escola, percebo a importância de os alunos aprenderem a ler e gostarem de ler o quanto antes. Isso abrirá um novo mundo para eles de todas as formas, fazendo com que de fato saibam mais.

Atualmente, curso duas faculdades e uma pós-graduação. Grande parte das minhas leituras são artigos, textos acadêmicos ou livros com enfoque educacional, que enriquecem meu conhecimento e aprimoram meu senso crítico. Portanto, ter o hábito de ler não só enriquece nosso conhecimento, mas também abre portas para novos mundos e possibilidades. Leia mais e descubra o quanto você pode aprender e crescer.



SOBRE A AUTORA:

Ritha de Kassia Coelho Fernandes é graduanda da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziu este relato na disciplina Prática de Leitura e Produção de Textos, ofertada no primeiro semestre de 2024. A organização e edição do material foi feita pelo Projeto de Extensão Aula Digital.

Este trabalho foi orientado pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

Minhas memórias de letramento

Minhas memórias de letramento


Desde cedo, o acesso a textos escritos em casa e na comunidade era algo comum para mim. Lembro-me de ver outras pessoas lendo, escrevendo ou manuseando livros, folhetos, jornais e revistas, principalmente durante momentos de lazer ou em situações cotidianas, como na escola ou em reuniões familiares. Minha introdução aos livros e textos mais elaborados também ocorreu cedo, por meio de quebra-cabeças, CDs interativos e outros materiais semelhantes, que despertaram minha curiosidade e interesse pela leitura.

Minha experiência com a matemática começou em casa, onde aprendi a contar e a reconhecer o valor do dinheiro. Quando entrei na escola, já tinha alguma noção de contas básicas, mas foi lá que aprofundei esses e outros conhecimentos. Acredito que tanto a escola quanto a família desempenharam papéis fundamentais nesse processo, complementando-se na construção do letramento matemático inicial.

Antes de frequentar a escola, eu já escrevia algumas coisas simples, como meu nome e palavras básicas, mas foi na escola que aprendi as primeiras letras de forma mais estruturada, aos sete anos de idade. Nos primeiros anos escolares, minha relação com a escrita era bastante exploratória, escrevendo principalmente textos narrativos simples e descrevendo experiências pessoais.

Ao longo da vida, ocorreram mudanças significativas na minha relação com a leitura e escrita. Inicialmente, eram atividades mais lúdicas e exploratórias, mas com o tempo, tornaram-se mais acadêmicas e direcionadas a objetivos específicos, como estudos e trabalhos universitários. No que diz respeito à matemática, as práticas com números sempre fizeram sentido para mim, pois eram facilmente aplicáveis à vida real. Essa relação prática contribuiu para uma compreensão mais sólida desses conceitos.

No primeiro ano de universidade, meus hábitos de leitura e escrita passaram por transformações significativas. A exigência de textos mais complexos e a necessidade de produção acadêmica trouxeram desafios, mas também possibilitaram um maior aprofundamento nos estudos. Essas mudanças trouxeram aspectos positivos, como o desenvolvimento de habilidades mais avançadas de leitura, escrita e matemática, além de uma maior autonomia intelectual. No entanto, também trouxeram desafios, como a necessidade de lidar com textos mais densos e complexos e a pressão pelo desempenho acadêmico.

No que se refere à veracidade dos textos diversos que nos cercam, acredito que seja importante estar atento e utilizar fontes confiáveis. Quanto aos conteúdos de língua e matemática que tive acesso ao longo da minha vida escolar, sinto que poderiam ter sido mais abrangentes em alguns aspectos. No entanto, considero que administro bem minhas questões financeiras, e acredito que o ensino médio tenha contribuído para isso, preparando-me para lidar com desafios nessa área.



SOBRE A AUTORA:

Maria Aparecida Luiz dos Santos é graduanda da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziu este relato na disciplina Prática de Leitura e Produção de Textos, ofertada no primeiro semestre de 2024. A organização e edição do material foi feita pelo Projeto de Extensão Aula Digital.

Este trabalho foi orientado pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.

A importância do incentivo

A importância do incentivo


Desde minhas memórias mais tenras, lembro-me de ficar sentadinha na biblioteca do meu avô, em seu escritório, enquanto ele estava à mesa lendo seu jornal Estado de Minas. Eu ficava ali ao lado com uns lápis e um pedaço de papel que embrulhava as flores. Às vezes, ia para a prateleira onde havia várias enciclopédias, mas sempre era alertada: “Muito cuidado, esses livros não são para você!”. O máximo que podia fazer era viajar pelo atlas gigante que ali existia. Quando me cansava de estar ali ou quando ele ia receber algum cliente, saía para brincar no meio das plantas e brincar de vendedora.

Em minha casa, com minha mãe, sempre fazíamos o devocional, mas era chato por ser sempre muito cedo, e as leituras eram longas e monótonas. Mas todos os dias tínhamos, e o que eu gostava mesmo era ver minha mãe todos os dias de madrugada fazendo sua leitura da Bíblia. Na igreja, era divertido, pois a tia gostava de contar histórias em um livro ilustrado bem grande, e ela sempre contava as histórias com entusiasmo e alegria.

Mas, infelizmente, quando fui para a escola, foi minha maior tristeza, pois na minha sala só havia meninos e apenas eu de menina. A professora tinha seis dedos em cada pé, uma história de palmatória e uma régua de madeira de metro. Eu, sentadinha lá atrás, no canto da sala, me esforçava para reconhecer e aprender. Era surpreendida com uma reguada na mesa que me fazia pular, e também me lembrava das gargalhadas dos meus colegas com meu susto. Era sempre chamada de burra no recreio, e para piorar, ainda tinha meu nome, que por ser de uma história bíblica que minha mãe lia, eu sempre falava assim: “Hadassa rainha Ester”, e isso sempre era motivo de chacota, além de me colocarem todo tipo de apelido. No final, ainda repeti de ano mesmo tendo conseguido nota. Me lembro que no meu boletim era 63, mas a professora, com todo seu conhecimento, convenceu minha mãe a me fazer repetir a 1ª série, pois na 4ª série eu teria dificuldade para acompanhar os demais. Escrevo isso e ainda me vem uma tristeza, pois me lembro do quanto me esforçava. Fato é que lá na bendita 4ª série estava eu repetindo, pois realmente era péssima em português e na leitura. E por aí fui rompendo, e sinceramente, as experiências com a leitura foram apenas piorando a cada dia.

Na adolescência, minha mãe, ao descobrir que eu estava namorando, ao invés de conversar comigo, me deu três livros como castigo. Nem me pergunte o nome, pois não faço ideia, apesar de ter feito um resumo de cada um deles. E toda vez que fazia algo de errado, era me dado um livro para ler, e o ódio pela leitura apenas aumentava.

Mas, depois de já crescida, ao me ver grávida, decidi pegar um livro sobre educação infantil para aprender algo sobre ser mãe. Esse livro foi o primeiro que devorei. Tinha 587 páginas com letras minúsculas, e lá, além de descobrir o quanto era benéfico a leitura, percebi o quanto a literatura me fez crescer como pessoa. Depois desse, passei a andar pelas lojas sempre buscando um novo título interessante. E cada vez mais fui evoluindo na leitura e na grafia. Ainda não tenho uma gramática perfeita, mas já evoluí bastante do que era. Depois veio o desejo de estudar, de crescer mentalmente, pois ali descobri que o conhecimento poderia me abrir horizontes. Também entendi que minha mãe, da maneira dela, queria apenas que eu abrisse a minha mente, mas eu não tinha tido boas experiências com a literatura, pois ela sempre me era colocada de maneira chata, como castigo.

Em minha casa não tinha televisão nem rádio, pois era coisa do capeta, assim dizia minha mãe. “Deus não está nisso, se você assistir, Deus vai te castigar”, dizia ela. Meu pai trazia umas televisões pequenas de tubo que tinham aqueles botões redondos preto e branco, mas minha mãe pegava e jogava pela janela, e meu pai ficava triste, calado, e ia ler os livros de faroeste dele, que minha mãe também odiava que ele ficasse ali deitado lendo. Quando ele saía, ela pegava aqueles livros e fazia fogueira, sempre xingando e falando que era do capeta.

Após meu conhecimento e evolução, procuro ponderar os meus incentivos literários e tecnológicos, pois acredito que minhas ações vão influenciar positivamente ou negativamente na evolução das pessoas ao meu redor. Busco fazer minhas leituras em horários que minhas filhas estão acordadas, para que elas vejam e desejem, e isso tem dado certo. Por elas mesmas, têm buscado suas leituras. Além disso, quando elas eram menores, sempre tiveram livros disponíveis entre os brinquedos para que pudessem ter acesso a eles. Quando íamos à casa do meu avô, buscava orientá-las para que tivessem cuidado ao folhear os livros da prateleira, as auxiliando para que não viessem as broncas do bisavô. Inclusive, elas adoram ler o livro das baleias que está ali.

As séries, filmes de princesa e desenhos são liberados, e alguns são orientados para que evitem, pois não as edificam. Mas sempre com cuidado para não ter ruptura de laços e encanto. Acredito que tenho grande impacto na evolução das gerações que estão chegando. Busco sempre orientar e viver como desejo que o mundo seja.

Sei o poder que a literatura tem sobre a evolução do ser humano. Ela pode levar a outros mundos, reais, ilusórios, criativos, e apresenta a diversidade social e cultural. É uma contribuição real para a disseminação de culturas. Por isso, acredito que ao fomentar um ambiente rico em leituras e aprendizagens, estamos não só moldando o presente, mas também plantando as sementes de um futuro mais consciente e informado.



SOBRE A AUTORA:

Hadassa Altivo Ferraz  é graduanda da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e produziu este relato na disciplina Prática de Leitura e Produção de Textos, ofertada no primeiro semestre de 2024. A organização e edição do material foi feita pelo Projeto de Extensão Aula Digital.

Este trabalho foi orientado pelo professor Carlos Henrique Silva de Castro.